PROTOCOLOS ASSISTENCIAIS Sarcopenia em foco Índices de queda, reinternacão e mortalidade são reduzidos com o diagóstico e tratamento integrados Por Lara Berol A té então sem receber a atenção de políticas públicas e negligenciadas ao acompanhamento nutricional e da fisioterapia, a discussão sobre sarcopenia ganha espaço com o envelhecimento da população e suas consequências nos resultados assistências e econômicos no sistema de saúde. A sarcopenia é um marcador clínico importante da síndrome da fragilidade, 60 Melh res Práticas nome que se dá à instabilidade relacionada ao declínio funcional do indivíduo. É uma condição clínica que aparece silenciosamente, fazendo com que o paciente perca massa muscular e, consequentemente, a força e a precisão dos movimentos. Percebida com mais frequência nos idosos, a sarcopenia é um acontecimento fisiológico que inicia seu processo lentamente após os 30 anos, quando o indivíduo já passou da fase de total maturação da massa muscular. O declínio acontece percentualmente, ano a ano. No decorrer das décadas, os sintomas podem ser mais notados. Estimase que, a partir dos 40 anos, ocorra perda exponencial de cerca de 15% de massa muscular a cada década, com declínio mais rápido após os 65 anos. Aos 80, a perda é de quase 30% a cada década e os membros inferiores costumam ser os mais afetados. As mulheres são acometidas com mais frequência do que os homens. A doença pode ser acentuada em casos de diabetes, baixas de imunidade e processos inflamatórios. Se combinada à falta de orientação, essa perda muscular progressiva e generalizada é o que, muitas vezes, acaba levando os idosos a fraturas e quedas. A queda está entre os eventos adversos mais frequentes em unidades de internação. “Isso acontece porque a perda de massa não interfere somente na força, mas também na precisão dos movimentos”, explica Myrian Najas, professora da disciplina de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista de Medicina, da Unifesp. Outras consequências estão relacionadas ao tempo de permanência no hospital, taxa de reinternação e mortalidade. Realizado na Inglaterra em 2013 com 432 pacientes, um estudo randomizado demonstrou que as pessoas idosas com sarcopenia têm má evolução clínica após uma doença aguda, em comparação com aqueles sem a doença. O impacto no tempo de internação hospitalar é significativo: 42,5% maior nos pacientes idosos sarcopênicos do que nos idosos sem a síndrome. No mesmo grupo, o risco de readmissão não eletiva nos seis meses de seguimento e a taxa de mortalidade foram menores nos pacientes sem a perda de massa muscular (veja quadro). O idoso que não tem uma dieta rica em proteína, e não pratica atividade física, está mais sujeito aos riscos consequentes da sarcopenia. “O organismo trabalha de maneira integrada. Deve existir alimentação correta, que auxilia no atraso da perda de Os protocolos assistenciais em sarcopenia incluem várias avaliações e um programa de tratamento com frequência e necessidades definidas massa muscular, atividade física de força para ativar os nervos e ossos bons para sustentar a estrutura”, explica Myrian Najas. Equipe unida Assim como o organismo trabalha de maneira integrada, as equipes assistenciais têm papel fundamental na manutenção e na prevenção, quando o assunto é saúde do idoso. “Ninguém cuida de idoso sozinho”, alerta a professora. “Atualmente, devido ao aumento da expectativa de vida e ao consequente aumento da população idosa, as medidas de prevenção e tratamento de doenças crônicas precisam ser consideradas com maior atenção e cuidado. A sociedade deve adaptar-se e estar preparada para atender às necessidades do idoso e contribuir para a manutenção da sua independência funcional”, alerta Laís Fonseca, responsável pelo departamento de reabilitação do Hospital São Cristóvão. No caso da sarcopenia, a equipe envolvida reúne profissionais das áreas de medicina, enfermagem, nutrição e fisioterapia. “Os protocolos assistenciais clássicos no quadro de sarcopenia incluem avaliações multidisciplinares, começando pela médica. Então é organizado um programa de tratamento específico com frequência e necessidades definidas”, explica Laís Fonseca. O exemplo mais clássico dessa interação acontece entre o médico e o nutricionista. Se, por uma lado, busca-se uma dieta rica em proteína, por outro, a função renal do indivíduo deve ser monitorada. O médico tem o papel de retaguarda durante toda a reeducação alimentar. É comum, entretanto, que a condição seja percebida primeiramente pela equipe de nutrição Melh res Práticas 61 PROTOCOLOS ASSISTENCIAIS Segundo estudo, o impacto no tempo de internação nos pacientes idosos sarcopênicos é significativo: 42,5% maior do que nos idosos sem a síndrome ovos, leite, queijo e carnes vermelhas são ricos em proteína e tem de fazer parte do cardápio do idoso. É importante ajustar a dieta, observar o que o indivíduo já consome e equilibrar os alimentos, criando condições assim de o idoso ter energia e nutrientes suficientes para iniciar uma atividade física”, comenta Myrian Najas, professora da Unifesp. Assim como a dieta, os exercícios físicos devem ter acompanhamento e liberação médica, afinal, pacientes idosos podem já ter algum quadro que comprometa ou impeça a realização de atividade física regular. “As dificuldades, nesse tipo de tratamento, são as restrições clínicas que podem existir, ou mesmo limitações físicas, como redução da amplitude articular ou quadros de dor crônica que impedem a realização e a adesão ao tratamento”, esclarece a fisiologista Laís Fonseca. Descartados esses impedimentos, o estímulo físico regular tem efeitos positivos na melhora dos quadros de sarcopenia e na diminuição da perda de massa muscular. “Exercícios de força e resistência são os mais indicados”, orienta Myrian Najas. que, em um ambiente hospitalar, precisa da sintonia com o clínico ou geriatra para que estejam envolvidos. Como o risco de queda é maior no paciente mais frágil, a enfermagem tem sua responsabilidade em orientação e supervisão do doente. Só depois de um diagnóstico, é traçado um plano integrado que comtemple as diversas áreas de suporte ao idoso. Segundo Massanori Shibata Jr., diretor técnico do Hospital Santa Helena Saúde, de Santo André, a sarcopenia, apesar de fazer parte da condição natural do envelhecimento, pode ser atenuada pelo trabalho da nutrição e terapeuta físico. “Hoje, sabemos que muitos idosos têm uma dieta pobre em proteínas. Muitos deles deixam de comer, por alguma restrição alimentar, ou até mesmo por falta de acesso, alimentos como AS CONSEQUÊNCIAS DA SARCOPENIA Análise de 6 meses de readmissão não eletiva de pacientes hospitalizados Análise de taxa de mortalidade após 6 meses 1,0 1,0 0,8 Sarcopenia 0,6 Sem Sarcopenia 0,4 0,2 Probabilidade de sobrevivência Readmissão cumulativa 0,9 0,8 Sarcopenia Sem Sarcopenia 0,7 0,6 0,5 0,4 0.,0 0 50 100 150 Número de dias até a readmissão Valor = 0,003 200 0 50 100 Melh res Práticas 200 Tempo de admissão até a morte (dias) Valor por igualdade de sobrevivência = 0,001 Fonte: Kaplan–Meier - Sarcopenia: Prevalence and prognostic significance in hospitalized patients Gariballa, Salah, Clinical Nutrition, Copyright © 2013 Elsevier Ltd and European Society for Clinical Nutrition and Metabolism 62 150