UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CÂMPUS DE JABOTICABAL TENOPLASTIA EXPERIMENTAL DO CALCÂNEO COMUM EM CÃES COM PERITÔNIO BOVINO CONSERVADO EM GLICERINA A 98%. JOÃO MOREIRA DA COSTA NETO ORIENTADOR: PROF. Dr. CARLOS ROBERTO DALECK Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias do Câmpus de Jaboticabal - UNESP, para obtenção do Título de Mestre em Medicina Veterinária - Área de concentração em cirurgia veterinária. JABOTICABAL - SP 1997 1 A meus pais Brivaldo e Maria Lúcia A minha tia Glaúcia A meus “filhos” Monique e Adriano 2 Àqueles que, na ânsia de aprender, fizeram-me prosseguir na árdua labuta do saber, meus alunos. AGRADECIMENTOS 3 - Ao Prof. Dr. Carlos Roberto Daleck, mestre e amigo, pela colaboração e orientação em todas as fases deste trabalho; - Ao Prof. Dr. Antonio Carlos Alessi, pela amizade e inestimável colaboração; - Ao Prof. Dr. João Gulherme Padilha Filho, pela amizade e valiosas sugestões apresentadas; - Ao Prof. Jaime Alves Silva, pelas condições que nos proporcionaram no Laboratório de Microscopia Eletrônica. - Ao Conselho Nacional de Pesquisas - CNPQ, pela concessão da bolsa de estudos; - Ao Departamento de Medicina Interna, Cirurgia e Reprodução Animal da Universidade Federal da Paraíba, pelo apoio e liberação para realizar o curso de mestrado, particularmente aos professores Pedro Isidro, Marcelo Sá, Onaldo Guedes Pereira e Sérgio Ricardo. - Ao Prof. José Dantas Ribeiro Filho pela amizade e estímulo; - À supervisào e aos funcionários do H.V., particularmente ao Arnildo, Antonio e Anésia, pela obtenção e manutenção dos animais utilizados neste trabalho. - As técnicas do laboratório de anatomia patológica, Francisca e Inês pelo auxilio no processamento das amostras. 4 - A técnica do laboratório de microscopia eletrônica, Claudinha, pela inestimável colaboração; - Ao fotografo Claúdio pela amizade e auxilio na realização do trabalho fotográfico. - A Bibliotecária Tieko Takamiya Sugahara pela correção das “Referencias Bibliográficas”; - Aos irmãos da Republica “Filomena”, sem os quais, o caminho teria sido demasiadamente árduo. - Ao João Pessoa e Fabiana pela amizade, companheirismo e apoio. - Aos amigos, Graça, Clodoaldo, Patrício, Eliane, Rosane e Albério, pelos bons momentos; - Aos companheiros da pós-graduação, Celso, Eraldo e Olísio pela excelente convivência; - As amigas Gisleine e Adriana, pelo estímulo e eterna amizade. - Aos amigos Beto, Eliane, Juliana e Larrisa, pela amizade, apoio e compreensão nos momentos difíceis. - A todos que direta ou indiretamente, contribuíram para realização deste trabalho. DADOS CURRICULARES DO AUTOR 5 JOÃO MOREIRA DA COSTA NETO, nascido em 16 de abril de 1965, em João Pessoa, PB,. Médico Veterinário formado pela Universidade Federal da Paraíba - Centro de Saúde e Tecnologia Rural, em maio de 1988. Professor Auxiliar III, lotado no Departamento de Medicina Interna, Cirurgia e Reprodução Animal do Centro de Saúde e Tecnologia Rural - UFPB. RESUMO 6 Título: Tenoplastia Experimental do Calcâneo Comum de cães com peritônio bovino conservado em glicerina a 98% Autor: João Moreira da Costa Neto. No presente estudo avaliou-se experimentalmente a utilização do peritônio bovino conservado em glicerina a 98%, no reparo de lesões induzidas no tendão calcâneo comum de cães. Utilizaram-se, 21 cães, adultos, sem raça definida, machos e fêmeas, com peso compreendido entre 10 e 15 kg, subdivididos aleatoriamente em sete grupos de três animais cada, sacrificados aos 02, 07, 15, 30, 60, 90 e 120 dias de observação pós-operatória. Analisaram-se os aspectos clínico-cirúrgicos referentes a recuperação funcional motora, bem membrana com o tecido como, a integração da tendíneo, mediante avaliação macroscópica, por microscopia óptica e por microscopia eletrônica de varredura. Concluiu-se, com base nos aspectos morfológicos, que o peritônio estimulou uma rápida deposição de tecido conjuntivo com mínima reação inflamatória, sendo incorporado ao tecido cicatricial e 7 servindo como alicerce para o desenvolvimento de um novo tecido, restabelecendo assim a estrutura do tendão. Do ponto de vista clínico, o “neotendão” apresentou resistência suficiente para suportar o estresse normalmente aplicado ao tendão calcâneo comum. 8 1. INTRODUÇÃO A constante preocupação em tentar minimizar os danos decorrentes das injúrias de tendões e ligamentos, têm sido objeto de estudo, tanto na Ortopedia Humana como na Veterinária. Inúmeras técnicas vem sendo desenvolvidas com o intuito de proporcionar satisfatória cicatrização tecidual com mínima formação de aderência, principalmente naqueles casos em que a aposição das extremidades não é possível. A ruptura crônica do tendão calcâneo comum, que figura como umas das mais freqüentes injúrias tendíneas observadas em cães, geralmente apresentam esse tipo de problema. As membranas biológicas preservadas em glicerina, têm sido amplamente utilizadas para reparação de inúmeras alterações anatômicas e patológicas nas diferentes espécies. Porém, sua 9 utilização em aplicações músculo-esqueléticas, particularmente nas lesões do tendão calcâneo comum, ainda é pouco estudada. Revendo a bibliografia, não detectou-se nenhuma citação a respeito da utilização do peritônio bovino na reparação do tendão calcâneo comum ou de quaisquer outros. Uma vez que essa membrana biológica já se mostrou viável em outras especialidades cirúrgicas, decidiu-se investigar seu emprego nestes casos. Dessa forma, objetivou-se, no presente estudo, avaliar experimentalmente o emprego do peritônio bovino conservado em glicerina a 98% no reparo de lesões induzidas no tendão calcâneo comum em cães. 10 2. REVISÃO DA LITERATURA Na ortopedia e traumatologia humana a preocupação em evitar a formação de aderências e manter a capacidade de deslizamento dos tendões, têm sido alvo constante de estudos para o desenvolvimento de novas técnicas e utilização de diferentes materiais para reparação de tendões danificados, principalmente no que se refere à cirurgia reparadora de ligamentos e tendões das mãos. Na cirurgia ortopédica Veterinária, as aderências também têm papel importante entre as considerações cirúrgicas, principalmente em algumas espécies, como os eqüinos, caninos e felinos, talvez, pelo tipo de atividade que desempenham (CLARK,1993). Dentre as injúrias tendíneas mais freqüentemente observadas no cão, encontram-se as lesões do mecanismo de Aquiles onde a 11 ruptura do tendão calcâneo comum é relatada com freqüência (BRADEN, 1974; BRADEN, 1976; BREE, 1982; REINKE, 1982; TOMLINSON, 1982; BONNEAU, 1983; GILMORE, 1984; BRINKER, 1990; REINKE, 1990; REINKE,1994). Em cães, as rupturas do tendão calcâneo comum podem ser parciais ou totais (POWER, 1981), agudas ou crônicas, envolvendo todos ou partes dos três componentes tendíneos, podendo ocorrer em qualquer ponto entre a junção músculotendínea e o tubérculo do calcâneo (REINKE, 1982). De acordo com POWER (1981) as rupturas parciais geralmente acontecem na junção músculo-tendínea, e as rupturas totais, ocorrem com maior freqüência próximo à inserção do tendão junto ao tubérculo do calcâneo. Ainda, segundo o autor, a etiologia das injúrias tendíneas podem estar relacionadas com a idade do animal, uma vez que com o envelhecimento ocorre uma certa degeneração dos tendões e eventualmente, uma moderada contração pode resultar em ruptura. Essa hipótese também é defendida por BRINKER (1990) e por REINKE (1993). Muitas injúrias tendíneas se desenvolvem durante corridas, provavelmente, quando os animais esforçam o membro pélvico para apoio. Nos cães, as raças susceptíveis a este tipo de 12 injúria são as de grande porte, as esportivas e as de trabalho, geralmente com mais de cinco anos de idade (BRINKER, 1990). REINKE (1993) sugeriu que a etiologia da ruptura do tendão, junto à sua porção tendínea, em fêmeas caninas idosas, assim como ocorre em mulheres idosas, pode estar relacionada a fatores que incluem: (i) osteoporose, (ii) hipotireoidismo, (iii) excesso de peso, (iv) altas dosagens de corticóides e (v) vida sedentária associada à inatividade. Todos esses fatores causam diminuição do suprimento sangüíneo e subseqüente degeneração do tendão com alteração na matriz colágena. Observou ainda que as fraturas avulsivas de cães com menos de dois anos de idade, estão associadas à incompleta maturação do osso no sítio de inserção do tendão. ARNER & LINDHOLM (1959) estudaram as mudanças histológicas ocorridas após a ruptura do tendão calcâneo comum em 74 pacientes humanos e concluíram que as mudanças degenerativas observadas, não foram secundárias ao dano do tecido traumatizado, e sim, devido à ocorrência de rupturas das partes livres do tendão. Porém, não puderam fornecer informações definitivas a respeito destas mudanças degenerativas, sugerindo que 13 danos ao suprimento sangüíneo poderiam ser responsáveis por tais mudanças. Outros autores (GELBERMAN, 1984; MOUTINHO,1989; BRADLEY, 1992; anteriormente MORI,1996) corroboram com a hipótese descrita de que a diminuição do suprimento sangüíneo no tendão calcâneo comum que ocorre após a terceira década de vida, pode ser considerado fator desencadeante; e explica a ocorrência natural de certas mudanças no tecido tendíneo com o avanço da idade em humanos. Segundo esses autores outros fatores também levam a diminuição da resistência do tendão, ou seja, doenças reumáticas, infecções sistêmicas e aumento do estresse implicado por exercícios extremos. A cicatrização tendínea subsequente ao trauma segue, segundo CLARK (1993) padrão similar ao da maioria dos outros tecidos conjuntivos, sendo bem definida em relação ao tempo necessário para perfeita união e resistência cicatricial após a união das extremidades tendíneas por meio de suturas. De acordo com RAIZER (1995), na primeira semana o processo cicatricial se inicia com brotamentos capilares e invasão de fibroblastos indiferenciados a partir do paratendão e tecidos adjacentes. Por volta do terceiro dia já ocorre síntese de colágeno e 14 substância fundamental. Na segunda semana, a reação vascular, assim com a proliferação fibroblástica e produção de colágeno, alcançam seu pico máximo. Na terceira e quarta semanas as fibras de colágeno próximas às extremidades tendíneas orientam-se longitudinalmente e aquelas no centro da ferida cicatricial permanecem desorganizadas e perpendiculares às linhas de estresse. O estágio de remodelamento ocorre a partir da quarta semana estendendo-se até a vigésima, havendo redução na massa cicatricial conforme o processo de colagenólise e de produção de colágeno direcionam as fibras de colágeno num plano paralelo ao eixo longitudinal do corpo do tendão. Esta organização que confere resistência à tensão é dependente de movimentação do tendão para enfraquecer as aderências aos tecidos adjacentes Segundo CLARK (1993) por mecanismos que ainda dependem de esclarecimentos, a aplicação de força naturalmente direcionada e sustentável ao tecido colágeno em processo de cicatrização induz ao realinhamento das fibras de colágeno. Posteriormente, o remodelamento da cicatriz diminuirá o número e a rigidez das aderências que por ventura se formarem, melhorando assim os resultados funcionais. 15 Em virtude do comportamento cicatricial tendíneo várias pesquisas têm sido desenvolvidas, tanto na Ortopedia Humana como na Veterinária com o objetivo de preservar a capacidade de deslizamento do tendão. Dessa maneira SRUGI & ADAMSON (1972) compararam histologicamente a reação tecidual de dez diferentes tipos de fios de sutura colocados em tendão flexor de cães e concluiram que: (i) o melhor material de sutura pode ser o náilon se o critério da reatividade tecidual for o padrão fundamental de julgamento; (ii) que o fio de aço inoxidável e outras suturas sintéticas têm comportamento semelhante, embora outros fatores como trauma tecidual, aperto do nó e edemaciação da região devam ser considerados e (iii) que suturas trançadas produzem uma grande resposta celular tecidual que pode ser explicada devido a maior área de superfície de material estranho exposto. ARON (1981) propôs um novo tipo de sutura para tendões, “o ponto modificado de Kessler”, também chamado de “loocking loop”. Esse padrão de sutura é de fácil aplicação, utiliza pouco material e requer poucas penetrações. Assim, minimiza o comprometimento da microcirculação promovendo menor formação de tecido cicatricial e conseqüente diminuição de aderências. TOMLINSON & MOORE (1982) utilizaram esse padrão de sutura 16 para o reparo de rupturas de tendão calcâneo comum no cão e verificaram que, ao contrário da sutura de “Bunnell”, possui as vantagens de preservar o suprimento sangüíneo intrínseco do tendão, promover boa reaproximação das extremidades, além de ser de simples e rápida aplicação. Por essas vantagens, minimizam a formação de aderências. Os autores também recomendaram sua utilização em outros tipos de injúrias de tendão. GILMORE et al. (1984) descreveram o uso da sutura com fio de aço multifilamentado “barbed” para reparo de lacerações ou rupturas do tendão do calcâneo em cães, com fixação temporária da articulação por meio de parafuso de osso esponjoso. Verificaram que este tipo de sutura, apesar da facilidade de implantação, mínimo manuseio de tecidos e colocação de pouca quantidade de material de sutura não reativa. Não apresentou boa aposição das extremidades tendíneas na maioria dos casos, embora os animais tenham recuperado o uso funcional do membro após o processo de cura. Todos os tratamentos cirúrgicos para rupturas do tendão calcâneo em cães têm em comum a imobilização temporária da articulação társica em parcial extensão para diminuir a tensão e promover uma revascularização precoce. Assim, BONNEAU (1983) 17 utilizou cerclagem com fio de aço para imobilização da articulação társica em 145 graus de extensão por um período de seis semanas. A imobilização dessa articulação num ângulo de aproximadamente 135 graus (ângulo de 45 graus entre o tubérculo do calcâneo e a tíbia) com auxílio de um parafuso de osso esponjoso, passado através do tubérculo do calcâneo e fixado à porção distal da tíbia é o método mais empregado por diversos autores, principalmente em cães de porte grande e obesos (BRADEN, 1974 e 1976 ; VAUGHAN, 1978; KELMAN , 1983; TOMLINSON & MOORE,1982; GILMORE et. al.,1984; REINKE, 1994) Quanto ao período de permanência do parafuso para esse tipo de imobilização, há certa divergência entre os autores, variando de três (TOMLINSON & MOORE,1982; REINKE, 1994) a oito (BRADEN, 1974) semanas. De acordo com BRADEN (1974), o parafuso para osso esponjoso é o mais recomendado pois utilizando-se o parafuso de osso cortical corre-se o risco de, no momento de sua introdução, haver lesão no tendão flexor digital profundo e na veia safena. A imobilização externa associada à imobilização interna, assim como a restrição da atividade física, são indicadas para evitar o estresse excessivo durante o período de remodelamento secundário e podem permanecer por mais algumas semanas após a 18 remoção da imobilização interna. Em contra-partida, esse tipo de imobilização pode ser aplicada isoladamente em cães pequenos e em gatos (BRADEN, 1974; BLOOMBERG,1993 , REINKE, 1994). BREE (1982) empregou um método de imobilização temporária da articulação társica, por transfixação externa, onde dois pinos de Steinmann são transpassados na porção distal da tíbia e no tubérculo do calcâneo e conectados lateral e medialmente com acrílico por um período de sete semanas. Posteriormente HANN et al. (1995) empregaram o mesmo método de imobilização em quatro cães, por um período de seis semanas. Na opinião dos autores, esse é um efetivo método temporário de imobilização da articulação társica para proteção da cicatrização de tenorrafias do tendão calcâneo comum em cães. GALLAGHER et al. (1992) testaram as indicações e eficácia da bota de fixação externa para suporte de vários reparos cirúrgicos envolvendo a tíbia e o tarso. Segundo os autores, apesar de algumas complicações encontradas, como, necrose da pata devido a mau posicionamento da bota, deslocamento do pino fixado à bota, desinserção do pino ao osso e contaminações, esse método promoveu adequado suporte e proteção para sustentação de peso após procedimentos cirúrgicos em 95% dos 21 casos analisados. 19 Uma das grandes dificuldades encontradas para o reparo de tendões flexores, têm sido em situações em que há perda de substância com conseqüente não união das extremidades tendíneas. Tal situação têm despertado o interesse de vários autores, no sentido de encontrar um material que seja adequado à cicatrização do tendão lesado, com resistência suficiente, sem alterar seu comprimento e manter sua capacidade de deslizamento. Assim, CORDREY (1963) comparou em tendão calcâneo comum de coelhos, o comportamento de enxertos autólogos frescos e homólogos preservados em timerosal, etanol ou por liofilização e concluiu que independentemente do método de transplantação ou preservação este é um método viável para reparação tendínea. MAGNAGHI et al. (1994) realizaram estudo experimental do processo de integração e cicatrização dos enxertos tendíneos homólogos liofilizados em coelhos. Esses autores observaram que o processo de integração do enxerto se dá através de neoformação vascular, invasão de células mesenquimais e organização de fibras colágenas, dando ao enxerto características de tendão próxima ao normal a partir da oitava semana da reconstrução. Relatam também que a utilização de tecidos liofilizados proporciona bons resultados, 20 com as vantagens de diminuir a capacidade antigênica do tecido e permitir sua preservação à temperatura ambiente. Várias próteses tem sido empregadas no reparo do tendão calcâneo comum, entre elas, a fibra de carbono é bastante utilizada. VAUGHAN et al. (1978, 1985) empregaram filamentos trançados de carbono para substituir o tendão calcâneo comum e ligamentos laterais do joelho de cavalos, cães, ovelhas e coelhos verificaram que após o período de cicatrização, o carbono implantado foi encoberto por tecido semelhante ao tendão e após um ano, o novo tecido se assemelhava, macroscópica e histologicamente, ao tendão normal. O reparo da ruptura crônica do tendão calcâneo comum em cão, utilizando o implante de fibra de carbono, foi também relatado por KELMAN (1983). AMSTUTZ et al. (1976) estudaram a aplicação de malha de dacron e silicone para reconstrução do tendão calcâneo comum e do tendão patelar de cães, porém verificaram que apesar dessa prótese fornecer um bom suporte para regeneração do tecido tendíneo, os resultados, particularmente no tendão calcâneo não foram satisfatórios. 21 As membranas biológicas, principalmente as preservadas em glicerina têm sido amplamente utilizadas para reparação de inúmeras alterações anatômicas e patológicas nas diferentes espécies. Os primeiros relatos datam de l964, quando PIGOSSI, utilizou dura-máter homóloga conservada em glicerina, em cães e demonstrou ser a glicerina um excelente meio de conservação e esterilização, possuindo inclusive a propriedade de diminuir a antigenicidade do implante. Segundo o autor a glicerina é fixador e desidratante de atuação rápida, substituindo a maior parte da água intracelular, sem, entretanto, alterar a concentração iônica das células; por este motivo, ela atua como eficaz protetor da integridade celular em tais circunstâncias. Aumenta-lhe a resistência à tração e não altera sua elasticidade. Age, ainda, como poderoso anti-séptico, frente as variadas amostras de germes, patogênicos ou não, exceto contra as formas esporuladas. De acordo com ALVARENGA (1992) as membranas biológicas consistem em implantes de natureza orgânica, livres, inertes, de aplicação ortotópica ou heterotópica, autológos, isogênicos, halogênicos ou xenólogos, por serem constituídos quase exclusivamente por colágeno, apresentam baixa antigenicidade. Suas aplicações são as mais variadas, pois sua utilização preenche 22 requisitos de disponibilidade, baixo custo, preparo simples, esterilização viável, facilidade de estocagem e utilização e mínima reação histológica ou tecidual. A principal finalidade das membranas biológicas, assim como dos implantes sintéticos é de fornecer um arcabouço para o desenvolvimento de um novo tecido, restabelecendo a estrutura do órgão afetado. Estas membranas podem ser obtidas de diferentes espécies e conservadas em glicerina 98%, mantidas em temperatura ambiente, o que facilita seu emprego em qualquer situação e ambiente, pois dispensa meios de conservação de custo elevado e difícil transporte. (BATISTA et al., 1997) Desse modo, a reparação da parede torácica em cão, foi estudada utilizando-se centro frênico de eqüino por ALVARENGA et al (1980) e com pericárdio eqüino por STOPIGLIA et al. (1986), ambos preservados em glicerina a 98%. BARROS (1980) empregou fragmentos de pericárdio de eqüino preservado em glicerina na substituição de porção da parede da bexiga de cães. DALECK et al. (1986) estudaram a viabilidade da utilização de peritônio de bovino conservado em glicerina a 98% como enxerto autólogo e homólogo, como solução de determinadas 23 enfermidades ou anomalias que requeiram a retirada de um retalho esofágico, na espécie canina. Mais recentemente, ALMEIDA et al., (1996) utilizaram com o mesmo intuito e na mesma espécie o pericárdio de caprino, conservado em glicerina a 98% ou refrigerado em solução fisiológica a 0,9%. RANZANI et al. (1986) utilizaram experimentalmente implante de pericárdio eqüino preservado em glicerina a 98% na correção de lesões diafragmáticas em cães. Experimento semelhante foi realizado por DALECK et al. (1988) empregando peritônio bovino também preservado em glicerina a 98%. LANTZMAN (1986) empregou experimentalmente o pericárdio de eqüino conservado em glicerina na reparação cirúrgica do duodeno de cães. A utilização do peritônio de bovino conservado em glicerina para a reparação das hérnias perineais em cães foi relatada por DALECK et al (1992). Poucos estudos, relatam a utilização de membranas biológicas em aplicações músculo-esqueléticas. ALVARENGA et al. (1992) utilizaram o pericárdio de eqüino conservado em glicerina 98% na substituição do ligamento cruzado anterior ou cranial do cão. 24 BRADEN (1976) recomendou o transplante de fáscia lata autólogo para reparo de defeitos crônicos na junção músculotendínea do tendão calcâneo comun. Empregando inicialmente uma sutura temporária de “Bunnell-Mayer” para diminuir o intervalo entre as extremidades, o autor utilizou o transplante de fáscia lata para recobrir o déficit deixado após a remoção da sutura. Dessa forma, um retalho de fáscia lata, colhido da face lateral da coxa foi transplantado para o sítio do defeito, onde recobriu de maneira circunferêncial as extremidades do tendão sendo em seguida suturado com sutura simples em pontos separados e sutura horizontal de colchoeiro. Posteriormente, a articulação társica foi fixada num ângulo de aproximadamente 135 graus com auxílio de um parafuso para osso esponjoso. O autor concluiu ser esta técnica uma boa forma de tratamento para as rupturas de tendões, em que a anastomose término-terminal não pode ser consumada e que o tipo de imobilização interna favoreceu a cicatrização tendínea. HOLZCHUH et al. (1990) verificaram experimentalmente a viabilidade do uso de pericárdio eqüino conservado em glicerina na substituição parcial do tendão de Aquiles em coelhos. Histologicamente, foi observado aos 30 dias uma delaminação e destruição total do pericárdio, sendo o mesmo substituído por 25 intenso infiltrado inflamatório e proliferação de tecido conjuntivo adjacente ao redor da membrana, aos 50 dias observaram áreas ocupadas por infiltrado inflamatório invadidas por tecido conjuntivo neoformado, do tipo frouxo, grande número de vasos neoformados e restos de pericárdio tendendo ao desaparecimento. Aos 200 dias, notou-se a presença de tecido conjuntivo denso que substituiu totalmente o pericárdio, refazendo o tendão primitivo. Relataram ainda que os animais retornaram suas atividades funcionais, principalmente aqueles que foram sacrificados após 200 dias. SILVARES (1990) investigou em ratos adultos, a substituição do tendão calcâneo por pericárdio bovino tratado pelo glutaraldeído. Foram analisados os achados anatomopatológicos em sete momentos, e realizados estudos de resistência cicatricial através de testes de ruptura em cinco momentos diferentes. Concluíram, com base no estudo anatomopatológico, que nas primeiras semanas, ocorre processo inflamatório com tecido granulomatoso seguido de fibroplastia que, no decorrer do tempo vai organizando-se e diferenciando-se em tecido fibrótico com focos de metaplasia cartilaginosa e óssea. Com relação ao teste de resistência, o estudo comparativo da força de ruptura entre os lados operado e controle mostrou que, nas primeiras semanas, a 26 resistência à ruptura foi maior no lado controle, tornando-se, ao final do experimento, igual nos dois lados ou mesmo maior no lado operado. Sugerem possibilidade da utilização do pericárdio bovino tratado pelo glutaraldeído na substituição de tendões e ligamentos lesados no homem. Mais recentemente BADYLAK et al. (1995) avaliaram as propriedades remodelantes de submucosa de intestino delgado de suíno como biomaterial para reparo de tendão do tendão calcâneo comum em cães. Verificaram que o material xenogênico estimula uma rápida deposição de tecido conjuntivo, que torna-se organizado ao longo do eixo de estresse, sendo o mesmo rico em hidroxiprolina, compatível com colágeno e proteoglicanos, o qual é destruído e removido do sítio de implante, deixando apenas tecido conjuntivo de substituição derivado do hospedeiro, que possui as características morfológicas e funcionais do tendão. Concluíram que o material serviu como alicerce que estimulou a deposição orgânica de tecido conjuntivo. Revendo a bibliografia, não detectou-se citação a respeito da utilização do peritônio bovino como reforço, ou em substituições a tendões e ligamentos. Uma vez que esta membrana biológica já se mostrou viável em outras especialidades cirúrgicas, 27 decidiu-se investigar experimentalmente sua aplicação e seu comportamento na reparação de lesões do tendão calcâneo comum em cães. Desta forma, este estudo tem por objetivo a avaliação experimental do emprego do peritônio bovino, conservado em glicerina a 98%, no reparo de lesões induzidas no tendão calcâneo comum, visando a obtenção de informações sobre aspectos clínicos, cirúrgicos, recuperação funcional motora dos animais, e também a respeito de sua integração com o tecido tendíneo. 28 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1- Animais Neste estudo foram utilizados 21 cães, machos e fêmeas, sem raça definida, adultos, com peso compreendido entre 10 e 15 quilogramas, clinicamente sadios, fornecidos pelo Hospital Veterinário Governador Laudo Natel da Faculdade de Ciências Agrárias e veterinárias de Jaboticabal - UNESP. Os animais passaram por um período de observação clínica, foram vermifugados e receberam alimentação balanceada e água “ad libitum ”. 3.2. Grupos experimentais vacina anti-rábica, 29 Os cães foram divididos, aleatoriamente em sete grupos de três animais cada um e submetidos a procedimento cirúrgico com implante do peritônio de bovino, conservado em glicerina a 98%, para substituição de um segmento de tendão calcâneo comum. Os animais foram identificados conforme período de observação pós-cirúrgico pelo qual passaram, conforme descrito abaixo : GRUPO I - Os animais foram sacrificados após 48 horas de observação pós-cirúrgica. GRUPO II - Os animais foram sacrificados após 7 dias de observação pós-cirúrgica. GRUPO III - Os animais foram sacrificados após 15 dias de observação pós-cirúrgica. GRUPO IV - Os animais foram sacrificados após 30 dias de observação pós-cirúrgica. GRUPO V - Os animais foram sacrificados após 60 dias de observação pós-cirúrgica. GRUPO VI - Os animais foram sacrificados após 90 dias de observação pós-cirúrgica. 30 GRUPO VII - Os animais foram sacrificados após 120 dias de observação pós-cirúrgica. 3.3 Membrana biológica (Peritônio) O peritônio utilizado foi obtido após sacrifício de um bovino isento de doenças infecciosas, parasitárias ou outras afecções sistêmicas. Após colheita, a membrana foi devidamente lavada em água corrente , acondicionada em frasco estéril, ao qual foi adicionado glicerina 1 a 98%, e mantida à temperatura ambiente. Estando apta para uso após um período mínimo de 30 dias. 3.4. Procedimento cirúrgico Os cães foram avaliados clínica e laboratorialmente (hemograma completo) no pré-operatório. Após constatação do estado de saúde dos animais, estes passaram por um período de jejum alimentar de 12 horas e hídrico de 6 horas, e receberam antibioticoterapia à base de ampicilina benzatina2 na dosagem de 25 1 Glicerina a 98 % - Apotheker Química e Farmacêutica Ltda. 2 Optacilin - BYK Química e Farmacêutica Ltda 31 mg/kg de peso corporal (PC), por via subcutânea, 20 minutos antes do procedimento cirúrgico. A medicação pré-anestésica foi feita com tranqüilizante do grupo dos fenotiazínicos, a acepromazina1, na dose de 0,1 mg/kg (PC) por via intravenosa. Em seguida foi realizada a tricotomia e limpeza da região a ser abordada cirurgicamente. Para indução e manutenção da anestesia foi utilizado barbitúrico , o tiopental sódico,2 na dosagem de 12,5 mg/kg (PC) por via intravenosa, com complementações no decorrer do ato operatório, mantendo o paciente no 2o plano do 3o estagio de Guedel. Retalhos de peritônio, foram removidos do frasco com glicerina 10 minutos antes do implante e colocados em uma placa estéril contendo soro fisiológico, acrescido de polivinilpirolidona3 na concentração de 0,1%. Sendo em seguida preparado um retalho de 2 cm de comprimento por 1,5 cm de largura. Com o animal em decúbito lateral direito, o membro pélvico esquerdo, foi preparado para cirurgia. 1 Acepran - Lab. Andrômaco Ltda 2 3 Thionembutal -Abbot Lab. Brasil Riodene - Ind. Farmacêutica Rioquímica Ltda. 32 Uma incisão de pele de aproximadamente 10 cm de comprimento foi realizada na região medial posterior da tíbia, desde o 1/3 médio da tíbia até porção proximal do tarso. Em seguida, foi realizada a divulsão do tecido celular subcutâneo e exposição do tendão calcâneo comum desde sua junção músculo-tendínea até o corpo do calcâneo, a hemorragia foi controlada através de ligaduras com categute 3-0 e por compressão.( Figura 1, A) Em seguida, realizou-se uma incisão de aproximadamente 2 cm de comprimento, no aspecto posterior do tubérculo do calcâneo, na bolsa calcâneal do tendão do músculo flexor digital superficial, expondo-se o corpo do calcâneo. Com auxílio de um guia de broca, um orifício foi perfurado na direção postero/anterior através do tubérculo do calcâneo e a tíbia. Esta perfuração foi realizada com a articulação do tarso em aproximadamente 135 graus onde foi introduzido um parafuso de aço inoxidável 304L auto-ataraxante (Figura 01 B, C, D). O tamanho e diâmetro do parafuso, assim como o diâmetro do orifício, variaram de acordo com o tamanho do animal. Utilizando-se parafusos de aço inoxidável 304l de 5,0 x 0,3 mm, 5,0 x 0,2 mm e 6,0 x 0,3 mm. Com o tendão exposto, utilizou-se duas agulhas hipodérmicas para demarcar e auxiliar a ressecção de um segmento 33 de aproximadamente 1 cm de comprimento junto a sua porção tendínea (Figura 02, A). Uma sutura modificada de Kessler com mononáilon 4-0 foi realizada para promover o alinhamento das extremidades (Figura 02, B). O espaço resultante foi preenchido com um retalho de peritônio de 2 cm por 1,5 cm de maneira circunferêncial partida, cobrindo 0,5 cm de cada extremidade do tendão e fixado com mononáilon 4-0 através de dois pontos de reparo (Figura 02, C). Uma sutura simples contínua iniciada em uma das extremidades, unindo as bordas da membrana e terminando na outra extremidade foi confeccionada (Figura 02, D), em seguida, duas suturas horizontais de colchoeiro foram passadas através do peritônio-tendão-peritônio em cada extremidade (Figura 03, A-B) O tecido subcutâneo e a fáscia profunda foram aproximados com fio categute 2-0 e a pele suturada com fio mononáilon 3-0, com pontos simples separados (Figura 03, C). Imediatamente após a cirurgia, aplicou-se um penso esparadrapado no membro operado (Figura 03, D) seguido de exame radiográfico. Os animais foram mantidos confinados individualmente em canis de 1 m2, onde receberam antibioticoterapia por mais nove dias. 34 Após sete dias de pós-operatório efetuou-se a retirada dos pontos e troca do penso esparadrapado, que permaneceu por mais 38 dias, na dependência do tempo de experimentação. Naqueles animais que o tempo de experimentação excedeu quatro semanas, após avaliação radiográfica, o parafuso foi removido e o membro afetado novamente imobilizado com o penso esparadrapado ficando os animais confinados por mais duas semanas. 35 36 37 3.5 - CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO 3.5.1 Avaliação clínica O exame clínico foi realizado em todos os animais diariamente, nos primeiros quinze dias e posteriormente a cada 38 semana até o final do período experimental, sendo feitas observações especialmente relacionadas a manutenção do penso esparadrapado, aspecto da ferida cirúrgica e uso funcional do membro. Para avaliação do uso funcional do membro, no que se refere aos graus de claudicação no pós-operatório e após a retirada do parafuso. e da bandagem, utilizamos o método proposto por SUMNER-SMITH (1993) abaixo descrito: GRAUS DE CLAUDICAÇÃO 0 - Normal 1 - Ocasionalmente descansa o do membro 2 - Claudicação suave em trote lento, sem sinal ao caminhar. 3 - Claudicação suave ao caminhar 4 - Claudicação óbvia ao caminhar, mas apoia o membro quando parado. 5 - Graus de severidade 6 - Graus de severidade 7 - Graus de severidade 8 - Graus de severidade 9 - Apoia apenas a ponta da pata quando parado e suspende o membro quando caminha 10 - Incapaz de pôr a pata sobre o solo. 3.5.2. Avaliação Radiográfica Todos os animais foram submetidos a exame radiográfico ao término do procedimento cirúrgico, ao final do período experimental nos animais do grupo II e III e aos trinta dias de 39 pós-operatório, para avaliação do tipo de imobilização empregado na articulação társica. As radiografias simples da articulação társica do membro pélvico esquerdo foram executadas na incidência ântero-posterior e látero-lateral, sendo a calibração do aparelho fundamentada na técnica que relaciona espessura da região em quilovoltagem (Kv) e miliamperagem-segundo (mAs), conforme DOUGLAS & WILLIAMSON (1980). Utilizou-se aparelho de Raios-x de modelo Tridoros 8121 e filmes Super HR-G2. A revelação e fixação foram realizadas em processadora automática modelo Runzamatic 130 3 3.5.3. Avaliação Macroscópica Decorrido o tempo pré-fixado para cada grupo, os animais foram sacrificados. Após a dissecção da pele, desde o terço proximal da tíbia até a região do tarso, do membro afetado, 1 -Siemens 2 -Fugi Medical X-ray filme 3 -Eletro Médica Brasileira Imp. e Exp. Ltda 40 observações foram feitas a cerca da presença ou não de aderências e aspecto do enxerto (coloração, consistência e espessura). Posteriormente o tendão foi dissecado e seccionado desde sua junção músculo-tendínea até sua inserção ao calcâneo, sendo em seguida incisionado longitudinalmente afins de melhor se observar as mudanças ocorridas durante o processo cicatricial. 3.5.4. Avaliação Histológica Após avaliação macroscópica, foram coletadas três amostras de cada animal, ou seja, das áreas de transição (cranial e caudal) e do segmento implantado, o que corresponde a nove amostras em cada tempo de observação (três animais por grupo). O material utilizado para exame histológico foi preparado pelas técnicas habituais de fixação, inclusão, corte e coloração normalmente empregados no laboratório de rotina de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina Veterinária de Jaboticabal UNESP. A fixação foi feita em formaldeído a 10%, com volume 5 a 10 vezes maior que o fragmento a ser fixado. O meio de inclusão foi a parafina e os cortes histológicos foram efetuados com 41 micrótomo comum, em secções de 5 micra de espessura. A coloração de rotina foi feita com Hematoxilina e Eosina (HE) e também pelo do Tricrômio de Masson (TM). 3.5.5 - Avaliação por microscopia eletrônica de varredura. Uma amostra da área do segmento implantado de um animal de cada grupo, assim como uma amostra de peritônio conservado em glicerina a 98% e uma amostra de tendão calcâneo comum normal foram coletadas para exame por microscopia eletrônica por varredura. Após lavagem vigorosa em solução tampão refrigerada de fosfato de sódio 0.1 M (PH = 7,7), as amostras foram imersas em glutaraldeido a 2% na solução tampão mencionada, por no mínimo 48 horas. Posteriormente lavadas em solução tampão pura (5 lavagens em 15 minutos) submetidas à osmicação em tetróxido de ósmio a 1% em tampão fosfato 0,2M (PH = 7,7) refrigerado, durante uma a duas horas. A seguir, foram desidratados em concentrações ascendentes de álcool etílico, utilizando como série gradual 30, 50, 70, 80, 95 e 100 % (quinze a vinte minutos cada). O processo foi executado a frio (4o c), repetindo-se, finalmente, três passagens em álcool absoluto, sendo uma com 42 álcool refrigerado e duas ã temperatura ambiente. A secagem foi realizada em secador de ponto crítico a base de dióxido de carbono. Posteriormente, as amostras foram montadas em cilindro metálico e recobertas com liga de ouro paládio em metalizador JEOL, modelo 1100. O material pronto para observação, foi fotografado em microscópio eletrônico de varredura, marca JEOL, modelo JSM 25SII. 43 4. RESULTADOS 4.1. Avaliação clínica Os animais operados apresentaram satisfatória evolução clínica, com os parâmetros fisiológicos observados, dentro da normalidade. A ferida cutânea evoluiu com aspecto clínico de cicatrização por primeira intenção. O uso funcional do membro operado, avaliada subjetivamente pelo método proposto por SUMNER-SMITH (1993), de maneira geral, mostrou-se favorável. No segundo dia de pósoperatório os animais apresentavam-se apoiando apenas a ponta da pata ao solo (grau de claudicação 9), a partir do quarto dia apresentavam claudicação, porém apoiavam o membro ao solo quando parados (grau de claudicação entre 8 e 6). Naqueles animais com período experimental superior a 7 dias, notou-se que a partir do oitavo dia de pós-operatório, a maioria apresentava claudicação suave ao caminhar, porém com descanso temporário do membro (grau de claudicação entre 3 e 1). Aos 15 dias, os animais, só apresentavam suave claudicação em trote lento sem sinal ao 44 caminhar, com descanso ocasional do membro (grau de claudicação entre 2 e 1). Após a retirada do parafuso ósseo, realizada nos animais com período experimental superior a 30 dias de pós-operatório, os mesmos mostravam-se, nos primeiros dois dias, receosos em apoiar o membro ao solo (grau de claudicação 10). No terceiro dia, o faziam apenas com a ponta da pata (grau de claudicação 9). A partir do quinto dia, já apoiavam o membro ao solo e apresentavam claudicação ao caminhar (grau de claudicação 8), que gradativamente diminuía com o passar dos dias, até que no 45o dia de pós-operatório, não apresentavam nenhum sinal de claudicação ao caminhar, apenas quando em trote lento e ocasional descanso do membro (grau de claudicação 2 e 1). Após retirada do penso esparadrapado, aos 45 dias de pós-operatório, foi possível evidenciar melhor a utilização funcional do membro. Por volta do 55o dia de pós-operatório, já não se observava nenhum sinal de claudicação, apresentavam deambulação normal, mesmo quando corriam e saltavam (grau de claudicação 0). Ao longo do período de experimentação não foram observados, nenhum tipo de alteração que comprometesse o membro operado. 45 4.2. Avaliação radiográfica As radiografias simples, da articulação társica, tomadas no pós-operatório imediato, revelaram o posicionamento do parafuso e serviram para controle radiográfico daquelas tomadas após sete, quinze e trinta dias nos demais grupos. Nesses tempos, não se evidenciou nenhuma alteração significativa que comprometesse a articulação. Observou-se apenas uma pequena área de osteólise ao redor do parafuso em ambos os ossos e moderada reação periosteal da tíbia e do tubérculo do calcâneo (Figuras 04). 46 4.3. Avaliação Macroscópica. Observou-se aumento de volume local em todos os animais, independentemente do período de experimentação, sendo mais evidenciado nos primeiros quinze dias. Nos animais sacrificados aos 7 dias (grupo II), notou-se adesão aos tecidos circunvizinhos, traduzindo-se em certa 47 resistência no momento da dissecção da pele. Esta aderência, diminuiu gradativamente com a evolução pós-operatória nos animais dos grupos III, IV e V (15, 30 e 60 dias), sendo pouco evidenciada nos animais dos grupos VI e VII (90 e 120 dias). Nos animais do grupo I, os quais foram sacrificados com dois dias de evolução pós-operatória, observou-se macroscopicamente, pequena quantidade de líquido serossanguíneo ao nível da área de enxerto. O peritônio era facilmente identificado, envolto por uma fina camada de fibrina. Após corte longitudinal, identificava-se as extremidades tendíneas que apresentavam-se edemaciadas envoltas por líquido serossanguíneo. Notou-se nos animais sacrificados após sete dias de pósoperatório (grupo II), que o edema era menos perceptível entretanto a adesão aos tecidos adjacentes estava presente. Observou-se ainda aumento de volume e relativa consistência da área do enxerto, o peritônio era pouco evidenciado, exceto após corte longitudinal sendo este recoberto por uma camada de fibrina e tecido de granulação (Figura 05, A). Nos animais sacrificados aos 15 dias de pós-operatório (grupo III), externamente já não se evidenciava sinais de edema, a aderência aos tecidos circunvizinhos era relativamente menor do 48 que nos períodos anteriores e a área de enxerto apresentava-se uniforme, espessado e de consistência firme. Ao corte longitudinal, identificava-se um tecido esbranquiçado, consistente, envolvendo as extremidades do tendão e o peritônio, que apresentava-se encoberto por tecido de granulação de coloração avermelhada (Figuras 05,B e 06,A). Nos animais do grupo IV, sacrificados aos 30 dias, a aderência aos tecidos circunvizinhos estava presente, porém menos evidenciada do que nos grupos anteriores, a área de enxerto permanecia uniforme, espessada e consistente. Após o corte longitudinal, encontrou-se certa dificuldade para identificar o peritônio que estava envolto por um tecido denso, esbranquiçado com áreas de coloração avermelhada, que permeava as extremidades do tendão (Figura 06,B). Nos animais do grupo V, sacrificados aos 60 dias de pósoperatório, à adesão aos tecidos adjacentes era mínima, o tendão estava uniforme, porém, menos espessado do que nos períodos anteriores e não identificava-se a área de enxerto. Após corte longitudinal, dificilmente evidenciava-se o peritônio. Observava-se tecido esbranquiçado, denso que era contínuo ao tendão. As 49 extremidades do tendão também não eram evidenciadas (Figuras 07,A-B e 08,A). Nos animais sacrificados aos 90 e 120 dias de pósoperatório, os aspectos macroscópicos encontrados, assemelharamse aqueles observados nos animais do grupo V. Todavia à aderência aos tecidos circunvizinhos e o diâmetro dos tendões diminuíam gradativamente à medida em que o período de observação aumentava. Esses e outros aspectos estão mostrados nas figuras 08 a 09. 50 51 52 53 54 4.4. Avaliação por microscopia óptica A observação dos cortes histológicos mostrou que o peritônio implantado podia facilmente ser localizado, desde a primeira colheita, ou seja, dois dias de pós-operatório, até a última, efetuada aos 120 dias de pós-operatório. De início, o peritônio 55 mantinha suas características histológicas e se apresentava infiltrado por células inflamatórias (Figura 10,A), principalmente polimorfonucleares neutrófilos (PMN). O material colhido aos sete dias de pós-operatório, ou depois, já mostrava o peritônio infiltrado por células mononucleares (MN). Com o passar do tempo, notava-se também que as fibras do peritônio tendiam a se dissociar, permitindo a infiltração de células MN, e, mais tarde, de algumas células gigantes. Essa fibra também se mostraram em estreita associação com fibras conjuntivas, fibroblastos e colágeno. Esses e outros aspectos estão mostrados nas figuras 10,B a 12. Nas colheitas com 90 e com 120 dias de pós-operatório, o peritônio era encontrado, às vezes, entre abundantes feixes de fibras conjuntivas (Figuras 13 e 14). Hemorragia e edema foram encontrados nos tempos de dois e sete dias, em proporções variáveis. Nos tempos subseqüentes, estes fenômenos não foram observados. A proliferação fibroblástica, presente, de forma incipiente, desde a primeira colheita, mostrou-se exuberante já no sétimo dia (Figuras 10,B e 11,A). Vasos neoformados também acompanharam essa proliferação, caracterizando o tecido de granulação típico do processo de reparação tecidual. A esse tempo, fibroblastos estavam 56 presentes, em grande quantidade, já se fazendo notar também a presença de colágeno. No material das colheitas posteriores, a cada tempo maior, notava-se maior presença de colágeno, cada vez mais organizado, ou seja, com fibras dispostas de forma longitudinal (Figuras 13 e 14,A). Constatou-se presença de tecido cartilaginoso metaplásico de forma incipiente em duas amostras, em um animal de 90 dias e em outro de 120 dias de pós-operatório (Figura 14,B). Em nenhuma amostra foi verificado presença de depósitos minerais ou ossificação ectópica. 57 58 59 60 61 4.5. Avaliação por microscopia eletrônica de varredura: Fragmentos de tendão normal, peritônio normal e dos locais de enxerto, colhidos nos mesmos tempos que para histologia, permitiram várias comparações. O tendão normal mostrou densa concentração de fibras, finas, dispostas paralelamente, sem espaço entre elas, com praticamente ausência de outras estruturas. As fibras de peritônio normal mostravam-se mais espessas, também dispostas de forma paralela, ligeiramente dissociadas umas das 62 outras. O “neotendão” mostrou disposição de fibras de maior espessura tendendo a organização em paralelo. Os aspectos mostrados nas figura 15 a 25. ultra-estruturais observados estão 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 5- DISCUSSÃO 74 A procura incessante de novas técnicas para reconstrução de tendões e ligamentos, tanto na Ortopedia Humana como na Veterinária, têm levado a utilização de diversos tipos de tecidos. Muitos materiais de natureza biológica têm sido empregados. É comum, na Ortopedia Humana o emprego de enxertos tendíneos autológos ou homólogos na reparação de lesões agudas ou crônicas. As membranas biológicas, principalmente aquelas conservados em glicerina a 98%, tem sido amplamente utilizadas no campo da cirurgia experimental, porém os estudos acerca de sua aplicação em tendões e ligamentos ainda são escassos. Encontramos relatos de transplantes autólogos ou homólogos de fáscia lata em tendão calcâneo comum de cães (BRADEN, 1976); em ligamento cruzado cranial (PICHLER, 1982; BUTLER et. al. ,1983; DENNY 1984, 1987), e no reparo do ligamento patelar (CULVENOR 1988), da utilização de pericárdio eqüino conservado em glicerina, na reconstrução do ligamento cruzado cranial do cão (ALVARENGA, 1982), na substituição do tendão calcâneo comum em coelho por HOLZCHUH (1989) e na substituição do tendão calcâneo em ratos por SILVARES (1990). Apesar da utilização do transplante autógeno de fáscia lata para reparo de defeitos crônicos do tendão calcâneo comum em 75 cães, proposto por BRADEN (1979) ter apresentado resultados satisfatórios, o emprego de uma membrana biológica conservada em glicerina com o mesmo objetivo, poderia exercer a mesma função, com a vantagem de reduzir em muito, o tempo operatório. A escolha do emprego do peritônio bovino conservado em glicerina a 98% baseou-se na ausência, de acordo com a literatura consultada, de trabalhos que fizessem menção à aplicação desta membrana biológica, na cirurgia reparadora de tendões, mais especificamente, do tendão calcâneo comum. O peritônio bovino, assim como outras membranas biológicas (pericárdio, dura-máter, centro frênico) é constituído quase que exclusivamente por colágeno (ALVARENGA,1992), e quando conservado em glicerina, tem-se mostrado biocompatível, resistente à infecção, além de possuir conhecidas propriedades mecânicas e fornecer um arcabouço para o desenvolvimento de um novo tecido, restabelecendo a estrutura do órgão afetado (BATISTA, 1997). No presente trabalho a ausência de reação tipo corpo estranho, intenso processo inflamatório e reação local de caráter imunológico, confirmaram as qualidades da glicerina como meio de 76 conservação, dessa membrana biológica, fato este também observado nos experimentos de PIGOSSI (1964) e LEITE (1979). O cão, animal escolhido para este trabalho, mostrou-se cooperativo e adequado para o desenvolvimento deste tipo de experimento, sendo o mesmo também empregado por SUGRI & JEROME (1972), BRANDEN (1974), AMSTUTZ et. al. (1976), ARON, (1981), TOMLINSON & MOORE (1982), VAUGHAN (1982), KELMAN, (1983), GILMORE (1984), EGGER & BERG (1985), HOLZCHUH (1990), BRADLEY (1992), GELBERMAN (1992) e BAYDLAK (1995) para o desenvolvimento de estudos acerca do processo cicatricial de tendões flexores. Por ser uma espécie que freqüentemente é acometida por lesões do tendão calcâneo comum, nos permitiu uma melhor avaliação da viabilidade da técnica. Em relação a técnica cirúrgica empregada, ao invés de optarmos por dois acessos cirúrgicos para a exposição do tendão calcâneo comum e do tubérculo calcâneal, como proposto por BRADEN (1976), optamos por um único acesso, obtido através de uma incisão de aproximadamente 10 cm de comprimento sobre o aspeto posterior da tíbia, desde seu terço médio até a porção proximal do tarso, expondo todo o tendão calcâneo e a tuberosidade calcâneal. A realização de uma ampla incisão, proporcionou boa 77 exposição e manipulação do tendão calcâneo comum, assim como facilitou a abordagem ao corpo calcâneo para a perfuração do orifício e a inserção do parafuso. Vale ressaltar o uso de agulhas hipodérmicas para demarcar, auxiliar a ressecção e manipular de maneira atraumática o tendão calcâneo comum. A falha criada cirurgicamente, de aproximadamente 1 cm, foi suficiente para a função requerida, ou seja, avaliar a capacidade do peritônio em orientar a cicatrização tendínea, uma vez que neste caso havia ausência de contração muscular e a falha foi realizada na porção tendínea do tendão calcâneo comum. No que diz respeito ao fio e padrão de sutura utilizados, verificamos que o fio de náilon monofilamentar número 4-0, proporcionou boa resistência, não tendo sido constatado nenhum tipo de reatividade tecidual significativa durante o processo cicatricial, o que reforça a afirmativa de SUGRI & JEROME (1972). O padrão de sutura. modificado de Kesller, utilizado com a finalidade de proporcionar um melhor alinhamento das extremidades tendíneas e evitar posterior contração muscular, apresentou resultados satisfatórios e semelhantes aqueles encontrados por ARON (1981) e por TOMLINSON & MOORE (1982), sendo de fácil e rápida 78 aplicação e apresentar mínimo comprometimento da microcirculação intrínseca do tendão. O retalho de peritônio, após reidratação mostrou ser de fácil manipulação, com consistência fibroelástica, permitindo-nos envolver de forma circunferêncial partida as extremidades tendíneas. Em relação ao tipo de parafuso usado para imobilização interna, não encontramos dificuldades em utilizar o parafuso auto atarraxante de aço inoxidável 304L, até então não empregado para este tipo de fixação articular. BRADEN (1976) e outros autores , aconselham apenas a utilização de parafuso para osso esponjoso, na tentativa de evitar danos as estruturas adjacentes, como veia safena e tendão flexor digital profundo, como também promover melhor adequação entre a tíbia e o calcâneo. Tais riscos foram contornados pela possibilidade de uma melhor visualização destas estruturas e conseqüentemente preservação das mesma através de manobras cirúrgicas. Devido a grande divergência entre autores quanto ao período de permanência do parafuso, optamos por sua retirada aos 30 dias de pós-operatório, uma vez que a partir da quarta semana de pós-operatório o tecido cicatricial já apresenta razoável grau de resistência e entra no estágio de remodelamento, sendo este, 79 segundo CLARK movimentação (1993) para e RAISER enfraquecer as (1995) dependente aderências de aos tecidos externa (penso circunvizinhos. A manutenção da imobilização esparadrapado) por mais duas semanas permitiu uma volta gradativa do estresse e tensão de sustentação de peso que favoreceu o remodelamento do tendão. Os achados radiográficos encontrados, principalmente aos trinta dias de pós-operatório, assemelham-se aqueles observados por BRANDEN (1974; 1976). A presença de pequenas áreas de osteólise e reação periosteal, tanto na tíbia como no tubérculo calcâneal não ocasionaram comprometimento da movimentação da articulação ou da função do membro. A avaliação histológica e por microscopia eletrônica, assim com a avaliação macroscópica realizadas nos tempos experimentais pré estabelecidos, nos permitiram uma maior compreensão do processo de regeneração do tendão calcâneo comum por peritônio bovino conservado em glicerina a 98%. A infiltração celular observada nos primeiros tempos de colheita foram provavelmente parte da resposta inflamatória da própria injúria. A proliferação fibroblástica, presente, de forma 80 incipiente, desde a primeira colheita e evidente já no sétimo dia, juntamente com a neovascularização caracterizam a formação de tecido de granulação típico do processo de reparação tecidual e foram evidentes em todas as formas de avaliação. A partir da terceira colheita (15 dias de pós-operatório) a diminuição do processo inflamatório e a presença cada vez maior de fibroblastos, já com a deposição de colagêno, dava início ao processo de remodelamento, que nas colheitas posteriores traduziase na deposição organizada de colágeno, com fibras dispostas de forma longitudinal entrando em estreita associação com as fibras de peritônio. Pode-se dizer que, a partir daí já havia a formação de um novo tecido, que com o tempo tornava-se mais organizado, principalmente após a retirada da imobilização interna e externa e reinicio da não restrição de sustentação de peso. De forma que na última colheita apresentava (120 dias de pós-operatório) o tecido conjuntivo denso, com fibras “neotendão” colágenas orientadas longitudinalmente, de aspecto uniforme, consistente, de espessura semelhante ao tendão normal. Observamos que o peritônio que esteve presente em todas as amostras analisadas, estimulou uma rápida deposição de tecido conjuntivo que começou a organizar-se ao longo do eixo de 81 estresse, servindo de arcabouço para o desenvolvimento de um novo tecido e restabelecendo a estrutura do tendão. Esses achados são coerentes com os achados de estudos anteriores em que o peritônio foi usado na reparação de outras estruturas como esôfago cervical, diafragma torácico e pélvico por DALECK (1986, 1988, 1992) e semelhantes aqueles encontrados por outros autores quando outros tipos de membranas foram utilizadas na reconstrução de diversas estruturas (ALMEIDA, 1996; ALVARENGA,1977; LANTZMAN, 1986; RANZANI, 1990) reforçando o ponto de vista de ALVARENGA (1992) que afirma que elas são incorporadas, sem se verificarem sinais de eliminação. HOLCHUH (1990) quando empregou experimentalmente o pericárdio de eqüino conservado em glicerina, na substituição do tendão calcâneo comum de coelhos e observou que por volta dos 30 dias de pós-operatório havia delaminação e destruição parcial do pericárdio por intenso infiltrado inflamatório, tendo desaparecido totalmente aos 200 dias de pós-operatório. Em nosso estudo, ficou evidente que as fibras do peritônio apresentavam-se em estreita associação com fibras conjuntivas - fibroblastos e colagêno e não eram destruídas e sim incorporadas, sendo encontradas entre 82 abundantes feixes de fibras conjuntivas nas colheitas com 90 e 120 dias. Nossos resultados também diferem daqueles encontrados por SILVARES (1991) quando empregou o pericárdio bovino na reconstrução do tendão calcâneo comum, e observou severa resposta polimorfonucleares inflamatória local neutrófilos, fibrina com e exudação edema, de havendo hialinização e fragmentação de fibras conjuntivas do pericárdio, fenômeno esse que o autor denominou de “necrose do enxerto”. Segundo o autor, a partir da sexta semana de pós-operatório, pouco ou nenhum resquício de enxerto foi encontrado, observando-se ainda nesse tempo, sinais de metaplasia cartilaginosa, que por volta da nona semana deu lugar a vários focos de metaplasia óssea, acentuada a partir da décima segunda semana. Esses fenômenos não foram observados no presente estudo. No presente estudo o processo inflamatório mostrou-se menos intenso, favorecendo o processo de cura. Tal observação justifica-se pela atenção estrita aos princípios da assepsia, manipulação e cuidados suaves ao tecidos, assim como pelas características inerentes ao peritônio. 83 Os indícios de metaplasia cartilaginosa observados de forma incipiente em dois animais (90 e 120 dias) são compatíveis com o processo cicatricial, pois de acordo com Payne in BOJRAB (1996) os tendões tendem a formar áreas de fibrocartilagem em regiões de elevada pressão. A ausência, nestes tempos de depósitos minerais ou ossificação ectópica descartam a possibilidade de calcificação do “neotendão”. Vale salientar que no presente estudo o número de cortes histológicos, assim como sua orientação e método de coloração (Hematoxilina/Eosina e Tricômio de Masson) foram cruciais na observação dos aspectos histológicos durante o processo cicatricial. 84 6. CONCLUSÕES Considerando os resultados obtidos das avaliações realizadas no período de observação pós-operatória dos cães submetidos a tenoplastia do tendão calcâneo comum com peritônio bovino conservado em glicerina a 98%, as seguintes conclusões podem ser emitidas: 85 1. O peritônio bovino conservado em glicerina a 98% estimulou uma rápida deposição de tecido conjuntivo com mínima reação inflamatória e serviu de alicerce para o desenvolvimento de um novo tecido, restabelecendo assim a estrutura do tendão calcâneo comum. 2. O peritônio bovino não provocou nenhum tipo de reação tipo corpo estranho, foi sim incorporado ao tecido cicatricial, sendo encontrado entre abundantes feixes de fibras conjuntivas 120 dias após o ato operatório. 3. O “neotendão”, do ponto de vista clínico, apresentou resistência suficiente para suportar o estresse normalmente aplicado ao tendão calcâneo comum. 4. A imobilização da articulação társica, num ângulo de aproximadamente 135° com auxilio de um parafuso de aço inoxidável 304L auto-atarraxante, mostrou-se eficaz, promovendo efetivo suporte e proteção para sustentação de peso após a tenoplastia. 86 5. A utilização do peritônio bovino conservado em glicerina a 98% mediante a técnica cirúrgica empregada neste trabalho abre novas perspectivas para seu emprego na rotina cirúrgica e representa uma alternativa na recuperação funcional do tendão calcâneo de cães. Também nos permite postular ser este material apropriado para reparação de tendões e ligamentos no homem. Entretanto, nos parece que será necessário maior número de estudos para confirmação desta suposição. 87 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, E.L. Reconstrução do esôfago cervical de cães com pericárdio de caprino conservado em glicerina a 98% ou refrigerado em solução fisiológica a 0,9% - Estudo experimental. São Paulo, 1996. 72p. 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