Fundamentos de Direito Penal
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§ 12 – CLASSIFICAÇÕES DAS FONTES
DE DIREITO PENAL
Leandro Ayres França1
Fernanda Guerra Drummond2
Sumário: 1. Referência Jurisprudencial. 2. O Caso. 3. Os Fundamentos da Decisão. 4. Problematização. 5. Referências.
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REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL
Corte Interamericana de Direitos Humanos – Caso Gomes Lund e outros
(“Guerrilha do Araguaia”) vs – Brasil – Juiz Presidente Diego García-Sayán,
com voto fundamentado do Juiz ad hoc Roberto de Figueiredo Caldas – j.
em: 24.11.2010.
2
O CASO
Em decorrência da morosidade das investigações oficiais de buscas
dos corpos das vítimas da Guerrilha no Araguaia3, o Centro de Justiça e Di1
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3
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Pesquisador do Grupo de Pesquisa Modernas
Tendências do Sistema Criminal. Advogado e escritor.
Graduada pela Universidade Federal do Paraná; e pós-graduanda pela Associação
Brasileira de Direito Constitucional – ABDConst. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa
Modernas Tendências do Sistema Criminal. Assessora Jurídica do Ministério Público
do Paraná.
“Em meio à fase de exceção estabelecida no Brasil durante a ditadura, por volta de
1972, um dos grupos de resistência armada, dirigido pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), e contando com cerca de 70 pessoas, fazia seu treinamento na região de
São João do Araguaia, no estado do Pará. (...), entre abril de 1972 e janeiro de 1975,
um contingente entre 3 mil e 10 mil representantes das Forças Armadas e da polícia
militar ocuparam a região, dizimando a resistência, no episódio que ficou conhecido
como a Guerrilha do Araguaia. / Conforme relatórios sobre o Direito à Memória e à
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Leandro Ayres França e Fernanda Guerra Drummond
reito Internacional (CEJIL), em conjunto com a Human Rigths Watch –
Americas, interpôs, em 07.08.1995, uma demanda para a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em representação aos familiares dos
desaparecidos. A Corte Interamericana foi suscitada para que realizasse um
controle de convencionalidade da Lei da Anistia (Lei 6.683/1979): questionava-se a compatibilidade da referida lei com as obrigações internacionais
do Brasil contidas na Convenção Americana4. Note-se que o pleito não solicitava que a CIDH realizasse um exame de constitucionalidade da Lei da
Anistia – questão de direito interno brasileiro –, sequer se pretendeu que a
CIDH revisasse o julgamento do Supremo Tribunal Federal na Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 153 – vez que, quando
da apresentação da demanda, sequer haviam sido emitidos os votos dos Ministros5.
4
5
Verdade (referidos pela CIDH na sentença), a partir de 1973, sob o comando do
General Médici, a repressão à Guerrilha do Araguaia se intensificou, sendo que a ordem oficial ‘passou a ser a eliminação dos capturados’. Por volta de 1974, segundo o
informe, já não havia mais guerrilheiros no Araguaia; existem muitos relatórios que
indicam que seus corpos foram desenterrados e queimados, ou então atirados nos rios
da região: ‘o governo militar impôs silêncio absoluto sobre os acontecimentos do
Araguaia e proibiu a imprensa de divulgar notícias sobre o tema, enquanto o exército
negava a existência do movimento’ ”. (FRANÇA, Leandro Ayres; OLIVEIRA, Roberta
Cunha de. Quando o dia raiou sem pedir licença: a responsabilização internacional do
Estado brasileiro pelos atos cometidos contra seus inimigos na Guerrilha do Araguaia
(1972-1975). In: FRANÇA, Leandro Ayres (Org.). Tipo: Inimigo. Curitiba: FAE Centro Universitário, 2011.)
O direito de não ser submetido a um desaparecimento forçado, decorrente dos arts. 3º, 4º,
5º e 7º; o direito à proteção judicial e às garantias judiciais relativos ao esclarecimento
dos fatos e à determinação das responsabilidades individuais por esses mesmos fatos, decorrentes dos arts. 8º e 25; todos da Convenção Americana.
Conforme previsão dos art. 102, § 1º, da Constituição da República, e do art. 1º da
Lei 9.882/99, a ADPF é a ação por via da qual se suscita a jurisdição constitucional
abstrata e concentrada do Supremo Tribunal Federal para evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do Poder Público. Na ADPF 153, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil questionou o teor do § 1º do art. 1º da Lei
6.683/79: “Art. 1º. É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02.09.1961 e 15.08.1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes
eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações ligadas ao poder público, aos Servidores dos
Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e complementares. § 1º Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados
com crimes políticos ou praticados por motivação política”. Até o termo da redação
deste artigo, a decisão não transitou em julgado, uma vez que o arguente interpôs Embargos de Declaração (13.08.2010) e apresentou relevante fato novo (23.03.2011) a ser
apreciado pela corte: a juntada da sentença proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Fundamentos de Direito Penal
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OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO
Ao recordar que o art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito
dos Tratados de 1969 estabelece que os Estados não podem, por razões de
ordem interna, descumprir obrigações internacionais, a CIDH explicou as
consequências das obrigações convencionais dos Estados:
Este Tribunal estabeleceu em sua jurisprudência que é consciente de que as autoridades internas estão sujeitas ao império da lei e, por esse motivo, estão obrigadas a aplicar as disposições vigentes no ordenamento jurídico. No entanto, quando um Estado é Parte de um tratado internacional, como a Convenção Americana, todos os seus órgãos, inclusive seus juízes, também estão submetidos àquele, o
que os obriga a zelar para que os efeitos das disposições da Convenção não se
vejam enfraquecidos pela aplicação de normas contrárias a seu objeto e finalidade, e que desde o início carecem de efeitos jurídicos. O Poder Judiciário, nesse
sentido, está internacionalmente obrigado a exercer um ‘controle de convencionalidade’ ex officio entre as normas internas e a Convenção Americana, evidentemente no marco de suas respectivas competências e das regulamentações processuais correspondentes. Nessa tarefa, o Poder Judiciário deve levar em conta
não somente o tratado, mas também a interpretação que a ele conferiu a Corte
Interamericana, intérprete última da Convenção Americana6.
Uma vez que o Brasil internalizou a Convenção Americana em
1992, tendo reconhecido a competência contenciosa da CIDH em
10.12.1998, a Corte Interamericana era competente para conhecer e julgar o
pedido de controle de convencionalidade. Em sua decisão, a CIDH reconheceu que o regime militar implantado no Brasil foi responsável por práticas
sistemáticas de detenções arbitrárias, torturas, execuções e desaparecimentos
forçados perpetrados pelas forças de segurança do governo militar. E, em
específico, que o extermínio ocorrido no episódio da Guerrilha do Araguaia
fez parte de um padrão de repressão, perseguição e eliminação sistemática e
generalizada da oposição política do regime ditatorial. Comprovou-se perante a Corte Interamericana que as vítimas dessa operação estiveram sob
custódia – isolada e incomunicável – do Estado em algum momento antes de
seus desaparecimentos. E que essas mesmas vítimas foram torturadas durante a custódia, conforme o “modus operandi seguido pelos agentes estatais nas detenções da região, bem como em outros desaparecimentos forçados e prisões de opositores políticos no Brasil”7.
6
7
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Gomes Lund e outros
(“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil. p. 65-66 (da sentença).
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Gomes Lund e outros
(“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil. p. 31 (da sentença).
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Fundamentos de
Direito Penal
Organizador: Paulo César Busato
ISBN: 978853624289-7
Número de Páginas: 306
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