ANÁLISE JURÍDICA DIREITO IMOBILIÁRIO
Outubro 2012
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Investimentos imobiliários no Brasil pelo
programa Minha Casa, Minha Vida
Maíra Lott · [email protected]
Marta Borsoi · [email protected]
Telma Hirata · [email protected]
Advogadas no Desk Brasil da Abreu Advogados
O progresso económico vivenciado pelo
Brasil nos últimos anos teve influência direta no crescimento do mercado imobiliário do país. Tal crescimento pode ser atribuído à evolução dos fundamentos deste
segmento, que inclui a exigência de que
os bancos efetivamente destinem parte
de seus recursos a empréstimos imobiliários, o aperfeiçoamento jurídico dos
instrumentos de garantia de crédito e a
ampliação dos direitos dos consumidores
como meio gerador de equilíbrio nas relações destes face às empresas.
Como consequência do desenvolvimento dos fundamentos do mercado imobiliário foram introduzidas significativas alterações nos elementos relacionados ao
crédito imobiliário, como o aumento dos
prazos de pagamento, a redução das taxas de juros, a flexibilização na análise da
renda familiar e a desburocratização na
contratação.
A conjunção de todos estes fatores
com o acréscimo decorrente do aumento do rendimento das famílias, da estabilidade dos preços e da diminuição da
taxa de desemprego estimularam os brasileiros a utilizarem o crédito imobiliário
como ferramenta para aquisição da casa
própria.
As políticas sociais implementadas no
Brasil durante a última década propiciaram
a ascensão de milhões de pessoas a uma
classe social que passou a ter maior rendimento familiar e capacidade de consumo,
mas que ainda não possui casa própria.
Como alternativa para suprir o deficit habitacional das classes sociais de baixa e
média renda, que integram a maioria da
população brasileira, o governo federal
criou o Programa Minha Casa Minha Vida
(PMCMV).
Programa Minha Casa Minha Vida
(PMCMV)
Instituído em 2009 e vinculado aos bancos públicos brasileiros – Caixa Económica
Federal (CEF) e Banco do Brasil, o PMCMV
estabelece mecanismos de incentivos à produção e aquisição de novas unidades habitacionais, urbanas ou rurais, mediante a oferta
de subsídios a fundo perdido e inversamente proporcionais à renda familiar, além de
taxas de juros mais reduzidas daquelas disponíveis no mercado, sendo tais benefícios
aplicáveis conforme as variáveis da faixa de
rendimentos mensais das famílias quando
dentro dos limites do Programa.
Na primeira etapa do PMCMV (2009/2010)
foram contratadas mais de um milhão de
unidades habitacionais. Para a segunda
etapa do Programa (até 2014) o governo
brasileiro pretende alcançar a meta de 2,4
milhões de unidades habitacionais, disponibilizando investimentos que atingem a
quantia de 71 bilhões de reais.
Recentemente, o governo brasileiro procedeu à alterações da legislação do PMCMV
que, em aspetos gerais, contribuíram para
ampliar o limite de renda para financiamentos de habitações populares, aumentar o valor máximo dos imóveis, reajustar a quantia
atribuída aos subsídios e diminuir a taxa de
juros. Este segmento do mercado imobiliário brasileiro tornou-se um mercado real amplamente atrativo ao investimento.
Requisitos para os investimentos
no âmbito do PMCMV
A Caixa Económica Federal (CEF) – agente
operador e financeiro do PMCMV - disponibiliza material com informações e especificações detalhadas para adesão ao Programa,
que permite a participação de empresas
atuantes no setor de construção civil e/ou
incorporação imobiliária, através da apresentação de projetos junto às Superintendências
Regionais da referida instituição financeira.
Os projetos precisam atender às especificações estabelecidas pelo Programa,
como área mínima das habitações, parâmetros legais de construção, materiais de revestimentos e acabamentos, além daqueles que envolvem o empreendimento, tais
como localização, adequação ambiental,
infraestrutura básica (como vias de acesso,
iluminação pública, abastecimento de água
e energia eléctrica) e existência ou o respetivo compromisso com o poder público
local para instalação ou ampliação de equipamentos e serviços relacionados à educação, saúde, lazer e transporte público.
Para os empreendimentos imobiliários
serem enquadrados no PMCMV, a CEF
procede à:
• análise do risco da operação – viabilidade do empreendimento;
• análise de risco da construtora e/ou
incorporadora imobiliária apresentante do projeto – para a avaliação das
condições económico-financeiras da
empresa, com validade de um ano;
• análise de engenharia e trabalho social
– inclui a verificação das condições do
projeto arquitetónico, valor de mercado
das unidades habitacionais e enquadramento no Programa, orçamento da obra,
além da análise do cronograma físico-financeiro para observar a viabilidade e a
coerência entre a execução da obra e o
desembolso financeiro programado;
• análise jurídica – verificação da situação jurídica do imóvel, vendedor,
construtor, seus sócios e representantes.
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Sobre os requisitos exigidos para enquadramento no PMCMV, importa ressaltar aquele referente à análise de risco
da empresa participante do projeto. Isto,
porque no processo habitacional brasileiro
é comum que as instituições considerem
o risco vinculado à figura das construtoras
e/ou incorporadoras imobiliárias (com avaliação da empresa, verificação dos últimos
balanços e outros aspetos além dos financeiros) como fator decisivo para financiarem seus projetos.
Neste sentido, especialistas do mercado imobiliário aconselham, como forma
alternativa para viabilizar o investimento
de estrangeiro neste setor, a busca de
parcerias com empresas brasileiras que
já atuam na área de construção civil e/
ou incorporação imobiliária. Para tais casos recomenda-se que, previamente ao
investimento, seja realizado o exame das
informações relativas a possível empresa
parceira, como idoneidade, ausência de
débitos pendentes e/ou acções judiciais
que afetam o património, bem como das
condições relacionadas ao projeto do
empreendimento imobiliário, para confirmação do atendimento dos requisitos
e efetiva vinculação ao PMCMV, além da
obtenção das garantias necessárias para
assegurar o investimento.
Aprovados, os projetos podem ser financiados por uma das linhas de financiamento à produção do PMCMV. Cabe ao
ente púbico local, do município ou estado,
a partir do cadastro que mantém das famílias com baixa renda e que demandem
habitações, fornecer a lista de beneficiários do Programa. Na ocasião em que for
formalizada a aquisição do imóvel pelo beneficiário procede-se à concessão dos benefícios vinculados ao PMCMV, momento
também em que o vendedor do empreendimento passa a ter direito aos recursos
financeiros.
Formas de Investimento
Os veículos utilizados para se investir no
PMCMV, subsumem-se, essencialmente,
às empresas do ramo da construção civil que podem ser constituídas no Brasil
pelos empreendedores estrangeiros, aos
quais, não obstante, também há a opção
de se associarem às companhias já existentes no país ou mesmo estruturarem
parcerias comerciais imobiliárias.
É certo que, em se tratando de construção ou reforma de imóveis, haverá
o envolvimento de incorporadoras e/ou
construtoras para que seja possível atingir
o seu fim.
No Brasil, a incorporação de imóveis,
semelhante à promoção imobiliária em
Portugal, mas com regulamentação jurídica específica, é a atividade exercida com o
intuito de promover e realizar a construção
para a alienação, total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas por unidades autónomas; enquanto
a construção civil se limita propriamente à
construção, demolição, reforma, ampliação de edificação ou qualquer outra benfeitoria agregada ao solo ou ao subsolo.1
No caso de o investidor preferir pela
constituição de empresa no Brasil, destaca-se que os tipos societários mais
comuns são a sociedade anónima e a sociedade por quotas de responsabilidade
limitada, modelos estes que serão adotados dependendo do interesse e do grau
de complexidade do investimento.
Entretanto, não é imprescindível que
o investidor estrangeiro constitua ou se
associe a uma sociedade por quotas ou
uma sociedade anónima do setor imobiliário no Brasil para viabilizar o seu projeto, uma vez que pode, ainda, se valer de
outros tipos de associação, com ou sem
personalidade jurídica própria, para a formatação de uma parceria. O ordenamento
jurídico brasileiro prevê três modalidades
que vêm sendo muito utilizadas no mercado: a Sociedade de Propósito Específico
(SPE), a Sociedade em Conta de Participação (SCP) e o Consórcio.
A SPE, que pode tanto ter a estrutura de
uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada como de uma companhia
S.A., conforme sugere o nome, trata-se
de uma sociedade com o propósito perfeitamente determinado. Ela se sujeita
às mesmas regras no que diz respeito à
natureza jurídica, responsabilidade entre
sócios e perante terceiros do tipo societário eleito no ato da sua constituição. O
grande diferencial é que, para o investidor, comprador e instituição financeira,
no modelo da SPE, existe uma diminuição
de riscos para todas as partes envolvidas, na medida em que é possível isolar
o empreendimento específico de outros
empreendimentos ou de outras atividades
comerciais dos seus controladores (blindagem patrimonial), de forma a permitir
uma ingerência mais fácil sobre os ativos
e recebíveis do empreendimento pelos
agentes financiadores, em caso de incumprimento.
A SCP, à semelhança do contrato de
associação em participação do direito
português, por seu turno, não deve ser
tratada propriamente como uma sociedade, pelo facto de não ser dotada de
personalidade jurídica. Caracteriza-se, na
realidade, como um contrato especial de
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investimento em que, nos termos do artigo 991 do Código Civil brasileiro (Lei nº
10.406/2002), a atividade para a execução
do objeto contratual deverá ser desenvolvida “unicamente pelo sócio ostensivo,
em seu nome individual e sob sua própria
e exclusiva responsabilidade”, enquanto os
demais sócios participarão apenas dos resultados correspondentes. Em verdade, é
um contrato entre duas pessoas, no qual o
sócio ostensivo (também dito operacional)
é responsável pela execução integral das
atividades relacionadas ao objeto social,
que no caso de uma parceria internacional
seria o parceiro brasileiro; e o sócio participante (também dito investidor ou oculto),
responsável unicamente pelo aporte de
recursos necessários para empreender as
atividades relacionadas ao objeto social,
que na hipótese da parceria internacional
seria o investidor internacional.
Todavia, tratando-se de investidor estrangeiro que tencione a posterior remessa dos lucros para o país de origem, por
ocasião da constituição de uma SCP, deverão ser adotados mecanismos jurídicos
que permitam o repatriamento do capital
estrangeiro investido2, tendo em vista a
vedação legal de registo, no Banco Central do Brasil, do investimento direto de
capital estrangeiro em SCP(s).
Finalmente, tem-se a forma consorciada de empresas (consórcio), expressa por
meio de um Termo de Consórcio, que é
um contrato de associação pelo qual duas
ou mais empresas se propõem a executar, em conjunto, determinado empreendimento. Também regulado no direito
português. Da mesma forma que a SCP,
o Consórcio não possui personalidade
jurídica, mantendo-se a estrutura jurídico-tributária de cada uma das empresas con-
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sorciadas, em que a carga fiscal incidirá
unicamente no ingresso de receita nas
pessoas consorciadas.
Incentivo Fiscal
De forma a incentivar a participação de
incorporadoras e construtoras no PMCMV,
a legislação brasileira confere tratamento
diferenciado quanto ao recolhimento de
determinados tributos, ou seja, um incentivo fiscal por meio da instituição de base
de cálculo e de taxa tributária diferenciadas, a fim de estimular a participação de
agentes do setor privado em projetos promovidos pelo governo.
Desta feita, há a previsão de que até 31
de dezembro de 2014 seja concedido benefício fiscal aos projetos de incorporação
que tiverem como objeto a construção de
imóveis residenciais de interesse social,
desde que cada unidade residencial tenha
um valor comercial de até R$ 85.000,00
(oitenta e cinco mil reais).
Às empresas envolvidas faculta-se o
recolhimento, de forma unificada, das
Contribuições para o Programa de Integração Social e para o Programa de Formação do Servidor Público (PIS/PASEP),
da Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social (COFINS), do Imposto
de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) 3 e da
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), no percentual de 1% (um por
cento) sobre a receita mensal recebida,
relativa àquela construção fomentada,
com a seguinte repartição: 0,09% - PIS/
PASEP; 0,44% - COFINS; 0,31 % - IRPJ;
e 0,16% - CSLL. 4
Deve-se deixar claro que a receita mensal auferida refere-se ao valor recebido
pelo contrato feito com os entes estatais
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para a construção de habitações que fazem parte do Programa examinado, e não
ao faturamento total da incorporadora ou
construtora, de modo que estas devem
manter a escrituração contábil segregada
para cada incorporação submetida ao regime de tributação diferenciado.
Considerações Finais
Verifica-se que o investimento imobiliário no Brasil, pelo PMCMV, é uma opção
de análise atrativa para os investidores do
setor, tendo em conta não só a variedade
de mecanismos jurídicos adequados à estrutura de investimento que corresponda
ao perfil do seu titular, mas também os
benefícios fiscais no âmbito do Programa,
tudo com olhos postos à redução de riscos e maximização dos lucros do capital
investido.
NOTAS
1 A incorporadora é a empresa responsável por
administrar todo o processo de compra, construção e
venda de imóveis, além de contratar e supervisionar a
execução da obra, feita pela construtora. Por sua vez,
a construtora tem o único papel de fazer a construção
do imóvel, de acordo com o que foi definido pela
incorporadora.
2 Conforme questão nº 9 do Frequently Asked Questions
(FAQ) do Banco Central do Brasil (BACEN). Disponível em:
<http://www.bcb.gov.br/?investemprestfaq>.
3 Equivalente ao Imposto sobre o Rendimento das
Pessoas Coletivas (IRC).
4 Regra geral, a carga tributária da atividade de
incorporação imobiliária no Brasil relativa aos tributos
federais, adotando-se o regime tributário com base no
lucro presumido, será de 6,99% da receita bruta auferida
pela pessoa coletiva, com a seguinte distribuição: PIS
- 0,65%; COFINS - 3,00 %; IRPJ - 2,26% (1,2% + 1,06%
- adicional de 10%); CSLL - 1,08% (9% x 12% da receita
bruta/100). Caso não haja o adicional do IRPJ, o total da
carga tributária relativa aos tributos federais reduz-se
para 5,93%.
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