Projeto de produto para cegos: uma contribuição do
design
Project of product for blinds: a contribution from Design
Ávila de Oliveira, Leonardo; Graduando do Curso Superior de Tecnologia em Design de
Produto; Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IF-SC).
[email protected]
Silva, Cheila da; Graduada em Design de Produto; Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IF-SC).
[email protected]
Santos, Rodrigo Gonçalves dos; Mestre em Arquitetura; Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de Santa Catarina (IF-SC).
[email protected]
Resumo
O estudo aborda os vínculos existentes entre a Percepção, o universo da Cegueira e suas ligações
com a área de Design, bem como os aspectos que devem ser levados em consideração durante o
processo de desenvolvimento de produtos. Com objetivo de entender a cegueira e poder
contribuir como profissional da área de design universal, foram feitos estudos teóricos e práticos
(vivências) do público de interesse desse projeto de pesquisa de iniciação científica, além de
registros com indicações de como o designer poderia desenvolver seus projetos de produto
também para o cego, sem que haja a necessidade de grandes modificações.
Palavras Chave: design; percepção e cegueira.
Abstract
The study is about the entails that there are among the Perception, universe of blindness and
their connections with Design area, and so the aspects that must be regarded during the process
of development of the product. With the purpose of understand blindness and be able to
contribute as a professional from universal design, studies, practical and theoretician, have been
done of the public that interests in this project of researches of scientific initiation, besides
registers with evidences that shows how the designer could develop their projects of products for
blind people too, without the need of expressive changes.
Keywords: design; perception and blindness.
Projeto de Produto para Cegos: Uma Contribuição do Design
Contextualização
Através do artigo Contribuição do design no ato perceptivo dos cegos (SILVA et al,
2009), foi possível se realizar a fundamentação teórica sobre o elo de ligação entre os temas
Design, Percepção e Cegueira. Feita esta aproximação com os temas, a pesquisa foi levada a
campo no intuito de se verificar os conceitos introduzidos por diversos autores da área do design,
percepção, psicologia e fenomenologia. Em parceria com a ACIC, a Associação Catarinense para
Integração do Cego, iniciou-se a segunda etapa da pesquisa, que originou o presente artigo.
Através de entrevistas, questionários e análises junto ao público de estudo – os cegos – foram
conhecidos aspectos que regem a percepção destes acerca dos produtos, o que influencia seu ato
de compra, suas preferências e aptidões. Tal estudo culmina em conclusões e reflexões sobre o
papel do designer enquanto promotor de inclusão social e de como esse profissional deve
ponderar aspectos de projeto visando a inserção de minorias em seus produtos.
O cego congênito e a cegueira adquirida
Antes de se fazer considerações sobre o público pesquisado, se faz necessário saber a
forma como uma pessoa chega à condição de cegueira. Conforme foi pesquisado e visto in loco,
os cegos podem encontrar-se nesta condição de não-visão em dois casos: encontram-se sem
visão desde a nascença (cego congênito) ou adquiriram este estado ao longo de suas vidas
(cegueira adquirida). Devido à isto, existem diferenças significativas entre os dois casos. Ambos
os casos puderam ser estudados durante pesquisa de campo junto a Associação Catarinense para
Integração do Cego (ACIC).
No primeiro caso, os cegos congênitos costumam desenvolver mais e mais rapidamente
seus sentidos auxiliares, uma vez que só dispõem dos demais sentidos (tato, audição, sentido
sinestésico, paladar, etc.). Além disso, todo seu desenvolvimento se dá em função da cegueira, o
que significa dizer a adequação de todo seu sistema cognitivo e seu desenvolvimento motor para
a adaptação à este estado. Aprende-se, desde cedo, a “ver com a cegueira”.
Já para aqueles com cegueira adquirida, o processo de adaptação é um pouco mais complexo.
Isso porque o indivíduo já está totalmente inserido em um contexto de percepção através da
visão, dificultando sua entrada numa realidade auditiva, tátil e saída de sua realidade visual. É de
grande importância se conhecer essas duas realidades já que, entre outras implicações, se pode
constatar diferença no processo de percepção de produtos por parte desses indivíduos, como foi
possível se constatar em entrevistas.
A ACIC trabalha com os dois casos de cegueira. Trata-se de uma instituição privada, sem
fins lucrativos, de âmbito estadual que promove ações no campo político e nas áreas da
habilitação, reabilitação e profissionalização, com vistas ao exercício da cidadania e a plena
participação na sociedade das pessoas cegas, de baixa visão e com outras deficiências associadas,
sempre que haja a predominância da cegueira, da seguinte forma:
• Habilitação/Reabilitação: ministram-se as seguintes disciplinas de Orientação e
Mobilidade, Atividades da Vida Diária, Sistema Braille, Simbologia Braille,
Alfabetização Braille, Escrita Cursiva, Comunicação Alternativa, Iniciação à Informática,
Educação Física, Musicoterapia, Assessoria pedagógico, Apoio pedagógico e Reforço
pedagógico.
• Profissionalização: esta tem o objetivo de sistematizar os atendimentos
profissionalizantes oferecidos aos educandos habilitados/reabilitados ou em processo de
habilitação/reabilitação, com vistas à sua inclusão no mercado de trabalho competitivo ou
em atividades ocupacionais.
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Projeto de Produto para Cegos: Uma Contribuição do Design
O sentido tátil na percepção do cego
O estudo do processo perceptivo historicamente vem apresentando uma tendência de
reduzir os aspectos da percepção exclusivamente à visão. Essa tendência se deve ao fato da
percepção humana ser 75% visual (Santaella, 1993). Existindo essa dominância do sentido visual
em relação aos demais sentidos, segundo a autora, o homem foi criando poderosos meios de
extensão principalmente do sentido visual e posteriormente do sentido auditivo, tais como
telescópios, microscópios, radares, entre outros. Mas não foram criados nenhum sistema de
signos olfativos ou sistemas relativos ao tato.
O sentido mais fortemente utilizado pelo cego é o tato e o seu complementar é a audição.
Os dois trabalham de forma mutualística durante o ato perceptivo, apreendendo as múltiplas
percepções acerca da compreensão do mundo à sua volta e fazendo o mesmo, conseqüentemente,
com os produtos. Isso se deve ao fato do tato caracterizar-se como um sentido distributivo,
sendo também funcional como auxiliar da visão e audição. No caso da cegueira pode-se
constatar, durante estudos com o público, que o tato configura-se como sentido principal e a
audição apresenta-se como um sentido distributivo (complementar).
O design para o público cego
O ato projetivo no design requer sempre abordagens multidisciplinares, abordagens dos
diversos contextos em que o produto estará inserido (contexto social, tecnológico, político) e um
estudo amplamente detalhado de público consumidor (Baxter,1998). Com isso, ao se pensar em
projetos para um público cego, a princípio o projetista infere que tal projeto consistirá em um
esforço maior, seja pela necessidade de maior estudo do público consumidor, seja pela maior
quantidade de peças, partes, adaptações ou tecnologia necessária para concretizar seu projeto.
Porém, ao se entrar em contato com o mundo da cegueira, através de revisões
bibliográficas e vivências com cegos, a equipe de pesquisa pôde perceber que esta ‘dificuldade’
de se projetar para esse público não se verifica. Em entrevista, quando indagados sobre sua
relação com produtos, os entrevistados (todos cegos) foram unânimes em declarar que, após
passar pelos programas de habilitação/reabilitação, eles estão totalmente aptos a utilizar os
produtos diários que qualquer outro usuário vidente utiliza, salvo em algumas exceções ou
produtos em particular.
Tal verificação mostra que o designer pensar em projetos diferenciados para cegos pode
ser um erro. Primeiramente, projetar para indivíduos específicos seria um ato contrário ao que
pregam os princípios do Design Universal.
De acordo com Melo (2005) Design Universal definido pelo Centro para o Design Universal na
North Caroline State University (EUA), é o design de produtos e de ambientes para serem
usados por todas as pessoas, na maior extensão possível, sem a necessidade de adaptação ou
design especializado.
Portanto, pensar em projetar produtos que incluam públicos específicos – que é o caso
dos cegos – requer pensar em formas sutis de inserir informação em um produto. Atualmente a
engenharia de materiais coloca à disposição do designer uma variada gama de materiais que
podem servir de estímulo ao toque, por exemplo. Outro output de informação do produto pode
ser o som, que atualmente é largamente utilizado pela indústria eletroeletrônica.
Segundo SILVA et al. (2009), essas seriam algumas formas de “aumentar a gama de
usuários sem restringir públicos com deficiências”, o que atende aos princípios de design
universal. Um exemplo que, de uma só vez, estimula o tato e a audição dos cegos, sem ‘ser um
produto para cegos’ é o telefone celular. Com a inserção de pontos em alto relevo que indicam a
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posição do dígito cinco (Figura 1), o uso do teclado do celular ficou bastante facilitado para os
cegos e videntes, já que o ponto serve de referência quando se desejar digitar números
telefônicos, por exemplo.
Figura 1: Celular com pontos em relevo
Aliado à isto, muitos celulares atualmente possuem a opção de emissão sonora quando
alguma tecla é digitada, o que serve de resposta aos comandos inseridos pelos usuários. Este
retorno que o aparelho dá ao usuário é muito útil tanto para cegos quanto para videntes, uma vez
que assim pode-se saber se o telefone está sendo utilizado de forma correta.
Outro fator a se ponderar no ato projetivo é quanto ao fator complexidade das partes do
produto. Em verdade, quando se usa a expressão complexidade, se fala do nível de informação
que o produto está oferecendo ao usuário. Como foi dito anteriormente, o tato é o sentido que, na
maioria dos casos, é desenvolvido de forma mais elevada pelos cegos. Ao tatear um produto, o
cego pode ter dois principais tipos de dificuldade:
• O produto pode ser muito complexo, com muitas partes ou elementos, o que dificulta a
exploração tátil do mesmo, minorando a usabilidade do produto; ou seja, o usuário é
submetido à um número demasiado grande de informação.
• O produto pode não conter complexidade suficiente, o que faz com que o cego não
consiga diferenciar partes distintas da interface do produto; ou seja, o usuário não
consegue extrair informação necessária do produto.
Como se pode verificar, os extremos de complexidade devem ser evitados. Na Figura 2 a
configuração das partes é tão complexa que o cego certamente não assimilará todas as
informações de modo satisfatório. Já na Figura 3, o portador de cegueira é bastante prejudicado
pelo fato de não haver partes/elementos o suficiente para que o mesmo extraia alguma
informação do produto.
Figura 2: aparelho de som com alta complexidade
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Figura 3: Imagem apresenta baixa complexidade
A condição para se evitar tais problemas por parte dos designers é única: buscar na
Teoria da Informação as técnicas que lhe farão tratar na medida certa o nível de informação que
será transmitido através dos elementos do produto a ser projetado. Sabendo do tipo de estímulo e
os tipos de informação que devem ser emitidos pelo produto, se pode trabalhar os níveis de
complexidade com o qual o usuário irá tomar contato durante a relação com a interface.O ponto
de partida é considerar que:
[...] as mensagens existem para eliminar dúvidas, reduzir a incerteza em
que se encontra o indivíduo – sendo dado como certo que, quanto maior
for a eliminação de dúvidas por parte de uma mensagem, melhor ela será.
(COELHO, 2003, p120)
Uma mensagem tem como objetivo promover naquele que a recebe uma alteração no seu
comportamento. No caso dos produtos, as mensagens emitidas por este podem servir para
variados fins, como: informar seu estado de funcionamento, informar a finalização de uma tarefa,
requerer decisões, etc.
Para que a mensagem enviada por esta fonte seja entendida por um receptor, é necessário
que os elementos dessa mensagem façam parte do repertório (entende-se repertório como
estoque de signos conhecidos ou vocabulário) de tal receptor. Na percepção de produtos, o
próprio produto é o informador, sendo que as mensagens enviadas para o receptor (usuário)
através dos signos visuais, sonoros ou táteis devem ser legíveis pelo indivíduo. No caso dos
cegos, por possuírem um repertório tátil e sonoro maiores que o repertório visual, o produto deve
utilizar formas de mensagens/informação que sejam entendíveis por esta parcela de usuários.
“Uma mensagem terá, pois, tanto mais valor quanto maior for o número de modificações que
pode provocar” (COELHO, 2003, p127). Para atingir os mais variados tipos de receptores e
causar-lhes modificações – sinônimo de tornar-lhes informados – uma mensagem emitida por um
produto deve contemplar os mais variados tipos de repertório. É o caso de produtos que
procuram oferecer dados ao usuário das mais variadas formas, através de sons, imagens,
vibrações, etc.
Um problema surge quando o nível de informação transmitido ao receptor é muito grande
e imprevisível, causando estranhamento no seu receptor. Ao contrário do que se espera, uma
mensagem com grande informação pode gerar a imobilidade do receptor, já que o grande nível
de informação pode transcender seu repertório. O foco do designer ao incluir nos produtos
elementos informativos é o de buscar o meio termo sempre que possível. Isso significa inserir
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elementos que transmitam um nível de dados satisfatório, que informe seu receptor sem saturálo. Além disso, informações importantes podem receber o recurso da redundância, ou seja, por
serem importantes, certos dados podem ser transmitidos por várias fontes. É o caso, por exemplo,
de algumas torradeiras disponíveis no mercado que acendem uma luz e emitem um som quando
o produto torrado está pronto para ser consumido. Dessa forma, além de redundar a informação
de que o usuário pode retirar seu lanche da torradeira, o produto emite esta informação por duas
vias (sonora e visual), permitindo a captação por usuários com diferentes repertórios e que
utilizam diferentes mecanismos sensoriais.
A inserção do Braille nos produtos
Sendo que alguns produtos são produzidos sem atender a requisitos básicos de um design
inclusivo (ver Figura 4), seja por falta informações ou por inviabilidade de produção, o cego se
vê, certas vezes, em uma situação em que o uso de determinado produto só é possível mediante
adaptações. Através de entrevistas, vieram à tona exemplos de produtos de uso diário que
receberam adaptações visando uma melhor usabilidade do produto pelo público com cegueira.
Figura 4: Produto de design não inclusivo
Um desses casos é o do forno microondas, onde, em parceria com o professor Cesar
Azevedo, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IF-SC), a
ACIC disponibilizou, para um usuário com cegueira, um microondas adaptado com um painel
que, quando encaixado na parte frontal do aparelho, servia como legendas em Braille para os
botões. Isto facilitou bastante o uso do eletrodoméstico, já que com tal painel o cego conseguia
identificar facilmente o local e função de cada botão.
Outro tipo de adaptação pode ser conferido em certos relógios, que possuem uma tecla
que emite uma voz pré-gravada com o horário. Como se pode perceber, as adaptações de
produtos para o público com restrição visual são sempre feitas valorizando os sentidos
remanescentes do usuário, principalmente os sentidos geralmente mais desenvolvidos, no caso o
tato e a audição.
Quando necessárias as adaptações em produtos industriais (lembrando que este não é um
acontecimento muito freqüente, sendo que os cegos não sentem tamanha dificuldade no uso dos
produtos da vida diária), estas devem ser feitas preferencialmente através do Braille, fato este
confirmado tanto pelo público pesquisado quanto pelos orientadores educacionais da ACIC que
foram entrevistados. Isso porque o sistema Braille é um sistema de linguagem bastante
desenvolvido, o que permite aos cegos a leitura de informações de forma bastante precisa. Esta
preferência também é justificada pelo fato de os cegos terem, em geral, o sentido do tato mais
aguçado, como dito anteriormente. O único impedimento das adaptações através do Braille é o
fato de que nem todos os cegos são alfabetizados nessa linguagem. É importante se notar que
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inserir o Braille significa, em todos os casos, inserir informação. Mais uma vez reitera-se o fato
de que é necessário que o designer entenda os fatores da interface de seus produtos como
transmissores de informação, o que propicia aos usuários melhores formas de utilização de tal
produto.
Decisão de compra e memória visual
O cego congênito, diferente daquele com cegueira adquirida, utiliza-se da memória visual
para a seletividade no ato de escolha, por exemplo, em um momento de compra.
Durante aplicação de entrevistas com o público obteve-se relatos referentes à seletividade
na escolha de produtos durante o ato de compra. Quando se questionou a respeito da compra de
um produto, por exemplo, um tênis, em meio à variedade de opções disponíveis, como seria feita
a opção de escolha de um produto em detrimento a outro? Nesse caso foi respondido que a
escolha se deu relacionada a um "gosto" adquirido quando essa pessoa ainda tinha a visão, ou
seja, por algo como uma "memória visual" das características consideradas agradáveis, belas. Foi
ainda relatado que uma pessoa vidente, do convívio do comprador, também opinou no ato da
compra, mas a decisão final foi fortemente influenciada pela memória da característica
considerada esteticamente desejável para aquele produto. O exemplo anterior se refere a um
individuo que não nasceu cego, ele foi perdendo a visão durante a sua vida e, enquanto a tinha,
formou um repertório crítico a respeito das opiniões sobre gosto.
Mas e quando a compra é feita por um cego congênito? Certamente, os cegos preferem
produtos com a função prática aprimorada/adequada à sua condição, ou seja, produtos funcionais
que valorizam seus sentidos remanescentes. Porém, quando a decisão de compra é influenciada
por fatores estéticos do produto, a opinião e decisão de compra não necessariamente partem
exclusivamente do cego. Por se tratarem de fatores como beleza (aspecto visual), o cego é
geralmente influenciado pela opinião de algum vidente de seu convívio. Por exemplo: na compra
de um tênis, um cego certamente escolherá um tênis com velcro ou zíper ao invés de um tênis
com cadarços (decisão influenciada pela facilidade de uso); mas dentre os tênis com velcro ou
zíper, a sua decisão de compra (admitindo-se todos os tênis com o mesmo preço) poderá ser
influenciada pela preferência estética de um vidente, seja este um familiar, um instrutor.
É este vidente que o direciona para a escolha daquilo que deve ser considerado
esteticamente agradável, e esta opinião é determinante para a escolha do cego, pois este tem
grande preocupação com a aceitação daquilo que compra perante o contexto em que vive. E todo
o conceito por ele formado são reflexos da opinião formada através da vivência com as pessoas
de seu convívio, tais conceitos são assimilados e dificilmente sofrem mudanças, como é comum
acontecer com videntes.
Os estudos e acompanhamentos realizados com o público mostraram que as três funções
do produto, - que segundo Löbach (2001) são divididas em função prática, estética, simbólica -,
influenciam de maneira distinta o vidente e o cego. Para o cego a função determinante para a
compra do produto geralmente é a função prática, o que muitas vezes parece não condizer com a
realidade do vidente, que cada vez mais é influenciado pela função simbólica. Isto não quer dizer
que aspectos estéticos e simbólicos do produto não sejam relevantes para o cego, mas em geral
são secundários no ato da compra.
A questão educacional na estimulação da independência do cego
Um fator limitante na percepção de produtos por parte dos cegos é a falta de repertório ou
experiência com objetos. Isso porque pode haver um bloqueio no desenvolvimento de uma vida
Projeto de Produto para Cegos: Uma Contribuição do Design
independente do cego em casos onde os pais não estimulam a independência de seus filhos. Por
falta de informação sobre as capacidades do cego ou por puro protecionismo, alguns pais fazem
com que aqueles interajam o menor tempo possível com o ambiente e objetos, no anseio de que
seus filhos possam se machucar ou atrapalhar a rotina da casa. Essa postura dos pais acaba
restringindo a vida de seu filho, restringindo a possibilidade destes de descobrir um mundo
objetual.
O repertório do cego (tudo o que ele conhecerá ou gostará) só será consolidado ao longo
de sua vida, quando ele entra em contato com os mais variados objetos, pessoas e situações.
Efeito disto, o cego tem a oportunidade de compreender o seu contexto, o que lhe permite estar
apto a conhecer o mundo que está à sua volta.
Os objetos "preferidos" pelo cego são os que ele por mais tempo pôde estabelecer
contato, podendo estes ser das mais variadas formas e utilizações. Também demonstram forte
relação com os objetos que auxiliam o seu cotidiano, como a bengala e objetos com dispositivo
viva-voz (celulares e relógio). Sendo assim, torna-se indispensável a estimulação do contato do
cego com os produtos desde a sua infância e que se mantenha esse contato, com intuito de
promover seu aprendizado.
Considerações Finais
O estudo das áreas de design, percepção e cegueira ao serem defrontados com a vivência
do cotidiano dos cegos, pôde mostrar a realidade desse público e possibilitar a equipe
pesquisadora indicações para incluir os cegos como público de interesse no projeto de
desenvolvimento de produtos.
Espera-se que o estudo contribua para o desenvolvimento de novas soluções, já que se
acredita que desenvolver projetos sob a abordagem do Design Universal e de princípios da nãodiscriminação é quesito essencial para uma prática profissional com responsabilidade social.
Referências
BAXTER, Mike. Projeto de Produto: guia prático para o design de novos produtos. São Paulo:
Edgard Blucher, 1998. 261p.
COELHO, Teixeira. Semiotica, informação e comunicação: diagrama da teoria do signo. São
Paulo: Perspectiva, 2003. 222p
LÖBACH, Bernd. Design Industrial: bases para a configuração dos produtos industriais. São
Paulo: Edgard Blücher, 2001. 206 p.
MELO, A.M., BARANAUSKAS, M.C. Design e avaliação de tecnologia Web-acessível. In:
Congresso da Sociedade Brasileira de Computação, 25.; Jornadas de Atualização em
Informática, 2005, São Leopoldo-RS, 25 à 29 de julho. Anais... p. 1500 - 1544.
SANTAELLA, Lucia. A Percepção: uma teoria semiótica. São Paulo: Experimento, 1993. 120p.
SILVA, Cheila da; OLIVEIRA, Leonardo Ávila de; SANTOS, Rodrigo Gonçalves dos.
Contribuição do design no ato perceptivo dos cegos. Congresso Internacional de Pesquisa em
Design, 5., 2009, São Paulo. Anais... São Paulo: CD Rom, 2009.
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