OBJETO: EXECUÇÃO DA OBRA DO MUSEU PELÉ, EM ÁREA DO EMISSÁRIO SUBMARINO DA
PRAIA DO JOSÉ MENINO, NO MUNICÍPIO DE SANTOS.
NÚMERO: 2003.61.04.001402-4
ÓRGÃO JULGADOR: SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO
AUTOR: . MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉUS: . MUNICÍPIO DE SANTOS
· CONSTRUTÉCNICA ENGENHARIA LTDA
· ESTADO DE SÃO PAULO
· UNIÃO
MINISTÉRIO
PROCURADORIA
PUBLICO
DA REPÚBLICA
FEDERAL
NO ESTADO
DE SÃO PAULO
EXMO. SR. JUIZ DA __
u VARA FEDERAL
DE SANTOS - SEÇÃO
JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
1
1111/:111,11111111111111/111'11111111111111 /1111111/ 1IIIi/!/II/III/IIIIIII/,111
1
2003 b1 04 001402-4
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por meio
dos procuradores da República infra, vem à presença de Vossa Excelência,
no uso de suas atribuições, com suporte nos artigos 129, IIr, da Constituição
Federal, 6°, VII, b, da Lei Complementar 75/93, 1°, I, e 5° da Lei 7.347/85,
bem
como
no
Procedimento
de
Investigação
Preliminar
n.
1.34.012.000455/2001-41, em anexo, propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
COM PEDIDO DE LlMINAR
1) o MUNICÍPIO DE SANTOS, co~ sede na Praça Visconde de Mauá, s/n,
Centro;
2) CONSTRUTÉCNICA
ENGENHARIA L TOA., com sede na Rua
Funchal, n. 203, 6° andar, São Paulo (SP);
3) o ESTADO DE SÃO PAULO, cuja Procuradoria-Geral está situada na
Rua Boa Vista, n. 103,5° andar, Sé, São Paulo (SP);
4) a UNIÃO, cujo órgão representativo, a Advocacia da União, está situado,
nesta cidade, na Praça Barão do Rio Branco, n. 30, 7° andar, pelos fatos e
fundamentos a seguir expostos.
DOS FATOS
1. O Município
de Santos
(concorrência n. 13.906/2002) com o seguinte objeto:
promoveu
licitação
"Constitui o objeto da presente licitação a contratação de empresa
para elaboração de projeto executivo e execução da obra do Museu
Pelé no Município de santos, conforme Anexos II - Memoriais
Descritivos, Anexo III - Planilha de Serviços e Preços e Anexo IV Cronograma Físico Financeiro e Anexo V - Projetos."(fI. 481).
2. Concluído o certame, sagrou-se vencedora a ré
CONSTRUTÉCNICA,
com a qual foi celebrado o contrato n. 386/2002,
acostado às fls. 148/152 do procedimento de investigação preliminar anexos às fls. 153/220. O objeto do contrato está assim definido:
"Constitui objeto do presente a elaboração de projeto executivo e
execução da obra do Museu Pelé no município de Santos conforme
Memoriais Descritivos, Planilha de Serviços e Preços, Cronograma
Físico-Financeiro e Projetos, que compõem os Anexos I, II, III e IV,
respectivamente, do Edital de Concorrência nO 13.906/2002, ao qual o
presente se acha vinculado." (Cláusula primeira, fi. 148).
3. O intróito do Anexo II uma boa idéia do projeto:
memoriais descritivos -
dá
"Trata-se de um edifício para abrigar o Museu Pelé, com área
de aproximadamente 5.300 m2, estrutura em concreto
protendido e vedação com vidro estrutural. O Museu ocupará
área de 3.000m2, no emissário submarino da Praia do José
Menino, ocupando grande destaque na paisagem, por sua estética
simbólica e partido arrojado, sem criar grande obstáculo às visuais do
local. Isso determinou a adoção de algumas soluções arquitetônicas,
como a elevação do piso, liberando a continuidade das perspectivas e
a vedação em vidro de todo o perímetro do edifício, permitindo uma
transparência e leveza. O programa de necessidades definido propõe
os usos da seguinte maneira:
O primeiro pavimento será ocupado por lojas de material
esportivo e souvenires do Rei Pelé, por meio de escadas e
elevadores se tem acesso ao segundo pavimento que estará
I TODAS AS FOLHAS DOS AUTOS MENCIONADAS NESTA PETIÇÃO REFEREM-SE À NUMERAÇÃO
DO PROCEDIMENTO DE INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR N. 1.34.012.000455/2001-41.
2
/~
exposto o acervo, com objetos, fotos, troféus, além de
auditório com capacidade para cerca de 200 pessoas, onde
será apresentado documentários, filmes e os gols de Pelé. Na
cobertura será instalado um restaurante e choperia." (fl. 154).
4. Os preparativos para a obra começaram recentemente,
com a colocação de tapumes e placa no local, como mostram as fotografias
constantes dos autos (fls.30l/310).
5. A cláusula quinta do contrato estabelece um prazo de
12 meses para a conclusão da obra, a partir da emissão da ordem de serviço
pela fiscalização da SEOSP (fl. 150).
6. A Plataforma do Emissário Submarino de Santos é
área de propriedade da União, cedida ao Município de Santos com base em
contrato de cessão. A certidão n. 10/96 da Delegacia da Secretaria do
Patrimônio da União em São Paulo (fls. 260/262) refere-se ao primeiro deles,
que resultou na Portaria n. 238, de 18.9.97, do Ministro da Fazenda, em cujo
art. 2° constava a destinação do imóvel:
"Art. 2° O imóvel a que se refere o artigo anterior destina-se à
implementação, pelo cessionário, de projetos paisagísticos e
urbanísticos, e à instalação e exploração de equipamentos de lazer e
recreação, e de estudo e pesquisa voltados à biologia marinha.
§ 10 O cessionário poderá cometer a terceiros, mediante locação ou
arrendamento, a instalação e a exploração dos equipamentos de lazer,
recreação, estudo e pesquisa mencionados no caput deste artigo,
caso que deverá ser creditado à União cinqüenta por cento das
receitas decorrentes, permanecendo os cinqüenta por cento restantes
com o Município, a título de administração e ressarcimento pelas obras
que venha a realizar." (fl.287).
7. Não satisfeita 'com a redação acima, a Prefeitura de
Santos propôs a modificação, para que ficasse expressa a sua possibilidade
de outorgar a particulares a exploração econômica de equipamentos e
acessórios e complementares ao aproveitamento público pretendido. Foi
lavrado, então, em 04.12.97, "termo de retificação e ratificação do contrato
de cessão, sob a forma de utilização gratuita", conforme a certidão n. 012/97
(fls. 288/289), passando o Prefeito a considerar liberada a utilização da
Plataforma do Emissário Submarino para a edificação do Museu Pelé (cr
cópia do Diário Oficial de Santos de 5.12.97, fl. 290). Prescreve o novo
contrato:
O imóvel composto por terreno de
acrescidos de marinha denominado Plataforma do Emissário
Submarino, situado na Praia do José Menino, no Município de Santos,
no Estado de São Paulo, destina-se à implantação, pela Outorgada
Cessionária, de projetos paisagísticos e à instalação e exploração de
equipamentos de lazer e recreação e de estudo e pesquisa voltados à
biologia marinha; cLÁUSULA SEGUNDA - A Outorgada Cessionária
poderá cometer a terceiros, mediante locação ou arrendamento,
observado o cumprimento da legislação vigente, a instalação e a
exploração dos equipamentos de lazer, recreação, estudo e pesquisa
mencionados no caput do artigo 2° da referida Portaria, caso que
deverá ser creditado à Outorgante Cedente cinqüenta por cento das
receitas decorrentes, permanecendo os cinqüenta por cento restantes
com a Outorgada Cessionária, a título de administração e
ressarcimento pelas obras que venha a realizar; (...)."
"cLÁUSULA
PRIMEIRA
-
8. O Governo do Estado de São Paulo se comprometeu a
investir na obra recursos da ordem de R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de
reais), como é público e notório, já que amplamente noticiado na imprensa
(cr, v.g., fi. 320).
9. Nos termos do contrato de cessão em vigor, a União
tem direito a cinqüenta por cento das receitas decorrentes de eventual
instalação e exploração dos equipamentos de lazer, recreação, estudo e
pesquisa ali mencionados.
10. Não foi realizado estudo de impacto ambiental e seu
respectivo relatório (ElA/RIMA), para instruir a decisão sobre a realização
da obra no local.
DOS FUNDAMENTOS
DE FATO E DE DIREITO
O objetivo da presente ação é a proteção do meio
ambiente, natural e artificial, bem como a preservação do uso coletivo de
bem de uso comum do povo, nos termos legais e constitucionais. Aspectos
do empreendimento em tela relativos ao patrimônio público (uso de dinheiro
público na obra, termos da exploração comercial do empreendimento, etc.)
poderão ser tratados em outro processo.
Vale registrar que, muito embora todas as homenagens
que se puderem prestar ao "atleta do século" passado, considerado o maior
jogador de futebol de todos os tempos, sejam merecidíssimas, principalmente
em Santos, terra que o projetou para o mundo e que se tomou famosa
também em virtude do grande time de futebol da cidade, que se formou nos
anos 60, com a participação magistral de Pelé, o certo é que tais homenagens
podem ocorrer à margem da lei.
o
local pretendido para a construção do prédio do
Museu Pelé, área das mais nobres da cidade, está sujeito a várias restrições
que não foram devidamente observadas pelas partes envolvidas, como se
verá a seguir.
b. a impossi~ilidade da construção de edificação para
uso especial em imóvel que se constitui em bem de uso comum do povo
A Plataforma do Emissário Submarino é um "terreno
acrescido" - ou seja, formou-se para o lado do mar, em seguimento ao
terreno de marinha. Nasceu tomando uma parte da Praia do José Menino, por
ocasião da construção do emissário de esgotos. Pertence, portanto, à União
(art. 20, VII, da Constituição).
No início, tratava-se de um aterro provlsono, para a
execução da obra. Verificada a inviabilidade da sua remoção, a plataforma
acabou se integrando no contexto da estrutura urbana da cidade, tomando-se
definitiva. Como se trata de área privilegiada, não demorou muito para que
ali se tentasse erguer prédios com destinação econômica.
Ocorre que não se pode restringir o acesso da
comunidade a um bem de uso comum do povo sem intervenção legislativa.
Tratando da alienação de bens público~, HEL Y L. MElRELLES afirma:
"As formalidades administrativas para a venda de bem público
imóvel são, como já vimos, a autorização competente, a avaliação
prévia e a licitação, nos termos da legislação pertinente. Tratando-se
de bem de uso comum do povo ou de uso especial, haverá
necessidade de desafetacão Ie.gal, que poderá constar da mesma
norma que autorize a alienação. (...) Mesmo no âmbito da União é
necessária a desafetacão por lei, pois é óbvio que a
autorizacão de venda Dor decreto, prevista no art. 195 do
Dec-Iei 200167, não a disPensa." (Direto Administrativo brasileiro,
21a ed, Malheiros, p. 450, destacou-se).
5
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MINISTÉRIO
PÚBLICO
FEDERAL
'··~I'T::"·:
o
Código Civil vigente até I 1. I .03 dispunha que "os
bens de que trata o artigo anterior [os bens públicos] só perderão a
inalienabilidade, que Ihes é peculiar, nos casos e forma que a lei prescrever."
"Tal inalienabilidade poderá ser revogada desde que o seja
mediante lei especial. Há juristas entendendo que apenas poderão
ser alienados, mediante lei, os bens dominicais. Todavia, como o
art. 67 não faz nenhuma distinção, entendemos que qualquer bem
público pode ser alienado desde que haja autorização legal, que
tenha perdido sua utilidade ou necessidade, que a entidade pública
o faça em hasta pública ou por meio de concorrência
administrativa
(RF, 83:27S; EJSTJ, 12:IS)." (Código Civil
anotado, sa ed., Saraiva, pp. 87/88.
Nesse sentido, o Tribunal Regional Federal da P Região
já decidiu: "sem a necessária desafetação
- que reclama ato legislativo
específico - os imóveis funcionais em questão remanesceram, por força de
expressa disposição legal, na esfera de inalienabilidade patrimonial da União
(STF, ROMS 21,96S-7/DF, ReI. Ministro CELSO MELLO, DJ 24.06.94)." (4<1
Turma, EDAC 96.01,06944-S /DF, ReI. Mário César Ribeiro, DJ de 29.3.99).
Se para a alienação do bem de uso comum do povo é
preciso lei, consectário lógico é que também isso será necessário para a sua
desafetação, seja para torná-Io alienável (bem dominical), seja para lhe
conferir uso especial. No caso dos autos, ainda que o prédio a íler construido
fosse da própria União, haveria essa necessidade,
pois mero ato
administrativo não pode transformar bem de uso comum em bem de uso
especial, sobretudo em se tratando de. um imóvel que tem destinação natural
para o uso de todos.
Segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO,
"a desafetação dos bens de uso comum, isto é, seu trespasse para o uso
especial ou sua conversão em bens meramente dominicais, depende de lei ou
de ato do Executivo praticado na conformidade dela. (...) Só um ato de
hierarquia jurídica superior, corno o é a lei, poderia ulteriormente contrariar
o destino natural que adquiriram ou habilitar o Executivo a fazê-Io." (Curso
de Direito Administrativo, sa ed., Malheiros, 434).
Vale lembrar que a cessão de uso,
Administrativo, é apenas "a transferência gratuita da
público de uma entidade ou órgão para outro, a fim de
utilize nas condições estabelecidas no respectivo termo,
indeterminado." (Hely L. MeireIles, op. cit., p. 442).
conforme o Direito
posse de um bem
que o cessionário o
por tempo certo ou
Transferência de posse, evidentemente, não implica
transfomlação da natureza do bem, que continua sendo de uso comum do
povo, passando apenas a ficar sujeito à administração do cessionário,
observadas as limitações peculiares ao bem em questão. Se a União não
poderia transformar a Plataforma em bem de uso especial, claro que não
poderia ceder esse direito.
o uso
desorqenado da orla marítima de Santos, em que
se nota a proliferação de bares avançando sobre o mar, atenta contra o direito
de todas as pessoas da comunidade de usufruir desse espaço, tirando,
inclusive, parte da vista para o mar. A própria Plataforma do Emissário tem
sido utilizada com freqüência para sediar empreendimentos sazonais, tais
como parques de diversão, feiras e circos, dentre outros eventos de
exploração econômica que privatizam o uso da área pública. Tal situação é
intolerável, como já teve oportunidade de decidir o Tribunal Regional
Federal da 53 Região:
"ADMINISTRATIVO. TERRENO DE MARINHA RESERVADO AO 'USO COMUM
DO POVO'. CONSTRUÇÃO IRREGULAR DE BARES E RESTAURANTES À
BEIRA-MAR. CONCESSÃO DE PRAZO PARA A DESOCUPAÇÃO IMÓVEL.
INCABIMENTO. - É DE LONGA TRADiÇÃO EM NOSSO DIREITO NÃO SE
ADMITIR DIREITO À POSSE, AINDA QUE PRECARIA E TEMPORÁRIA, DE
TERRENO DE MARINHA, OU DE QUALQUER OUTRO BEM PÚBLICO, QUE
ESTEJA DESTINADO ESPECIFICAMENTE AO SERViÇO PÚBLICO OU AO USO
COMUM DO POVO, COMO SUCEDE NO CASO PRESENTE. - AO CONCEDER
PRAZOS DILATADOS AO APELADO PARA QUE PERMANEÇA NA POSSE DE
ÀREA QUE, SOBRE SER PROPRIEDADE PÚBLICA, É BEM RESERVADO AO
USO COMUM DO POVO, A DECISÃO A QUO INOVA PERIGOSAMENTE NA
MATÉRIA E CAUSA, PELA CONVALlDAÇÃO DO MAU EXEMPLO, GRAVES
PREjuízos
À ORDEM PÚBLICA, MORMENTE QUANDO NA INSTÂNCIA
ADMINISTRATIVA O APELADO JÁ TEVE DEFERIDOS DIVERSOS PEDIDOS DE
PRAZO PARA A RETIRADA DA CONSTRUÇÃO. - APELAÇÃO E REMESSA
OFICIAL PROVIDAS." (TRF da 58 Região, 1 Turma, AC 180507, ReI. Castro Meira,
DJ de 06.4.01, unânime, destacou-se).
Ad argumentandum, ainda que se diga que é possível
mudar a destinação da Plataforma mediante o ato de cessão praticado,
transformando-a, parcialmente, em bem público de uso especial, o certo é
que o projeto que se pretende implantar não está de acordo com os termos da
cessão feita pela União.
De acordo com o contrato de cessão em vigor, a
Plataforma destina-se à implantação, pela Prefeitura de Santos, "de projetos
paisagísticos e à instalação e exploração de equipamentos de lazer e
recreação e de estudo e pesquisa voltados à biologia marinha".
Não se concebe como, dessa descrição, possa se concluir
que é possível a edificação de um prédio de três andares no local, pois tal
construção não se encaixa no conceito de projeto paisagístico ou no de
equipamento de lazer e recreação.
o
arquiteto
explica o que é paisagismo:
e paisagista
Rodrigo
Gonçalves
asSIm
"O paisagismo não é um mero enfeite ou efeito estético atribuído ao
projeto de arquitetura ou urbanismo. Um projeto paisagístico
contempla, antes de tudo uma sincronia com a natureza e objeto
construído, buscando amenizar impactos no ambiente urbano que a
consolidação do empreendimento possa ocasionar. Grandes projetos como por exemplo, hotéis, marinas, trapiches para atracação, centros
empresariais ou culturais - os quais mexam consideravelmente em
uma estrutura ambiental e/ou urbana, devem ser idealizados
juntamente com um projeto de paisagismo, aliando espaço construído
com vegetação, pátios, jardins, entre outros. Estes elementos
paisagísticos dão uma qualidade estética à construção e mostram uma
consciência
ambiental
bem
mais
apurada, digna de
empreendedores
do
novo
milênio.
(Fonte:
htto:llwww.folhanorte.com.brlsite/noticia.php?id
noticia::;::187,
em
12.02.02).
o
dicionário
paisagismo da seguinte forma:
Hôuaiss
da língua
portuguesa
define
"2 ARQ URB a arte e a técnica de planejar e organizar a paisagem
para possibilitar ao homem maior aproveitamento e fruição de grandes
espaços externos de uso coletivo 3 ARQ estudo para preparação e
realização de paisagens como complemento arquitetônico 4 ARQ URB
B plano, projeto paisagístico que se desenvolve a partir da conjugação
de elementos naturais com outros como seleção e distribuição da
vegetação compatível, emprego do material adequado (pedra, água,
concreto), projeto das estruturas arquitetônicas,
circulação etc." (l a ed., Objetiva, p. 2105).
da iluminação,
Portanto, a menção a paisagismo remete a jardins,
calçadas, praças, espaços externos de uso coletivo, etc., não a edificações.
Mas certamente a Prefeitura entende que o projeto do
Museu Pelé se enquadra no conceito de "equipamento de lazer e recreação".
Pode até ter sido essa a intenção de ambas as partes que
finnaram o contrato de cessão, mas, em se tratando de direito público, a
vontade das partes não pode suplantar o que consta do ato administrativo, até
porque o princípio da publicidade impõe a exteriorização precisa das ações
do poder público.
Analisando-se o que ficou escrito, "lazer e recreação",
em uma área de uso comum do povo, dá a idéia de quadras esportivas,
bancos de areia, playgrounds, local adequado para a pesca desportiva, etc.,
vale dizer, equipamentos que possam ser usados por qualquer pessoa.
Já um museu (que é a atividade principal que se pretende
implantar), em princípio, só por interpretação bastante extensiva pode se
enquadrar no conceito de "equipamento de lazer e recreação", pois se trata,
antes de mais nada, de um espaço cultural. No caso concreto, ao museu se
agregaran1, como visto acima, lojas, um restaurante e uma choperia,
transformando o museu quase em um pequeno shopping center.
Todavia, tal destinação da Plataforma deveria vir
expressa no ato de cessão, com a previsão da possibilidade da construção de
um prédio e do funcionamento de comércio, dado o grave impacto ambiental
da sua implementação.
Mas isso não ocorreu, nem poderia ter ocorrido, porque
não é esse o objetivo do ato de cessão. Este, evidentemente, visava a
preservar a característica do local de bem de uso comum do povo, não se
admitindo que esteja subentendida a construção de obras que desvirtuem o
terreno, atendendo à discricionariedade da Administração.
Como se viu, a cessão é apenas a transferência da posse
de um bem, para uso nas condições especificadas no contrato. Se o próprio
cedente (no caso, a União) não poderia fazer o que ora pretende o Município
".,)
• MINISTÉRIO
PÚBLICO
FEDERAL
?~~;'i
de Santos, não se pode imaginar que este, mercê do ato de cessão, possa
fazê-lo.
Não é a primeira vez que a Prefeitura tenta erguer um
] á em 1998 foi ajuizada ação popular contra projeto que
reservava ali "espaço para setenta e quatro lojas, bares, restaurantes e
cinemas." A sentença, acostada às fls. 291/299, julgou procedente o pedido,
fundada primordialmente na discrepância entre o projeto e a finalidade do
imóvel, prevista no contrato de cessão, no edital de licitação e na lei
municipal autorizadora. Tendo ocorrido o distrato entre o município e a
empresa ganhadora da licitação, requereu-se a extinção do feito, sem exame
do mérito, por perda do objeto do processo, o que foi acatado no Eg.
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (fls. 2231229).
A nova tentativa, pelos motivos acima expostos, não
merece outra resposta do Poder Judiciário.
"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defende-Io e preserva-Io para as presentes e futuras gerações.
(...)
§ 10 Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder
Público:
N - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio
ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade; ( ...)."
o projeto
do Museu Pelé é potencialmente causador de
significativa degradação ao meio ambiente artificial, pois está previsto para
um terreno acrescido a terreno de marinha, bem de uso comum do povo,
local usado pela população como área de lazer, acarretando, inclusive,
diminuição da vista do mar. Influências também pode haver no meio
ambiente natural, já que a Plataforma está construí da sobre um emissário de
esgotos, não havendo estudo que mostre quais são as possíveis implicações
,/ ~.'~;'<'.~"\
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do projeto, tanto sobre a tubulação como em relação à necessidade eventual
de um conserto da mesma.
A SABESP, respondendo a oficio do Secretário de
Obras de Santos, afirmou, sobre "o projeto de reurbanização do Emissário
Submarino": "não interfere diretamente com o equipamento, porém,
devemos salientar que se por necessidade de manutenção ou por algum
acidente com o referido emissário e, portanto, danificarmos o que sobre a
faixa de proteção for colocado" (sic) - fi. 240.
Já o IBAMA, em informação técnica (fls. 238/239), não
se manifestou sobre o projeto arquitetónico, mas tão-só sobre a vegetação
existente no local (gramíneas), não vendo, sob esse estrito aspecto,
impedimento técnico ao projeto. Recomendou, contudo, o IBAMA, a oitiva
dos órgãos estaduais competentes, como a SABESP, a CETESB e a DAIA.
A lacónica informação do IBAMA não se afigura
suficiente para se concluir que o projeto não é potencialmente causador de
significativa degradação do meio ambiente, de modo a se dispensar o estudo
de impacto ambiental e seu respectivo relatório (EIA/RIMA). O princípio
da prevenção impõe ao administrador o dever de se cercar de todos os
subsídios técnicos disponíveis para tomar sua decisão. PAULO AFFONSO
LEME MACHADO acentua o caráter não-vinculativo do estudo e seu
objetivo de chamar a atenção para a importância dos fatores ambientais e
possibilitar o sopesamento de prós e contras com a devida consciência. Cita
J F. CHAMBAUL T ("Lês études d'impact et Ia Communauté Européene",
in Revue Juridique de I 'Environnement 4/401-441, 1985):
" 'A função do procedimento de avaliação não é influenciar as decisões
administrativas
sistematicamente
a favor
das considerações
ambientais, em detrimento das vantagens econômicas e sociais
suscetíveis de advirem de' um projeto'. O objetivo é dar 'às
Administrações Públicas uma base séria de informação, de modo a
poder pesar os interesses em jogo, quando da tomada da decisão,
inclusive aqueles do ambiente, tendo em vista uma finalidade
superior', como acentua J. F. Chambault." (Direito Ambiental
Brasileiro, lQa ed., p. 199).
In casu, nem mesmo relatório ambiental preliminar, para
avaliar a necessidade do estudo de impacto, foi produzido, revelando que a
Administração não conferiu ao problema ambiental a importância merecida.
Contudo, a discussão sobre se a degradação potencial é
ou não significativa mostra-se ociosa, na espécie, pois a Lei 7.661//88 impõe
a realização de EIA/RIMA:
"Art. 6° O Iicenciamento para parcelamento e remembramento do
solo, construção, instalação, funcionamento e ampliação de
atividades, com alterações das características naturais da Zona
Costeira, deverá observar, além do disposto nesta Lei, as demais
normas específicas federais, estaduais e municipais, respeitando as
diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.
( ...)
§ 2° Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao
responsável pela atividade a elaboração do estudo de impacto
ambiental e a apresentação do respectivo Relatório de Impacto
Ambiental - RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei.
ff
Tal dispositivo insere-se no âmbito da proteção especial
destinada à Zona Costeira, que tem foro constitucional. O § 4° do art. 225 da
Constituição a considera patrimônio nacional, estabelecendo que a sua
exploração será feita, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos
naturais.
• o fumus boni Juris decorre dos fatos e fundamentos
jurídicos expostos acima: a área da construção é imóvel de uso comum do
povo, não desafetado conforme lei específica; o instrumento de cessão do
bem pela União não contempla o uso que se pretende dele fazer; e a
implantação do projeto não foi precedida de ElA/RIMA;
• o periculum in mora evidencia-se pelo fato de que a
construção está prestes a começar, já tendo sido levantados os tapumes e
estando em fase de construção as casas dos operários. Uma vez construí do,
ainda que parcialmente, o prédio causará estorvo à coletividade, que não
poderá usufruir da Plataforma na sua totalidade, bem como tampará parte da
vista do mar e tomará mais custoso, inclusive para os cofres públicos, o
retomo à situação original.
Pelo exposto, requer-se a concessão de medida liminar,
inaudita altera parte, que detennine aos réus Município de Santos e
Construtécnica Engenharia Ltda. a) a imediata paralisação da obra, b) a
remoção, no prazo de 20 dias, dos tapumes e instalações de operários lá
erguidos, para que, durante o processo, a Platafonna esteja plenamente apta a
ser utilizada pela população, assim como c) a não-promoção de novas
edificações no local, pennanentes ou sazonais, sem a prévia aprovação, com
a devida publicidade e a realização de audiências públicas, do estudo de
impacto ambiental e do respectivo relatório, sob pena de multa diária de R$
20.000,00, a ser destinada ao Fundo instituído pela Lei 7.347/85, com
expressa disposição de que o valor deverá ser aplicado in situ, sem prejuízo
das demais sanções legais, inclusive de natureza penal.
Tal estudo d~verá atender às disposições nonnativas e
abordar, inclusive, os aspectos paisagísticos (poluição visual), a livre
acessibilidade à prai~ a poluição sonora, o fator socioeconâmico e a
totalidade dos impactos já provocados por outros equipamentos implantados
na orla, traçando, aind~ uma perspectiva do impacto conjunto com projetos
que se pretenda instalar na orla.
DO PEDIDO
2. I. impedir qualquer obra tendente à realização do
projeto que constitui o objeto do contrato n. 386/2002, celebrado entre a
Prefeitura Municipal de Santos e a COllstrutécnica Engenharia Ltda.;
2.2. subsidiariamente, impedir qualquer obra tendente à
realização do projeto que constitui o objeto do contrato citado sem a
elaboração prévia de ElA/RIMA, ao qual deve ser assegurada a necessária
publicidade, possibilitando-se a participação da coletividade por meio das
audiências públicas:
2.3. impor ao Município de Santos a obrigação de
recolocar o imóvel em condições de uso pela população, para os fins
previstos no contrato de cessão celebrado em 04.12.97.
Nesses termos,
Pede deferimento.
o Ministério Público Federal vem, re
I
p itosamente, presença de
Vossa Excelência esclarecer alguns pontos importantes ara subsidiar a respeitável
decisão Iiminar que se aguarda, dentre eles:
1) reafirmar o caráter de bem público de uso comum do povo da
plataforma;
2) retificar incorreção contida na narrativa dos fatos e;
3) especificar a abrangência do Estudo de Impacto Ambiental
necessário, objeto do pedido, para que avalie inclusive a
possibilidade e a viabilidade da restauração do bem público de
uso comum do povo ao estado original.
Outrossim, requer que tais esclarecimentos
instruam os
competentes mandados de citação das rés a serem expedidos, de modo a que
integrem a petição inicial como parte da causa de pedir e do pedido.
Cabe observar que os esclarecimentos solicitados às rés já
atendem à exigência legal, sendo, ao que parece, desnecessário postergar a análise do
pedido Iiminar, eis que elas já puderam explanar as razões pelas quais entendem
adequada a construção do empreendimento.
Considerando o prosseguimento da execução das obras no
local, o Ministério Público Federal ratifica o pedido de concessão, em caráter de
urgência, da Iiminar.
O autor requer a juntada do parecer anexo, subscrito em
18/12/1995, pelo Dr. Elias Bauab, ilustre Procurador Patrimonial da União, indicativo do
caráter provisório do aterro denominado "plataforma" do emissário de esgotos feito
sobre área de uso comum do povo, o qual seria removido após a implantação do
emissário de esgotos. Entretanto, não houve a remoção do aterro, segundo parece pelo
fato da União ter atendido a pedido em tal sentido formulado pela ré Prefeitura.
Ocorre que tal aterro provisório cobriu a praia e o mar, ou
seja,
bens públicos de uso comum do povo, tendo provocado indiscutível
alteração da natureza local, dentre outros aspectos, pelas modificações no fluxo
de areias, no fluxo de águas (que influi no perfil das praias) e pela supressão de
parte de praia e de mar destinados ao lazer comunitário gratuito e a outras
atividades, além do prejuízo à paisagem natural.
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MINISTÉRIO
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PÚBLICO FEDERAL
2003.6104.001402-4
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A justificativa apresentada para a permanência do aterro r~~~
basicamente, na necessidade de fixação para a tubulação, pois a instalação da mesma
não teria observado a profundidade prevista.
Cabe ponderar, contudo, que a engenharia é, segundo consta,
uma ciência exata, não parecendo plausível que inexistam no equipamento outras
formas de ancoragem, considerando o caráter provisório da plataforma. Ademais, não
parece razoável, também considerando a manutenção do perfil planialtimétrico dos
Jardins da orla de Santos, que não se tenha enterrado a tubulação na profundidade
prevista, considerando a transitoriedade da plataforma, salvo erro grosseiro na
execução decorrente de falha das empresas que o executaram e da própria União que
não fiscalizou a contento. Questiona-se: será que a engenharia empregada seria tão
imprecisa, a ponto de não ser capaz de colocar a tubulação na profundidade adequada
no subsolo e de retirar o aterro após o serviço, conforme previsto na autorização
precária, sem prejuízo para a segurança e para a qualidade ambiental?
Contudo. como é cediço, o bem público de uso comum do povo
(praia e o mar) continuou a ser utilizado pela coletividade gratuitamente a maior parte
do tempo como mirante, para passeios e atividades esportivas, apesar da permanência
do aterro sobre ele, ou seja, manteve o sentido de bem público de uso comum do povo
destinado ao lazer comunitário.
Importante notar que a praia e o mar subsistem no local, porém
cobertos pelo aterro. O simples fato de cobrir tais bens, de forma precária, e de não
retirar tal aterro indevidamente, não possui o condão de alterar a natureza do bem,
retirando o atributo de uso comum do povo. Com a devida vênia, absurdo supor o
contrário. Dispõe a Lei nO9.636/98:
"Arf. 4° Os Estados, Municípios e a iniciativa privada, a juízo e a
critério do Ministério da Fazenda, observadas as instruções que
expedir sobre a matéria, poderão ser habilitados, mediante
convênios ou contratos a serem celebrados com a SPU, para
executar a identificação, demarcação,· cadastramento e
fiscalização de áreas do patrim6nio da União, assim como o
planejamento e a execução do parcelamento e da urbanização
de áreas vagas, com base
da legislação pertinente.
em projetos elaborados na forma
§ 1° Na elaboração e execução dos projetos de que trata este
artigo, serão sempre re~peitados a preservação e o livre acesso
às praias marítimas, fluviais e lacustres e a outras áreas de uso
comum do povo.
§ 3° A participação nas receitas de que trata o parágrafo
anterior será ajustada nos respectivos convênios ou contratos.
observados os limites previstos em regulamento e as instruções a
serem baixadas pelo Ministro de Estado da Fazenda, que
considerarão a complexidade, o volume e o custo dos trabalhos
de identificação, demarcação, cadastramento, recadastramento e
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PÚBLICO FEDERAL
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fiscalização das áreas vagas existentes, bem como"<"'~àà:,:::~:.:;
elaboração e execução dos projetos de parcelamento e
urbanização e, ainda, o valor de mercado dos imóveis na
região e, quando for o caso, a densidade de ocupação local.
Art. 42 ....
Parágrafo único. Quando o empreendimento necessariamente
envolver áreas originariamente de uso comum do povo.
poderá ser autorizada a utilização dessas áreas, mediante
cessão de uso na forma do art. 18, condicionada. quando for
o caso. à apresentação do Estudo de Impacto Ambiental e
respectivo relatório. devidamente aprovados pelos órgãos
competentes.
observadas as demais disposiçóes
legais
pertinentes.
Art. 11. Caberá à SPU a incumbência de fiscalizar e zelar para
que sejam mantidas a destinação e o interesse público, o uso
e a integridade f{sica dos imóveis pertencentes ao patrimônio da
União, podendo, para tanto, por intermédio de seus técnicos
credenciados, embargar serviços e obras, aplicar multas e demais
sanções previstas em lei e, ainda, requisitar força policial federal e
solicitar o necessário auxílio de força pública estadual.
§ 4° Constitui obrigação do Poder Público federal, estadual e
municipal, observada a legislação especffica vigente, zelar pela
manutenção
das áreas de preservação
ambiental, das
necessárias à proteção dos ecossistemas naturais e de uso
comum do povo, independentemente da celebração de convênio
para esse fim."
A natureza de uso comum do povo foi reafirmada, portanto, pela
Lei 9636/98, ao mencionar que as "praias marítimas, fluviais e lacustres e outras
áreas de uso comum do povo", reproduzindo previsão da Lei 7661/88, que trouxe
maiores detalhes a respeito.
Além disso, o valor de flnercado dos imóveis na região é um dos
parâmetros a ser considerado em eventual cessão, a qual deve respeitar o
procedimento licitatório sempre que possível. Ainda que sob o prisma de
desenvolvimento do turismo, em áreas originariamente de uso comum do povo (que é o
caso, pois antes era apenas praia e mar e depois continuou como praia e mar com um
aterro provisório), as exigências da Lei 7661/88 incidem sobre o bem.
A praia e o mar pertencem à União e são bens de uso comum do
povo, segundo os dispositivos constitucionais, sendo que tais atributos não podem ser
modificados pelo Executivo a seu bel talante, sem incorrer em ilegalidade, seja pela
omissão na retirada de um aterro provisório sobre tais bens, seja pela edição de atos
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Autos n° 2003.61.04.001402-4
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normativos infralegais que cederam o aterro para terceiros explorarem economicamente
o espaço, exploração esta que restringirá a ocupação gratuita na área por qualquer
pessoa da população, em especial os menos aquinhoados que mal conseguem o
mínimo para uma subsistência digna (dentre eles, por exemplo, inúmeros aposentados
que recebem benefícios insuficientes para subsistência).
Cabe considerar que grande parte das edificações na região é
constituída por apartamentos pequenos sem áreas de lazer. Portanto, o espaço das
praias e da orla é fundamental, sendo de elevado valor para a coletividade (como
exemplo, tem-se os belíssimos Jardins de Santos que atraem milhares de pessoas para
inúmeras atividades de descanso e lazer gratuíto, valorizando o sentido de cidadania,
sendo que, ao menos naquele espaço, todos são donos em igualdade de condições,
existindo ali uma isonomia entre ricos ou pobres).
Evidente que compete ao Poder Público assegurar a ordem e o
respeito recíproco entre os freqüentadores do local, bem como evitar que ocorram
indevidas apropriações de tais bens, ainda que sob o disfarce de permissão ou cessão
de uso, locação ou arrendamento, sob condições que não asseguram o cumprimento
das exigências legais e a participação da coletividade, através das audiências públicas,
além de não deixar evidenciado que o particular que eventualmente vier a explorar
economicamente o local pagará o valor justo (a ser definido também com a colaboração
do ElA/RIMA) pelo bem público, de localização privilegiada, que estará desfrutando,
caso se mostre viável a edificação.
Ora, conforme consta das respeitáveis decisões anexas, que
decidiram matéria correlata da praia do Itararé, em São Vicente (vizinha do emissário),
a realização do Estudo de Impacto Ambiental sobre bens integrantes da zona costeira é
exigência legal, que não se torna dispensável por mera declaração dos órgãos
ambientais ou pelo fato da área já ter sido objeto degradação ambiental pela
antropização anterior.
Cumpre observar que não consta ter sido realizado tal estudo e
que tenha, através de equipe multidisciplinar composta por especialistas dos vários
ramos do conhecimento envolvidos, sido apreciada, dentre outras alternativas,
inclusive se é ou não possível e viável a remoção da plataforma.
Tal aspecto, acerca da eventual possibilidade e viabilidade de
remoção é, inclusive, um pré-requisito para que se possa avaliar eventual destinação
da plataforma.
Portanto, para que reste bem esclarecido, o estudo requerido
nesta ação deve ser completo, ou seja, inclusNe avaliar a necessidade de permanência
de tal aterro e, caso entenda justificável a permanência, deverá incorporar o passivo do
aterro indevido e incluir medidas mitigadoras e compensatórias. Deverá, ainda, avaliar
o impacto turístico, qualificando o perfil do turista e o reflexo na economia local, de
modo a demonstrar o valor a ser exigido pela exploração econômica e se haverá efetivo
retorno do investimento para o dinheiro público envolvido, inclusive na construção do
próprio aterro. Vale notar os indicativos de que o prazo de tal exploração econômica
seria de 25 anos, prorrogável por mais 50 anos, ou seja, atravessa gerações e
caracteriza alienação, na prática.
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MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL
Autos nO 2003.6104.001402-4
Portanto, a praia, bem de uso comum do povo por definição legal,
não pode ter tal finalidade alterada por mera disposição do Executivo, ainda mais
considerando a irregularidade da permanência do aterro "provisório".
A reportagem anexa indica que o responsável pela direção da
empresa, possivelmente beneficiária da exploração econômica do museu e dos outros
empreendimentos nele existentes, teria declarado que o museu isoladamente não é
viável para a iniciativa privada, a qual somente arcaria com os custos de construção se
entendesse viável o empreendimento, bem como que já estaria mantendo contatos com
outras empresas para a exploração do local.
Não pode, portanto, a coletividade ser alijada do processo de
cessão da área sem que sejam feitos os estudos multidisciplinares sobre a situação de
permanência ou não do aterro
Importante retificar o trecho da inicial que relata o processo de
cessão da área. A área inicialmente foi cedida para urbanização, ajardinamento e
fazer comunitário, ou seja, atividades que permitiriam ao menos a preservação da
finalidade de bem público de uso comum do povo (Certidão nO10 - cláusula quarta). As
posteriores retificação e ratificação possibilitaram a utilização para equipamentos
ligados à biologia marinha e a cessão a terceiros para exploração econômica (certidão
nO
12).
A União, em sua resposta, apenas indicou que entende que o
Museu enquadra-se no conceito de lazer cultural. Todavia, a expressão contida na
cessão deve ser interpretada de forma estrita, sob pena de abranger praticamente tudo
e alcançar inclusive atividades, por exemplo, de bingos e boates, as quais, assim como
o Museu projetado, nada tem a ver com a praia ou o mar. Importante lembrar o disposto
na Lei nO 9.636/98:
"Arf. 18. A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos,
gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos
regimes previstos no Decreto-Lei nO 9.760, de 1946, imóveis da
União a:
I - Estados, Municípios e entidades, sem fins lucrativos, de
caráter educacional, cultural ou de assistência social;
/I - pessoas físicas Ou jurídicas, em se tratando de interesse
público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse
nacional, que mereça tal favor.
§ 3° A cessão será" autorizada em ato do Presidente da
República e se formalizará mediante termo ou contrato, do qual
constarão expressamente as condições estabelecidas, entre as
quais a finalidade da sua realização e o prazo para seu
cumprimento, e tornar-se-á nula, independentemente de ato
especial, se ao imóvel, no todo ou em parte, vier a ser dada
aplicação diversa da prevista no ato autorizativo e
conseqüente termo ou contrato.
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§ 5° A cessão,
quando
destinada
à execução
de
empreendimento de fim lucrativo, será onerosa e, sempre que
houver
condiçóes
de
competitividade,
deverão
ser
observados os procedimentos Iicitatórios previstos em lei. "
A União não justificou, portanto, a razão para tolerar as lojas,
a choperia e o restaurante, os quais também não necessitam estar associados à
praia ou ao mar e não caracterizam Jazer em sentido estrito. Vale notar que, dos
três pavimentos, no máximo um está projetado para abrigar o acervo do ilustre
jogador, ou seja, a maior parte será destinada para o comércio (situação diversa
da existente em outros importantes museus do mundo, onde o inverso
predomina, ou seja, o acessório ocupa menor espaço que o principal. Sem
precisar ir tão longe, basta lembrar do Museu de Pesca e do Museu do Ipiranga).
O risco de se investir dinheiro público em tal obra, em desrespeito
à natureza do bem e aos limites da cessão, sem prévio estudo multidisciplinar que
avalie inclusive a necessidade de permanência do aterro e, portanto, que pode inclusive
culminar com a necessidade de posterior demolição parcial ou total, bem como o fato
de não estar suficientemente demonstrado o efetivo e adequado retorno financeiro para
os cofres públicos são razões que impõem a concessão da liminar pleiteada em caráter
de urgência.
Termos em que,
Pede e Espera Deferimento.
Santos, 18 de m~rço de 2003
I
p
7(7"
PODER JUDICIARIO
JUSTiÇA FEDERAL
1a VARA CíVEL FEDERAL EM SANTOS
AUTOS DO PROCESSO N° 2003.6104001402-4
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PEDIDO DE L1MINAR
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉUS: MUNICípIO DE SANTOS E OUTROS
O Ministério
Público Federal aJU1ZOUação civil
pública em face do Município de Santos, Construtécnica
Engenharia Ltda,
Estado de São Paulo e a União. Pede a concessão de tutela
jurisdicional
liminar para que sejam paralisadas as obras de construção, bem como impedir
o início de novas edificaçães relativas ao projeto MUSEUPELÉ, no município
de Santos, especificamente na área em que se situa a plataforma do emissário
submarino da Praia do José Menino, área de propriedade da União, cedida ao
Município de Santos por contrato de cessão.
Alega que não foram devidamente observadas várias
restrições
para
impossibilidade
desafetação
a
realização
de edificação
do projeto
sendo elas:
a
em bem de uso comum do povo sem a
do bem, defendendo,
intervenção legislativa;
em questão,
para tanto,
a necessidade de prévia
inobservância das condições da cessão, por não estar
o projeto respaldado em nenhuma das espécies de destinação previstas no
contrato de cessão celebrado.eAo
estudo de impacto ambientalí?
I'
município de Santos e a União;
falta de
PODER JUDICIÁRIO
JUSTiÇA FEDERAL
Este Juizo reservou-se à apreciação do pedido de
liminar
após a manifestação dos representantes
das pessoas juridicas
de
direito público, nos termos do art. 2°, da Lei 8.437/92.
Para melhor
compreensão
da
questão,
urgem
esclarecimentos concernentes ao espaço fÍsico no qual se assenta o projeto de
construção do Museu.
Trata-se de uma plataforma elevada sobre a areia
da praia, com área de 42.766m2,
denominada
Submarino de Esgotos, situada no munidpio
marinha surgido da utilização
Plataforma
de Santos, um acrescido de
da praia como canteiro
construção daquela obra sanitária,
do Emissário
de obras para a
tendo à época (década de setenta) se
obrigado a SABESPa remover o aterro artificial
e restituir a praia ao estado
natural, o que não foi feito. Com o passar dos anos, o aterro não retirado foi
integrado à paisagem urbana.
Atualmente.
existem
no local
jardins,
calçada,
iluminação pública, plataforma para surfistas, pista de bicicross e outros. Em
parte dessa área, o Munidpio de Santos pretende a construção do Museu Pelé,
projetado
num edificio de três pavimentos, sendo o primeiro destinado ao
comércio, o segundo a eXQosições e o terceiro,
choperia e restaurante.
um mirante,
destinado a
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL
o Ministério
Público Federal aponta, como primeira
restrição à realização do projeto, a necessidade de intervenção legislativa a
amparar o trespasse do uso do bem, pela edição de ato legislativo específico.
Contudo, analisando o conjunto de atos norma ti vos reguladores, entre eles os
Decretos-Leis nOs 9.760146
e 178/67,
- dispondo,
ambos, sobre os bens
imóveis da União e sua cessão - bem como as Portarias nOs497, de 11 de
setembro de 1.995 e
Fazenda,
238, de 18 de setembro de 1.997, do Ministério da
reconheço-os
como
suficientes
a
prestigiar
o
princípio
constitucional da legalidade.
A segunda restrição não observada para a realização
do projeto, refere-se à inobservância das condições da cessão veiculadas no
respectivo contrato, no que se relaciona à destinação do imóvel cedido.
Sobre o assunto, a cláusula quarta do mencionado
contrato prevê a destinação do imóvel para a implantação de urbanização,
ajardinamento
e equipamentos de lazer comunitário.
A Portaria n° 238, do
Ministério da Fazenda prevê que o cessionário destinará o imóvel a projetos
paisagÍsticos e urbanísticos, e à instalação e exploração de equipamentos de
lazer e recreação, e de estudo e pesquisa voltados à biologia marinha.
É fora de dúvida que um museu proporciona aos
seus visitantes momentos de lazer e recreação, classificável,
portanto,
no
conceito de equipamento dessa espécie.
A terceira restrição não observada, diz respeito à
necessidade do estudo
ambien1f
de impacto
ambiental
e relatório
de impacto
3
PODER JUDICIÁRIO
JUSTiÇA FEDERAL
Por esse fundamento, a pretensão liminar do autor
merece ser acolhida. Senão, vejamos.
A Lei nO 6.938, de 31 de agosto de 1.981, ao dispor
sobre a Política Nacíonal do Meio Ambiente, alçou à estatura de principio o
planejamento
e fiscalização do uso dos recursos ambientais (art. 2°, 111). O
art. 3° do mencionado diploma, considera poluição a degradação da qualidade
ambiental
resultante de atividades que direta ou indiretamente
afetem as
condições sanitárias do meio ambiente.
A Lei n° 7.661,
de 16 de maio de 1988, que
instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, no arte 6°, prescreve,
"verbis":
"O
{;cenôamento
remembramento
para
parcelamento
do solo, construção,
e
instalações
das característica naturais da Zona Costeira, deverá
observar, além do disposto nesta lei, as demais
normas
especificas
federais,
estaduais
e
municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de
Gerenôamento Costeiro.
"Para
o
solicitará
[icenôamento,
ao
responsável
o
órgão
pela
competente
atividade
elaboração do estudo de impacto ambiental
apresentação do respectivo Relatório
a
e a
de Impacto
PODER JUDICIARIO
JUSTIÇA FEDERAL
Ambiental - RIMA, devidamente aprovado, na forma
da lei."
A Portaria 497/95,
Fazenda, alterada pela de n° 238/97,
art. 2°, § 4° do Ministério da
é expressa quanto à necessidade de
prévia aprovação pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Renováveis - IBAMA, para os projetos e instalações no imóvel cedido, não
podendo ser efetuada qualquer modificação no imóvel enquanto não cumprida
essa condição.
Ao que parece, segundo os documentos juntados, o
Município acredita haver se desincumbido desse mister ao obter do Engenheiro
Chefe do E.R.IBAMA/SANTOSo parecer de fls. 259/260.
Contudo, o documento
emitido, além de não se constituir em Relatório de Impacto Ambiental, revela
conteúdo inconsistente, e, s.m.j.,
desconforme às determinações expressas
no art. 10, especificamente o parágrafo 4°, da Lei n° 6.938/81,
quando refere
à competência do IBAMA para o licenciamento de construção capaz, sob
qualquer forma, de causar degradação ambiental.
Com o mesmo propósito, talvez, o Município colheu
ofício subscrito por engenheiro da Companhia de Saneamento Básico do
Estado de São Paulo - SABESP,de redação sucinta e confusa.
Presentes,
consubstanciados na plausibilidade
assim,
os
do direito
requisitos
autorizadores,
e no perigo da demora -
PODER JUDICIÁRIO
JUSTiÇA FEDERAL
caracterizado este pelo alto custo que envolverá o retorno à situação original
- CONCEDO a liminar para determinar a imediata paralisação da obra e a
remoção, no prazo de vinte dias, dos tapumes e instalações de operários lá
erguidos, de modo a ensejar, de forma plena, sua utilização pela população,
bem como para impedir no local a
promoção de novas edificações sem o
indispensável Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto
Ambiental - RIMA, sob pena de multa diária de RS20.000,OO.
Oficiem-se o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
Recursos Naturais Renováveis - IBAMA e a Companhia de Saneamento Básico
do Estado de São Paulo - SABESPpara ciência.
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ACP 20036104001402-4 SP - Meio Ambiente e Patrimônio