Entrevista completa com Saulo Oliveira dos Santos (CRP 05/31988),
conselheiro-secretário do CRP-RJ e coordenador do Grupo de Trabalho do
Ano Temático da Avaliação Psicológica no estado do Rio de Janeiro
Jornal do CRP-RJ: A Avaliação Psicológica (AP) está presente em todos os campos de atuação do
psicólogo. Nesse sentido, esse profissional recebe a mais variada gama de demandas. Como o
psicólogo deve lidar com essa situação?
A partir das discussões que o Grupo de Trabalho (GT) de AP promoveu, foi possível entender que as
inúmeras demandas que são encaminhadas ao psicólogo muitas vezes são realizadas por
profissionais de outras áreas que não possuem (e não são obrigados a possuir) o conhecimento da
nossa profissão. Por isso, cabe ao psicólogo analisar a demanda, e, dependendo da mesma,
transformá-la, apresentando os objetivos profissionais, se esforçando para não se restringir à
descrição de fatos isolados e tentando apresentar uma visão abrangente, não “olhando”
exclusivamente para o fenômeno, mas para todo o contexto que o circunda.
A ampliação da visão acerca da AP, a qual não se restringe a uma prática exclusivamente
psicométrica ou descontextualizada de determinações históricas, sociais, econômicas e políticas,
uma vez que esses são elementos constitutivos do processo de subjetivação, é o principal desafio.
O cenário atual da nossa prática profissional deve estar voltado para a superação das ideias e
discursos psicologizantes, compreendendo as relações entre o mundo subjetivo e o mundo sóciocultural da pessoa, da instituição ou da situação avaliada.
Jornal do CRP-RJ: Que tipo de postura, seja ela técnica ou ética, é necessária para que esse
profissional possa encaminhar adequadamente essas demandas?
Acredito que o psicólogo deva analisar a demanda. É preciso pensar nas questões éticas para além
das resoluções e do Código de Ética, mas também refletir sobre as nossas práticas e os efeitos que
elas produzem. Além disso, devemos sair da zona de conforto de atender “expectativas” do
demandante e assumir o compromisso ético e social em nossa profissão, levando em consideração
que demandas não são encomendas. É preciso também voltar-se para uma intervenção crítica e
transformadora das condições de vida ou de funcionamento, dependendo da demanda, e estar
comprometido com a crítica dessa realidade a partir da perspectiva de nossa ciência e de nossa
profissão.
Reforço que acredito que o caminho seja a adoção de uma postura crítica frente ao fenômeno
apresentado e sair do lugar de “desvelador de verdades”, de prever ou de intuir comportamentos,
seja o principal passo para assumir uma postura ética, política e crítica a partir dos Direitos
Humanos e do reconhecimento da diversidade e complexidade humana para além das normativas
que regem a nossa profissão.
O objetivo do GT de AP, formado durante o Ano Temático, em 2011, não apresentou formatos de
“avaliação psicológica”; mas sim questionamos junto à categoria e aos estudantes a forma
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padronizada de se fazer a AP, que muita das vezes desconsidera a complexidade e a singularidade
humana. A discussão da nossa categoria profissional não deve ser pensada ou marcada por uma
discussão técnica. Precisamos discutir estratégias e veiculação epistemológica.
Jornal do CRP-RJ: Parte expressiva das denúncias éticas que chegam à Comissão de Orientação e
Ética (COE) do CRP-RJ diz respeito a avaliações psicológicas e à elaboração de laudos e pareceres.
Na sua avaliação, por que isso acontece? Que tipo de atuação – para além da fiscalização e
punição apenas – o CRP pode ter nesse sentido?
Para além da ausência da postura citada na pergunta anterior, durante os encontros do Ano
Temático, o GT do CRP-RJ identificou que há um escasso conhecimento das normativas que
orientam a elaboração dos documentos produzidos pelos psicólogos. Inclusive, o principal motivo
pelo qual a AP foi escolhida como discussão para o Ano Temático de 2011 refere-se às constantes
representações éticas em virtude da elaboração de documentos distanciados dos instrumentos
normativos que regem a nossa profissão.
Acho que o Ano Temático foi um exemplo do que o Sistema Conselhos pode realizar nessa
fomentação de reflexão acerca da Avaliação Psicológica. A realização de eventos temáticos que o
CRP-RJ há muito tempo tem realizado são estratégias construídas para orientar a prática
profissional. Porém, muitas discussões sobre o fazer profissional não interessam a determinadas
parcelas da categoria, pois há a interpretação de que AP restringe-se exclusivamente à mera
utilização, aplicação e correção de testes psicológicos. Isso é um equívoco! A partir desse
imaginário, mapeado durante a realização do Ano Temático, o GT discutiu com a categoria e com
os estudantes de Psicologia a prática da AP em consonância com o Código de Ética e com as
resoluções que norteiam nosso exercício profissional, a fim de assumirmos uma postura éticopolítica compromissada com as questões do social, do econômico, do político e da relação
indivíduo/sociedade: pois esses são os elementos que constituem o processo de subjetivação.
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Entrevista completa com Saulo Oliveira dos Santos (CRP - CRP-RJ