Veículo: Folha de S. Paulo (SP) Editoria: Opinião Autor: Roberto Luis Troster* Uma proposta para a solvência do Estado Considerando que foi o próprio governo que causou o deficit atual, nada mais justo do que ele arcar com uma parte do esforço para sua correção Uma grave crise fiscal assombra o país, a solvência da dívida pública brasileira está em xeque, exigindo prêmios de risco mais altos, ao mesmo tempo em que há uma queda da arrecadação tributária, por causa do crescimento menor. O remédio para evitar o pior será uma combinação de cortes de gastos e aumento de impostos, com efeitos negativos tanto na produção como no emprego. A arte está em encontrar medidas politicamente viáveis, que sejam rápidas e minimizem os impactos sociais. Nesse sentido, o governo criou o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), que permite a manutenção dos empregos, com uma redução líquida de salários para os trabalhadores do setor privado de até 15%, contribuindo para a sobrevivência financeira das empresas. A proposta deste artigo é sugerir outro plano análogo, mas com algumas vantagens adicionais: o Programa de Proteção da Solvência do Estado (PPSE). É uma medida para deixar a folha de pagamentos do governo federal sem correção no ano que vem. A proposta do governo de adiar o reajuste dos servidores até agosto não é suficiente. Incluiria Executivo, Legislativo e Judiciário e todo o funcionalismo federal, com vencimentos acima de três salários mínimos (valor a partir do qual o cidadão já é considerado classe C). Não afetaria quem tem ordenado abaixo de R$ 2.364. Como quase a totalidade do funcionalismo tem estabilidade no emprego, não haveria demissões, como não vai haver mesmo sem o programa. Considerando o espírito cívico desses trabalhadores brasileiros, a medida teria uma aceitação imediata de todos, ou quase todos. Como o salário médio do funcionalismo é na média 85% superior ao de empregados do setor privado, o sacrifício seria de quem tem mais para oferecer. A presidente já deu uma sinalização de apoio à proposta, ao reduzir seu salário, o do vice-presidente e os dos ministros. O impacto fiscal da eliminação de oito ministros de Estado e de 10% dos vencimentos de sua equipe de governo é inferior a R$ 5 milhões por ano. É, todavia, emblemático, porque mostra a importância de se cortar gastos do governo. O PPSE fecharia a conta fiscal de 2016. O valor a ser economizado é superior ao que seria arrecadado com a CPMF, por exemplo. Apenas com essa correção, o deficit primário projetado de R$ 30 bilhões seria totalmente eliminado. Até agora, a inflação, o desemprego, a inadimplência e a queda de vendas têm obrigado o setor privado a fazer sacrifícios. Considerando que foi o próprio governo que causou este deficit, nada mais justo do que ele arcar com uma parte do esforço para sua correção. O PPSE seria aplicado apenas em 2016, ano em que se prepararia um ajuste mais duradouro, corrigindo outras aberrações dos gastos do governo. O regime de aposentadoria diferenciado para os servidores públicos é um exemplo. Apenas em 2015, o deficit do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) dos servidores da União custou cerca de R$ 60 bilhões, o dobro do deficit primário do Orçamento projetado para 2016. Os funcionários públicos, além de terem estabilidade, quando se aposentam, recebem o mesmo salário que os que estão na ativa, diferentemente do que ocorre com os trabalhadores do setor privado, que têm seus vencimentos reduzidos. Este momento exige uma reflexão mais aprofundada sobre o Orçamento público, sobre a legitimidade de quem deve pagar, quanto e como, e de quem deve receber, o montante e o motivo. O Programa de Proteção da Solvência do Estado seria uma medida importante, tanto do ponto de vista das finanças públicas, como da sinalização do comprometimento do governo com o futuro do país. ROBERTO LUIS TROSTER, 64, doutor em economia, foi economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos - Febraban e da Associação Brasileira de Bancos - ABBC. Foi professor da PUC-SP e da USP