1 Influências do educador social nas práticas educativas para crianças e adolescentes: Programa Bairro Escola Barueri José Nildo Oliveira Soares1 RESUMO O presente trabalho tem como finalidade refletir e propor ações quanto à atuação do educador social do Programa Bairro-Escola Barueri, programa que teve suas práticas iniciadas em julho de 2007 e que hoje oferece atividades de Trilhas Educativas a um público de crianças e adolescentes de comunidades carentes, em horário diferenciado do período regular ao escolar. A investigação surge de experiências cotidianas com o programa e de leituras acadêmicas sobre o tema. Parte, também, da inquietude de se olhar de forma mais atenta e de promover ações que visem melhor qualidade na oferta da educação social e na contribuição do educador social para formação de uma comunidade multicultural e cidadã, baseados na Pedagogia Social proposta por expertos como Romans. Analisaremos como ocorre a relação dos atores envolvidos em conjunto com a comunidade atendida, para isso empregando o paradigma sócio-crítico, que trabalha com a hipótese de, a partir de análises dos movimentos educacionais, ser possível a transformação das realidades e das ações praticadas nas diversas áreas do conhecimento. Verificaremos e refletiremos sobre os indicadores de 2007 a fim de identificar as melhoras sociais, nos valendo, portanto, dos dados pré-existentes e do referencial teórico analisado até o presente momento. Palavras-chave: educação social, criança e adolescente, comunidade. Abstract This work has as its finality to reflect and to propose actions over the performance of social instructors of the program “neighbourhood – Barurei school”, this program started its practices in July 2007 and today offer activities such as Educative programmes for children and teenagers from needy communities out of normal school hours. This investigation emerges out of the 1 Trabalho desenvolvido junto ao Mestrado do Programa de Pós Graduação em Psicologia Educacional, Linha de pesquisa Ensino-aprendizagem, da UniFIEO/Osasco, sob orientação do Prof. Dr. Clemente de Souza Neto . E-mail: [email protected]. 2 daily experiences with the program of academics readings about the theme. This perspective offers the challenge to be attentive and to promote actions that tends to improve the quality of education and the instructor´s contribution to the formation of a multicultural community and citizenship, based on Social Pedagogy propose by experts such as Romans. We´ll analyze how relations occur amongst the actors involved together with the assisted community, through this, by putting to use the socio-critical paradigm, that works with the hypothesis, from the analyses of educational movements, being possible for the transformation of realities and the practical actions in different disciplines. We shall verify and reflect on the survey of 2007 in order to identify the social improvements, taking the pre-existing data into consideration and the theoretical reference analyzed till the present moment. Keywords: Social education, children and teenagers, community. Objetivos do Estudo O objetivo geral deste estudo é contribuir no processo de influência do trabalho do Educador Social do Programa Bairro-Escola Barueri que exerce suas práticas educacionais junto a crianças e adolescentes de uma comunidade de alta vulnerabilidade social. Para melhor entendimento do objetivo geral, nos pautamos nos objetivos específicos a seguir: a) analisar a proposta inicial do programa em face dos resultados colhidos nos seis primeiros meses de aplicação do programa; b) refletir sobre o papel dos educadores quanto ao engajamento profissional na área social; c) apontar os resultados alcançados no período e indicar o perfil do educador social para atuar em áreas da comunidade em situação de vulnerabilidade social. Problema No ano de 2007 o fundo Social de Solidariedade da cidade de Barueri procurou o Projeto Escola Cidade Aprendiz, na capital paulista, cujo mentor é o Jornalista Gilberto Dimenstein, a fim de conhecer os trabalhos desenvolvidos nesta ONG da Vila Madalena. Assim, foi criado o Programa Bairro-Escola Barueri que tem por missão: 3 “Contribuir para a formação de um bairro educador, investindo na autonomia e responsabilidade de todos os sujeitos da comunidade, desenvolvendo ações articuladas e integradas, possibilitando a formação de cidadãos conscientes e participativos”. O programa corresponde a um eixo central de atividades educacionais, cuja finalidade é estimular os aprendizes a ultrapassar os muros da escola, ou seja, transformar os espaços existentes na comunidade em espaços de aprendizagem e propiciar troca de experiências entre os diversos atores parceiros, no sentido de fornecer mecanismos aos participantes de serem agentes protagonistas e transformadores de si mesmo, do próprio seio familiar e da comunidade a que está inserido. As atividades educacionais são realizadas por meio de “trilhas educativas”, as quais são desenvolvidas por eixo temático perpassando por práticas educativas, esportivas, culturais e urbanização do espaço público coletivo. Justificativa As políticas neoliberais das últimas décadas, em conjunto com o fenômeno veloz da globalização, tem promovido mudanças nem sempre propícias à criação de uma melhor forma de vida. Tais mudanças tem conferido aos indivíduos menos privilegiados socialmente, em especial as crianças e adolescentes, uma espécie de nódoa no âmbito da sociabilidade, por conta de promover cada vez mais desigualdades econômicas, culturais e de acesso a informação, fatores estes que contribuem para um apartheid cada vez mais desumanizador do sujeito. Por isso, este trabalho foi motivado visando averiguar como e educador social, em especial o educador do Programa Bairros-Escola Barueri, pode ser um facilitador/mediador da troca de experiências, estas que agregam benefícios aos participantes, no sentido de refletir sobre a educação social que a priori deve ocorrer de forma pensada em termos coletivos e com o fim de atingir a cidadania por meio da prática social e, esta pela troca de experiências entre as pessoas. Ou seja, entendemos que o aluno que recebe este tipo de educação poderá se situar num campo real de seu cotidiano, o que fará esse 4 indivíduo se sentir melhor contextualizado e, consequentemente, mais à vontade para troca de saberes. Muitas vezes a educação social sofre preconceitos, além de ser vista como atividade de menor importância frente à educação formal e, não raro, ser entendida como prática para o preenchimento do ócio dos participantes, dessa forma, emprestando entendimento de não requerer preparo, qualificação e planejamento. No entanto, não se passa em branco a consciência de que haja certa liberdade nos preparos dos projetos e que, nem sempre, o educador social se apresenta suficientemente qualificado para o exercício de suas atividades. Esse ambiente de somenos pode fazer gerar um ambiente fraco e sem empolgação para o desempenho das atividades, principalmente quando refletimos sobre a fala de GHANEM: As formas de recrutamento, o status profissional e a formação de quem desempenha função educacional em programas não-formais são muito variáveis, uma vez que a exigência de títulos acadêmicos é menor e relativizada. [...] Não é também suficiente para que os indivíduos engajados no trabalho educacional constituam equipes articuladas e para que extraiam bom proveito das múltiplas características de experiência, origem e formação possíveis. (GHANEM, 2008, p. 72). Dessa forma, averiguarmos e darmos atenção à preparação intelectual do educador social é ponto que perpassa nossa análise, pois a partir das competências, do comprometimento e de seu fazer cotidiano é que será ofertada uma educação baseada na multidisciplinaridade e de melhor qualidade, pois como aponta ROMANS: [...] o exercício profissional do educador social se baseia na orientação, na melhoria, no enriquecimento e nas contribuições para os processos educativos dos demais, [...] sua atividade profissional repousa nas interações com os usuários dos serviços, aspectos que requerem não apenas o conhecimento de técnicas, recursos e métodos, como também, e principalmente, a capacidade de empatia, escuta e resposta em sua relação profissional. (ROMANS, 2003, p. 128). Assim, entendermos como o educador social pode auxiliar a comunidade a perceber sua importância na transformação do ambiente em que vive e levá- 5 la à reflexão sobre seu papel de agente transformador de si mesma é uma tarefa importante para rompermos um ciclo vicioso que se encontra estagnado na sociedade atual e que só faz gerar desconfortos e indignação por parte de uma comunidade segregada. Por isso, acreditamos na relevância deste trabalho, por entender sua pertinência na manutenção das práticas desenvolvidas pelos educadores sociais, além de servir como ponto de apoio para tomada de decisões das políticas públicas sociais em execução e a serem executadas e, assim, a educação social não se transformar em: “[...] uma espécie de colchão, de suavizador das contribuições existentes no seio da sociedade, camuflando e ocultando as desigualdades e as injustiças sociais tentando simplesmente adaptar o indivíduo as coordenadas sociais existentes”. (ROMANS, apud AYREBE, op. cit. p.131) Embasamento Teórico-metodológico Este trabalho desenvolve-se de forma a compreender como o educador social pode ser um facilitador a partir de sua atuação nas comunidades menos privilegiadas e perceber qual referencial esse profissional se utiliza para suas práticas, pois como nos aponta SOUZA NETO, (2006, op. cit. p. 69): “A aprendizagem humana pressupõe a interação de aspectos biológicos, culturais e emocionais, com suas variáveis de elementos sociais, espirituais, econômicos e afetivos”. WEBER, (1998, p. 64), ao refletir em Gramsci sobre: “[...] de que maneira o indivíduo poderia compreender-se criticamente, compreender-se como um sujeito histórico?”, aponta que: “[...] a personalidade humana não se constitui absorvendo aleatoriamente, passivamente, as concepções de mundo construídas ao longo da história. A internalização de uma concepção de mundo implica na ação dos indivíduos qua avaliam as diferentes formas de se ver o mundo mediante a realidade cotidiana”. (WEBER, 1998, op. cit. p. 64). Por isso, entendemos que, no mundo contemporâneo, se faz necessário o indivíduo compreender-se criticamente e se situar como sujeito da sua própria 6 história, para isso deve ter contato com atividades que o leve refletir sobre seu estar no mundo a partir de seu local, a fim de entender os processos globais que permeiam a sociedade mundializada, Em concordância com a autora citada acima, entendemos que as diversas práticas educacionais no cotidiano dos aprendizes como uma trilha educativa, uma aula de teatro, uma palestra profissional, uma roda de leituras, uma aula de reforço, a sessão de um filme e tantas outras atividades educacionais, devem se oferecidas de forma pensada e contextualizada, a partir de uma intenção pertinente sobre seu fazer e sobre seus objetivos fins. Na mesma linha de pensamento discorre SOUZA NETO, (2006, op. cit. p. 69), que nos remete à reflexão de que o desenvolvimento das práticas educativas devem ser pensada e contextualizada, nos dando conta de que: “A formação do educador social é permanente e acontece, sobretudo, na práxis, em todos os momentos da vida, na construção da condição humana”. As falas desses autores parecem indicar, quando analisamos a propositura apresentada por Gramsci, que é a filosofia da práxis a única capaz de proporcionar às pessoas simples, ou às nominadas menos privilegiadas, maneiras de se perceberem como atores co-responsáveis pelo próprio processo de mudança e consequentemente a transformação do coletivo, de forma permanente, equilibrada e sensata a partir da aquisição da consciência de seu eu, como relata SEMERARO, (2001, p. 110 e 111): [...] todos os homens são capazes de refletir e filosofar, que as fontes do saber não dependem só de mentes privilegiadas, isoladas em elaborações cerebrinas e livrescas. Suas raízes estão profundamente ligadas à vida prática dos homens, à descoberta dos meios mais eficientes de produção e organização, à busca do sentindo da existência individual e coletiva. Mais do que determinar novas verdades teoréticas e categorias abstratas dentro duma atividade intelectual “pura”, a filosofia da práxis reelabora e socializa “verdades” já existentes no senso comum, aprofundando suas conexões e alargando ao nível das massas as dimensões universais da cultura. A filosofia é da práxis porque nasce da vontade do conjunto, interessada concretamente em descobrir os nexos íntimos da realidade, as relações entre economia, política e filosofia. Ela estabelece uma continuidade coerente e recíproca entre concepção de mundo e normas de vida; entre os interesses reais das grandes massas e a formulação teórica de seus intelectuais; entre o senso 7 comum e a elaboração orgânica superior. Só por meio desse processo é possível sair dum comportamento conformista de homens-massa, orientado por opiniões “ocasionais e desagregadas”, e passar a participar criticamente duma concepção de mundo unitária e coerente, elevada até as fronteiras mais avançadas do pensamento mundial. TOURAINE (1998, p. 31), nos adverte que: “[...] não devemos adaptar-nos passivamente a uma sociedade e a uma cultura de massa, por trás das quais se escondem forças de dominação muito reais, que devem se identificadas e combatidas”. Dessa forma, é preciso adotar uma postura proativa em relação às formas atuais de ensino-aprendizagem vistas nos diversos campos do conhecimento, ou como relata (WEBER, op. cit. p. 117, apud GRAMSCI, 1958, p. 23): “É preciso deixar de conceber a cultura como saber enciclopédico, na qual o homem não é visto senão sob a forma de um recipiente para amontoar dados empíricos, fatos brutos e desconexos, que ele depois deverá arquivar no seu cérebro como nas colunas de um dicionário para poder, depois, em cada ocasião, responder aos vários estímulos do mundo externo. Esta forma de cultura é verdadeiramente danosa para o proletariado”. Não diferente SOUZA NETO, (2006, op. cit. p. 69) nos diz: “A aprendizagem humana pressupõe a interação de aspectos biológicos, culturais e emocionais, com suas variáveis de elementos sociais, espirituais, econômicos e afetivos”. Não obstante as falas dos autores anteriormente citados, concordamos com a dialética por eles trazidas as quais corroboram com o pensamento de Paulo Freire e com o prescrito no Relatório Delors, apresentados por ROMÃO, (2007), que diz: “No mundo do não-diálogo, é preciso “dialogar sobre a negação do próprio diálogo”. (ROMÃO, op. cit. p. 105. apud FREIRE,1978, p.71), e continua Romão: “Parece, pois, que a educação deve utilizar duas vias complementares. Num primeiro nível, a descoberta progressiva do outro. Num segundo nível, e ao longo de toda a vida, a participação em projetos comuns, que parece ser um método eficaz para evitar ou resolver conflitos latentes”. (ROMÃO, op. cit. p. 105 apud DELORS, 1998, p.97). Na espreita do que vimos nas referências apontadas até aqui e não deixando de falar sobre a questão do educador social como sujeito contribuinte e um dos atores responsáveis pela a aplicabilidade de uma educação que visa não substituir a educação formal, mas, sim lhe oferecer mecanismos complementares, nos pautamos no entendimento de que o educador social é o 8 sujeito responsável por estar permanentemente atento no sentido de entender que: “[...] a educação social deve ser precisa em sua conceitualização. E deve ter bem presente, por outro lado, o dinamismo da realidade social, a fim de adaptar-se a ela continuamente. É preciso que a educação social seja conceitualizada e explicada em função de fatores diversos, como o contexto social, a política, as formas de cultura predominantes, a situação econômica e a realidade educativa do momento. (ROMANS, 2003, op. cit. p. 55). Entendemos assim, para o Programa em estudo ser bem sucedido é preciso que o educador social mantenha uma relação de colaboração e envolvimento dos participantes no sentido de fazer refletir no educando “[...] uma progressiva aceitação de si mesmo, ao processo de integração social e à obtenção de capacidades e de habilidades que lhe permita maior autonomia e independência social pessoal”. (ROMANS, 2003, op.cit. p. 160). Pois dessa maneira, contribuirá para que o indivíduo consiga mobilizar as energias necessárias para questionar a fundo o sentido de sua própria existência e os rumos que ela toma. Metodologia de Pesquisa A pesquisa deste trabalho foi desenvolvida com base nos dados observados ao longo do segundo semestre de 2007. O questionamento e interesse motivadores foram a de promover analises à influência do trabalho do educador social que atende crianças e adolescentes face à proposta inicial do Programa Bairro-Escdola nos seis primeiros meses de atividades. Nosso critério de verificação e análise ocorreu da seguinte forma: No primeiro momento verificamos os projetos das trilhas educativas, os quais foram apresentados pelos educadores e ratificados pelo corpo gestor do programa. Em seguida, visitamos 16, das 29, trilhas em execução, a fim de entender o desenvolvimento dos projetos e de perceber o relacionamento dos educadores quanto ao desenvolvimento das propostas e ali conversamos com os educadores para percebermos a afetividade do educador. 9 Realizamos pesquisas, por meio de relatórios, com três educandos, das trilhas esportiva, cultural e urbana, respectivamente e com três mães que acompanham o desenvolvimento de seus filhos. Junto à diretora e a uma coordenadora pedagógica de uma Unidade Escolar formal do bairro, colhemos, em forma de entrevista gravada, o depoimento sobre a participação de um aluno que frequenta aquela escola a fim de percebermos seu rendimento escolar e mudanças de relacionamento no ambiente escolar. Junto a comunidade verificamos sua participação nas atividades externas e coletivas no que se refere à ocupação dos espaços públicos, visitando as vielas, escadões e becos do bairro. A metodologia segue um formato no sentido de visualizarmos transformações na educação social, unindo teoria e prática. Também, tem o fim de conduzir o conhecimento no sentido de orientar o indivíduo a uma autoreflexão, promovendo, dessa maneira, uma mudança continuada a fim de apresentar ao educando maneiras de se fazer protagonista de sua própria história. Dessa forma, pudemos identificar como ocorre a relação educador/educando/comunidade e observar e analisar as ações realizadas, tanto as teóricas como as trilhas que extrapolam as paredes da sala de aula como, por exemplo, as atividades nos muros, escadões, becos do bairro, etc. Resultados – Análises dos dados Geral Este trabalho tem por base, como mencionado anteriormente, analisar o papel do educador social como facilitador/mediador da troca de saberes em uma comunidade em vulnerabilidade social. Nesta perspectiva, destacamos a necessidade de se pensar a Pedagogia Social como ciência preponderante que oferecerá o delineamento metodológico 10 para o profissional educador social desenvolver suas atividades. É manifesta a pertinência de os educadores promoverem uma educação social no sentido de ofertar ao aluno conhecimentos de como esse educando deve aprender a conhecer, a fazer e a ser, pois, por meio da interação é-se possível um trabalho melhor efetivo. Visitas as (aos) trilhas/educadores Conforme disposto, nos debruçamos sobre os projetos apresentados pelos professores à coordenadoria do programa. Percebemos que, os projetos encaminhados, quando no início das atividades, poucos sofreram alterações nas suas estruturas originais, pois, apenas dois, dos dezesseis estudados, apresentavam observações para alteração. No entanto, uma leitura amiúde faz revelar uma série de fatores que acreditamos conter algumas inconsistências pedagógicas e, por vezes indo ao desencontro com a missão proposta pelo programa como, por exemplo, desenvolver ações articuladas e integradoras. Durante as visitas às trilhas, realizadas em 16 das 29 existentes, percebemos que importante parte dos educadores não conduz as atividades no sentido de oferecer mecanismos aos educandos no que diz respeito à proposta inicial do programa e, tampouco segue proposituras paradigmáticas da Pedagogia Social, este posicionamento se dá por desconhecimento melhor aprimorado dessa ciência. Os resultados apontam, também, que uma parcela, pequena, mas significativa, dos professores ainda carece de uma afetividade para o trabalho de educador social. Pois, observa-se, na fala de alguns, que não há um entendimento integralizador das práticas e alguns profissionais, ainda, não possui consciência de que essa integração ocorre em meio a uma série de “conflitos humanos, políticos e sociais”. SOUZA NETO, (2006, op. cit. p.70). No entanto, quase todos os 16 educadores visitados entendem qua há falta de ajustamento do grupo e de entendimento sobre a importância das 11 práticas por eles realizadas, ou seja, lhes falta consciência que as atividades são ações socializadora e importantes para uma mudança significativa da comunidade a que serve. Pautamo-nos assim, porque, quando solicitado para pontuarem situações problemas para o desenvolvimento das trilhas, indicam como preponderante para o desenvolvimento de seus trabalhos, dentre outros fatores, a “falta de experiência no trabalho com a comunidade”, “falta de entendimento da proposta do programa”, “uma metodologia melhor adequada que os norteiem”, “inexistência de conhecimento teórico e prático das trilhas aplicadas pelos demais colegas”, “desconhecimento do paradigma Pedagogia Social”, “falta de visão do corpo pedagógico”, “não valorização dos trabalhos executados”, ou seja, há, ainda, importante caminho a ser percorrido, no sentido de promover a esse corpo de profissionais conhecimentos crítico e dialético, estes que pautarão uma verdadeira transformação social na comunidade. É de se relevar que o educador constrói sua identidade no fazer cotidiano de suas atividades, em permanência diária com os educandos e na vivência com a comunidade em que atua, por isso, é de importância que tenham um maior envolvimento no sentido de repensar seu modus operandi e sua permanência antes, durante e após as atividades a partir de leituras reflexivas de sua identidade pessoal e em seus afazeres, no sentido de promover alternativas possíveis para uma permanente influência condutora de seu status como educador social e consequentemente na transformação social do entorno em que atua. CUNHA, (2005, p. 193), propõe que: “[...] a educação é um empreendimento histórico e, como tal, se constitui de acordo com a configuração de múltiplos fatores; [...] tal configuração não obedece a leis ou regras previamente determinadas, mas resulta da interação entre pessoas e situações”. Por isso, é importante o educador social compreender que suas práticas devem ser conduzidas em um sentido amplo, isto é, não permitir que o tecnicismo seja o meio pelo qual as aulas sejam realizadas, mas sim, refletir sobre sua atuação e sobre seu fazer no programa como um agente igualmente, 12 social e que se encontra em um processo de contínuo aprendizado, de forma a respeitar-se quanto ao seu posicionamento e seu agir sob a perspectiva de sua própria subjetividade e personalidade, pois assim, poderá, também, romper um círculo vicioso e de alienação atual e, então, promover uma educação por meio da práxis e consignada ao sujeito. Resultados apontados pelos atendidos Não obstante ao que vemos até aqui, os alunos entrevistados apontam satisfação considerável ao programa. Em suas falas, consta um grau de importância relevante para as práticas e, alguns depoimentos nos fazem inferir que houve mudança significativa nos relacionamentos escolares, familiares e sociais. Destacamos como, por exemplo, a fala de Beatriz (nome fictício), que, também, participa das trilhas reforço matemática e de língua espanhola, que diz: “Depois que iniciei as atividades da trilha Corpo em Ação, meu desenvolvimento [motor] melhorou bastante e consegui entender melhor as aulas de matemática, pois antes [eu] era uma menina que pouco me relacionava com as pessoas e por conta disso não conseguia entender o que a professora passava na lousa.” Dos depoimentos das mães, destacamos a fala de Sandra (nome fictício), que tem duas filhas participantes da trilha de língua espanhola: “No início não entendia muito bem o que elas faziam nas trilhas. Mas, depois percebi que elas começaram a melhorar na escola e em casa. Antes brigavam muito, mas depois percebi que não se separavam e sempre estavam conversando em espanhol e trocando bilhetinhos entre si. Percebi que o relacionamento em casa melhorou bastante e que elas melhoraram as notas da escola, principalmente em português.” Dos pressupostos acima, percebemos que as práticas realizadas fez acontecer uma compreensão, nos participantes, quanto ao tempo e lugar em que estão situados, ou seja, as mudanças, tanto requeridas e impostas cotidianamente, acontecem a partir de uma troca de saberes múltiplos entre os diversos atores envolvidos nas ações realizadas. 13 Assim, podemos dizer que as ações, realizadas de forma contextualizadas, promovem certa significação aos sujeitos envolvidos, pois: “[...] Não é o modo de ser do indivíduo que explica seu modo de relacionar-se, mas, são as relações sociais em que ele está envolvido que explicam seu modo de ser”. (CUNHA, op. cit. p. 201, apud. VYGOTSKY, 1992, p. 320). Parceiros As falas da diretora e da coordenadora pedagógica, de uma Unidade Escolar, parceira do programa, são interessantes, pois trazem a mensagem de importante porcentagem dos alunos da sua escola, que participa do programa, apresentaram, no período analisado, melhoras nas notas, além da mudança, para melhora, comportamental. Verificamos também, que a direção da Unidade Escolar trabalha no sentido de encaminhar seus alunos para participar das trilhas, inclusive contribui na cessão de espaço para o desenvolvimento de atividades no interior da escola, esta visão de todo, por parte da direção da escola vem de encontro com o proposto por DOWBOR, ao dizer que: “Uma educação que insira nas suas formas de educar uma maior compreensão da realidade local terá de organizar parcerias com diversos atores sociais que constroem a dinâmica local”. (DOWBOR, 2009, p. 27). Melhorias externas na comunidade Do ponto de vista da valorização do espaço, observamos que houve engajamento por parte da comunidade em modificar o visual local. Verificamos que houve considerável mobilização das pessoas em dar as vielas e escadões existentes no bairro um novo visual, o que fez promover um ambiente mais socializado na comunidade assistida. 14 Nesse contexto, chamou-nos à atenção para uma moradora que ao ser entrevistada relatou que: “Quando vi que meu neto estava aprendendo sobre pintura, comentei com ele que gostava da escritora Tarsila do Amaral, daí o professor veio até aqui e me levou pra aula de pintura e, eu gostei tanto que comecei a trabalhar com os meninos”. Dessa maneira, o educador da trilha de Pinturas em Muros, passou a trabalhar com a senhora Sebastiana (nome fictício), e juntos reproduziram obras da artista nos muros do bairro e, claro, as pinturas foram realizadas pelos próprios alunos, após as aulas de pintura promovidas pelo educador. Conclusões finais Do presente estudo concluímos e entendemos que, de forma concreta, tem havido envolvimento por parte dos educadores no sentido de fazer acontecer mudanças substanciais na comunidade e, dessa forma, tem exercido influência para a promoção da quebra de paradigmas sociais, por meio das ações educativas realizadas, em especial ao público de crianças e adolescentes, uma vez que as ações realizadas promovem atividades abertas e flexíveis e, também, tem interesse pelas questões sociais do bairro, não apenas aos quesitos educativos, mas, também, às questões de sociabilidade o que faz gerar, nos moradores, uma sensação de pertencimento ao todo da sociedade. Acreditamos ser de fundamental importância a manutenção do programa, no entanto, entendemos ser pertinente voltar-se para a formação continuada do corpo de educadores a fim de lhes proporcionar metodologias apropriadas e outros olhares para a questão em pauta e, assim, poderem adotar uma postura que tem por princípio promover: “[...] educação integral do ser humano que tende a preparar a criança, o adolescente, o jovem ou adulto para uma convivência com seus semelhantes que elimine ou reduza ao mínimo os atritos e os conflitos, capacitando-o a compreensão dos demais, o diálogo construtivo e a paz social.” (ROMANS, op. cit. p. 28, notas 4 apud QUINTANA, 1984, p.19). 15 De acordo com a proposta inicial do programa e o verificado ao longo dos seis meses de atividades, faz-nos entender que a proposta atende as necessidades a que foi submetida, ou seja, deu-se um passo importante para o início das atividades e pode-se registrar ações concretas das práticas realizadas. No entanto, é pertinente a equipe pedagógica acompanhar a confecção e desenvolvimento dos projetos apresentados pelos educadores e promover amplo debate sobre os temas abordados. Acreditamos não existir um biotipo ideal de educador social, porém, há um conjunto de competências nas quais devem se pautar o profissional que atua na área social, quais sejam, “[...] os conhecimentos, as capacidades, e as atitudes”, (ROMANS, op. cit. p. 125), ao exercício da profissão. Isto é, “conhecimentos” no sentido de não se deter em apenas algo em especial e, sim, ter sempre em mente que seu fazer educador se dá em contextos diferenciados e com pessoas portadoras de múltiplos saberes, quereres e dificuldades, dessa forma, necessitando, o educador, de um permanente atualizar-se e principalmente ser possuidor de um amor próprio, o qual deverá se materializar no educando. Quanto às “capacidades”, é importante uma reflexão sobre a multiplicidade de teor que envolve o trabalho do educador social, quer seja na elaboração de projeto, quer seja na gerência de tempo, recursos materiais e até financeiros. Por fim, às “competências” atitudinais destacamos posturas proativas frente a determinadas situações, devendo pautar-se de forma condizente e ética com as diversas questões que venha a se deparar. Estar sempre disposto a atender a situações de conflitos e conduzi-los de forma a promover uma solução adequada e respeitosa frente ao educando. Não queremos aqui esgotar quais competências deve o educador social ser possuidor para condução de uma prática educativa e pertinente ao meio 16 social, apenas pontuamos alguns tópicos para reflexão e deixamos a questão em aberto para reflexões futuras e pesquisas adicionais. Finalmente, entendemos que os objetivos do programa, na sua quase totalidade, são concretizados. Pois, os resultados verificados neste estudo apontam que o educador social desenvolve importante influência junto às crianças e adolescentes atendidos e que, sua forma de atuação, ainda que necessite de algumas reflexões de âmbito da Pedagogia Social, ocorre de maneira a contemplar os quereres e necessidades dos educandos e da comunidade a que serve. Referências CUNHA, Myrtes Dias da. Subjetividade e constituição de professores. In GONZÁLEZ REY, Fernando. (org.) Subjetividade, complexidade e pesquisa em psicologia. São Paulo, Thomson: 2005. DOWBOR, Ladislau. Educação e desenvolvimento local. In MAFRA, Jason. ROMÃO, José Eustáquio. SCOCUGLIA, Afonso Celso. GADOTTI, Moacir. (orgs.). Globalização, educação e movimentos sociais: 40 anos da Pedagogia do Oprimido. São Paulo,Esfera: 2009. GHANEM, Elie; TRILLA, Jaume; ARANTES, Amorim Arantes. (org.). Educação formal e não-formal: pontos e contrapontos. São Paulo, Summus: 2008. GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. 4ed. São Paulo, Loyola: 2004. ______. Educação na-formal e cultura política: impacto associativismo do terceiro setor. 4ed. São Paulo, Cortez: 2008. sobre o HILSDORF, Maria Lucia Spedo. História da educação brasileira: leituras. 1ed. 3. reimpressão, São Paulo, Thomson: 2003. MACCIOCCHIO, Maria-Antonieta. Tradução de Angelina Peralva. A favor de Gramsci. Rio de Janeiro, Paz e Terra: 1976. MAFRA, Jason; ROMÃO, José Eustáquio... [et. al.] (orgs.). Globalização, educação e movimentos sociais: 40 anos da Pedagogia do Oprimido. São Paulo, Instituto Paulo Freire; Esfera: 2009. MAXIMO, Antonio Carlos. Os intelectuais e a educação das massas: o retrato de uma tormenta. São Paulo, Autores Associados: 2000. 17 OLIVEIRA, Cristiane Gonçalves de. Educação não formal de crianças e adolescentes: expectativas quanto ao Programa de Núcleos Comunitários em Campinas, SP. 2008. 175 p. Dissertação Mestrado em Sociologia da Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo/USP-SP. PEREIRA, Potyara A. P. Política social: temas & questões. São Paulo, Cortez: 2008. ROMÃO, José Eustáquio. Pedagogia Dialógica. 2ed. São Paulo, Cortez: 2007. ROMANS, Mercè; PETRUS, Antoni; TRILLA, Jaume. Tradução Ernani Rosa. Profissão: educador social. Porto Alegre, Artmed: 2003. SEDANO, Alfredo Rodríguez. La cuestión del método en la pedagogía social. 2007. 161-176 p. Revista Educación y educadores, año/vol. 10, n 001. Universidad de La Sababa, Cundinamarca, Colombia. <http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/src/inicio/ArtPdfRed.jsp?iCve=83410113> acessado em: 19mar10. SEMERARO, Giovanni. Gramsci e a sociedade civil: cultura e educação para a democracia. 2ed. Rio de Janeiro. Vozes: 2001. SILVA, Gerson Heidrich da. A construção de identidade do educador social na sua prática cotidiana: a pluralidade de um sujeito singular. 2008. 167 p. + anexos. Dissertação de Mestrado em Educação Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo/USP-SP. SOUZA NETTO, João Clemente de. DE LIBERAL, Márcia Mello Costa. [et. al.] (orgs.). Educar para o trabalho: estudos sobre os novos paradigmas. Curitiba, Arauco: 2006. ______; SILVA,Roberto da; MOURA, Rogério Adolfo de. (orgs.) Pedagogia Social. São Paulo. Expressão e arte: 2009. SPOSITO, Marília Pontes. O povo vai à escola: a luta popular pela expansão do ensino público em São Paulo. 4ed. São Paulo, Loyola: 2002. TEIXEIRA, Elenaldo Celso. O local e o global: limites e desafios da participação cidadã. 2ed. São Paulo, Cortez: 2001. TOURAINE, Alain. Tradução de Carlos Aboin de Brito. Iguais e Diferentes: poderemos viver juntos? Portugal, Instituto Piaget: 1998. ______. Tradução de Elia Ferreira Edel. Crítica da modernidade. 8ed. Rio de Janeiro, Cortez: 2008. WEBER, Sueli Wolff. Gramsci e Vygotsky: na educação para excluídos. 1998. 244 p. Dissertação de Mestrado em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC-SC.