Anátomo-Clínica: COMA
Jorge Alberto Martins P. Júnior
Eduardo Oliveira Campos
Coordenação: Bruno Vaz, Luciana Sugai,
Paulo R. Margotto
Patologista: Ophélia Araújo
Escola Superior de Ciências da Saúde
(ESCS)/SES/DF
22/6/2007
www.paulomargotto.com.br
*Os trechos entre aspas foram copiados do prontuário.
G.A.B., sexo masculino, pesando 15 Kg, com 2
anos e 9 meses de idade, natural de Rondônia e
residente no Núcleo Bandeirante-DF.
Foi atendido no PS do HRAS às 13:25h do dia
01/08/05 com a seguinte queixa: “Vômitos hoje. Dor de
ouvido há dois dias. Ontem supurou o ouvido. Febre
ontem”. O exame físico revelou:
“REG, hidratado, palidez cutânea, bem perfundido.
Orof.: NDN.
AR: MVF s/ RA.
AC: RCR 2T, BNF s/ sopros.
Abd.: NDN.
Ext.: s/ edema.”
Foi feito diagnóstico de “OMS e vômitos” e a criança
foi liberada após a seguinte medicação: Bromoprida e
Paracetamol.
Às 18:00h do mesmo dia a criança foi novamente
levada ao HRAS: “Paciente retornou devido a 4 episódios
de vômitos. Não está ingerindo líquidos. Refere dor
abdominal. Está desidratada”. Diante da nova avaliação a
criança foi internada às 18:40h para realização de fase
rápida (250 ml SG 5% + 250 ml SF 0,9% - duas etapas) e
analgesia (Dipirona 0,5 ml endovenoso).
Às 19:20h teve fim a primeira etapa da fase rápida.
Segundo relatos da enfermagem a criança ainda estava
vomitando, não apresentava diurese, estava pálida e
gritava de dor.
Às 19:30h foi realizada admissão no Pronto-socorro
interno (colhida nova história clínica e realizado novo
exame físico). Dessa admissão tem-se que: “Há 2 semanas
mãe percebeu secreção amarelada saindo do ouvido, fez
uso de Otosynalar® (2 gotas – 2 vezes ao dia – usou
durante 3 dias). Há 1 semana iniciou vômitos + febre (3838,5°C) fazendo uso de Tylenol® (1 gota/Kg), um episódio
somente. Passou bem durante a semana, neste sábado
(dia 30/07/05) iniciou febre (38-38,5°C) + vômitos (2
episódios) e reiniciou a otorréia (secreção amarelada); fez
uso novamente do Otosynalar® + Scaflam® (30 gotas – 2
vezes ao dia – por 2 dias). Houve melhora. Hoje pela
manhã iniciou novamente otorréia e febre. Iniciou vômitos
(+ ou – 7 episódios). Nega sangue no vômito. Aspecto
bilioso (esverdeado e amarelado). Hiporexia. Hoje aceitou
somente leite + nescau.”
Ainda em relação a anamnese tem-se: criança
previamente saudável, sem história de internações
prévias, alergias e outras doenças. Mãe informou que a
criança teve 1 episódio de otite há 1 ano. Freqüenta
creche. O calendário vacinal estava em dia. Pais e
irmã de 7 anos saudáveis. Nada mais digno de nota.
O exame físico na ocasião revelou:
“REG, palidez cutâneo-mucosa, desidratado
(+/4+), fácies de dor, acianótico, anictérico, irritado.
Perfusão < 2’’. Respiração de Kussmaul.
ACV: FC = 74 bpm.
AR: FR: 22 irpm. MV +, s/ RA. Eupneico. Respiração
acidótica.
ABD: Flácido, fígado há mais ou menos 3 cm do RCD,
não palpei baço, aparentemente indolor a palpação.
EXT:Boa perfusão, sem edemas.
PELE: Palidez cutânea-mucosa, sem edemas.
OROSCOPIA: Levemente hiperemiada.
OTOSCOPIA: Otorréia abundante em OD.
SNC: Criança bastante irritada, não deixa fazer
flexão de pescoço (rigidez de nuca?). Sinal de
Kernig
e
Brudzinski
Meningismo.
Pupilas
fotorreagentes, isocóricas.
IMPRESSÃO
DIAGNÓSTICA:
Desidratação
+
meningismo a/e + otite supurada.”
Diante da nova avaliação foram solicitados:
hemograma completo, eletrólitos e EAS.
Às 19:40h foi iniciada a segunda etapa da fase
rápida. Os exames acima solicitados ainda não haviam
sido liberados.
Às 20:45h, após segunda etapa da fase rápida, a
criança foi reavaliada e apresentava “sinais de toxemia
e desidratação refratária”, “choro com fácies
dolorosa sem causa aparente”, “respiração de
Kussmaul” e “sinal de Kernig (meningismo?)”.
Pensou-se em realizar punção lombar, porém, esta não
foi realizada sob o argumento de que a criança ainda
estava desidratada e não havia urinado até então.
Foram resgatados os exames da criança,
visualizados no quadro seguinte.
Hemograma
Hemoglobina
10,3
Hematócrito
32,3
VCM
72,1
Plaquetas
174000
Leucócitos
6100
Segmentados
51%
Bastões
36%
Linfócitos
11%
Monócitos
01%
Eosinófilos
00
Basófilos
01%
VHS
36 mm
Bioquímica
Glicose
381
Uréia
22
Creatinina
0,4
Sódio
132
Potássio
3,4
Cloretos
102
TGO
19
TGP
13
Amilase
22
Logo em seguida criança apresentou diurese
abundante (poliúria).
Diante da nova avaliação foi aventada hipótese de
cetoacidose diabética desencadeada por otite média
aguda supurada e foram solicitados glicemia capilar e
gasometria arterial, descritos em seguida.
Glicemia capilar
436
Gasometria arterial
pH
7,47
Bicarbonato total
15
pCO2
21
pO2
118
Sat. O2
99
Foi adotada conduta para CAD, iniciada às 21:00h
(20 ml/kg de SF 0,9% - gotejamento livre até glicemia de
250 mg% e glicemia capilar de 1/1 h).
Neste momento, optou-se por observar evolução
clínica para avaliar conduta e possibilidade de punção
lombar.
Às 21:35h foi prescrito ceftriaxona (750 mg
endovenoso de 12/12h).
Às 21:50h a glicemia capilar foi novamente aferida e
seu valor encontra-se no quadro a seguir.
Glicemia capilar
345
Neste momento foi iniciada nova etapa de SF 0,9%
- 20 ml/kg em gotejamento livre.
Às 22:00h foi aplicada a primeira dose de
ceftriaxona.
Às 22:40h foram resgatados novos exames
complementares, listados abaixo.
Bioquímica
Glicose
285
Uréia
14,3
Creatinina
0,34
Sódio
135
Potássio
3,9
Cloretos
109
Ca++
7,76
Mg++
1,32
Na ocasião, o exame físico da criança revelou:
“Perfusão < 2’’, FC = 88 bpm, FR = 30 irpm, Sat. O2
91% e diurese presente. Pupilas isocóricas e
fotorreagentes.”
Criança
com
quadro
de
“desorientação têmporo-espacial com gritos e
tonicidades”. Diante do quadro foi solicitada vaga em
UTI.
Às 22:50h a criança foi transferida para UTI.
Às 23:30h a criança foi admitida na UTI com
“estado geral comprometido, em coma, pupilas
midriáticas e fotorreagentes, com hipertonias,
reflexos profundos e superficiais presentes, com
palidez cutânea (4+/4+), pulso com 80 bpm,
turgência
jugular,
respiração
irregular
e
hipotérmica.” Neste momento foi obtido acesso venoso
central, iniciada ventilação mecânica,
realizada
sedação,analgesia e adotadas medidas neuroprotetoras.
Após procedimentos foi iniciado manitol. Em seguida
foram solicitados hemocultura, hemograma completo,
bioquímica, gasometria e radiografia de tórax.
Gasometria venosa (acesso central)
pH
7,39
Bicarbonato total
16
pCO2
27
pO2
43
Sat. O2
79
A criança evoluiu com episódios de taquicardia,
queda da Sat. O2 (até 83%) e hipotensão (PAM: 49
mmHg) ao longo da madrugada. Acrescentado
dopamina a prescrição.
Às 08:45h do dia 02/08/05 a criança estava
“gravíssima, hipotensa, hipotérmica, com pupilas
midriáticas sem resposta a luz, reflexo corneano e
da tosse ausentes.”
Diante do quadro a sedação e a analgesia foram
suspensas, a dose da dopamina elevada e o protocolo
para morte encefálica programado para daí a seis horas.
Familiares cientes do quadro clínico do paciente.
Às 12:40h os exames da noite anterior foram
resgatados e encontram-se listados abaixo e a seguir.
Hemograma
Hemoglobina
11,4
Hematócrito
33,7
VCM
72,1
Plaquetas
178000
Leucócitos
1900
Segmentados
78%
Bastões
01%
Linfócitos
20%
Monócitos
01%
Eosinófilos
00
Basófilos
00
Bioquímica
Glicose
241
Uréia
15
Creatinina
0,3
Sódio
133
Potássio
4,0
Cloretos
109
Por fim, a criança evoluiu em coma profundo, com
arreflexia universal e midríase bilateral até a 01:00h
do dia 03/08/05, quando apresentou parada
cardiorrespiratória irreversível e constatação de óbito.
Síndromes:
INFECCIOSA;
CHOQUE CARDIOCIRCULATÓRIO;
ABDOME AGUDO;
ENDOCRINOMETABÓLICA;
infecciosa
Infecção Sepse Sepse grave choque
séptico DMOS
FOCO?
ETIOLOGIA?
COMPLICAÇÕES?
EVOLUÇÃO?
SÍNDROME INFECCIOSA
MENINGITE
AGUDA
SIND.
HIC
SIND.
TOXÊMICA
Cefaléia
Vômitos
Confusão mental
Febre alta
Confusão mental
Mal-estar
Sinal de Faget
SIND. IRRITAÇÃO
MENÍNGEA
Rigidez de nuca
Kernig
Brudzinski
Desconforto lombar
Síndrome infecciosa
Bacteriana:
1)pneumococos
– Otites!!!
– Pneumonias
– Sinusites
– Lesão cardíaca
Síndrome infecciosa:
Meningocócica:
– “rash” cutâneo ou equimoses
– Choque
– Epidemia
– Evolução rápida.
Síndrome infecciosa:
Estreptococos do grupo B
E.coli
Listeria monocytogenes
– Antecedentes obstétricos
– Idade< 3meses
Haemophilus influenzae:
– Otites
– IVAS.
Síndrome infecciosa:
Meningite viral:
– Presença das 3 síndromes;
– Quadro clinico mais brando;
– Etiologia( Enterovirus, Herpes
simples,Varicela-Zoster e Epstein-barr)
Síndrome infecciosa:
Encefalite viral:
– Acometimento neurológico focal;
– Acometimento neurológico generalizado;
– Febre+ cefaléia
– Etiologia( HSV-1,HSV-2; arbovírus)
Síndrome infecciosa:
Meningoencefalite herpética:
– Presença das 3 síndromes;
– Acometimento focal
– Alterações do comportamento
– Etiologia( HSV-1)
– Dx ( RNM,EEG,LCR,PCR e anticorpos)
Síndrome infecciosa:
Abscesso cerebral:
– Distribuição bimodal ( 30-40 anos e 4-7 anos)
– Etiologia variada;
– Focos primários;
– Fatores de risco;
– Tríade ( febre+ cefaléia+ sinais focais)
– Convulsões.
Síndrome infecciosa:
Síndrome infecciosa:
Choque:
Choque séptico? SepseDMOS
Hipovolêmico?
Misto?
Choque:
Indícios:
–
–
–
–
–
–
–
–
–
Vômitos;
Desidratação;
Desidratação não responsiva a volume;
Oliguria/anúria;
Urina concentrada;
“boa perfusão periférica”
“Respiração acidótica”
Poliúria/ taquicardia/ taquipnéia / hipotensão
Hipotermia.
Choque:
Se choque séptico foco?
Se hipovolêmico respondeu a volume?
– CAD?
– Desidratação leve?
 misto causas?
Cetoacidose diabética:
Definição:
– Hiperglicemia > 300mg/dl
– Acidemia: pH<7,3 ; bic<15mEq/L
– Cetonemia>3 e/ou cetonúria
Cetoacidose diabética:
Fatores precipitantes:
– Dx na primidescompensação;
– Infecção em 1/3 crianças( CADÊ O FOCO?) ;
– Erros na administração da insulina;
– Baixo nível socioeconômico;
– Distúrbios alimentares;
– Adolescência;
– estresse emocional
Fisiopatologia:
Cetoacidose diabética:
Sinais:
– Alteração da consciência;
– Desidratação de graus variados;
– Hipotensão/taquicardia;
– Respiração de kussmaul;
– Hálito cetônico
Cetoacidose diabética:
Sintomas:
– Polidipsia;
– Sede;
– Poliúria;
– Polifagia;
– Perda de peso/ fraqueza;
– DOR ABDOMINAL.
Cetoacidose diabética:
Complicação  EDEMA CEREBRAL
Diferencial:
– Coma hiperosmolar não – cetótico;
– IRA + sepse( foco?)
– Intoxicações exógenas
– Cetose de jejum( ausência de glicosúria)
Uremia:
Dor abdominal;
Náuseas e vômitos;
Alterações do trânsito intestinal;
Parada de eliminação de gases e fezes;
Peritonismo ;
IRA ou IRC.
Abdome agudo:
“A regra geral para o abdome agudo: são
pacientes que estavam bem previamente
e iniciaram quadro com dor abdominal
contínua por mais de 6 horas ( dor de
importância cirúrgica)”
Sir Zachary Cope(18811974)
Abdome agudo:
Anamnese + exame físico;
6 tipos:
– Inflamatório;
– Perfurativo;
– Obstrutivo;
– Hemorrágico;
– vascular;
– Traumático.
Abdome agudo:
Sexo e idade
Características da dor;
Anorexia,náuseas,alterações intestinais;
Distensão abdominal/peritonite;
Febre ;
Dor precede os vômitos;
Abdome agudo:
Diferencial:
– Causas exógenas
– Causas endógenas
– Metabólicas( CAD)
– Hematológicas
– Vasculares
– Cardíacas
Gastroenterite:
Invasiva X não invasiva;
Etiologia variada( vírus, bactérias e
protozoários);
Quadro clinico variado;
Complicações.
Gastroenterite :
Gastroenterite:
Dor abdominal;
Náuseas e vômitos;
Diarréia aguda;
Febre.
Gastroenterite:
Complicações:
E. coli enterohemorrágica Sínd.
Hemolítico-urêmica:
Toxinaslesão vascular renaldeposição
de plaquetas+destruição de
hemáciasanemia
microangiopática+hepatoesplenomegalia
Gastroenterite :
Clínica:
Irritabilidade/fraqueza/letargia;
Palidez;
História de gastroenterite;
IRA;
Plaquetopenia ;
Anemia;
Hematúria.
Gastroenterite:
Salmonela:
Pode ocorrer:
– Febre alta
– Confusão mental
– Meningismo
– Cefaléia
– Convulsões
– Bacteremia( meningite,osteomielite e sepse)
Gastroenterite :
Shiguella:
Pode ocorrer:
– Convulsões
– Rigidez de nuca
– SIADH
– Sínd. Hemolítico-urêmica
Gastroenterite:
Entamoeba histolitica:
Peritonite
Perfuração intestinal.
Conclusões
Como facilitar o processo diagnóstico?
1) Definir a queixa principal
2) Sinais e sintomas do sistema acometido
3) Sinais e sintomas de sistemas associados
4) Fatores de melhora e piora
5) Intervenções realizadas e resultados
6) Revisão sistemática
José Ramos Jr.
Patologia
Causa básica:
broncopneumonia
bacteriana
bilateral com microabscessos
peribrônquicos
Pulmão: abscesso
Traqueíte aguda com erosão; adenomegalia predominantemente paratraqueal
e mesentérica; hiperplasia reacional de linfonodos; infiltrado neutrofílico
interfascicular miocárdico; fígado reacional (infiltrado mononuclear periportal e
vasocongestão; congestão esplênica com hiperplasia linfóide (polpa branca
Reativa; enterite ileal com acentuada hiperplasia linfóide reativa (Placas de
Peyer);
Duodenite com erosão. Gastrite discreta; esofagite leve; timo com reações
hiperplásicas
Reativas; congestão renal; discreto/moderado derrame cavitário abdominal
NOTA: não realizado histologia do cérebro por problemas técnicos
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Anátomo-Clínica: COMA - Paulo Roberto Margotto