JOÃO PAULO SALVIANO ALMEIDA DA COSTA – 12/0033488 IGOR MOREIRA NOVAIS TEIXEIRA – 12/0013193 SENTENÇA EXTRA PETITA BRASÍLIA - 2013 RECURSO ESPECIAL Nº 1.351.005 - RJ (2012⁄0225898-0) RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE : INDUCOM COMUNICAÇÕES LTDA ADVOGADOS : HERLON MONTEIRO FONTES MÁRCIO VIEIRA SOUTO COSTA FERREIRA E OUTRO(S) FREDERICO JOSE FERREIRA RECORRENTE : TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S⁄A - TELEBRÁS ADVOGADOS : GABRIEL FRANCISCO LEONARDOS ELISA BASTOS MUTSCHAEWSKI E OUTRO(S) RAFAEL LACAZ AMARAL E OUTRO(S) RECORRIDO : OS MESMOS RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI ADVOGADO : MÁRCIA VASCONCELOS BOAVENTURA E OUTRO(S) EMENTA RECURSO ESPECIAL. INVENÇÃO. PATENTE. DIREITO SISTEMA CIVIL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AUTOMÁTICO PARA CHAMADAS TELEFÔNICAS A COBRAR. AÇÃO ANULATÓRIA DO CANCELAMENTO DO REGISTRO DA PATENTE. VIOLAÇÃO DO ART. 58 DA LEI Nº 5.772⁄1971. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. NOVIDADE. SUFICIÊNCIA DESCRITIVA DO DEPÓSITO. REEXAME DE PROVAS. INADEQUAÇÃO DA VIA. SÚMULA Nº 7⁄STJ.COMPARTILHAMENTO DA TITULARIDADE DA INVENÇÃO ENTRE O AUTOR E TERCEIRO. PEDIDO NÃO COMPREENDIDO NOS LIMITES DA LIDE. JULGAMENTO EXTRA PETITA. ARTS.128 E 460 DO CPC. SANEAMENTO DO VÍCIO. ART. 257 DO RISTJ. 1. A ausência de prequestionamento da matéria suscitada no recurso especial, a despeito da oposição de embargos declaratórios, impede o conhecimento do recurso especial (Súmula nº 211⁄STJ). 2. O conhecimento do recurso especial, no que se refere à aferição da natureza de novidade da invenção objeto do depósito de patente, bem como da suficiência descritiva deste, demanda nova incursão fático-probatória, inviável tendo em vista a incidência da Súmula nº 7⁄STJ. 3. O interesse em recorrer resulta da conjugação de dois fatores: (i) da utilidade da interposição do recurso - que consiste na possibilidade de obtenção pelo recorrente de um resultado que corresponda à situação mais vantajosa, do ponto de vista prático, do que aquela resultante da decisão recorrida e (ii) da necessidade de sua utilização - que se revela por sua imprescindibilidade para que o recorrente alcance a vantagem almejada. 4. Carece de interesse recursal a parte ré quanto à pretensão de extipar do acórdão impugnado matéria estranha, configuradora de julgamento extra petita, mas que não lhe diz respeito por versar sobre relação jurídica distinta - havida entre a parte autora da demanda e terceiro não chamado a integrar a lide. 5. Reconhecido o cabimento do especial, cumpre ao Superior Tribunal de Justiça julgar a causa aplicando o direito à espécie, a teor do art. 257 do RISTJ. 6. Consoante o disposto pelo art. 128 do CPC, o autor fixa os limites da lide e da causa de pedir na petição inicial, cabendo ao juiz decidir de acordo com esse limite. É justamente por tal motivo que não é dado ao julgador proferir sentença acima, fora ou aquém daquilo que foi postulado. 7. Estando o pedido autoral adstrito à anulação da decisão administrativa do INPI, que, a pedido da TELEBRÁS, cancelou o registro da patente do "Sistema Automático para Chamadas Telefônicas a Cobrar", não é dado ao julgador, sob pena de incorrer em julgamento extra petita, decidir sobre a existência de relação jurídica diversa, relativa à eventual necessidade de divisão da titularidade do registro entre a parte autora e empresa distinta, que não pretendeu tal solução em juízo e sequer chegou a integrar a presente lide. 8. Recurso especial da TELEBRÁS não conhecido e recurso especial da INDUCOM provido para, aplicando o direito à espécie, afastar do acórdão recorrido o capítulo que configurou julgamento extra petita. ACÓRDÃO A Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial de Inducom Comunicações Ltda e não conhecer do recurso especial de Telecomunicações Brasileiras S⁄A - TELEBRÁS, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Dr(a). FREDERICO FERREIRA, pela parte COMUNICAÇÕES LTDA Brasília (DF), 1º de outubro de 2013(Data do Julgamento) Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva - Relator RECORRENTE: INDUCOM Neste caso concreto, observa-se o não provimento do recurso interposto pela Telebrás por esbarrar no fenômeno jurídico conhecido como julgamento (também pode ser sentença) extra petita. Este fenômeno jurídico é, de certa forma, acompanhado por outros dois: ultra petita e citra petita, que por mais que se pareçam, não se confundem. Os três se referem à sentenças e decisões proferidas por juízes que se tornam “defeituosas” por não serem condizentes com o pedido das partes, seja ultrapassando-o ou por não considerar parte dele. É previsto no Código de Processo Civil a vedação do proferimento desse tipo de decisão no artigo 460, que dispõe o seguinte: “É defeso ao juiz proferir sentença a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.” A respeito das competências do juiz, o artigo 128 do mesmo CPC ainda reforça a impossibilidade de tamanho grau de discricionariedade do juiz, conforme sua redação: “O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conceder de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.” Pelo que é previsto pelo CPC, é notória a preocupação da redação deste em afastar a possibilidade de julgamentos que difiram, em natureza ou quantidade, da petição do réu. A diferença entre as três é relacionada com esses aspectos, e podem ser descritos de tal forma: Ultra petita: “O defeito da sentença ultra petita, por seu turno, não é totalmente igual ao da extra petita. Aqui, o juiz decide o pedido, mas vai além dele, dando ao autor mais do que fora pleiteado (art. 460)” (THEODORO JUNIOR, Humberto) Extra petita: “A sentença extra petita incide em nulidade porque soluciona causa diversa da que foi proposta através do pedido. E há julgamento fora do pedido tanto quando o juiz defere uma prestação diferente do que lhe foi postulada, como quando defere a prestação pedida, mas com base em fundamento jurídico não invocado como causa do pedido na propositura da ação. Quer dizer que não é lícito o julgador alterar o pedido, nem tampouco a causa petendi” (THEODORO JUNIOR, Humberto) Após a definição dos dois conceitos que são mais passíveis de confusão, fica mais claro a diferença entre ambos os casos. O conceito da sentença ultra petita é mais simples e restrito, pelo fato de a decisão do juiz diferir apenas na quantidade do que é pedido. Exemplos de pagamento de indenizações tornam o conceito mais inteligível: na petição, o autor pede um valor X, baseando seus cálculos em jurisprudência, leis e etc, mas o juiz condena o réu a pagar um valor de 2X. A sentença extra petita é um pouco mais complexo por ser mais abrangente, mas pela exemplificação também é de fácil compreensão. Como diz a definição de Humberto Theodoro Júnior, em seu Curso de Direito Processual Civil, o juiz resolve causa diversa do pedido. Em outras palavras, o juiz condena o réu a cumprir ou pagar coisa diferente do que foi pleiteado na petição inicial do autor. Podemos considerar um exemplo análogo ao anterior desta forma: na sentença, o juiz condena o réu a pagar uma indenização em dinheiro de valor X e repor determinado bem Y, tendo o autor da causa, hipoteticamente, pedido apenas a reposição desse bem Y, e sequer pediu algum tipo de indenização financeira. A natureza do que é colocado na sentença difere da petição. Portanto, a diferença básica entre ambas é que na ultra petita, o juiz ultrapassa o valor ou quantidade de coisa da mesma natureza do que foi pedido, ao passo que na extra petita, a condenação ultrapassa a petição não apenas de maneira “quantitativa”, mas “qualitativa”, ou seja, de natureza diversa. Há ainda um terceiro de tipo de “defeito” em relação á definição da sentença, que é: Citra petita “A sentença é enfim citra petita quando não se examina todas as questões propostas pelas partes. O réu, por exemplo, se defendeu do pedido reivindicatório alegando nulidade do título dominial do autor e prescrição aquisitiva em seu favor. Se o juiz acolher o pedido do autor, mediante reconhecimento apenas da eficácia do seu título, sem cogitar do usucapião invocado pelo réu, terá proferido sentença nula, porque citra petita, já que apenas foi solucionada uma das duas questões propostas” (THEODORO JÚNIOR, Humberto) O caso citra petita é bem explanado por HTJ, porém vale ressaltar aspecto importante que pode, de certa forma, gerar confusão. A sentença citra petita não se confunde com não reconhecimento ou provimento de parte do pedido do autor. HTJ enfatiza que acontece citra petita quando o juiz não resolve determinada parte do pedido ou da apelação, simplesmente a ignorando, o que é diferente de não aceitar. No caso concreto escolhido por nós, o STJ indefere recurso especial interposto pela TELEBRAS exatamente por ser caso extra petita. Isso se deve ao fato de a TELEBRAS ter pedido junto ao INPI cancelamento da patente do “Sistema Eletrônico para Chamadas Telefônicas a Cobrar” e depois ter sido decidida em juízo a divisão dos direitos da patente. Fica notório o problema exatamente nesse ponto. Foi pedido o cancelamento da patente, processo para que ela deixasse de existir. Como seria possível o juiz decidir a respeito da divisão de algo que não existe? Sendo mais específicos, o que o juiz deveria fazer era simplesmente aceitar ou não o cancelamento da patente e não dividi-la, configurando caso claro de Sentença Extra Petita, pois a decisão vai além do pedido em sua natureza, resolvendo algo que se quer foi colocado em questionamento. Ambos concordamos com a decisão do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva em não reconhecer o recurso especial da TELEBRÁS, pelo fato de que sendo as cortes de justiças, hierarquicamente superiores ou não, ambientes extremamente profissionais, não cabe ao juiz “remendar” ou mesmo “consertar” por meio de decisões extra petita, pedidos mal formulados pelos procuradores das partes. Ou mesmo, em hipótese mais obscura, a anulação da sentença quando o juiz tenta beneficiar a parte de maneira totalmente discricionária, protegendo de possível corrupção.