9. Magnetismo
Neste Capítulo, vamos explorar as diferentes manifestações do magnetismo em
materiais. Assim como no Capítulo anterior, que tratou dos materiais semicondutores,
vamos descrever uma área que têm não só uma física básica muito rica e interessante,
mas também enormes impactos na sociedade devido às aplicações em diversos
dispositivos, desde os ímãs permanentes até materiais usados em gravação magnética.
Veremos que há vários tipos de fenômenos magnéticos e estudaremos, em
particular, o diamagnetismo, o paramagnetismo, e o ferromagnetismo. Para o estudo
destes fenômenos, mais uma vez é fundamental a abordagem da Mecânica Quântica.
Assim, nosso ponto de partida é a análise dos efeitos introduzidos por um campo
magnético externo no Hamiltoniano atômica.
9.1 - Hamiltoniano atômico em um campo magnético
Vamos supor que conhecemos o Hamiltoniano eletrônico H 0  T0  V de um
átomo ou íon sem nenhum campo externo aplicado, e vamos analisar as modificações que
ocorrem neste Hamiltoniano quando introduzimos um campo magnético externo B. Estas
modificações surgem tanto no termo de energia cinética como na interação do campo
magnético com os spins eletrônicos.
Inicialmente, vamos analisar as modificações na energia cinética. A energia
cinética do átomo ou íon de N elétrons sem campo é
T0 
1 N 2
 pi .
2m i 1
(7.1)
Na presença de um campo magnético B descrito por um potencial-vetor A tal que

B    A , a energia cinética se modifica e assume a forma1:
T
1 N
 p i  eA 2 .
2m i 1
(9.1)

Por conveniência, vamos usar o calibre (gauge) de Coulomb, no qual   A  0 . Desta
1
forma (verifique!) podemos escrever o potencial-vetor como A   r  B . Por
2
1
Pode parecer estranho que a energia cinética seja modificada pela presença de um campo magnético, mas
isso é necessário para que o Hamiltoniano seja consistente com a força de Lorentz para uma partícula
carregada. A demonstração deste resultado está no Apêndice G do Kittel (cuidado apenas com o uso de
unidades c.g.s. nesse livro, enquanto aqui adotamos o SI).
141
conveniência, arbitramos que o campo magnético aponta na direção z: B  Bzˆ . Assim, o
potencial-vetor torna-se:
A
B
 yxˆ  xyˆ  .
2
(9.2)
Substituindo este resultado na expressão da energia cinética, encontramos



2
1 N
 i i  eA

2m i 1


1 N

  2  i2  ie  i  A  A   i  e 2 A 2

2m i 1
T



(9.3)


Sabendo que, no calibre de Coulomb, o operador  comuta com A (veja aqui2) e
substituindo em (9.3) a expressão (9.2), obtemos:
T


1 N  2 2

  e2 B2 2
2






i

eB
y

x

x

y

 .

i
i
i
i
i
 x
2m i 1 
yi 
4
i




(9.4)
Agora, identificamos nesta expressão a componente z do operador momento angular
adimensional do elétron i 3:


 
 .
l z ,i  xi p yi  yi p xi  i xi
 yi
xi 
 yi
(9.5)
Desta forma, a energia cinética torna-se:
T

1 N  2 2
e2 B2 2




e

Bl

xi  yi2  .

i
z ,i

2m i 1 
4



(9.6)
O primeiro termo da expressão acima nada mais é do que a energia cinética na ausência
de campo (T0). Podemos escrever o segundo termo como:
e  N 
  l i   B  BL  B ,
2m  i 1 

(9.7)

2




  A   A      A   A  

3
Por conveniência, vamos usar o operador momento angular e de spin adimensionais, em unidades de ħ.
0
142
onde
L é o momento angular total do conjunto de N elétrons e
e
B 
 0,579  10 8 eV/G é o magneton de Bohr. Finalmente, escrevemos então a
2m
variação na energia cinética T  T  T0 causada pela aplicação do campo magnético:
T   B L  B 
e2 B2
8m
 x
N
i 1
2
i
 yi2

(9.8)
O campo magnético interage também com os momentos magnéticos de spin dos
elétrons. A hamiltoniana H spin que descreve esta interação é
H spin  g 0  B S  B ,
(9.9)
onde S é a soma dos momentos angulares de spin de todos os elétrons e g 0  2,0023 é a
chamada fator g do elétron. Somando a hamiltoniana de spin com a variação da energia
cinética (9.8), chegamos finalmente à variação da Hamiltoniana do conjunto de N
elétrons causada pela introdução do campo magnético:
H   B L  g 0 S   B 
e2 B2
8m
 x
N
i 1
2
i
 yi2

.
(9.10)
Em última análise, esta hamiltoniana dá origem às mais diversas manifestações do
magnetismo nos átomos (e consequentemente nos sólidos), e é ela que vamos usar como
ponto de partida em nosso estudo do magnetismo.
9.2 - Diamagnetismo de Larmor-Langevin
Note que o primeiro termo da Eq. (9.10) é linear em B, enquanto que o segundo
termo é quadrático. Desta forma, espera-se que, na medida em que o campo magnético
possa ser tratado como uma perturbação, o primeiro termo deve ser muito mais relevante
que o segundo. No entanto, em átomos ou íons de camada fechada, ou seja, aqueles em
que os números quânticos de momento angular total L e spin total S são nulos no estado
fundamental4, o primeiro termo se anula, e assim o segundo termo passa a ser relevante.
É precisamente este segundo termo que dá origem ao fenômeno do diamagnetismo.
Vamos analisar em teoria de perturbação a variação causada na energia do estado
fundamental de um átomo ou íon de camada fechada devido ao termo diamagnético. Seja
0 o estado fundamental e E 0 a sua energia não-perturbada, de modo que:
H 0 0  E0 0 .
4
Como veremos em breve na nossa descrição das chamadas Regras de Hund.
143
(9.11)
Como dissemos, a perturbação diamagnética é o segundo termo da Eq. (9.10):
H dia
e2 B2

8m
 x
N
i 1
2
i

 yi2 .
(9.12)
Assim, em primeira ordem de teoria de perturbação, a energia do estado fundamental é
alterada por:
E0  0 H dia 0 


N
e2 B2
0  xi2  yi2 0 .
8m
i 1
(9.13)
Esta expressão está escrita de maneira muito particular devido à escolha da direção z para
a orientação do campo magnético. Podemos torná-la mais geral se lembrarmos que
ri 2  xi2  yi2  z i2 e, no caso de um átomo esfericamente simétrico,
x
2
i
 y
2
i
 z
2
i

ri 2
3
.
(9.14)
Assim, obtemos finalmente
e2 B2 2
E0 
0 ,
12m
(9.15)
N
onde  02  0  ri 2 0 .
i 1
As duas quantidades de maior interesse experimental em magnetismo são a
magnetização e a susceptibilidade magnética. A magnetização M é o momento
magnético por unidade de volume V do sólido, e é formalmente definida por
M 
1 F
,
V B
(9.16)
onde F  E  TS é a energia livre de Helmholtz. Já a susceptibilidade χ é proporcional à
derivada da magnetização com relação ao campo:
  0
 2F
M
 0
B
V B 2
(9.17)
Voltando ao caso do diamagnetismo, vamos supor que nosso sólido é uma coleção de N
átomos de camada fechada, a temperatura zero. Neste caso, a magnetização será
M 
ne 2  02 B
1 NE0 

,
V
B
6m
144
(9.18)
onde n  N / V é a densidade. Note que a magnetização diamagnética é proporcional e
tem direção contrária ao campo. Isso nos lembra a Lei de Lenz do eletromagnetismo
clássico: para se opor à variação de um fluxo magnético em um circuito fechado, surgem
correntes induzidas que produzem um momento magnético contrário ao campo aplicado.
O diamagnetismo de Larmor-Langevin sugere esta interpretação a nível microscópico
(atômico).
Vamos calcular agora a susceptibilidade:
  0
 ne 2  02
M
.
 0
B
6m
(9.19)
Note que a susceptibilidade é negativa e constante (independente do campo). Esta é a
assinatura experimental do diamagnetismo.
9.3 - Regras de Hund
Vamos agora analisar o magnetismo de átomos ou íons que não têm camada
fechada e que portanto podem ter momento angular e/ou de spin diferentes de zero. Para
proceder com esta análise, precisamos desenvolver um conjunto de regras que nos
permita prever, a partir da estrutura eletrônica do átomo, quais os seus números quânticos
L e S. A este conjunto de regras empíricas dá-se o nome de regras de Hund.
Vamos supor que um dado átomo ou íon tem a última camada com estados nãopreenchidos de momento angular orbital l. Desta forma, levando-se em conta as duas
orientações de spin e os 2l  1 valores possíveis do número quântico lz, há um total de
2  2l  1 estados possíveis de 1 elétron para este sistema. Se estes níveis são semipreenchidos com um número n de elétrons, há uma enormidade de combinações possíveis
para se ocupar estes estados. Devido à interação elétron-elétron e ao acoplamento
spin-órbita, estas diferentes combinações têm energias diferentes. As regras de Hund
descrevem, para cada átomo, a combinação que resultará na menor energia.



Sejam L o momento angular orbital total, S o spin total e J = L + S o momento
angular total.
J, L e S aproximadamente comutam com H0 (desprezando acoplamento spinórbita L.S, este sendo importante apenas para átomos pesados).
Números quânticos: L, Lz, S, Sz, J, Jz
Operadores
L2
Lz
S2
Sz
J2
Jz
Autovalores
L(L+1)
Lz
S(S+1)
Sz
J(J+1)
Jz
145
Regras de Hund
1. Spin total S é máximo
S máximo = valor máximo de Sz consistente com Princípio de Exclusão.
2. L é máximo
Consistente com a primeira regra e com o Princípio de Exclusão.
 L  S , se n  2l  1
3. J  
L  S , se n  2l  1
Exemplos:
1. Íon de Cr+2 - camada não-preenchida: 3d4
lz =
2
1
0
-1
-2
S  2

L   l z  2

J  0
Notação espectroscópica: Termo 2S+1XJ, onde X = S, P, D, F, G, H, I,... para L = 0, 1, 2,
3, 4, 5, 6,... respectivamente.
Assim, no caso do Cr+2, o termo é 5D0.
2. Íon de Er+3 - camada não-preenchida: 4f11
lz =
3
2
1
0
-1
-2
-3
S  3 / 2

L  6
 J  15 / 2

Notação espectroscópica: 4I15/2.
146
9.4 - Paramagnetismo em isolantes




Vamos agora analisar o paramagnetismo de isolantes contendo íons com J ≠ 0
Definido o valor de J no estado fundamental sem campo magnético aplicado,
temos agora uma degenerescência de (2J+1) níveis no estado fundamental,
correspondendo aos diferentes valores de Jz
O campo magnético aplicado na direção z quebra esta degenerescência. A
perturbação agora é o primeiro termo da Eq. (9.10). Lembrando da teoria de
perturbação degenerada, para encontrarmos os níveis de energia com o campo
magnético aplicado temos que diagonalizar a matriz
 B B JLSJ z Lz  g 0 S z  JLSJ z
Pelo Teorema de Wigner-Eckart (veja por exemplo o livro de Mecânica Quântica
do Cohen-Tannoudji, p. 1055)
 B B JLSJ z Lz  g 0 S z  JLSJ z   B Bg ( J , L, S ) JLSJ z J z JLSJ z
  B Bg ( J , L, S ) J z  J z , J z


Ou seja, é uma matriz diagonal nesta base
J ( J  1)  S ( S  1)  L( L  1)
é o fator g de Landé (veja Ashcroft,
g ( J , L, S )  1 
2 J ( J  1)
Apêndice P)
Lembre-se que Jz pode assumir 2J+1 valores: -J, -J+1, ..., J-1, J. Assim, os níveis
de energia com o campo aplicado têm os valores g B J z B , como mostra a figura
abaixo
B≠0
Jz = J
B=0
2J + 1 níveis
degenerados

Jz = - J
A função de partição Z para este sistema se escreve: Z 
J
 exp g
J Z  J
B
BJ z  ,
onde   1 k BT . Trata-se da soma de uma progressão geométrica com razão
exp g B B  , de modo que o resultado é:
e  g B BJ e  gB B  e gB BJ e gB B  J 1 2   e  gB B  J 1 2 

 exp F  , onde F é a
e gB B  1
e g B B 2  e g B B 2
energia livre de Helmholtz.
Z
147

A partir desse resultado podemos calcular a magnetização para um conjunto de N
N F
íons em um sólido: M  
. Após alguma álgebra, chega-se no resultado:
V B
2J 1
N
 2J 1  1
 x 
coth
x 
coth
M  g B JBJ g B JB, onde BJ ( x) 
é a
2J
V
 2J
 2J
 2J 
chamada função de Brillouin.

O gráfico abaixo mostra o comportamento da função de Brillouin (e, portanto, da
magnetização) para alguns valores de J:
http://moxbee.blogspot.com.br/2010/11/chapter-7-magnetic-properties-of.html

Podemos interpretar esse resultado da seguinte maneira: Para valores altos de
g B JB
, ou seja, campos magnéticos altos ou temperaturas baixas, a
x
k BT
magnetização atinge o seu valor máximo, ou valor de saturação:
N
N
M sat  g B J   (lembre-se que o momento magnético é μ   g B J ). Isso
V
V
corresponde à situação em que todos os momentos magnéticos estão orientados na
mesma direção. No limite oposto, ou seja, para valores pequenos de x (campos
magnéticos baixos ou temperaturas baixas), os momentos magnéticos tendem a se
orientar aleatoriamente e a magnetização vai gradualmente a zero. No
paramagnetismo, existe portanto uma competição entre dois efeitos: o campo
magnético, que tenta orientar todos os momentos magnéticos na mesma direção, e
a temperatura, que tenta torná-los com orientação desordenada.
148

Vamos analisar com mais detalhe o comportamento para x  1 , ou seja,
k BT  g B JB (temperaturas altas ou campos baixos). Neste limite,
1 1
coth x   x  O( x 3 ) . Assim, a magnetização torna-se:
x 3
N
2 J ( J  1)
M   g B 
B.
V
3k BT
Ou seja, a magnetização é positiva e proporcional ao campo. Dela podemos
extrair a susceptibilidade:
M N
2 J ( J  1)
  0
  0  g B 
B V
3k B T
A susceptibilidade positiva é uma assinatura do paramagnetismo, em contraste
com a susceptibilidade negativa do diamagnetismo. Além disso, nota-se a
dependência com a temperatura na forma de  ~ 1 T , que é conhecido como Lei
de Curie:
9.5 - Paramagnetismo de Pauli em metais

Vamos analisar agora a resposta magnética de elétrons deslocalizados em metais.
Suponha um modelo de elétrons livres:
D(ε)
Spin +1/2 (paralelo a B) - E  E   B B
Spin -1/2 (antiparalelo a B) - E  E   B B
149

Magnetização: M   B N   N     B  2 B B  

Susceptibilidade:  Pauli   0

Além
disso,
elétrons
de
D F 
  B2 D F B
2
M
  0  B2 D F  (independente de T)
B
condução
Diamagnetismo de Landau -  Landau
exercem
1
   Pauli
3
blindagem
diamagnética:
9.6 - Origens da interação magnética

Interação entre spins causa magnetização espontânea mesmo com B = 0

Qual a origem da interação entre spins?

Interação
dipolar
magnética
tem
magnitude
muito
pequena:
 
 
U  1 3 2  104 eV , menor que energia térmica a temperatura ambiente, seria
r
insuficiente para ordenar os spins
μ1
μ2
r

Na verdade, a interação entre os spins é surge principalmente devido à
combinação entre interação coulombiana e estatística de férmions (anti-simetria
da função de onda eletrônica): interação de troca ("exchange")

Vamos ilustrar esse fenômeno tomando como exemplo a molécula de H2 (dois
prótons e dois elétrons)
Cada elétron tem s = 1/2 e portanto sz = +1/2 (↑) ou -1/2 (↓).
Assim, construímos os autoestados de spin de 2 elétrons:
S
Sz
Denominação
Auto-estado
Singleto
0
0
1
  
2
1
1


Tripleto

 
2
1
 


150
1
0
1
-1

Para o estado singleto, o estado de spin é anti-simétrico pela permutação dos
elétrons, enquanto que para o tripleto o estado de spin é simétrico. Como elétrons
são férmions, a função de onda total deve ser anti-simétrica. Isso implica em que a
parte espacial deve ser simétrica para o singleto e anti-simétrica para o tripleto:
Por exemplo, na chamada aproximação de Heitler-London, se escreve a parte
espacial dos estados singleto e tripleto como:
s 
t
1
2
a r1 b r2   a r2 b r1 ,
onde r1 e r2 são as posições dos dois elétrons e  a e b são orbitais atômicos
localizados nos dois prótons a e b.

Assim, os dois estados de spin distintos dão origem a partes espaciais distintas,
que consequentemente terão energias diferentes (ainda que a Hamiltoniana não
dependa explicitamente das coordenadas de spin):
 s H  s  E s (energia do singleto)
 t H  t  Et (energia do tripleto)
Tipicamente podemos ter diferenças de energia entre singleto e tripleto da ordem
de 0,1 a 1 eV. Essa é a chamada energia de troca, que é a energia
primordialmente responsável pela ordem magnética na maioria dos materiais

Ainda que a Hamiltoniana não dependa das coordenadas de spin, a discussão
acima nos permite escrever uma Hamiltoniana efetiva de dois spins, que
reproduz as energias dos estados singleto e tripleto. Consideremos os operadores
  


de spins para os dois elétrons, s1 e s 2 , e o spin total S  s1  s 2 . Sabemos que
11  3
s12  s 22    1 
22  4
151
Daí podemos obter os autovalores de S2:
  2
 
  0, para S  0
3
S 2  s1  s 2   s12  s 22  2s1  s 2   2s1  s 2  
2
2, para S  1
 
   3 4 , (singleto)
Assim, os valores possíveis para s1  s 2 são s1  s 2  
1 4 , ( tripleto)
Desta forma, nossa hamiltoniana efetiva de spin se escreve:
H spin 
1
E s  3Et   E s  Et s1  s2
3
Verifique que esta Hamiltoniana fornece os valores corretos da energia para os
estados de singleto e tripleto, ou seja:
H spin s  E s s
H spin t  Et t

Podemos redefinir nosso zero de energia para eliminar o primeiro termo da
Hamiltoniana de spin e simplificá-la:
 
H spin   Js1  s 2
onde J  Es  Et  é a chamada constante de troca.

Generalizando essa abordagem para um sólido com N spins, chegamos na
Hamiltoniana de Heisenberg:
 
H   J ij si  s j ,
ij
onde o somatório é sobre todos os pares de spin ij . Note que o caso de J > 0
favorece um alinhamento entre os spins, o que chamamos de estado ferromagnético. Por
outro lado, J < 0 favorece spins anti-paralelos, o chamado estado antiferromagnético.
9.6 - Ferromagnetismo: Teoria de campo médio

Vamos considerar o caso ferromagnético (J > 0), que vai dar origem a um sistema
de spins alinhados mesmo com campo B = 0. Note que a temperatura pode
desalinhar os spins, de modo que devemos esperar que a magnetização como
função da temperatura (com B = 0) deva apresentar um comportamento
qualitativo como o mostrado na figura abaixo:
152
M
M(0)

O gráfico acima é um exemplo de uma transição de fase que ocorre a uma
temperatura crítica TC (neste caso conhecida como temperatura de Curie). Para
T < TC temos a fase ferromagnética, com o spins apresentam algum alinhamento
e portanto magnetização finita, enquanto que para T > TC temos a fase
paramagnética, com spins desalinhados e magnetização nula a campo zero.

Vamos descrever quantitativamente este comportamento através de uma teoria de
campo médio para spins 1/2. Lembramos que no caso do paramagnetismo
tínhamos a magnetização como função do campo magnético que (no caso de J =
1/2) era dada por:
 B
M   B tanh  B 
 k BT 
(esta é a magnetização média por íon, e não por volume). Um gráfico esquemático
da magnetização (dividida pela magnetização de saturação M (0)   B ) como
função do campo pode ser visto abaixo:
B
153


Podemos utilizar este resultado para descrever um ferromagneto, supondo que a
interação entre os spins possa ser representada por um campo magnético interno
efetivo Bint. A teoria de campo médio consiste em supor que esse campo
magnético é proporcional à magnetização média do sistema M. Ou seja, perde-se
informação sobre as correlações locais entre os spins. Assim:
Bint  M
Substituindo este resultado na expressão para a magnetização de um paramagneto,
chegamos ao resultado:
  M
M   B tanh  B
 k BT



 M
Fazemos agora a substituição de variáveis m  B
, de modo que a equação se
k BT
torna:
k BT
m  tanh m
2
B

Podemos encontrar graficamente a solução desta equação, como está ilustrado na
figura abaixo:
T = Tc
T < Tc
m

A temperatura crítica é obtida a partir da condição de que a derivada da reta
descrita pelo lado esquerdo da equação seja igual a 1:
Tc 
154
 B2 
kB

A partir da teoria de campo médio, podemos encontrar o desvio da magnetização
de saturação para baixas temperaturas, M  M (0)  M (T ) . Para isso, basta
expandir a tangente hiperbólica:
lim tanh x  1  2e 2 x
x 
Deste modo, e sabendo que M (0)   B , obtemos:
M (T  0)  M (0)  2 B e  2  B M ( 0) k BT
2
M
 2  B e  2  B  k BT
M (0)

Portanto a teoria de campo médio prevê uma dependência exponencial do desvio
 k T
da magnetização de saturação a baixas temperaturas e B , o que sugere um gap
de energia no espectro de excitações do sistema.
Referências:
- Ashcroft e Mermim, Capítulos 31 a 33.
- Kittel, Capítulos 14 e 15.
- Ibach e Lüth, Capítulo 8.
155
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9. Magnetismo - Instituto de Física / UFRJ