Zero Hora/RS, 13 de agosto de 2007
STF | Ministros Aposentados | Ministro Paulo Brossard
Provisória, mas para sempre
ARTIGOS
PAULO BROSSARD/ Jurista, ministro aposentado deral vem crescendo ano a ano e que não há
do STF
necessidade de prorrogar a CPMF para manter seus
encargos, dado que só o acréscimo registrado no priFaz alguns anos, era ministro da Saúde pessoa de alto
meiro semestre de 2007, R$ 27 bilhões, quase enconceito, o professor Jatene. Impressionado com a
costou no total arrecadado pela questionada
penúria de recursos destinados à saúde e a gravidade
contribuição provisória, no ano passado, R$ 32 bida situação existente no setor, imaginou a criação de
lhões. Só no primeiro semestre. Se se contar o ano de
medida emergencial para superar a preocupante di2007 o acréscimo será largamente superior à soma
ficuldade. Foi criada então, 1996, pela Lei 9.311, a
"perdida", o que significa que a União pode liberar es"contribuição provisória sobre movimentação fise ônus porque ela está coberta com o simples aunanceira", CPMF, com a duração de 13 meses. No
mento da arrecadação, regular, objetivo e previsto.
exercício de 1997, a alíquota era de 0,20%, e ensejou
a arrecadação de quase R$ 7 bilhões, R$ 6.909 biMas tem mais. Enganar-se-ia quem imaginasse que
lhões, o que correspondia a 0,74% do PIB. Ocorre
parte da arrecadação da CPMF não é aplicada nos serque a contribuição provisória, como sói acontecer
viços expressamente indicados na lei que criou a concom o provisório, foi virando definitiva; em 1999 foi
tribuição, mas vai compor o superávit primário do
prorrogada até 2002, em 2002 prorrogada até 2004,
governo federal. É assim que se engana a população.
em 2004 prorrogada até 2007 e agora se pretende
prorrogá-la até 2011. A alíquota também aumentou.
Visto o problema sob outro ângulo, observei na CCJ
Começou em 0,20% em 1999, passou para 0,24%,
da Câmara que ninguém nega seja elevada a carga fisem 2000 para 0,34%, em 2001 para 0,36% e a partir
cal entre nós e que a ela não correspondem os serviços
de 2002 passou para 0,38%. Os números são impúblicos, que são defectivos, salvo raras exceções;
pressionantes. Se a arrecadação no ano de sua coninguém ignora que é generalizado o entendimento
brança inicial foi de quase R$ 7 bilhões, em 1998 foi
segundo o qual a mencionada carga deve ser aliviada,
de quase R$ 8 bilhões, em 1999 quase R$ 8 bilhões,
como condição do desenvolvimento nacional; no enem 2000 mais de R$ 14 bilhões, em 2001 mais de R$
tanto, ano a ano, o peso da carga aumenta; quer-se ver17 bilhões, em 2002 mais de R$ 20 bilhões, em 2003
dadeiramente aliviar a carga fiscal ou o que se diz é
mais de R$ 23 bilhões, em 2004 mais de R$ 26 bipura mistificação ou ardiloso ilusionismo? Pouco
lhões, em 2005 mais de R$ 29 bilhões, em 2006 mais
importa sustentar que é preciso reduzir a carga, mas
de R$ 32 bilhões, em 2007 a previsão é de R$ 35 binão adelgaçá-la, e ao contrário, aumentá-la sempre,
lhões.
ano a ano; é uma falsidade e uma falsificação.
Nesta altura, é fácil imaginar, a União não pode dispensar a contribuição. Recorreu à droga e agora está
dependente dela. Ficou impossível despedir-se do
crack ou coisa que o valha. Não sei se ninguém se
lembrou de dizer em latim, para ficar mais bonita a
tramóia, ad impossibilia nemo tenetur. Acontece que
a assertiva é falsa. A observação não é minha, mas de
um cidadão da maior autoridade no setor, Antônio Ermírio de Morais. Ele lembrou que a arrecadação fe-
Ora, se não me engano, a CPMF era de nascença provisória e nos termos do art. 20 da lei que a criou, para
vigorar durante 13 meses "contados após decorridos
90 dias da data da publicação desta lei, quando passará a ser exigida". Os 13 meses já duram mais de 11
anos... e a União quer prorrogar a sua cobrança por
mais quatro. É tempo de dizer-se, sem meias palavras, o Executivo e o Legislativo estão realmente
empenhados em reduzir a carga tributária ou não?
Zero Hora/RS, 13 de agosto de 2007
STF | Ministros Aposentados | Ministro Paulo Brossard
Continuação: Provisória, mas para sempre
O governo disse o que quer. Ele não quer reduzir um
centavo do que arrecada, a começar pela CPMF por
ser para ele o mais cômodo dos tributos. A União não
arrecada nem fiscaliza. Ela faz o sacrifício de receber
em casa o tributo que ela mascarou com a falsa denominação de "contribuição temporária". E para que
dúvida não pairasse, abriu as torneiras do erário dispondo-se a pagar o que é de lei, as emendas parlamentares, três vezes mais do que agora fora pago.
No momento em que escrevo, a imprensa informa
que a "prorrogação" está garantida mediante o compromisso de alguns favores, entre os quais, a "anistia"
para os 38 parlamentares que trocaram de partido depois da eleição. São mais alguns votos que podem ser
decisivos... E assim se cuida de aliviar a carga tributária. Entre nós há coisas curiosas. Imposto, contribuinte e parlamento são irmãos siameses e
historicamente o parlamento foi o natural defensor
do contribuinte, nenhum tributo será criado sem lei,
nenhum será cobrado sem autorização legal ou orçamentária. No Brasil não ocorre assim. Sempre ferro no contribuinte porque, se ele não é, foi ou será
sonegador...
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