DESPACHO SEJUR Nº 484/2015 (Aprovado em Reunião de Diretoria em 06/10/2015) EMENTA: Possibilidade de cancelamento das inscrições de pessoas físicas, jurídicas, médicos estrangeiros ou não que se encontram inadimplentes. Possibilidade do Cancelamento sem caráter de sanção. Possibilidade com o objetivo de atualização de cadastro. Cancelamento possível dede que constatada a comprovação inequívoca do não exercício da medicina pelo profissional ou pela pessoa jurídica e que se esgotem todas as vias legais para a cobrança das anuidades atrasadas. Referência: Expediente CFM nº 8468/2015 DOS FATOS O SEJUR foi solicitado a se manifestar sobre a possibilidade de cancelamento das inscrições de pessoas físicas, jurídicas, médicos estrangeiros que se encontram inadimplentes. É o breve relatório. DA ANÁLISE TÉCNICA A Nota Técnica de Expediente nº 19/2011, do SEJUR (Aprovada em Reunião de Diretoria de 08/06/2011), serviu de fundamento para a edição da RESOLUÇÃO CFM nº 1.977/2011 (Publicada no D.O.U., n. 174, de 09 de setembro de 2011, Seção I, p. 142), que revogou a Resolução CFM nº 1.607/00, que tratava do cancelamento de inscrição do profissional médico junto ao CRM em caso de atraso no pagamento de anuidades por período superior a um ano, verbis (...) II – DO DIREITO a) Rediscutir a existência da Resolução CFM nº 1.607/2002, que trata do cancelamento da inscrição por inadimplência Inicialmente, cumpre esclarecer que a edição de uma resolução é um ato administrativo, que necessita obrigatoriamente de uma motivação idônea dirigida a uma finalidade pública obrigatória. É também lastreada na oportunidade e conveniência (discricionariedade) da Administração existente quando de sua edição. Assim, a Resolução CFM nº 1.607/2002 deve ter sido editada por uma motivação e visando uma finalidade pública. Contudo, se os motivos e a conveniência de tal norma não mais existam, pode a Administração Pública revogar a resolução, tendo o cuidado de verificar se a sua retirada do mundo jurídico não irá causar prejuízo a terceiros. A citada resolução “trata do cancelamento automático da inscrição do médico no CRM em caso de inadimplência por mais de 01 (um) ano.” Em seu artigo 1º tem-se que: Art. 1º - Em caso de inadimplência do médico por mais de 01 (um) ano, em relação às anuidades, este terá automaticamente cancelada sua inscrição junto ao CRM, estando proibido de exercer a medicina, sob pena de ser processado por exercício irregular da profissão, sem prejuízo de inscrição de seu débito na Dívida Ativa da União. SGAS 915 Lote 72 | CEP: 70390-150 | Brasília-DF | FONE: (61) 3445 5900 | FAX: (61) 3346 0231| http://www.portalmedico.org.br O assunto tratado na referida norma é por demais polêmico e tem enfrentado resistência severa no Poder Judiciário, em especial por não existir previsão legal para o cancelamento de registro quando não exista lei permitindo tal sanção. O Superior Tribunal de Justiça já enfrentou a questão, tendo firmando entendimento de que não é possível o cancelamento de registro de profissional liberal pela simples inadimplência da anuidade: TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM. FALTA DE PAGAMENTO DE ANUIDADES. 3 CANCELAMENTO DO REGISTRO PROFISSIONAL. DESCABIMENTO. NECESSIDADE DE COBRANÇA POR MEIO DE EXECUÇÃO FISCAL. I - Os Conselhos de Fiscalização Profissional são autarquias especiais e suas anuidades têm natureza de taxa. A cobrança das contribuições em atraso deve ser realizada através de execução fiscal e não por intermédio da coação ilícita que representa o cancelamento do registro do profissional de saúde. II - Recurso especial improvido. ( REsp 552894 / SE - Ministro FRANCISCO FALCÃO - PRIMEIRA TURMA) Cabe dizer ainda que esta assessoria jurídica manifestou-se contrariamente ao teor da referida resolução quando de sua edição, mas não teve sua manifestação acatada. Neste sentido, entendemos que se for da conveniência e oportunidade da revogação da resolução, poderá o CFM editar outra resolução retirando do mundo jurídico a referida norma (princípio da simetria das formas). (...) (grifo) Esse tema também foi discutido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em face de igual restrição pela Ordem dos Advogados do Brasil, senão vejamos: A inadimplência de anuidade com a Ordem dos Advogados do Brasil não suspende o direito de exercer a advocacia. Esse foi o entendimento do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ao negar a apelação interposta pela seccional paulista da OAB. Para a desembargadora da Justiça Federal, Regina Helena Costa, a restrição à atividade profissional, como forma de coação ao pagamento das taxas, contraria o princípio da legalidade e livre exercício de trabalho, garantidos pela Constituição. No caso em questão, o advogado Manoel Carlos Rodrigues Cardoso entrou com Mandado de Segurança contra a OAB, para que não houvesse suspensão do seu direito de advogar por falta de pagamento da anuidade. Ele defende que a seccional não poderia, mesmo a título de sanção ético-disciplinar, apreender sua carteira profissional. Para o advogado, que atua desde 1990, os procedimentos de execução fiscal são mais adequados para a cobrança de dívidas dessa natureza e caberia ao legislador condicionar o exercício de qualquer profissional regulamentada. De acordo com a OAB, autora do recurso de apelação, o artigo 37 do Estatuo da Advocacia (Lei 8.906/94) estabelece a prerrogativa de aplicar sanções de suspensão aos inadimplentes. Era necessário reformar a sentença, para a seccional, porque a entidade não participa de recursos públicos e a falta de pagamento constitui risco ao cumprimento de suas finalidades legais. Por unanimidade, a Sexta Turma do TRF–3 não deu razão à recorrente e confirmou a sentença da 2ª Vara de São Paulo. Para a desembargadora Regina Helena Costa, a restrição profissional ao advogado inadimplente “atenta contra o princípio da legalidade e da garantia ao livre exercício de trabalho, ofício ou profissão, assegurados na Constituição da República”. O Ministério Público Federal também havia opinado pela manutenção da decisão de primeiro grau. SGAS 915 Lote 72 | CEP: 70390-150 | Brasília-DF | FONE: (61) 3445 5900 | FAX: (61) 3346 0231| http://www.portalmedico.org.br De acordo com a relatora, a legislação referente ao assunto estabelece que são garantidos às autarquias de fiscalização profissional “os meios próprios para a cobrança de anuidades, observado o devido processo legal e o princípio do contraditório, ou seja, por meio de execuções fiscais”. A corte definiu o recadastramento do advogado, a expedição de sua carteira de identificação profissional e a liberação para o exercício do trabalho, independentemente da quitação das dívidas. Em fevereiro de 2013, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região já havia entendido que o advogado que não pretende mais exercer a profissão pode se desligar da Ordem sem quitar as anuidades atrasadas. A possibilidade de advogados inadimplentes votarem na OAB é outra pauta recorrente nas cortes. Em 2009, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que os profissionais em débito não têm direito ao voto, durante julgamento de recurso especial proposto por advogados inscritos na OAB-CE. A corte definiu que a restrição, prevista pelo artigo 134 do Regulamento Geral da Ordem, não fere o Estatuto da Advocacia. Apelação 0004594-66.2003.4.03.6100. (http://www.conjur.com.br/2013-mai-14/anuidade-oab-atraso-nao-suspende-direitoadvogar-decide-trf3 disponível em 25.06.2015) Assim, está firmado o entendimento de que não é possível o cancelamento de registro de profissional liberal pela simples inadimplência da anuidade como coação, impedimento que se estende às pessoas jurídicas e ainda, que o profissional que não pretende mais exercer a profissão pode se desligar da sua entidade de fiscalização sem quitar as anuidades atrasadas. A ilegalidade está na coação (na aplicação de sanções de suspensão aos inadimplentes) o que contraria os princípios da legalidade e do livre exercício de trabalho garantidos pela Constituição. No entanto, não haverá qualquer prejuízo aos inadimplentes se o cancelamento do registro pelo CRM visar apenas a atualização do cadastro dos médicos/pessoas jurídicas. Ao contrário, evitará a continuidade da inadimplência. Por fim, vale ressaltar que para o cancelamento é necessário a comprovação inequívoca do não exercício da medicina pelo profissional ou pela pessoa jurídica e que o CRM esgote todas as vias legais para a cobrança das anuidades atrasadas, independente do cancelamento da inscrição. DA CONCLUSÃO Pelo exposto, é legal a possibilidade de cancelamento das inscrições de pessoas físicas, jurídicas, médicos estrangeiros ou não, que se encontram inadimplentes, desde que não seja com caráter de sanção. É o que nos parece, s.m.j. Brasília, 22 de setembro de 2015. Giselle Crosara Lettieri Gracindo Assessora Jurídica Turíbio Pires de Campos Assessor Jurídico SGAS 915 Lote 72 | CEP: 70390-150 | Brasília-DF | FONE: (61) 3445 5900 | FAX: (61) 3346 0231| http://www.portalmedico.org.br