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Classificação do artigo 5 mar 2015 O Globo
ANA PAULA RIBEIRO ana. ribeiro@ sp.oglobo.com. br ALYNE BITTENCOURT alyne. bittencourt@ infoglobo.com.
br travel money — Colaborou Eliane Oliveira
Mais uma barreira rompida
Dólar comercial atinge R$ 2,98, e quem planeja viajar ao exterior já paga até
R$ 3,33 pela divisa
“Houve um mau humor com a devolução, pelo presidente do Senado, da medida provisória que trata das
desonerações” Bernard Gonin
Analista da Bozano Investimentos
O temor de que medidas de ajuste fiscal não sejam aprovadas pelo Congresso levou o dólar comercial
a bater R$ 3, na máxima do dia, e fechar a R$ 2,98, o maior patamar desde 19 de agosto de 2004. Nas
casas de câmbio, o dólar turismo era negociado por até R$ 3,33 nos cartões pré­pagos de viagem ea R$
3,17 em espécie. Lojas de importados já reajustam preços e preveem queda nas vendas. ­SÃO PAULO,
RIO E BRASÍLIA­ A percepção de risco em relação ao Brasil já não era boa. E agravou­se ainda mais diante
da piora das relações entre o governo federal e o PMDB, que detém as presidências da Câmara e do
Senado. Os investidores calculam que o risco político está maior, dificultando as chances de
implementação do ajuste fiscal — e isso se refletiu diretamente na cotação da moeda americana. O dólar
comercial fechou ontem em alta de 1,77%, a R$ 2,980, maior valor de fechamento desde os R$ 2,987 de
19 de agosto de 2004. Na máxima do pregão, a divisa chegou aos R$ 3, valor mais alto registrado desde
os R$ 3,013 de 18 de agosto de 2004. Os recordes não pararam por aí. No câmbio turismo, aquele usado
por quem viaja ao exterior, os valores também dispararam: atingiram máxima de R$ 3,33.
O preço médio do dólar turismo em São Paulo, compilado pela agência CMA, ficou em R$ 3,18, uma
alta de 3,24% em relação ao pregão anterior. Sobre esse valor, há ainda a cobrança de IOF, que é de
0,38% no papel­moeda e de 6,38% no cartão viagem.
No Rio, a Corretora Cotação cobrava R$ 3,33 pelo dólar turismo para quem escolhia carregar um
cartão pré­pago, o chamado valor que já inclui o IOF. Para quem comprava em espécie, a divisa saía a R$
3,17, também já com o imposto. Nas corretoras TOV e Ultramar, o valor cobrado para o cartão pré­pago
era de R$ 3,29. Mas, na primeira, o dólar em espécie saía a R$ 3,14, contra R$ 3,09 na segunda. No
Banco do Brasil, o consumidor tinha de desembolsar R$ 3,18 pelo dólar turismo no pré­pago e R$ 3,08 em
espécie. No Bradesco, os valores eram de R$ 3,29 e R$ 3,14, respectivamente.
Em outubro do ano passado, em plena campanha eleitoral, o então ministro da Fazenda, Guido
Mantega, disse, em entrevista à “Folha de S.Paulo”, que quem apostasse na alta do dólar após a reeleição
de Dilma Rousseff iria “quebrar a cara”. Na ocasião, a cotação da moeda americana estava em torno de R$
2,40.
LISTA DA LAVA­JATO PESA NA INCERTEZA
A tensão nos mercados se deve ao temor de que o governo não consiga aprovar as medidas
necessárias para o ajuste fiscal, dificultando o cumprimento da meta do superávit primário, de 1,2% do
Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país). E essa incerteza faz crescer
o receio de que o Brasil possa perder o grau de investimento concedido pelas agências de classificação de
risco, que representa um selo de bom pagador. Se o país perder essa classificação, receberá menos
investimentos externos. Além disso, analistas temem uma paralisia nos trabalhos legislativos, devido à
deterioração nas relações entre o governo Dilma e o Congresso.
— Houve um mau humor com a devolução, pelo presidente do Senado, da medida provisória que trata
das desonerações. Além disso, a lista do procurador­ geral, Rodrigo Janot, criou um desequilíbrio político —
avaliou Bernard Gonin, analista econômico da Bozano Investimentos, referindo­se à lista de políticos que
teriam envolvimento com a Operação Lava­Jato.
Na terça­feira à noite, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), devolveu a medida provisória
(MP) que altera as regras de desoneração da folha de pagamentos. A reação do governo foi enviar à
Câmara dos Deputados um projeto de lei, com o mesmo conteúdo, com urgência constitucional. “Ao se
alterar de medida provisória para projeto de lei, a cobrança das novas alíquotas terá de esperar pelo
menos 90 dias. Dessa forma, o efeito final da medida será bem inferior ao projetado pela equipe
econômica, ou seja, R$ 5,8 bilhões neste ano”, avaliou Marco Aurélio Barbosa, da CM Capital Markets, em
relatório a clientes.
Além disso, os integrantes da agência de classificação de risco Standard & Poor’s se reuniram ontem
com representantes dos ministérios da Fazenda e Planejamento. Isso acabou aumentando os rumores
sobre a possibilidade de o país perder o grau de investimento.
— Ontem houve um clima mais de pânico, por isso esse movimento de desvalorização da moeda
brasileira. Se o governo não conseguir aprovar as MPs do ajuste fiscal, pode gerar uma crise mais forte —
explicou Raphael Figueredo, analista da Clear Corretora.
Na abertura dos negócios, chegaram a circular rumores de que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy,
teria pedido para deixar o cargo — todos negados pelo Palácio do Planalto.
PREOCUPAÇÃO COM OS DADOS DOS EUA
Outro fator que tem contribuído para a desvalorização do real é a expectativa em relação aos novos
dados da economia americana, que podem mostrar um aquecimento ainda maior no mercado de trabalho
— um indicador acompanhado com lupa pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano). O índice
de desemprego de fevereiro será divulgado amanhã. Se houver melhora nos dados de emprego, aumenta
a chance de a alta de juros nos Estados Unidos ser antecipada. Atualmente, o juro básico do país está
próximo de zero. A elevação dessa taxa atrairia para os EUA investidores externos, que deixariam os
mercados emergentes, pressionando mais a cotação do dólar.
Os negócios na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) também refletiram as tensões do cenário
político brasileiro. Os papéis preferenciais (PN, sem direito a voto) da Petrobras caíram 4,06%, cotados a
R$ 9,21, enquanto os ordinários (ON, com voto) recuaram 3,78%, a R$ 9,15. Também tiveram queda
significativa as ações da Vale. As PN tiveram desvalorização de 2,32%, e as ON, de 1,92%. Os bancos, que
têm maior peso na composição do Ibovespa, também operaram em terreno negativo. Os papéis PN do
Itaú recuaram 0,87%, e os do Bradesco caíram 2,07%. No caso do Banco do Brasil, a queda foi de 5,03%.
Na contramão desse movimento, as ações das empresas de papel e celulose fecharam em forte alta.
Isso se deve ao fato de essas companhias se beneficiarem da valorização do dólar. Os papéis da Suzano
subiram 3,20%, enquanto os da Fibria avançaram 3,49%.
— Se tem um setor que está bem é o de papel e celulose, devido à alta do dólar. Não tem crise com a
moeda nesse patamar — disse Alan Oliveira, analista da Futura Invest.
FLUXO CAMBIAL VOLTA AO VERMELHO
Já o fluxo cambial, que é a diferença entre os ingressos e as saídas de dólares do país, voltou a ficar
negativo em fevereiro, em US$ 1,142 bilhão. Em janeiro, havia ficado positivo em US$ 3,9 bilhões. Com
isso, o saldo acumulado nos dois primeiros meses do ano ficou no vermelho em US$ 245,868 milhões.
Segundo o Banco Central, as transações comerciais entraram na conta com um superávit de US$
567,5 milhões, com exportações em US$ 12,379 bilhões e importações de US$ 11,812 bilhões. Já as
operações financeiras — que reúnem, entre outros, investimentos estrangeiros diretos e em carteira,
remessas de lucros e dividendos e pagamento de juros — ficaram negativas em US$ 1,856 bilhão.
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