Poder e Ciberespaço Excelências
Exmos Srs Convidados
É para mim um privilégio poder proferir as palavras de abertura de
mais um importante seminário organizado pelo nosso CAE/CPLP;
Felicito o seu Director pela oportunidade da escolha de um tema tão
premente e sensível.
As minhas breves palavras de abertura destinam-se apenas a dar o
mote ao seminário, lançar-vos algumas ideias para reflexão e
debate, pelo que decidi falar um pouco sobre o Poder e o
Ciberespaço.
Podemos considerar que neste nosso século está a ocorrer uma
importante mudança estrutural no Poder e que isso se deve à sua
difusão. E esta difusão acontece devido às evoluções tecnológicas
nas áreas da informação e do conhecimento, mas, e sobretudo às
cibertransformações provocadas pela revolução da informação, com
implicações estruturais, sociais e económicas profundas, afetando o
como os governos, as empresas e os indivíduos comunicam e
fazem negócios; estando também a mudar a natureza dos governos
e dos estados e a acelerar a difusão do Poder.
As barreiras à entrada no domínio do ciberespaço são praticamente
nulas, e podemos considerá-lo como um global common (recurso
comum), do qual a exclusão é difícil.
O ciberespaço não veio substituir o espaço físico e geográfico, nem
mesmo abolir a soberania dos Estados, mas veio complexificar
extremamente a noção de soberania ou de poder no nosso século.
Hoje uma parte substancial da população mundial tem acesso ao
poder
que
comunidades
deriva
da
virtuais
informação.
permitem
o
O
desenvolvimento
atravessar
de
das
jurisdições
territoriais nacionais e desenvolver os seus próprios padrões de
governação.
A característica base que podemos considerar chave nesta
Revolução da Informação assenta no aumento exponencial da
capacidade de transmissão de dados (diremos que quase infinita), e
a sua quase imediata transformação em conhecimento, a um custo
praticamente irrisório.
A vulgarização de smartphones e tablets e outros computadores
pequenos, ajudam muito a disseminar o poder pelas populações,
criando a internet um poder de comunicação ilimitado, de um para
um, de um para muitos, redes sociais, e.mail, etc.
Desta forma, quer indivíduos, organizações, empresas, governos, e
mesmo grupos criminosos e terroristas tem a possibilidade de
desempenhar um papel activo e direto na política mundial. E este
poder e nível de relação acaba por fugir ao controlo completo as
Unidades Políticas, incluindo e sobretudo, o desenvolvimento de
códigos e regras da internet.
Esta nova revolução industrial, a 3ª, cria um mundo de
interdependências globais, com uma agenda mais vasta e diversa e
em que todos parecem poder participar, representando interesses
públicos fora da alçada dos Estados, ajudando a desenvolver novas
normas e funcionando como pressão direta dobre governos para
alterarem suas políticas, assumindo uma das mais importantes
formas de soft power (na expressão de Nye).
Podemos considerar que as economias pós-modernas, baseadas
no conhecimento, estão numa fase de transição para uma situação
de total dependência das tecnologias de informação, sem qualquer
hipótese de retrocesso para os antigos processos e modos de
funcionamento. Na base desta mudança estão as Infraestruturas
Críticas (IC) que sustentam a nossa segurança nacional, o nosso
desenvolvimento sócio-económico e o nosso bem-estar.
Mas a dependência destes sistemas complexos e tecnologias trás
enormes riscos para as sociedades, para os sistemas de
comunicação e informação, para os computadores e, mais
importante ainda, para o normal funcionamento das IC que eles
suportam, estando as nossas sociedades mais vulneráveis a
diversas ameaças transnacionais de cariz subversivo.
Recordamos
no
entanto
que
estas
ameaças
derivam
das
vulnerabilidades inerentes às propriedades do ciberespaço e,
devido a estas mesmas características, a ameaça ciberespacial
difere fundamentalmente de todas as outras. Aqui seguimos Joseph
Nye, e consideramos como cibercameaças à segurança nacional: a
ciberguerra, a espionagem económica e o crime, e por último o
terrorismo.
Este
último
fenómeno,
hoje
desterritorializado,
aproveita
a
infraestrutura física e virtual existente e cria mais do que santuários
e campos de treino virtuais, efectuando um recrutamento,
financiamento e atuação também transnacional. Os sites criados e
utilizados por este tipo de organizações, que sabemos possuírem
estruturas adaptativas muito complexas, podem ser controlados ou
mesmo encerrados pelas agências governamentais, mas a
criatividade e resiliências imperam, surgindo sempre outros novos
sites.
Hoje em dias as nossas sociedades dependem cada vez mais de
um conjunto de infraestruturas consideradas críticas, porque
determinantes para o seu normal funcionamento incluindo das suas
empresas e governos. Uma ruptura no seu normal funcionamento
pode dar origem a graves perturbações sociais e levar até à perda
de vidas humanas.
Embora a tecnologia nos proteja de algumas ameaças, é
imprescindível que seja posta ao serviço da protecção das IC já
referidas. O crescente número de incidentes relacionados com
ataques a partir da camada virtual podem ser lançados contra a
camada física de IC atesta da sua relevância, enquanto alvos
preferenciais para um potencial inimigo do Estado.
É hoje razoavelmente consensual afirmar que o impacto de um
ataque cibernético sobre uma IC pode ser idêntico, ou mesmo
superior, ao de um ataque físico convencional, podemos mesmo
considerar que estas ciberarmas são verdadeiras armas de
disrupção massiva.
O ciberespaço assume assim um papel preponderante, não só
como ambiente informacional para a interligação das IC, mas
também como origem das maiores ameaças ao seu normal
funcionamento. E a esta capacidade de obter efeitos desejados
através do uso de recursos informativos do ciberdomínio, para
produzir os efeitos no ciberespaço ou fora dele, nós designamos por
ciberpoder.
Mas o cibepoder é um poder assimétrico. Não são apenas os
Estados ou as grandes organizações que a ele têm acesso, outros
actores,
mesmo
que
erráticos
conseguem
infligir
perdas
consideráveis inclusive às grandes potencias económicas e
militares.
Na realidade, o problema passa, em grande parte, pelo carácter
intelectual deste poder. Contrariamente ao que ocorria com os
meios tradicionais, no ciberespaço, mais recursos não se traduzem
necessariamente em mais poder. Isto significa que a aritmética
perde o seu valor neste novo contexto.
Esta situação de assimetria de poder, conjugada com a situação de
crescente interdependência de todos os sistemas e tendo por pano
de fundo a incerteza acerca da origem das ameaças, leva a que
seja impossível avaliar com rigor o risco associado a uma
ocorrência catastrófica envolvendo, por exemplo uma IC.
O aumento das vulnerabilidades expande a superfície de ataque; a
rede de interdependências aumenta o potencial impacto e a
dependência tecnológica amplifica o risco social.
Assim, na dialética pelo ciberpoder, a análise potencialidades e das
vulnerabilidades das IC, a identificação das ameaças, a avaliação
dos impactos e a gestão dos riscos associados, são áreas da maior
importância estratégica. Esta responsabilidade é, não só dos
governos, mas também das empresas proprietárias e operadoras
das IC, sendo assim uma tarefa que exigirá um esforço concertado
a vários níveis, incluindo o da CPLP.
Uma das questões e desafio que vos coloco para reflexão será:
• como se pode controlar estas duas camadas do ciberespaço?
Sabendo que a camada física pode estar sujeita a jurisdição e
controlo soberano, e que a camada virtual, essa sim tem um
difícil controlo jurisdicional?
Neste espaço, tal como em qualquer outro, as ameaças criam
insegurança, resultando numa procura de proteção que pode levar
à fragmentação e à criação de “condomínios fechados”.
E deixo-vos outro desafio para reflexão:
• Como ultrapassar a contradição entre o pretender proteger e
preservar a internet, para usufruto das sociedades, e ao
mesmo tempo proteger essas sociedades daquilo que
também lhes surge pela internet, levando a compromissos
imperfeitos?
A sociedade internacional hoje privilegia a interligação em
detrimento da segurança o que dificulta imenso a tarefa de todos
quantos tentam desenvolver novas e diferentes abordagens e
responsabilidades à cibersegurança. Todas as organizações,
governamentais ou privadas, que procurem enfrentar estes
problemas
terão
que
encontrar
novas
formas
de
partilhar
informação sensível acerca de ameaças e vulnerabilidades,
envolvendo todas as partes interessadas num esforço colectivo com
vista à protecção das sociedades no seu todo e das IC no particular.
É necessário que as organizações sejam adaptáveis e capazes de
acompanhar o ritmo da mudança, ajustando em permanência as
suas metodologias de avaliação do risco, tentando minimizar a
dependência da cadeia de abastecimentos.
Seja qual for o sector considerado, as organizações dependentes
destes sistemas e tecnologia devem estar preparadas para
enfrentar
um
crescimento
das
ciberameaças
criadas
pela
proliferação e integração das telecomunicações e de sistemas
informáticos em todas as IC, sendo que consideramos neste
processo uma definição da hierarquia de prioridades, concentrando
os investimentos onde eles são mais necessários e orientando esse
esforço para sectores onde as dependências garantem algum tipo
de redundância.
Os desafios são complexos mas a protecção das IC tem que ser
assumida como um verdadeiro desígnio nacional e internacional,
para o qual devem contribuir todas as entidades privadas em
parceria com os governos e organizações internacionais que lidam
com ciberameaças.
E termino com mais alguns desafios para reflexão sobre a disputa
pelo poder no ciberespaço:
• caberá apenas aos Estados o adoptar de medidas adequadas
à protecção das suas IC através de regulamentação
adequada? Ou este deve apenas ser um facilitador para que
em parceria com a sociedade civil se potenciem eventuais
sinergias para o apoio ao desenvolvimento de programas
sectoriais, e até mesmo empresariais, de proteção de IC?
• Quais as políticas e as medidas que a CPLP pode adoptar no
âmbito da cibersegurança?
• Como poderemos nós, Estados membro, aproveitar a CPLP
para potenciar as nossas medidas e cooperação no âmbito do
ciberespaço?
Bem hajam.
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