CRIATIVIDADE NA EDUCAÇÃO MEDIADA POR TECNOLOGIAS: POSSIBILIDADES PARA NOVAS APRENDIZAGENS Vanessa Nunes da Silva1 Universidade Estadual do Maranhão [email protected] Isabel C. Pereira Auler2 Universidade Federal do Tocantins [email protected] RESUMO: As rápidas evoluções socioculturais e tecnológicas do mundo atual geram incessantes mudanças nas organizações, no pensamento humano e revelam um novo universo no cotidiano das pessoas. Isso exige independência, criatividade e autocrítica na obtenção e na seleção de informações, assim como na construção do conhecimento. Dessa maneira, o paradigma educacional emergente requer a inserção de novas práticas curriculares e metodologias inovadoras, para fazer frente às necessidades de uma sociedade globalizada que altera padrões de vida das pessoas, seja na maneira de se comunicar, nas habilidades profissionais de atuação ou na forma de aquisição do conhecimento e do pensar. E neste sentido, as tecnologias têm uma função de grande relevância, uma vez que auxiliam na mediação pedagógica, aumentam a interatividade entre aluno e professor, e levam um mundo de conhecimento para dentro da sala de aula, através de várias formas, como por exemplo, a educação a distância via Internet, que tem se tornado uma referência para o desenvolvimento de propostas que enfatizam a interação entre os participantes e o desenvolvimento do trabalho colaborativo e criativo. A presente produção científica é fruto de pesquisa bibliográfica de cunho qualitativo e está embasada nos autores: Belloni (2008), Castell (1999), Cunha (2001), Lévy (2011), Zabalza (2004). Palavras-chave: Educação mediada por tecnologias. Novas demandas de formação. Criatividade. 1 Mestranda em Educação - Universidade Federal do Tocantins; professora e coordenadora do Núcleo de Tecnologias para Educação na Universidade Estadual do Maranhão campus Balsas. 2 Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia; Pesquisadora do grupo de pesquisa CNPq/Plataforma Lattes/UFT – NEPCE; Vice-Reitora da Universidade Federal do Tocantins. 1. INTRODUÇÃO A sociedade moderna vive momentos difíceis, confusos, pois, várias transformações culturais, sociais, econômicas e tecnológicas deram uma nova configuração aos tempos atuais. O cerne da transformação que estamos vivendo em nada se compara a outras revoluções vivenciadas pela humanidade. Essa revolução refere-se às tecnologias da informação, processamento e comunicação. Nesta atual revolução, as tecnologias da informação tiveram a mesma importância que as fontes de energia tiveram para as revoluções anteriores (CASTELLS, 1999). Diante de todo esse processo, o papel da Universidade e do professor evidencia-se como um desafio em busca da formação de cidadãos aptos na utilização da tecnologia no seu cotidiano de forma crítica e criativa. A sociedade atual mergulha em profundas mudanças, e assim, emerge uma nova característica: a supervalorização do conhecimento, exigindo profissionais com senso crítico, criativo, reflexivo e com capacidade de aprender a aprender. Por causa do processo de globalização, a necessidade de cada indivíduo desenvolver novas competências e habilidades torna-se crucial neste século e o aprender a aprender evidencia-se como condição para o sujeito continuar competitivo no mercado de trabalho. Atualmente, são poucas as ocupações que não necessitam de formação específica, por isso a formação é cada vez mais importante à medida que a sociedade se torna mais complexa, os indivíduos tem consciência de que a formação é imprescindível tanto é que incorporaram a educação superior ao planejamento de vida. 2. A COMPLEXIDADE DA FORMAÇÃO DOCENTE NO MUNDO EM TRANSFORMAÇÃO Novos desafios são postos à educação formal, que tem suscitado a implementação de políticas públicas visando corresponder às demandas da sociedade. Neste contexto, o conceito de formação ao longo da vida aparece como uma das chaves de acesso ao século XXI. Em consequência, a educação a distância tem avançado exponencialmente em todo o mundo. De certa forma, pode-se afirmar que a educação mediada por tecnologias é o novo paradigma educacional que marca a sociedade moderna baseada no conhecimento e no aprender a aprender ao longo da vida. Os cursos nesta modalidade podem ser assíncronos em que a interação entre os agentes é defasada no tempo e síncronos em que a interação entre os indivíduos acontece em tempo real, sem atraso entre o fim de uma mensagem e o começo de outra. O grande desafio da educação mediada por tecnologias está ancorado na criação de um ambiente de aprendizado suportado pelas tecnologias (internet), permitindo transformar informações em conhecimentos independente da hora ou local. Neste contexto, o termo formação merece atenção para que seu sentido original não se perca e caia no vazio dos discursos, alheios ao verdadeiro sentido da formação. Nem mesmo as universidades estão imunes a este risco, pois fala-se muito sobre formação, os professores se dedicam a oferecê-la aos alunos, porém, pouco se reflete sobre esta temática, produzindo um esvaziamento de significado. A ideia de formação acaba por se reduzir à mera aquisição de uma nova informação ou nova habilidade. Segundo Zabalza (2004, p. 40), o termo formação costuma ser interpretado de maneira equivocada, ao menos do ponto de vista pedagógico: Formar = modelar. Partindo dessa definição, entende-se que a formação busca modelar os indivíduos, isto é, são transformá-los no tipo de produto que se torna modelo; Formar = conformar. A intenção é fazer com que o individuo aceite e conforme-se com o planejamento de vida e de atividades para o qual foi formado. Este tipo de formação é o mais grave, pois gera alienação. A formação entendida deste modo acaba sendo definida mais pelo que se ofertou ou pelo tipo de produto externo que se quer obter do que pelo efeito que ela exercerá na vida das pessoas. De certo modo, todos discutem a formação, mas nem sempre é feita uma análise crítica sobre seu verdadeiro significado. Neste sentido, Zabalza (2004, p. 39, grifos do autor) esclarece que: A importância da formação deriva de sua necessária vinculação ao crescimento e ao aperfeiçoamento das pessoas, aperfeiçoamento que tem de ser entendido em um sentido global: crescer como pessoas. Levando isso ao extremo, torna-se desnecessário falar a respeito da contínua formação se não é sob a perspectiva de crescer como pessoas. Sob esta perspectiva, qualquer atividade universitária voltada para a formação docente deveria focar nos seguintes aspectos: dinâmica geral do desenvolvimento pessoal, aprimoramentos dos conhecimentos e das capacidades dos indivíduos, domínio das novas tecnologias da comunicação e da informação e, referências ao mercado de trabalho. A formação docente não pode se reduzir a questões como desenvolvimento de competências e habilidades, memorização de conceitos/conteúdos, dito de outra forma, a formação deve promover a integração entre diferentes áreas do saber, produzir e atualizar conhecimento, possibilitando ressignificações na prática docente. Segundo Masetto (2005, p. 12) colocar a aprendizagem no centro do processo de formação inicial dos alunos requer modificar a pergunta: o que ensinar aos meus alunos? por esta – “O que meus alunos precisam aprender para se tornarem cidadãos profissionais competentes numa sociedade contemporânea?” Neste sentido, o papel docente é fundamental, o professor precisa antes de tudo ter uma formação cientifica, cultural, ética, política e atuar como mediador do conhecimento acumulado para que o estudante assimile esses saberes. Nesta perspectiva, a formação de professores precisa ser entendida como política educacional e também social. As políticas públicas nesta área devem garantir acesso e democratização do ensino superior com qualidade, a formação de profissionais capazes de intervir na implantação de políticas, de atuas nas diversas esferas do sistema educacional e de assegurar as condições necessárias à aprendizagem dos discentes. Neste aspecto, a formação não pode ser entendida como uma questão meramente técnica, mas como elemento essencial para o desenvolvimento pessoal e profissional do professor, comprometido com a realidade social, com a formação humana e cultural. 3. NOVAS DEMANDAS E NOVOS PERFIS PROFISSIONAIS A sociedade brasileira está vivendo em diversos setores o desenvolvimento tecnológico das áreas de informática e telecomunicações que por sua vez, criam novos espaços de conhecimentos. Neste cenário, exige-se qualidade de serviços, formação continuada dos profissionais, bem como novas habilidades: adaptabilidade ao novo, autonomia, criatividade, comunicação, iniciativa, capacidade de gerir conflitos e trabalhar em equipes, capacidade de buscar novas informações, saber usar os recursos tecnológicos. No dizer de Masetto (2005, p. 16), exige-se um “profissional intercambiável”, combinando imaginação e ação. É indispensável uma nova concepção de educação e, consequentemente, de formação de professores. Supõe-se que seja ultrapassada a visão puramente tecnicista, instrumental da educação como meio para se obter certos resultados e se passe a considerá-la na sua totalidade. A formação inicial de professores ofertada pelas instituições de ensino superior deve criar condições de aprendizado de conteúdos essenciais para a vida em sociedade, oferecendo instrumentos de compreensão e intervenção nesta mesma realidade, favorecendo a participação dos educandos nas instâncias sociais, bem como o exercício competente de sua profissão. De outro modo, o papel da universidade é proporcionar um conjunto de conhecimentos e práticas que possibilitem ao aluno assimilar determinados conteúdos culturais indispensáveis à sua formação pessoal e profissional. Neste contexto, o mais importante será repensar o papel da universidade, o papel e a função dos cursos de formação de professores, seu eixo norteador, seu foco, seus valores e finalidades, considerando que a finalidade principal da universidade é o permanente exercício da crítica que se sustenta no tripé: ensino, pesquisa e extensão. Assim, o ensino nos cursos de formação docente deve constituir-se de um processo de construção científica e de crítica ao conhecimento historicamente produzido. Tal desafio se torna crucial na sociedade do conhecimento, pois a docência exige atuação competente na área de conhecimento, bem como domínio na área pedagógica, domínio da tecnologia educacional e exercício da dimensão política. É preciso ressaltar também que “a tecnologia será importante, mas principalmente porque nos forçará a fazer coisas novas, e não porque permitirá que façamos melhor as coisas velhas”. (MASETTO, 2005, p. 18 apud DRUCKER, 1993, p. 153). No cenário do século XXI fica evidente que a maioria das competências adquiridas por um trabalhador estará obsoletas antes do término da carreira profissional. Paralelo a isto surge uma nova natureza do trabalho: o indivíduo deve ser capaz de aprender, transmitir saberes e produzir conhecimentos. A forma tradicional de trabalho com base no horário integral, projetos profissionais bem delineados e um padrão de carreira ao longo da vida estão em vias de extinção (Castells, 1999, p.339). Assiste-se ainda o fortalecimento do ciberespaço que sustenta tecnologias inteligentes, que por sua vez favorecem novas formas de acesso à informação e novos estilos de raciocínio e de conhecimento amplificando e modificando numerosas funções cognitivas humanas. (LÉVY, 2011, p. 159) Por conta disto, torna-se indispensável romper a visão de aprender e de “assistir aulas” rumo ao “apreender” no sentido de que este movimento engloba apropriar, assimilar mentalmente, entender, compreender, dar significados por parte dos alunos. O papel do professor será o de desafiar, motivar, estimular os alunos na construção do conhecimento, num clima de confiança, criatividade, diálogo e interação. De acordo com a visão sociointeracionista o conhecimento é considerado como uma representação que o aluno faz do mundo físico e social, ou seja, o conhecimento é uma construção individual, mediada pelo social. A busca por formas criativas de ensinar pressupõe a quebra de diversos modelos educacionais, a memorização cede ao lugar ao pensamento divergente, buscam-se novas respostas, novas possibilidades de aprendizado. Abertura a novas experiências, ousadia, confiança, curiosidade, humor, idealismo, comprometimento com a profissão escolhida, facilitador são consideradas características de um profissional criativo. O processo de formação docente que valorize a criatividade deve pautar-se pelas seguintes diretrizes segundo Cunha (2001, p. 132): ruptura com a forma tradicional de ensinar e aprender; primar pela gestão participativa; reconfiguração de saberes (anulação ou diminuição entre saber científico/saber popular, ciência/cultura); reorganização da relação teoria/prática e, perspectiva orgânica no processo de concepção, desenvolvimento e avaliação da experiência desenvolvida. Segundo Lévy (2011, p. 160) duas reformas são necessárias à educação: a primeira destaca a importância de se explorar as potencialidades da educação mediada por tecnologias estabelecendo um novo modelo de pedagogia, no qual o professor assume o papel de mediador, de animador, possibilitando o crescimento intelectual dos alunos, ao mesmo tempo em que favorece a aprendizagem coletiva em rede. A segunda reforma diz respeito recai sobre a experiência adquirida na educação a distância, a colaboração e a interação constituem os principais meios para a modelagem dos processos de aprendizagem no ambiente on line, considerando que o ciberespaço está em constante transformação. No âmbito da educação mediada por tecnologias, independentemente de sua qualidade, deve-se entendê-la como papel significativo neste novo contexto, mas não como substituta das atuais instituições de ensino superior. O que está surgindo na universidade de qualidade destaca Castells (1999, p. 487) é a combinação do ensino on line a distância com o ensino in loco. Significa dizer que o futuro da educação mediada por tecnologias não será on line e sim em redes entre nós de informática, considerando que a comunicação mediada por computadores já é uma realidade mundo afora, embora ainda tenhamos regiões excluídas deste processo. Nesse sentido, a construção de espaços de formação on line constitui um desafio que não se limita à simples disponibilização de conteúdos no ambiente ou plataforma. A articulação entre os processos de interação, colaboração e o ambiente on line implica que o objeto de aprendizagem seja uma produção resultante, não só dos conteúdos disponibilizados na plataforma (ou acessíveis através dela), mas também das atividades de exploração conduzidas por meio da interação e dos processos colaborativos. O grande diferencial nos cursos de formação será a mudança qualitativa nos processos de ensino e aprendizagem, estabelecendo novos paradigmas dos conhecimentos e de construção de novos saberes, priorizando a ‘aprendizagem cooperativa’. (LÉVY, 2011, p. 173). Dito de outra forma, os professores aprendem ao mesmo tempo em que os estudantes e atualizam seus conhecimentos, o professor perde o status de detentor do conhecimento e assume a postura de incentivador da aprendizagem dos alunos. Nas palavras de Lévy (ibid., p. 173), o professor torna-se um “animador da inteligência coletiva” dos grupos, sendo sua atividade centrada no acompanhamento e na gestão das aprendizagens. A grande discussão não é a passagem da “educação presencial” para a “educação a distância” e seus recursos multimídias, o desafio é a transição de uma educação e de uma formação historicamente tradicional e institucionalizada para uma situação de troca de saberes, compartilhamentos, cooperação, permitindo ao ser humano explorar suas potencialidades posicionando-se criticamente diante da realidade social, sendo transformado e transformando-a. Neste sentido, Lévy (2011, p. 174) destaca que o papel dos poderes públicos seria garantir a todos uma formação de qualidade; permitir a todos um acesso aberto e gratuito a pontos de entrada no ciberespaço, sem negligenciar a mediação humana do acesso ao conhecimento e regular e animar uma nova economia do conhecimento. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A educação começa a navegar nesse mundo de transformações radicais, em que o desenvolvimento das tecnologias digitais e a profusão das redes interativas colocam a humanidade diante de um caminho sem volta, diante das novas necessidades do modelo capitalista, criando um cenário de incertezas. Neste cenário, não basta capacitar o futuro professor para usar as novas tecnologias, é indispensável que ele seja capaz de selecionar informação, reconstruir conhecimento, assumir um posicionamento crítico contribuindo para a transformação da realidade. Espera-se que o professor utilize a tecnologia digital no sentido de romper o isolamento, a indiferença, a alienação. Não se trata de usar as tecnologias a qualquer custo, mas acompanhar essa mudança de paradigma que incidem diretamente sobre a função das escolas e sobre os papéis do professor e do aluno no século XXI. A formação inicial deve estar voltada para o desenvolvimento da competência indispensável ao exercício da prática docente, comprometida com a sociedade e com a comunidade na qual a universidade se insere. Os processos de aquisição do conhecimento que estão sendo vivenciados na sociedade do conhecimento assumem atualmente um papel de destaque e exigem da educação, a formação de um profissional crítico, criativo, reflexivo e com capacidade de pensar, de aprender a aprender, de trabalhar em grupo e de se conhecer como indivíduo. Mas para tanto, a educação capaz de formar esse profissional não pode mais ser baseada na instrução que o professor transmite ao aluno, mas, na construção do conhecimento pelo aluno e no desenvolvimento dessas novas competências. REFERÊNCIAS BELLONI, M. L. Educação a distância. 5ª ed. Campinas: Autores Associados, 2008. CASTANHO, Sérgio; CASTANHO, Maria Eugênia (Org.). Temas e textos em metodologia do ensino superior. In: CUNHA, Maria Isabel. Inovações: conceitos e práticas. Campinas: Papirus, 2001. P. 125-136. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: a era da informação. Tradução: Roneide Venâncio Majer. 6ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. LÉVY, P. Cibercultura. Tradução Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Editora 34, 2011. MASETTO, Marcos (Org.). Docência na universidade. 7 ed., Campinas: Papirus, 2005. ZABALZA, Miguel. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Porto Alegre: Artmed, 2004.