NÚMEROS PRIMOS E SUAS HISTÓRIAS.
Dulcyene Maria Ribeiro
Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste
Email: [email protected]
Ana Cláudia Strapasson Scherer
Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste
Email: [email protected]
Jean Sebastian Toillier
Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Unioeste
Email: [email protected]
Resumo:
Nesse minicurso temos por objetivo tratar sobre números primos, divisores, múltiplos, Crivo de
Eratóstenes e História da Matemática. Os extratos de livros didáticos apresentados no texto e as
atividades que exploraremos destacam a construção do conceito de números primos e algumas
discussões de como esse conceito foi constituído ao longo do tempo. Entendemos que conhecer a
história da disciplina que ministra é um subsídio importante para a prática do professor. Buscaremos
exemplificar situações em que a História da Matemática é tratada em atividades pedagógicas.
Esperamos que a partir destes exemplos surjam outros olhares e possibilidades para a utilização da
História no processo de ensino e aprendizagem da Matemática.
Palavras-chave: Números primos. História da Matemática. Formação de professores.
Introdução
Números primos é um conceito matemático apresentado no 6º ano do Ensino
Fundamental, mas retomado ao longo desse ciclo e parece não passível de dúvidas.
Professores, na maioria das vezes, pensam saber tudo sobre números primos. Não titubeiam
em dizer sua definição, em que outros conceitos são utilizados, listam sequências de números
primos, etc.. Mas é só começarmos a lançar alguns outros questionamentos que as certezas
vão se dissipando.
Quantos números primos existem entre 1 e 500? Quais são eles?
Como saber se um número é primo ou não?
Existe número par que é primo?
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Qual é o menor número primo?
Quantos e quais são os números primos?
O conjunto dos números primos é infinito ou finito?
Existem números primos negativos?
O número 1 é primo ou não?
Algumas dessas questões contradizem outras, mas o objetivo aqui é mesmo destacar
incertezas. Alguns vão dizer que 1 não é primo. Outros desconfiados da pergunta permanecem
em silêncio, esperando que deva existir algo por trás dela.
Motivados por curiosidades da História da Matemática como essa, preparamos esse
minicurso como uma readaptação de um material já trabalhado com professores de
matemática em um projeto de extensão com discussões sobre conteúdos de matemática
discutidos sob aspectos da sua história. A temática dos números primos foi uma delas.
Os números primos
1- O que define os números primos?
2- O que os números 36, 10, 57, 35, 13, 5, 19 têm em comum?
Para um público que já conhece um pouco de matemática, espera-se que façam a
decomposição desses números e como resposta à segunda pergunta, digam que todos são
divisíveis por 1. Outros dirão que alguns desses números têm vários divisores, outros que são
divisíveis só pelo 1 e por si próprio! Por exemplo, o 13 e o 5. Essa propriedade define os
Números Primos! Para um público menos experiente é possível discutir sobre divisores e
múltiplos.
Diferentes definições de números primos
A primeira delas provavelmente é a menos conhecida:
“Um número p
divisores de
são
é chamado número primo se (i)
e
; (ii)
e (iii) os únicos
”. (DOMINGUES, 1982, p. 6)
Uma das definições mais usuais para números primos é a apresentada abaixo: “Um
número natural diferente de 0 e de 1 e que é apenas múltiplo de 1 e de si próprio é chamado
de número primo. Um número diferente de 0 e de 1 que não é primo é chamado de número
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composto” (HEFEZ, 2009, p. 31). Com poucas variações ela aparece na maioria dos livros
didáticos.
Também podemos citar outras de diferentes épocas, como a que está presente no livro
Matemática: saber & fazer, de Averbuch, Gottlieb, Sanches e Liberman, publicado em 1985:
Observemos os conjuntos dos divisores de 1, 2, 7 e 8:
D(1) = {1}
D (7) = {1, 7}
D (2) = {1, 2}
D (8) = {1, 2, 4, 8}
Notamos que os conjuntos D(7) e D(2) têm somente dois elementos. Dizemos que 7
é um número primo e que 2 é, também, um número primo.
Por outro lado, D(1) e D(8) não têm somente dois elementos. Dizemos que 1 não é
um número primo e que 8 também não é um número primo.
Assim:
 Os números que possuem dois e somente dois divisores são chamados números
primos.
 Existem infinitos números primos. (AVERBUCH et al, 1985, p. 75. Grifos como
no original).
E essa de Castrucci e Lima Filho (1961), no livro Matemática para a primeira série
ginasial de 1961:
DEFINIÇÃO. Um número maior que 1 chama-se primo quando é divisível sòmente
pela unidade e por êle mesmo.
O número primo tem, então, sòmente dois divisores.
Exemplo: 2, 3, 5, 7, 11, 13 são primos.
Os números maiores que 1 que não são primos, como 4, 8, 9, 12 são chamados por
alguns de números compostos.
Porque os números que são divisíveis somente pelo 1 e por si próprios são chamados
de números primos?
A palavra primo vem do latim primus que quer dizer primeiro, ou seja, a partir dos
números primos é que formamos todos os outros números. É a ideia da decomposição em
fatores primos, em que um número composto sempre pode ser decomposto em um produto de
dois ou mais números primos. Por exemplo, o número 42 pode ser escrito como sendo
(2).(21), porém o número 21 pode ser escrito como sendo (3).(7). Daí temos que: 42 =
(2).(21) = (2).((3).(7)) = 2.3.7
Porque o número 1 não é considerado primo?
O número 1 é divisível por 1 e por ele mesmo, porque então não é considerado primo?
Como vimos nas definições anteriores, o 1 é considerado como não primo, em outras, ele não
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é mencionado e como será visto na definição da página 6-7, ele é colocado como 1
simplesmente.
O número 1 não é primo por convenção! É que existe um Teorema, o Teorema
Fundamental da Aritmética, que garante que todo número deverá ser decomposto em fatores
primos de forma única. E assim, ao considerar o número 1 como sendo primo contraria-se este
teorema, pois então poder-se-ia escrever todo número em fatores primos de duas formas
distintas. O exemplo seguinte ilustra essa ideia.
 Não considerando o número 1 como primo, o número 6 pode ser escrito como sendo:
3.2
 Já considerando o número 1 como sendo primo, o 6 poderia ser escrito de duas formas:
3.2 ou 3.2.1
Há algum tempo atrás, alguns autores de livros didáticos consideravam o número 1 um
número primo. Em livros didáticos usados no Brasil em meados do século XX, o número 1
era considerado primo, como nos exemplos apresentados por Imenes em sua dissertação de
Mestrado e citados por Viana (1997).
Livro "Mathemática - 1o anno" de Cecil Thiré - Mello e Souza, editado pela Livraria
Francisco Alves em 1933.
Dizemos que um numero é primo quando só é divisível por si e pela unidade.
São primos os numeros: 1, 2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, etc.
Os numeros primos formam um conjuncto denominado conjuncto dos números
primos
O conjuncto dos numeros primos é illimitado, isto é, sendo dado um numero primo
qualquer é sempre possível achar outro numero primo maior. (IMENES, 1989,
apud VIANNA, 1997 p. 192)1.
Depois passou-se por um processo intermediário em que o 1 mesmo ainda sendo
considerado primo na definição registrada no livro, o autor explica que isso poderia ser
diferente, como feito por Osvaldo Sangiorgi, no livro Matemática - curso ginasial, 1a série,
editado em 1962, pela Companhia Editora Nacional.
Um número diz-se primo, quando é divisível sòmente por si e pela
unidade. Caso contrário diz-se composto.
Assim, por exemplo, o número 13 é primo porque só é divisível por 13 e
por 1 enquanto que os números 4, 6, 8, 9, 10, 12 .... são compostos, pois
admitem outros divisores além da unidade e do próprio número
considerado.
Os primeiros números primos dispostos em ordem crescente, isto é:
1
IMENES, Luiz Márcio. Um estudo sobre o fracasso do ensino e da aprendizagem da matemática. 1989.
326p. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) Instituto de Geociências e Ciências Exatas,
Universidade Estadual Paulista, Rio Claro (SP), 1989.
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1, 2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, 23, ...
constituem a sucessão dos números primos (*) que é infinita, ou seja é
sempre possível encontrar novos, números primos.
O asterisco remete a uma longa observação que transcrevemos em seguida:
(*) Poderíamos, conforme faz M. Cipolla, nos seus "Elementi de Aritmetica
Razionale - Ed. 1950, pág. 75" - deixar de considerar o número 1 como
primo. Todavia o tradicionalismo histórico ressaltado por ilustres
tratadistas da Aritmética, onde o 1 (que satisfaz a definição dada para
número primo) figura no Crivo de Eratóstenes - que é a mais antiga tábua
de números primos registrada na História - como o primeiro número
primo, permite-nos considerá-lo ainda como tal. Uma das maiores tábuas
de números primos que se conhece, a de Burckhardt, registra todos os
números primos desde 1 até 3030000.
Outrossim, estudos famosos, tais como a Proposição de Golbach ("Todo
número par é a soma de dois números primos"), bem como a Memória de
Riemann ("Número de números primos") dão ao número 1 personalidade
de número primo. Posteriormente, num curso de Aritmética Racional (2o
ciclo) seria precisado o conceito dos números que admitem sòmente dois
divisores distintos. (IMENES, 1989 apud VIANNA, 1997, p. 192).
Pelo extrato acima vê-se que no livro italiano o 1 já figurava como não sendo primo,
mas Sangiorgi ainda optou por manter o 1 na lista de números primos e nos forneceu seus
motivos, o que nos ajuda hoje a entender a mudança de condição do número 1.
Mas dois anos depois, em 1964, no livro Matemática 1: Curso moderno para cursos
ginasiais, V. 1, publicado pela Companhia Editora Nacional, as informações de Sangiorgi
sobre números primos davam conta de que o 1 não era primo.
4. Número 1; números primos; números compostos
Você já percebeu que o número 1 tem uma posição privilegiada na
divisibilidade, pois, é divisor de qualquer número ou, em outras palavras,
qualquer número é divisível por 1.
Veja, agora, o que ocorre com os outros números da sucessão dos números
naturais:
O 2 é divisível por 1 e 2 (e só!)
O3“ “
“ 1 e 3 (e só!)
O4“ “
“ 1, 2 e 4
O5“ “
“ 1 e 5 (e só!) [...]
Logo:
1°) Existem números (como: 2, 3, 5, 7,...) divisíveis sòmente por 1 e por si
mesmos; tais números chamam-se primos.
2° Existem números (como 4, 6, 8, 9,...) que, além de serem divisíveis por 1
e por si mesmos, são divisíveis por outros números; tais números são
chamados compostos.
Portanto, qualquer número natural apresenta-se como
Número 1
Ou  número primo
Número composto
E, dentro desta classificação, valem as definições:
Número primo é o número (diferente de 1) que possui sòmente dois
divisores: 1 e êle mesmo.
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Número composto é o número que possui mais de dois divisores.
(SANGIORGI, 1964, p. 120-121. Grifo como no original).
Seria justo o número 1 deixar de ser primo somente para não contrariar o Teorema
Fundamental da Aritmética?
Eratóstenes e seu método de encontrar número primos
Eratóstenes viveu no século III a. C. Era de Cirene, mas passou grande parte da sua
vida em Atenas e depois e para Alexandria, onde foi bibliotecário da Universidade. Trabalhou
como astrônomo, matemático, geógrafo, historiador, filósofo, atleta e poeta, segundo Eves,
(2004, p. 196-197). Ele criou um método para reconhecer os números primos que ficou
conhecido como Crivo de Eratóstenes.
O conjunto dos números primos é infinito. Mas na atividade seguinte utilizaremos
apenas os números naturais de 1 a 100, com o objetivo de compreender como podemos
reconhecer entre esses números quais são primos, utilizando o Crivo de Eratóstenes.
A partir de uma tabela com os números de 1 a 100, colocados em ordem crescente,
determinaremos quais os números dentre esses são primos. Para isso deve-se excluir os
múltiplos dos números primos da tabela, fazendo com que ao final restem apenas os números
primos. Dessa forma, seguem os procedimentos:.
 localizar o primeiro número primo da tabela (número 2);
 marcar todos os múltiplos desse número;
 localizar o segundo número primo (número 3) e marcar todos os seus múltiplos na
tabela;

Repetir a operação para os próximos primos até chegar ao último número da tabela.
Assim restarão na tabela ao final do trabalho sem marcar apenas os números que são
primos.
Mas o que são múltiplos mesmo? Entendemos que esse é um excelente momento para
a discussão sobre múltiplos.
Considerando o conjunto dos números naturais, múltiplo de um número é o produto
desse número por um outro número natural.
EXEMPLO 1: Os múltiplos do número 2:
2.0 = 0
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2.1 = 2
2.2 = 4
2.3 = 6
⁞
Assim, M(2) = {0,2,4,6,8,10,...}
Mas será que em uma tabela que vai do 1 até o 100, é preciso repetir a operação
localizando todos os números primos? Teria como saber quais seriam os primos sem ter que
marcar todos os múltiplos desses primos? Sim, pelo menos é possível diminuir o trabalho,
buscando os múltiplos dos primos menores de
, neste caso. Ou considerando uma lista
de números de 1 a , basta eliminar da lista os múltiplos de todos os números primos até
.
O crivo, além de determinar todos os números primos, determina as fatorações dos
números compostos, até um dado número N. Ele funciona bem quando se está sendo
considerada uma quantidade pequena de números, como no exemplo. Existem outras formas
para se determinar números primos usando processos computacionais.
Existem infinitos números primos, resultado já provado por Euclides (c. 300 a. C.) no
livro Os Elementos. Porém, não existe uma fórmula capaz de gerar números primos. Pode-se
apenas constatar se determinado número é primo ou não, ou seja, determinar a “primalidade”
de um número.
A título de considerações
Os números primos são de extrema importância, especialmente na criptologia, pois
números primos, extremamente grandes, são usados em vários algoritmos de criptografia de
chave pública.
Descrevemos uma forma de abordar o conceito de números primos relacionando à
História da Matemática. Essas e outras atividades que exploraremos destacam a construção do
conceito de números primos e trazem algumas discussões de como esse conjunto numérico foi
constituído ao longo do tempo.
A construção do conceito de número primo revela que o desenvolvimento da
Matemática enquanto ciência nem sempre se deu de forma lógica, maneira como, em geral, é
exposta aos alunos durante o processo de ensino e aprendizagem. Muitos autores concordam
que seu desenvolvimento histórico revela contradições, idas e vindas para o estabelecimento
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de sua organização lógica atual. Dessa forma, conhecer a história da disciplina que ministra
serve de subsídio para a prática do professor.
Referências
AVERBUCH, A.; GOTTLIEB, F. C.; SANCHES, L. B.; LIBERMAN, M. P. Matemática:
saber & fazer: 5a. série, 1º grau. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 1985.
CASTRUCCI, B. LIMA FILHO, G. DOS S. Matemática para a primeira série ginasial. 2
ed. Rio de Janeiro: Editora Paulo de Azevedo Ltda., 1961.
DOMINGUES, H. H. Álgebra Moderna. 2 ed. São Paulo: Atual, 1982.
EVES, H. Introdução à História da Matemática. Trad. DOMINGUES, H. 2.ed., Campinas:
Ed. da UNICAMP, 1997. 842p.
HEFEZ A. Iniciação à Aritmética. 2009. Disponível em:
<http://www.obmep.org.br/docs/Apostila1-aritmetica.pdf >. Acesso em: 01 mai. 2014.
XXXXX., História da Matemática e a formação de professores de matemática. In: Strieder
Dulce M.; Malacarne, Vilmar (org.) Ensino de Ciências e Matemática: aspectos da
formação docente. Curitiba, CRV, 2011.
SANGIORGI, O. Matemática 1: Curso moderno para cursos ginasiais. V. 1, São Paulo,
Companhia Editora Nacional, 1964. 327p.
SARAIVA, M.; PONTE, J. P. (2003). O trabalho colaborativo e o desenvolvimento
profissional do professor de Matemática. Quadrante, v.12, n.2, p. 25-52. 2003.
VIANNA, C. R. Introdução à história da matemática para professores. In: Anais do 2º
Encontro Luso-Brasileiro de História da Matemática e Seminário Nacional de História da
Matemática. (Ed.) Sérgio Nobre. Águas de São Pedro-SP. 1997, p.181-196.
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