Acordão do Supremo Tribunal Administrativo Acórdãos STA Página 1 de 5 Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: Data do Acordão: Tribunal: Relator: Descritores: 0886/14 19-11-2014 2 SECÇÃO ISABEL MARQUES DA SILVA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL TEMPESTIVIDADE REVISÃO OFICIOSA Sumário: I – Não apenas o pedido de revisão apresentado dentro do prazo de reclamação administrativa, mas também o pedido de revisão oficiosa da liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços apresentado no prazo de 4 anos, aproveitam ao sujeito passivo para efeitos de lançar mão da impugnação judicial. II – O “erro imputável aos serviços” a que alude o artigo 78.º, nº 1, in fine, da LGT compreende não só o lapso, o erro material ou o erro de facto, como, também, o erro de direito, e essa imputabilidade aos serviços é independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na emissão da liquidação afectada pelo erro. Nº Convencional: Nº do Documento: Data de Entrada: Recorrente: Recorrido 1: Votação: JSTA000P18235 SA2201411190886 15-07-2014 A............, LDA FAZENDA PÚBLICA UNANIMIDADE Aditamento: Texto Integral Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório 1 – A…………, Lda., com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 31 de Janeiro de 2014, que, na impugnação judicial por si deduzida do indeferimento de pedido de revisão oficiosa de liquidação de IRC relativa ao ano de 1999, no montante de €347.060,19, julgou verificada a excepção de caducidade do direito de deduzir impugnação, absolvendo a Fazenda Pública do pedido. A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: A) A douta sentença sob recurso interpreta e aplica erradamente o preceituado no art. 78.º, n.º 1, da LGT, ao considerar que os fundamentos alegados pela recorrente no pedido de revisão da liquidação impugnada não se subsumem à noção de erro imputável aos serviços B) Constitui erro imputável aos serviços, nos termos e para http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b3c77daecf855a348... 09-12-2014 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo Página 2 de 5 os efeitos do n.º 1 do art. 78.º da LGT, toda e qualquer ilegalidade de actos tributários de liquidação que não seja imputável ao contribuinte. C) a interpretar-se a norma ínsita no n.º 1 do art. 78.º da LGT em termos restritivos que constam da douta sentença sob recurso, a mesma é inconstitucional por violação dos princípios da legalidade, da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efectiva D) O pedido de revisão foi apresentado, pois, tempestivamente, do mesmo modo que tempestivamente foi apresentada a impugnação judicial Nestes termos e nos demais de direito, deve ser concedido provimento ao presente recurso, com a consequente revogação da douta sentença recorrida e a final procedência da impugnação, como é de JUSTIÇA. 2 – Não foram apresentadas contra-alegações. 3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 151 e 152 dos autos, concluindo no sentido de que deve dar-se provimento ao recurso, revogar-se a sentença recorrida, baixando os autos à 1.ª instância para apreciação do mérito da causa. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. - Fundamentação 4 – Questão a decidir É apenas a de saber se, como decidido, é intempestiva a impugnação judicial deduzida pela ora recorrente do indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação oficiosa de IRC sindicado. 5 – Matéria de facto: A decisão recorrida deu por assentes os seguintes factos, tidos como relevantes para a decisão da questão prévia da caducidade do direito de impugnar: A) À impugnante foi liquidado adicionalmente o IRC de 1999, liquidação com o n.º 200318310019436, emitida em 18/11/2003, no montante de €347.060,19, com o prazo limite de pagamento voluntário em 18/01/2004, cf. PA junto aos autos. B) Em 08/10/2003 a Impugnante apresentou pedido de revisão nos termos do art. 91.º da Lei Geral tributária (LGT), que por falta de acordo resultou na liquidação adicional aqui impugnada e supra identificadas, cf. PA junto aos autos. C) Em 2005 a Impugnante apresentou um pedido de http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b3c77daecf855a348... 09-12-2014 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo Página 3 de 5 revisão da liquidação adicional supra identificada, tendo dado origem ao processo n.º 3326/2005, nos termos do art. 78.º da LGT com os seguintes fundamentos: “não se verificam os pressupostos legalmente definidos para a utilização de métodos indirectos; o concreto método indirecto utilizado na sequência do parecer do perito da administração tributária não só não está fundamentado como não satisfaz as exigências legais relativas a tal metodologia de tributação; ocorreu ilegal alteração nas decisões do procedimento de revisão da fixação inicialmente efectuada; a quantificação por métodos indirectos enferma de erro que os rácios que resultam da fixação efectuada evidenciam; a fixação efectuada com recurso a métodos indirectos enferma de injustiça grave e notória”, cf. PA junto aos autos e fls. 32 e 33 da PI. D) Tal pedido mereceu despacho de indeferimento em 26/09/2007 e notificado à impugnante pelo ofício nº 7334 de 26/11/2007, cf PA junto aos autos. E) A presente impugnação foi remetida em 27/02/2008, por fax, para este TAF, cf. fls. 2 dos autos. 6 – Apreciando. 6.1 Da caducidade do julgada extemporaneidade da impugnação judicial A decisão recorrida, a fls. 120 a 124 dos autos, julgou verificada a excepção de caducidade do direito de impugnar, suscitada pela Fazenda Pública na sua contestação e corroborada pelo Ministério Público em 1.ª instância, no entendimento de que tendo o pedido de revisão oficiosa sido apresentado para além do prazo de reclamação administrativa, e atento a que os fundamentos do pedido são de ilegalidade da liquidação, a intempestividade do pedido de revisão oficiosa afecta o prazo para a apresentação da presente impugnação que, em consequência, tem de se considerar intempestiva (cfr. decisão recorrida, a fls. 124 dos autos). Discorda do decidido a recorrente, imputando à decisão recorrida erro de julgamento ao considerar que os fundamentos alegados pela recorrente no pedido de revisão da liquidação impugnada não se subsumem à noção de erro imputável aos serviços, alegando que para efeitos do n.º 1 do artigo 78.º da LGT constitui erro imputável aos serviços toda e qualquer ilegalidade de actos tributário de liquidação que não seja imputável ao contribuinte, que a interpretação restritiva do disposto no http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b3c77daecf855a348... 09-12-2014 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo Página 4 de 5 n.º 1 do artigo 78.º da LGT adoptada pela decisão recorrida é inconstitucional, por violação dos princípios da legalidade, da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efectiva, concluindo ter sido tempestivamente apresentado o pedido de revisão e a impugnação judicial do seu indeferimento. O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto no seu parecer junto aos autos pronunciou-se no sentido no provimento do recurso. Vejamos. Decorre da lei e constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal que a revisão oficiosa de actos tributários a que alude a parte final do n.º 1, do art. 78.º da LGT “por iniciativa de administração tributária” pode realizar-se a pedido do contribuinte (art. 78.º n.º 7 da LGT), sendo o indeferimento, expresso ou tácito, desse pedido de revisão susceptível de impugnação contenciosa, nos termos do art. 95.º n.º 1 e 2, al. d) da LGT e art. 97.º, n.º 1, al. d) do CPPT, quando estiver em causa a apreciação da legalidade do acto de liquidação e não prejudicando essa possibilidade a circunstância do pedido de revisão oficiosa ter sido apresentado muito depois de esgotados os prazos de impugnação administrativa, mas dentro do prazo dos 4 anos para a revisão do acto de liquidação “por iniciativa de administração tributária”. É que, contrariamente ao decidido, tem desde há muito entendido este Supremo Tribunal de forma pacífica que existindo um erro de direito numa liquidação efectuada pelos serviços da administração tributária, e não decorrendo essa errada aplicação da lei de qualquer informação ou declaração do contribuinte, o erro em questão é imputável aos serviços, pois tanto o n.º 2 do artigo 266° da Constituição como o artigo 55° da Lei Geral Tributária estabelecem a obrigação genérica de a administração tributária actuar em plena conformidade com a lei, razão por que qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável à própria Administração, sendo que esta imputabilidade aos serviços é independente da demonstração da culpa de qualquer um dos funcionários envolvidos na emissão do acto afectado pelo erro, conforme se deixou explicado, entre outros, no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 12/12/2001, no recurso n.º 026233, pois «havendo erro de direito na liquidação, por aplicação de normas nacionais que violem o direito comunitário e sendo ela efectuada pelos serviços, é à administração tributária que é http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b3c77daecf855a348... 09-12-2014 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo Página 5 de 5 imputável esse erro, sempre que a errada aplicação da lei não tenha por base qualquer informação do contribuinte. Por outro lado, esta imputabilidade aos serviços é independente da culpa de qualquer dos seus funcionários ao efectuar liquidação afectada por erro» já que «a administração tributária está genericamente obrigada a actuar em conformidade com a lei (arts. 266°, n.° 1 da CRP e 55° da LGT), pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços. - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 14 de Março de 2012, rec. n.º 1007/11, e numerosa jurisprudência aí citada. Mal andou, pois, a decisão recorrida ao julgar caducado o direito de deduzir impugnação em razão da intempestividade do pedido de revisão oficiosa apresentado, pois que este o não foi intempestivamente. Em consequência, haverá que, no provimento do recurso, revogar a decisão recorrida e ordenar a baixa dos autos à primeira instância para que prossigam, se a tal nada mais obstar. - Decisão 7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, baixando os autos ao tribunal “a quo” para que prossigam, se a tal nada mais obstar. Sem custas, pois a Fazenda pública não contra-alegou. Lisboa, 19 de Novembro de 2014. - Isabel Marques da Silva (relatora) – Ana Paula Lobo – Fonseca Carvalho. http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b3c77daecf855a348... 09-12-2014