AS DIFICULDADES ENFRENTADAS POR ALUNOS E PROFESSORES NO
PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DAS TÉCNICAS DE LEITURA
E INTERPRETAÇÃO TEXTUAL.
*Vinícius Ferreira de Aguiar
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo analisar os problemas enfrentados por
alunos e professores durante o processo de ensino e aprendizagem da Língua
Portuguesa nos campos da leitura e interpretação textual. Não se pretende,
porém, simplesmente subjugar as teorias até o momento implantadas ou a
qualidade do ensino, mas sim, propor de forma real e efetiva meios para que o
aprendizado possa ser real, levando-se em consideração a bagagem cultural e
intelectual já obtida pelo aluno ao longo de sua vida, e desmistificando a
necessidade de utilização do ensino e avaliações tradicionais e dos autores
clássicos para o incentivo à leitura.
Palavras-chave: leitura, interpretação, ensino, aprendizagem, dificuldades.
*Professor de Língua Portuguesa no Ensino Médio e da disciplina de Português Instrumental
no curso de graduação em Nutrição, da Faculdade Atenas em Paracatu-MG.
1 – INTRODUÇÃO
Este trabalho não objetiva revolucionar a forma de ensino aplicada na
educação dos jovens brasileiros. O objetivo, antes de qualquer outro, é mostrar
os motivos reais que tornaram os nossos alunos seres repetidores e não seres
pensantes, as razões que levaram o ensino e a educação brasileira ao
tecnicismo e desvirtuaram a forma humanista de se repassar o conhecimento,
chave notória para o crescimento profissional, e, dentro deste patamar, desejase, através deste estudo, traduzir todos os elementos que fazem com que os
alunos atinjam os níveis médio e superior levando consigo uma imensa
dificuldade quanto à leitura e interpretação.
2 – DESENVOLVIMENTO
2.1 – QUANTO À METODOLOGIA
Paulo Freire, através de sua Pedagogia da Esperança, pregava uma
metodologia de ensino em que os alunos fossem reconhecidos de forma
individualizada, que fossem tratados de forma amorosa e amistosa, para que
assim, a educação fosse de fato otimizada:
(...) que saibamos que, sem certas qualidades ou
virtudes como amorosidade, respeito aos outros, tolerância, humildade, gosto
pela alegria, gosto pela vida, abertura ao novo, disponibilidade à mudança,
persistência na luta, recusa aos fatalismos (...) abertura à justiça, não é
possível a prática pedagógico-progressista, que não se faz apenas com ciência
e a técnica. (FREIRE, 1997, p. 136).
Transcendendo as ideias do renomado autor, surge ainda a questão da
resposta por parte dos discentes a respeito desta “prática pedagógicoprogressista” por ele citada, tendo em vista que a cultura do tecnicismo atingiu
também os educandos, bem como suas famílias e toda a sociedade.
Apesar destes obstáculos, muito tem se falado a respeito do real papel da
escola na vida dos estudantes. A Metodologia e a Didática têm discutido o
assunto de forma consistente, de modo que a forma de ensinar tem sido
otimizada, e o papel do professor na sala de aula tornou-se ainda mais
fundamental, posto que o ensino nada mais é que uma troca de conhecimentos
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em mão dupla, e não simplesmente a inserção autoritária e verticalizada de
informações por parte do docente ao aluno.
Apesar das notáveis mudanças, a cultura de ensino, de forma geral,
permanece a mesma, e é visível a discordância metodológica de uma grande
parte dos professores no sentido de considerar a aplicação de uma nova forma
de ensino, em que o aluno passa a ser sujeito agente, participante, e não
somente uma cabeça a receber informações. Devido á esta resistência,
percebe-se as dificuldades quanto às tão necessárias mudanças no processo
de ensino, que, embora estejam sendo aplicadas na prática, ainda não foram
desenvolvidas de forma sistemática, real, principalmente de forma cultural para
quem transmite o conhecimento. Vários são os motivos capazes de explicar
este fato, mas pode-se afirmar que o principal deles está na metodologia de
ensino tradicional da qual advém à grande maioria dos nossos professores,
sejam eles originários de instituições privadas ou públicas.
2.2 – QUANTO À ESTRUTURA
A docência tem sido uma das profissões mais marginalizadas, por assim dizer,
nos últimos anos. Culturalmente, ser professor é sinônimo de baixa
rentabilidade e insucesso profissional, levando em consideração os baixos
índices de alunos da graduação que optam por cursos de licenciatura. Sendo
assim, o quadro de professores tornou-se defasado, e mais que isso, antiquado
e muitas vezes até acomodado, posto que diante de muitos anos de profissão e
muito pó de giz, os docentes não buscam o aperfeiçoamento, e por vezes,
perderam sua ideologia e sua “utopia” de transformar a qualidade do ensino
dentro das salas de aula.
Para que se possa transformar um ensino culturalmente verticalizado, é
preciso, antes de tudo, transformar os profissionais que nele atuam, seja na
docência, na pedagogia, na administração, e em todas as demais áreas que
envolvem o sistema educacional, e, vale ressaltar, que esta transformação
precisa ser cultivada na base do ensino, desde as séries iniciais até a
graduação, para que os alunos possam adquirir, a partir da sua formação
básica, um modo diferente de lidar com a aprendizagem e desta desfrutar de
3
forma
mais
proveitosa,
independentemente
da
área
profissional
que
escolherem seguir.
2.3 – QUANTO AO ENSINO E APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA
No campo da leitura e interpretação, o ensino tradicional tem prejudicado
categoricamente e efetivamente o real aprendizado do aluno, e pode-se ousar
ainda a afirmar que o sistema de ensino de leitura e teoria da Língua
Portuguesa adotado atualmente, de maneira geral, tem prestado um verdadeiro
desserviço à educação das crianças, adolescentes e jovens que precisam
ultrapassar as etapas para atingir à graduação.
É sabido por todos que leitura e interpretação não são apenas dons divinos.
Como qualquer outra área de ensino, trata-se de uma formalização cuja teoria
pode auxiliar em seu aprendizado, desde que esta teoria leve o educando à
prática efetiva. O que se pode perceber, analisando os currículos de escolas de
ensino básico e médio é que as teorias de ensino da Língua Portuguesa neste
campo específico para a formalização do conhecimento têm, na verdade,
impedido que a prática possa ser efetivada. A partir do momento em que não
se considera os conhecimentos prévios e a carga emocional e cultural de cada
um dos alunos, o docente está fadado a transformar a necessidade de
repassar a matéria ao aluno num difícil calvário para este, o que,
automaticamente, gera a antipatia e pior, o desgosto do aluno pelo conteúdo
estudado.
Segundo Lopes (1996), a leitura é a única habilidade que atende às
necessidades educacionais e que o aprendiz pode usar em seu próprio meio
(propósito utilitário e educacional); é a única habilidade que o aprendiz pode
continuar a usar autonomamente ao término do curso. A afirmação do autor
aplica-se perfeitamente nos parâmetros do ensino da Língua Portuguesa. É
impossível inserir-se em qualquer meio social carregando uma considerável
dificuldade, mesmo no campo cognitivo, diante da leitura. Dentro desta
perspectiva, as bases de conhecimento do aluno surgem como um excelente
ponto de partida para que o professor possa desenvolver seu trabalho de forma
mais efetiva e eficaz.
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Observou-se, ao longo deste trabalho, que a questão do ensino da Língua
Portuguesa nos campos da leitura e interpretação está inteiramente ligada ás
raízes tradicionalistas da atuação dos professores em sala de aula, e mesmo
do sistema educacional, relacionando-se, neste fator, a questão das provas de
vestibulares e da comercialização do ensino como produto, e não como
processo. Tecer críticas apenas ao ensino da base pode não parecer justo,
considerando que as séries iniciais preparam para o formato tecnicista - cujo
foco não é o aluno, mas o conteúdo - das provas que garantem o ingresso em
cursos superiores. Desde criança, o aluno tem sido preparado para passar no
vestibular, e não para aprender, de fato. Esta verdade tem transformado os
professores em comerciantes do conhecimento, em meros transmissores de
um produto fechado, acabado e inquestionável, como se o “aprender” estivesse
limitado apenas ao que os educadores transmitem dentro de uma sala de aula,
e, levando em conta as ideias de Paulo Freire, de que a sociedade não é um
objeto estagnado, e sim um processo em constante modificação e transição,
esta forma sistemática de atuação dos professores, baseados no ensino
tradicional, torna-se condenável, posto que é impossível desvincular o
processo de aprendizado das constantes transformações sociais nas quais
convivem os alunos fora do ambiente da sala de aula.
A primeira questão está em analisar o contexto do público-alvo, no caso, os
alunos. De onde vêm, qual seu nível familiar, educacional, social, econômico e
político? Qual a estrutura de vida peculiar a cada um dos alunos daquele
determinado grupo com o qual se quer trabalhar? A partir da definição deste
perfil, pode-se transformar a forma de atuação, diante das reais necessidades
do grupo, não apenas visando a uma futura aprovação no vestibular, mas à real
troca de conhecimentos, o que leva ao nível efetivo de aprendizagem.
Através de experiências no nível médio do ensino público, é possível entenderse que são alunos com uma enorme bagagem de vida e acima de tudo
sentimental. Muitos sofrem com problemas familiares, financeiros, violência
doméstica, e demais males que são chagas da sociedade atual. Diante de
situações de tais naturezas, como se pode impor a esses estudantes a “cruel”
leitura de um Dom Casmurro, por exemplo? Embora pareça absurdo, os
currículos de muitas escolas públicas e os programas dos vestibulares exigem
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categoricamente conhecimentos literários no mínimo indevidos, por assim
dizer, para alunos de tais feitas.
No entanto, como dito anteriormente, esta classe de estudantes possui uma
enorme carga de conhecimento de vida, posto que muitos trabalham e vivem
como adultos, tendo as mesmas responsabilidades, inclusive financeiras, para
com suas famílias. A partir desta constatação, pergunta-se: por que não
aproveitar esta experiência de vida que estes alunos trazem para a sala de
aula, e transformá-la em interesse pela leitura? A resposta é simples: porque o
sistema educacional não permite. E sendo assim, os professores criam, através
deste método tecnicista em que o aluno não é um ser, mas uma máquina onde
se impõe o conhecimento de forma impiedosa, mesmo sabendo-se que pouco
vai, de fato, ficar. Mas a implementação de novas teorias de ensino passa
também pela conscientização dos demais agentes envolvidos no processo
educacional, como familiares, diretores, pedagogos, governo e toda a
comunidade escolar.
2.4 – A INFLUÊNCIA DO SISTEMA EDUCACIONAL NO APRENDIZADO
Como experiência própria advinda do ambiente escolar, pode-se citar um
momento em que, durante um processo avaliativo numa escola pública, foi
solicitado que os alunos realizassem um texto argumentativo a respeito da
liberação da maconha no Brasil. A ideia era incentivar a pesquisa a respeito do
tema, tendo em vista que se trata de algo que faz parte do dia a dia dos
mesmos, além de ser um assunto bastante atual e discutido. Por indução,
estes estudantes iriam estudar a respeito dos malefícios da utilização das
drogas e, por consequência, iriam abandonar a postura de sujeitos
mecanizados cujas informações lhes são impostas a todo o custo, para tornarse pessoas que pensam e que são capazes de definir sua própria opinião a
respeito de um tema tão importante na sociedade atual. Apesar de louvável, a
ideia foi vetada pelo setor pedagógico da escola, sob o argumento de que
como muitos dos alunos usavam drogas, fazer-lhes escrever sobre o tema
poderia criar uma situação constrangedora na relação escola-família.
São exemplos como estes que justificam a grandiosa necessidade de repensar
o sistema educacional brasileiro, tanto público quanto privado, pois se na
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escola pública o objetivo parece ser livrar-se o mais rápido possível dos alunos
aprovando-os nas disciplinas, na escola privada a educação foi comercializada
de tal forma que existe a necessidade de se aprovar um número cada vez
maior de alunos nas universidades, para assim, aumentar a publicidade da
escola.
Considerando todos estes fatores, percebe-se que os problemas no ensino da
leitura e interpretação são advindos de toda uma estrutura educacional que não
permite que o discente consiga adquirir o hábito pela leitura, o que facilitaria
bastante o aprendizado. Ao desconsiderar toda a bagagem de conhecimento,
mesmo que não-teórico, trazida para a sala de aula pelo seu aluno, o professor
passa a condenar aquele aluno a um eminente fracasso em seu processo de
aprendizagem. É preciso, antes de tudo, enxergar esta aprendizagem como um
processo de fato, e não um produto, em que o professor ensina, o aluno
aprende, obtém a nota na avaliação, é aprovado e, por isso, detém o
conhecimento. Percebe-se, por muitos motivos, que esta teoria é falha, tendo
em vista a grande quantidade de alunos da graduação que não tem qualquer
ideia a respeito de conteúdos estudados nos ensinos médio e fundamental.
2.5 – O DIREITO DE ERRAR
Considerando todas as razões supracitadas, é necessário que se estabeleça
formas para que o estudante tenha a real oportunidade de cometer erros, e
através destes, adquirir o conhecimento verdadeiro, que não se resume ao dia
da avaliação. Para tanto, as atividades avaliativas precisam ser contínuas,
processuais, ao contrário do que o atual sistema educacional faz. As avaliações
fechadas, com datas marcadas e conteúdo sistematizado fazem com que o
estudante esteja focado apenas em adquirir o conhecimento básico necessário
para obter a nota da qual precisa para ser aprovado naquela determinada
matéria, cuja avaliação é naquele determinado dia, e, ao lograr êxito, este
estudante está fadado a desconhecer o conteúdo já no momento em que
finaliza aquela avaliação.
A questão a ser tratada agora é como realizar esta transformação na estrutura
de ensino no campo da leitura e interpretação textual. Sabe-se que todo ser,
baseado na educação familiar que obteve e no meio social no qual vive, faz
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opções pessoais, define escolhas, e através destas, traça suas metas. Trata-se
do já discutido conhecimento prévio, que todo e qualquer aluno traz para a sala
de aula. Considerando a faixa etária do ensino médio, pode-se afirmar que há
preferências por música, carros, festas, relacionamentos, internet, entre outros.
Diante desta constatação, é necessário que o professor saiba usar estas
preferências dos alunos a favor do conteúdo ministrado. Diferentemente do que
sugerem as diretrizes curriculares das escolas e os programas dos vestibulares
e das provas de avaliação realizadas pelo governo, deve-se estimular, a priori,
a leitura dos temas que são relevantes para os estudantes, e não dos temas
que o professor julga relevantes, ou seja, é fundamental que se permita, e mais
que isso, incentive, o trabalho de leitura relacionado aos temas de real
interesse do público em questão.
2.6 – OS FALSOS CONCEITOS QUE INFLUENCIAM NO APRENDIZADO
Um dos maiores problemas encontrados no processo de aprendizagem
lingüístico é a definição, infeliz por assim dizer, do conceito de “subliteratura”. O
ensino tecnicista da literatura transformou os autores clássicos em intocáveis e
deuses, deixando de levar em consideração os contemporâneos que surgiram
falando de temas atuais, através de contextos também atualizados e de uma
linguagem mais amena, que chama muito mais a atenção dos jovens
estudantes que estão na sala de aula. Não se pode desvirtuar esta verdade.
Para um aluno que não tem o hábito de ler, exigir a leitura de um autor clássico
é ter por consequência o seu desgosto, talvez de maneira definitiva, pelo
fantástico conhecimento que a leitura pode proporcionar. Conforme Aguiar e
Silva
(1976),
a
literatura,
enquanto
conjunto
de
textos,
é
também
correlativamente, um conjunto aberto, não sendo possível formular quaisquer
regras historicamente recursivas dotadas de capacidade preditiva em relação
aos textos que, no futuro, se hão de integrar nesse conjunto aberto e que hão
de introduzir alterações na dinâmica significativa e axiológica de todo o
conjunto. Embora a literatura não seja detentora de um conceito fechado, a
educação tradicional tende a rotular negativamente determinados tipos de
leitura, o que acaba por prejudicar o efetivo processo de aprendizagem. Dentro
desta perspectiva, é preciso considerar e aceitar que todo e qualquer tipo de
leitura, mesmo que não esteja dentro do conceito dos grandes autores
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clássicos, é válida como meio de transmissão de conhecimento, tendo em vista
que este também não pode ser rotulado, considerando que se trata de um
constante processo e não de um produto que abriga começo, meio e fim.
Não se pretende, no entanto, desqualificar a importância dos grandes autores
utilizados no ensino da Literatura e da Língua Portuguesa. É inegável a
contribuição de clássicos como Machado de Assis, Jorge Amado, Manuel
Antonio de Almeida, Graciliano Ramos, Mário de Andrade, entre outros. São
obras que transformaram, em sua época, o conceito de Literatura, e acima de
tudo, romperam com importantes barreiras sociais do seu tempo. Por outro
lado, é importante que se considere o fato de que para a leitura, compreensão
e apreciação destes renomados autores é necessário que o aluno possua uma
base intelectual sólida, uma capacidade linguística efetiva e principalmente
detenha o verdadeiro prazer com a leitura. Tais fatores devem ser adquiridos
através de textos contemporâneos, com estrutura de linguagem compatível ao
dia-a-dia vivenciado pelo educando, para que este possa enxergar a leitura
como um processo constante, cujos degraus devem ser vencidos um a um,
sem que se ultrapassem os limites de conhecimento prévio do aluno, fazendo,
assim, com que o aprendizado seja inserido a partir do próprio aluno e não a
partir do conteúdo programático, conforme determina o tão discutido Arco de
Maguerez, que determina a utilização da Metodologia Ativa de Ensino e
Aprendizagem, processo que se encontra em processo de discussão.
Percebe-se, portanto, que não basta que o sistema educacional seja
repensado através de investimentos governamentais na construção de novos
campi universitários, reformulação nas questões salariais ou em condições de
trabalho dos professores e demais profissionais envolvidos neste processo. É
preciso, antes de tudo, que se mude a mentalidade do que, de fato, é
educação. Os maiores problemas enfrentados em absolutamente todas as
áreas profissionais têm raízes nas dificuldades relacionadas ao processo de
comunicação, e para que este processo seja considerado completo, é preciso
que se analise a real necessidade de transformar os alunos, desde a sua base
acadêmica, em seres que sejam capazes de raciocinar a respeito dos
conteúdos ministrados, e não apenas repeti-los. O professor precisa ser visto
como mediador de um processo que é constante, e que, depende, em muitas
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vias, das necessidades e das atitudes dos próprios alunos. No campo do
ensino da Língua Portuguesa, cabe salientar que toda e qualquer experiência
linguística e mesmo teórica trazida pelo estudante deve ser inserida no
conteúdo programático, e este adaptado, para que o aprendizado possa se dar
como uma troca, e não de forma verticalizada e imposta.
2.7 – REFORMULAÇÃO DOS CURRÍCULOS ESCOLARES
Dentro deste contexto, recomenda-se, por exemplo, a implantação dos
chamados “best sellers” nos parâmetros curriculares, principalmente das
escolas de ensinos médio e fundamental, e por que não dizer, na estrutura dos
cursos superiores, tendo em vista que a grande maioria dos alunos que
chegam à graduação, principalmente nas áreas de exatas e saúde, não
chegam ao número de 05 (cinco) livros lidos durante toda a sua vida
acadêmica, segundo pesquisas realizadas por este estudo em sala de aula.
Mais grave que a própria falta de leitura, é o desinteresse pelo hábito de ler. O
ensino tradicional está formando profissionais de conhecimento meramente
técnico e retórico, ou seja, traduzindo, por vezes literalmente, o que foi
transmitido em sala de aula. A incapacidade de se pensar a respeito do que foi
aprendido vem exatamente do ensino “em mão única”, utilizado pela forma
tradicional de se portar em sala de aula.
É preciso afirmar, ainda, que mudanças relativas à forma de se transmitir o
conteúdo geram também desgaste perante a comunidade acadêmica e à
sociedade em geral, que exige do professor uma postura de certa forma
autoritária, sendo este, teoricamente, o detentor do conhecimento.
Em se
tratando do ensino de Língua Portuguesa no campo da interpretação textual, é
possível afirmar que se o aluno não for devidamente incentivado ao hábito da
leitura, será impossível desenvolver um trabalho no sentido de transmitir-lhe o
conhecimento a respeito do processo de interpretação. Este fato justifica-se a
partir do momento em que o ato de interpretar exige, inevitavelmente, a
ativação do conhecimento linguístico e de mundo por parte do leitor. Segundo
Casella (2005), a leitura é um processamento onde os diversos conhecimentos
prévios atuam concomitantemente, esforçando-se, revezando-se, para trazernos o entendimento do texto. A ativação do conhecimento prévio é essencial à
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compreensão do texto, pois são os conhecimentos do leitor que lhe permitem
fazer as inferências necessárias para dar coesão à leitura. Sendo assim, caso
o professor não consiga mediar e incentivar, antes de qualquer coisa, a
aquisição
deste
conhecimento
de
mundo
ou
conhecimento
prévio,
consequentemente todo e qualquer processo de interpretação textual será
ineficaz. Mas a questão esbarra em dois vértices contrários: para ler bem o
aluno precisa do hábito da leitura, e para ter o hábito da leitura, o aluno precisa
ler. Este é o impasse central que este estudo pretende discutir.
Para solver esta questão, retornamos ao propósito de se enxergar o
aprendizado como um processo, e não como um produto. Sendo assim, é vital
que se transforme a sistemática da didática do ensino numa teoria palpável aos
alunos, e não somente aos professores. Desnudando-se da teoria, cabe
ressaltar a importância da implementação das mais diversas tipologias e
estruturas textuais no conteúdo programático, principalmente dos ensinos
médios e fundamentais. Antes, porém, é necessário que se descomercialize o
processo educacional, e que se passe a formar alunos preparados, e não fortes
vestibulandos. Escolas, públicas e privadas, devem transformar suas salas de
aula num ambiente onde o aluno possa ver o seu futuro através de um
aprendizado agradável e acima de tudo necessário à sua futura vida
profissional. Dentro desta ideia, é viável a implementação de leituras
contemporâneas
não
somente
nas
escolas,
mas
nas
avaliações
governamentais que levam à graduação, como é o caso do Exame Nacional de
Ensino Médio (ENEM). A este propósito, entende-se que a própria avaliação
deve ser repensada, posto que é factual que uma determinada prova a ser
realizada num determinado dia não é capaz de avaliar o verdadeiro
conhecimento de toda uma vida acadêmica, porém, este tema deverá ser
tratado num outro momento. Falou-se na implementação de leituras
contemporâneas, mas não se deve simplesmente deixar de lado até mesmo o
que não se considera leitura acadêmica. Revistas e textos que falam de
esportes, música, internet, televisão, automóveis, ou qualquer outro tema que
seja de interesse dos educandos, devem ser, por fim, trazidos à sala de aula e
inseridas no processo de avaliação. O hábito da leitura deve partir do prazer
em estar lendo, e não da imposição. Traçando-se um perfil geral dos alunos de
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nível médio nos dias atuais, é plausível entender que seus interesses estão
fincados nas questões atuais que remetem ao seu próprio processo de
diversão e entretenimento. A verdade é que o objetivo central destes alunos é
fazer profissionalmente algo que gostem de fazer em seu tempo livre. Nesta
perspectiva, torna-se muito mais efetivo o processo de compreensão textual
quando o objeto de estudo converge diretamente com os interesses do leitor,
no caso, os educandos.
2.8
–
ASPECTOS
TÉCNICOS
DA
INTERPRETAÇÃO
TEXTUAL
E
AVALIAÇÕES
A interpretação textual passa, tecnicamente, pelos seguintes níveis de leitura:
•
Nível Sensorial: O leitor reconhece a linguagem do texto;
•
Nível Emocional: O leitor passa a definir suas primeiras impressões a
respeito do que está lendo;
•
Nível Racional: Momento em que o leitor identifica a tese defendida pelo
autor, ou seja, o que o autor quis dizer com seu texto;
•
Nível de Controle: O leitor identifica os argumentos utilizados pelo autor
para defender a sua tese;
•
Nível de Repetição: Nível opcional em que o leitor realiza uma releitura e
escreve com suas próprias palavras um resumo do texto;
Tendo em vista que os níveis de leitura são elementos essenciais no
processo de interpretação textual, é possível compreender o fato de que,
caso o leitor-aluno não tenha conhecimento a respeito do tema abordado,
ele consequentemente não conseguirá desenvolver cognitivamente a sua
leitura, e sua compreensão estará prejudicada já a partir do segundo nível,
que é, em suma, o momento em que o leitor ativará o seu conhecimento de
mundo a respeito do tema em questão, para assim obter suas impressões
iniciais a respeito do texto. Neste caso, a única coisa que o leitor conseguirá
realizar é o reconhecimento da linguagem, que na verdade é apenas o
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código através do qual o texto foi escrito, no caso em pauta, a Língua
Portuguesa. Já quando se dá a reformulação do processo de ensino e
aprendizagem e passa-se a apresentar aos alunos elementos textuais que
fazem parte do conhecimento real trazido pelos educandos à sala de aula,
todo o ciclo de interpretação textual, passando por todos os níveis de
leitura, passa a ser completo.
Assim, utilizando-se de leituras atuais e de interesse dos alunos, o
professor permite a estes que desenvolvam sua capacidade de ler,
interpretar, traduzir, e raciocinar o texto, seja ele de que natureza for. Antes
de levar o conhecimento clássico e tradicional, é preciso ativar o
conhecimento prévio e real, para que por meio de uma cadeia de
capacidade intelectual e da própria aquisição do conhecimento teórico, o
aluno possa, por si só, buscar leituras mais aprimoradas e direcionadas à
sua área de interesse acadêmico. Outra questão a ser defendida é a
mudança no processo de avaliação acadêmica, principalmente em se
tratando do campo da Língua Portuguesa. Considerando a verdade de que
o aluno deve ser permitido a errar, e o professor, como mediador, deve
trabalhar exatamente em cima destes erros, é preciso que se avalie
continuamente, através de um processo de aprendizagem constante. A
realização de avaliações pontuais, datadas, fechadas e tradicionais pode
ser traduzida como uma obrigação - inconveniente ao aluno e ao seu
aprendizado - de que este aprendiz venha a dominar o conhecimento total
do conteúdo ministrado, e assim, adquira a nota suficiente para sua
aprovação. Ora, se o propósito do aluno ao buscar uma sala de aula é o
aprendizado, como se pode exigir, numa data pré-determinada, que este
aprendizado seja total? É preciso compreender que nenhum processo é
findo, ainda mais quando se trata de algo tão complexo como é a
transmissão do conhecimento. O aprendiz tem o direito, e mais que isso, o
dever de errar, avaliar seus erros, consertá-los e com eles adquirir o
conhecimento.
A avaliação tradicional torna-se classificatória,
punitiva; os erros são contados pela quantidade,
não pela sua natureza em si. Cada palavra escrita
“errada” menos pontos. Se considerássemos a
natureza do erro, não reprovaríamos, pois teríamos
13
um trabalho mais reflexivo. Em termos de Língua
Portuguesa, percebemos que não se avalia muito a
leitura em termos de compreensão, pois se usa
perguntas que já estão explícitas, óbvias, no texto.
(Ghelli, 2002)
É evidente que, num determinado momento, o professor precisa estipular uma
nota que irá avaliar o seu aluno e o seu nível de conhecimento, no entanto, a
formalização desta nota deve ser repensada, para que as instituições
educacionais não caiam no erro de avaliar de forma tecnicista, e, por si
mesmas, vetar a possibilidade real de aprendizado do aluno. Sabe-se que
muitos alunos trabalham somente para adquirir a nota para aprovação. É
preciso que a escola não trabalhe apenas para dar esta nota. De acordo com
Ghelli (2002), a avaliação deve ser um processo de questionamento e não
apenas a atribuição de notas e números. É necessário que se considere o
esforço pessoal, a atenção, a assiduidade, a capacidade de interpretação da
realidade, o senso crítico, a capacidade de julgamento, domínio de técnicas de
cultura, de expressão oral e de redação. No entanto, para a realização deste
processo não existe uma “receita pronta”. É necessário que se estimule a
discussão acadêmica a respeito da uma forma mais humanista de avaliação,
para que a aprendizagem possa ser factual.
3 - CONCLUSÃO
Portanto, é possível concluir-se que, ao julgarmos o problema do aprendizado
da Língua Portuguesa e das dificuldades enfrentadas pela maioria dos alunos
em desenvolver as simples técnicas de escrita e compreensão textual, precisase, sobretudo, repensar o que nós, como educadores, estamos realizando
dentro de sala de aula, seja na elaboração das nossas matrizes curriculares,
conteúdos programáticos, planos de aula, seja no próprio processo de
avaliação, que, por hora, é excludente. A marginalização e rotulação da
realidade trazida pelos alunos são as principal razões para que estas
dificuldades na relação ensino-aprendizado sejam tão constantes na sala de
aula, e, o meio mais eficaz para que esta realidade seja mudada, é o
reordenamento de toda a estrutura educacional, desde o ensino de base até a
graduação, por meio de uma mentalidade inclusiva, humanista, coerente com a
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realidade acadêmica e social, transformando a relação entre professor e aluno
numa parceria e não num regime autoritário onde um tem o poder, e o outro
deve obedecer.
Trazendo esta premissa para o campo do ensino da Língua Portuguesa, é
preciso, antes de tudo, que o educador se desnude das suas preferências
pessoais de leitura, dos consagrados autores, dos romances regionalistas, para
adentrar nas preferências do público-alvo, considerá-las também como meios
de se atingir a excelência no processo comunicativo, partindo das bases reais
do educando a fim de chegar à teorização trazida pelo educador e tão
necessária ao bom andamento de toda e qualquer atividade profissional.
DIFFICULTIES FACED BY STUDENTS AND TEACHERS IN THE PROCESS
OF TEACHING AND LEARNING OF READING AND TEXTUAL
INTERPRETATION’S TECHNIQUES.
ABSTRACT
This study aims to analyze the problems faced by students and teachers during
the process of teaching and learning the Portuguese Language on the fields of
reading and textual interpretation. It is not intended, however, simply subjugate
the theories so far deployed or the quality of the teaching, but to propose a
genuine and effective way for the learning to be real, taking into account the
cultural and intellectual baggage already obtained by the students throughout
their lives, and demystifying the need of the traditional assessments and
teaching use, and also classical authors to encourage reading.
Keywords: reading, interpreting, teaching, learning, difficulties.
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REFERÊNCIAS
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Fontes, 1976. 1ª ed. Brasileira.
ANDRADE, Maria Margarida de, HENRIQUES, Antônio. Língua Portuguesa:
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MOITA LOPES, L.P. Oficina da Linguística Aplicada. Campinas: Mercado das
Letras, 1996.
16
Download

as dificuldades enfrentadas por alunos e professores no