Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 58-64, jan./mar. 2011 DOI: 10.4260/BJFT2011140100008 Adequação das boas práticas de fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS Adequacy of the good manufacturing pratices in bakeries in the city of Ijuí, RS, Brazil Autores | Authors Neide Taciana Lukaszewski SCHIMANOWSKI Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ) e-mail: [email protected] Adriane Cervi BLÜMKE Centro Universitário Franciscano (UNIFRA) Área de Ciências da Saúde Curso de Nutrição Rua Silva Jardim, 1175 CEP 97010-491 Santa Maria/RS - Brasil e-mail: [email protected] Autor Correspondente | Corresponding Author Recebido | Received: 03/09/2010 Aprovado | Approved: 24/01/2011 Resumo Este trabalho teve como objetivo avaliar a adequação das Boas Práticas de Fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS. O estudo foi realizado em 15 padarias que possuíam Alvará Sanitário. O instrumento utilizado para avaliar a adequação das padarias foi a Lista de Avaliação para Boas Práticas em Serviços de Alimentação proposta e validada por Saccol et al. (2006), baseada na RDC 216/04/ANVISA. Também foi realizada uma entrevista com os proprietários ou responsáveis pelos estabelecimentos. Os resultados revelaram que 7% dos estabelecimentos foram classificados como “bom”, 13% como “ruim” e 80% como “regular”. A falta de documentação e registro foram os itens que mais colaboraram para a baixa adequação das panificadoras, obtendo somente 4,7% de adequação nos locais pesquisados. Já a exposição ao consumo do alimento preparado e o controle integrado de vetores e pragas urbanas apresentaram os maiores índices de adequação, 85,7 e 85,6%, respectivamente. Além disso, nenhuma panificadora possuía Manual de Boas Práticas e Procedimentos Operacionais Padronizados (POP’s) implantados em sua totalidade. Em relação à entrevista, observou-se que a maioria dos proprietários tem bom nível de escolaridade, conhece a legislação e sabe o que são boas práticas. Os resultados obtidos revelaram que as panificadoras avaliadas não estão adequadas em relação à legislação. Assim, torna-se imprescindível a ação efetiva dos órgãos fiscalizadores para assegurar o cumprimento da legislação, bem como a realização de capacitações periódicas sobre boas práticas para os profissionais que atuam nesses estabelecimentos. Palavras-chave: Boas Práticas de Fabricação; Qualidade dos alimentos; Segurança alimentar e nutricional. Summary The objective of this work was to evaluate the adequacy of the Good Manufacturing Pratices (GMP) in bakeries in the city of Ijuí in the State of Rio Grande do Sul, Brazil. The study was carried out with 15 bakeries that had received their Sanitary Licenses. The instrument used to evaluate the adequacy of the bakeries was the Evaluation List for the Good Practices in Food Services proposed by Saccol et al. (2006), based on the RDC 216/04/ANVISA. The owners of the establishments or those responsible were also interviewed. The results showed that 7% of the establishments were classified as “good”, 13% as “bad” and 80% as regular. A lack of Documentation and Registration were the items that most collaborated to the low adequacy of the bakeries, obtaining only 4.7% adequacy in the locations evaluated. However, exposition of the prepared food for consumption and the integrated control of vectors and urban pests presented the highest indices of adequacy, 85.7 and 85.6%, respectively. In addition, none of the bakeries possessed the Manual of Good Practices or had completely implanted the Standardized Operational Procedures. With respect to the interview, it was observed that most of the owners had a good educational level, knew the legislation and knew what the good practices were. The results obtained showed that the bakeries evaluated were not adequate in relation to the legislation. Thus effective action by the inspection agencies is essential to ensure fulfillment of the laws, as well as periodic training in the good practices for the professionals working in these establishments. Key words: Good manufacturing practices; Food quality; Food and nutrition safety. www.ital.sp.gov.br/bj Adequação das boas práticas de fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS SCHIMANOWSKI, N. T. L. e BLÜMKE, A. C. 1 Introdução A rápida urbanização, a concentração nas grandes cidades e as mudanças no estilo de vida das pessoas vêm contribuindo para substanciais mudanças na alimentação do brasileiro. Entre estas, pode ser destacado o consumo de refeições fora de casa, marmitas, lanches, alimentos semiprontos, fast-foods e a opção por pratos ou refeições rápidas (SEIXAS et al., 2008). Neste contexto, os estabelecimentos prestadores de serviços de alimentação assumem um papel importante na qualidade da alimentação da população urbana (SOUZA et al., 2003). Destacam-se neste setor as panificadoras, que registraram um crescimento de 12,61% nas vendas em 2009, segundo levantamento realizado pelo Programa de Apoio à Panificação (PROPAN). Somente no Estado do Rio Grande do Sul, em 2009, o número de padarias era de 6.068, o terceiro maior do país. O segmento de panificação no Brasil é composto por 63 mil panificadoras, sendo que, destas, 60 mil são micro e pequenas empresas (96,3%), recebem diariamente 40 milhões de clientes (21,5% da população nacional) e geram 700 mil empregos diretos (PROPAN, 2009; ABIP, 2010). Dentre os aspectos de Segurança Alimentar, a produção de alimentos seguros tem sido uma exigência mundial, especialmente nos últimos anos, com a ocorrência de toxinfecções na Europa e EUA, mais especificamente por carnes e aves (SILVA JR., 2005). Entretanto, o número de casos de Doenças Transmitidas por Alimentos (DTA) aumentou assustadoramente, em nível mundial. No período de 1999 a 2008, foram notificados 6.062 surtos de DTA no Brasil, com acometimento de 117.330 pessoas e mediana de sete doentes por surto; além disso, foram registrados 64 óbitos nesse período (BRASIL, 2008). Para se assegurar de que os alimentos sejam preparados de modo a garantir a segurança do consumidor, devem ser adotadas medidas de prevenção e controle em todas as etapas da cadeia produtiva. Uma das formas para se atingir um alto padrão de qualidade dos alimentos é a implantação das Boas Práticas de Fabricação (BPF). Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), as BPF abrangem um conjunto de medidas que devem ser adotadas pelas indústrias de alimentos e serviços de alimentação a fim de garantir a qualidade sanitária e a conformidade dos produtos alimentícios com os regulamentos técnicos (BRASIL, 2004). As BPF são obrigatórias pela legislação brasileira para todas as indústrias e estabelecimentos de alimentos, e estão pautados nas Portarias nº. 1428/93, 326/97, 368/97, Portaria CVS nº. 6/99 e nas Resoluções da Direção Colegiada RDC nº. 275/2002 e 216/2004 (SEIXAS et al., 2008). empresas em aplicar efetivamente essa ferramenta de qualidade e a importância da capacitação dos colaboradores, que está pautada na Portaria Estadual 78/09 (RS), e buscando ampliar as pesquisas realizadas sobre esse tema, o presente trabalho objetiva avaliar a adequação das Boas Práticas de Fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS. 2 Material e métodos Trata-se de uma pesquisa transversal, quantitativa e descritiva, na qual a coleta de dados ocorreu no período de janeiro a março de 2010. Para definição da amostra, partiu-se de uma lista de padarias fornecida pela Vigilância Sanitária (VISA) do município, referente ao ano de 2009, com 27 padarias cadastradas que possuíam Alvará Sanitário. Destes estabelecimentos, 12 não autorizaram a realização da pesquisa. Sendo assim, a amostra do estudo foi constituída por 15 padarias, representando 55,6% da população inicial. Para avaliar a adequação das padarias, foi aplicada a Lista de Avaliação para Boas Práticas em Serviços de Alimentação desenvolvida e validada por Saccol et al. (2006), baseada na RDC 216/04/ANVISA. Esta lista é composta por 182 itens divididos em 12 blocos: 1) Edificações, instalações, equipamentos, móveis e utensílios; 2) Higienização de instalações, equipamentos, móveis e utensílios; 3) Controle integrado de vetores e pragas urbanas; 4) Abastecimento de água; 5) Manejo de resíduos; 6) Manipuladores; 7) Matérias primas, ingredientes e embalagens; 8) Preparação do alimento; 9) Armazenamento e transporte do alimento preparado; 10) Exposição ao consumo do alimento preparado; 11) Documentação e registro; e 12) Responsabilidade. Em cada item, há três respostas possíveis: adequado, inadequado e não aplicável, sendo assinalada apenas uma. Para a classificação das panificadoras, a lista utilizada considera como Grupo 1: Bom – os estabelecimentos que atendem entre 76 e 100% dos itens avaliados; Grupo 2: Regular – entre 51 e 75%; e Grupo 3: Deficiente – entre 0 e 50% dos itens avaliados (SACCOL et al., 2006). Considerando a importância da efetiva aplicação das BPF em serviços de alimentação para garantia da Segurança Alimentar e Nutricional, a dificuldade das Além da verificação das BPF, foi realizada uma entrevista semiestruturada, elaborada para este estudo, e aplicada ao proprietário ou responsável pelo estabelecimento, abordando aspectos, como: escolaridade, conhecimento sobre a legislação RDC 216/2004 e o que é BPF; frequência de participação em cursos sobre higiene e boas práticas; frequência de visita da VISA, e ações que a VISA desenvolve junto a este setor de alimentos. A todos os estabelecimentos que fizeram parte da pesquisa, foi entregue uma cartilha, ao término do estudo, com orientações sobre noções de higiene e manipulação segura de alimentos. Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 58-64, jan./mar. 2011 59 www.ital.sp.gov.br/bj Adequação das boas práticas de fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS SCHIMANOWSKI, N. T. L. e BLÜMKE, A. C. Os dados foram analisados de forma quantitativa e descritiva. Verificou-se o percentual de adequação dos itens que compõem a lista de avaliação, apresentando os itens com maior e menor conformidade segundo a legislação. Já as informações da entrevista foram analisadas de forma descritiva. Os dados foram apresentados em forma de tabelas. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do SUL (UNIJUÍ) sob o protocolo nº. 017/2010. A coleta dos dados foi realizada somente após a autorização do estabelecimento e a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. 3 Resultados e discussão O resultado geral da aplicação da lista de avaliação da implantação das Boas Práticas nas 15 padarias pesquisadas pode ser verificado na Tabela 1. Nota-se que 7% dos estabelecimentos foram classificados como bom - grupo 1, apresentando índice de adequação superior a 76%. Outros 13% foram classificados como ruim - grupo 3, ou seja, atenderam a menos de 50% dos itens avaliados. A maioria, 80% dos estabelecimentos, foi classificada como regular - grupo 2, estando de acordo com a legislação em 51 a 75% dos itens avaliados. Foi observada em todos os estabelecimentos a falta de documentação e registro, o que evidencia que não há nenhum monitoramento escrito das atividades. Além disso, 93,3% das padarias não apresentam responsável técnico comprovadamente capacitado, o que evidencia a falta de conhecimento das legislações e das adequações necessárias para garantia da segurança alimentar desses serviços de alimentação. Estudo realizado por Back et al. (2006) em panificadoras do município do Rio de Janeiro em 2005 revelou que a média de atendimento dos itens avaliados foi de 46%, ficando os estabelecimentos classificados como ruins - grupo 3. O item que mais colaborou para a baixa adequação foi a falta de Manual de Boas Práticas e de Procedimentos Operacionais Padronizados (POP’s) implantados, resultado que foi evidenciado também na presente pesquisa. Xavier (2008) estudou as condições higiênico-sanitárias de panificadoras da cidade de Quixeré- CE e verificou que todos os locais avaliados apresentaram percentual de adequação inferior a 50%. Segundo parâmetros da RDC 275/2002, 20% das panificadoras foram classificadas como “ruins” e 80% como “péssimas”. Resultados de Silva et al. (2007), ao avaliarem as condições higiênico-sanitárias de duas panificadoras no município de Volta Redonda-RJ, demonstraram que estas obtiveram 42 e 47% de adequação em relação à legislação. O estudo ressalta que as duas panificadoras avaliadas precisavam adequar-se à legislação vigente, visto que várias condições higiênico-sanitárias não foram classificadas como satisfatórias. Por sua vez, Silva e Oliveira (2009), ao avaliarem padarias de São José dos Campos-SP, obtiveram média de 53% de adequação, ainda muito inferior ao necessário de acordo com a lei federal. Pode-se constatar que, mesmo depois de passados mais de cinco anos da entrada em vigor da legislação, muitos estabelecimentos continuam sem se adequar e a fiscalização e a orientação a estes estabelecimentos parecem ser a forma mais eficaz para a garantia de qualidade dos produtos fornecidos por esses locais. Observou-se, no presente estudo, que somente 7% dos estabelecimentos pesquisados apresentam adequação superior a 76% e nenhum apresentou as Boas Práticas implantadas em sua totalidade, demostrando a importância da fiscalização e da orientação periódica. Tabela 1. Classificação das padarias quanto à adequação às Boas Práticas de Fabricação. Padaria Total avaliado (AD + IN) AD IN NA 1 172 108 64 10 2 172 76 96 10 3 164 96 68 18 4 180 127 53 2 5 173 85 88 9 6 174 96 78 8 7 171 137 34 11 8 175 128 47 7 9 173 122 51 9 10 163 104 59 19 11 168 104 64 14 12 169 96 73 13 13 172 105 67 10 14 175 108 67 7 15 174 127 47 8 %AD 62,8 44,2 58,5 70,6 49,1 55,2 80,1 73,1 70,5 63,8 61,9 56,8 61,0 61,7 73,0 Classificação Regular Deficiente Regular Regular Deficiente Regular Bom Regular Regular Regular Regular Regular Regular Regular Regular AD: Adequado; IN: Inadequado; NA: Não Aplicável; %AD: Percentual de Adequação. Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 58-64, jan./mar. 2011 60 www.ital.sp.gov.br/bj Adequação das boas práticas de fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS SCHIMANOWSKI, N. T. L. e BLÜMKE, A. C. O percentual de adequação por bloco de itens avaliados pode ser observado na Tabela 2. Verifica-se que os blocos que mais comprometeram o bom desempenho das padarias foram a falta de Documentação e Registro (bloco 11) e a falta de Responsabilidade (bloco 12). Somente 13% (n = 2) dos 15 estabelecimentos pesquisados possuem o Manual de Boas Práticas escrito e este não está implantado em 100% dos locais avaliados. Vale destacar que os locais que apresentam o Manual de BPF em fase de implantação obtiveram melhores índices de adequação no estudo. Quanto à responsabilidade técnica, somente 7% (n = 1) dos estabelecimentos apresentam responsável comprovadamente capacitado. Resultado semelhante foi encontrado em estudo realizado por Xavier (2008), no qual todas as panificadoras pesquisadas em Quixeré-CE não dispunham de Manual de Boas Práticas de Fabricação e dos Procedimentos Operacionais Padronizados. Stangarlin et al. (2009), ao analisarem os serviços de alimentação, entre estes 13 padarias da cidade de Santa Maria-RS, verificaram que 92,5% dos estabelecimentos não tinham o manual de boas práticas, 5% tinham e 2,5% estavam em fase de elaboração. Já em relação aos POP’s exigidos pela legislação, também não estão implantados em nenhum dos estabelecimentos pesquisados no estudo. Tais resultados evidenciam a falta de comprometimento e conscientização dos serviços de alimentação quanto a RDC 216/04, que exige o cumprimento desses procedimentos. Entretanto, os blocos que obtiveram o maior percentual de conformidade foram os de Exposição ao Consumo do Alimento Preparado (bloco 10) e o de Controle Integrado de Vetores e Pragas Urbanas (bloco 3) com 85,7 e 85,6% de conformidade, respectivamente. No presente estudo, o controle de pragas nas padarias avaliadas é feito por empresa especializada com periodicidade regular. Entretanto, os proprietários afirmam que há uma fiscalização efetiva deste item por parte da VISA municipal. Dessa forma, percebe-se que quando há cobrança, é maior a adequação por parte dos estabelecimentos, sugerindo que os demais itens da legislação podem não estar sendo fiscalizados com efetividade. Em relação à melhor pontuação obtida na área de exposição dos alimentos, um aspecto a ser considerado é o fato de que essa área é a mais vista pelo consumidor e, preocupados em causar uma “boa impressão” aos clientes, os proprietários acabam por investir mais na área de exposição do que na própria área de produção. Ao se analisar as não conformidades de cada bloco verificaram-se que as principais foram: ausência de lavatório exclusivo para higienização das mãos, em 93,3% das padarias; ausência de portas, portas abertas ou sem fechamento automático, em 86,7% das padarias; ausência de vestiários adequados, em 80% das padarias; ausência de proteção nas luminárias, em 80% das padarias; ausência de telas milimetradas em portas e/ou janelas, em 66,7% das padarias; ausência de registro da limpeza periódica dos reservatórios, em 73,3% das padarias. Coletores sem fechamento automático em 66,7% dos estabelecimentos, uniformes incompletos, em 100% dos locais pesquisados; presença de adornos nos manipuladores de 60% dos locais pesquisados; ausência de controle periódico de saúde, em 53,3% das padarias; local desorganizado, mal conservado, separação inadequada entre os itens e sem identificação das matérias-primas, em 80% das padarias. Inexistência de monitoramento do tempo e temperatura no preparo e no armazenamento dos alimentos, em 100% dos estabelecimentos; ausência de controle de substituição de óleos e gorduras de frituras e de controle de temperatura de aquecimento do óleo em 73,3% das padarias; falta de registro do monitoramento da temperatura dos balcões de exposição, em 100% dos Tabela 2. Percentual (%) de adequação dos estabelecimentos analisados por bloco de itens avaliados. Bloco de Descrição Nº de itens % de itens avaliados adequação 01 Edificação, instalações, equipamentos, móveis e utensílios 55 69,0 02 Higienização das instalações, equipamentos, móveis e utensílios 17 74,9 03 Controle integrado de pragas e vetores urbanos 6 85,6 04 Abastecimento de água 8 43,3 05 Manejo de resíduos 4 48,3 06 Manipuladores 13 68,7 07 Matérias-primas, ingredientes e embalagens 13 72,3 08 Preparação do alimento 24 67,2 09 Armazenamento e transporte do alimento 6 36,7 10 Exposição ao consumo do alimento preparado 10 85,7 11 Documentação e registro 24 4,7 12 Responsabilidade 2 10,0 Total 182 Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 58-64, jan./mar. 2011 Classificação decrescente 5º 3º 2º 9º 8º 6º 4º 7º 10º 1º 12º 11º 61 www.ital.sp.gov.br/bj Adequação das boas práticas de fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS SCHIMANOWSKI, N. T. L. e BLÜMKE, A. C. estabelecimentos; ausência de BPF implantada, em 100% das padarias; ausência de POP’s escritos e implantados, em 100% das padarias; ausência de responsável técnico comprovadamente capacitado, em 93% das padarias. Cabe destacar que tais não conformidades podem contribuir no comprometimento das poucas ações que estão adequadas, conforme a legislação, diminuindo o percentual de adequação das padarias. Pesquisa realizada por Germano et al. (2009) em padarias de São Paulo-SP constatou irregularidades muito semelhantes às do presente estudo, tais como: janelas sem telas, ausência de tampas nas lixeiras, uso de adornos, falta de proteção nos cabelos, temperaturas dos balcões de exposição fora do padrão, fluxo cruzado, entre outros. Xavier et al. (2008) também verificaram a inexistência de vestiários e de lavatórios para higienização das mãos em 60% das panificadoras avaliadas de Quixeré-CE. Além disso, em todas as panificadoras observaram o uso de adornos por parte dos manipuladores de alimentos e a ausência de uniforme adequado. Por outro lado, também não existiam registro do monitoramento do controle de temperatura e a identificação das matérias-primas. Tais resultados corroboram com os encontrados no presente estudo. Convém destacar que em 100% das panificadoras pesquisadas não há o controle do binômio tempo e temperatura, o que é um grande risco para a segurança alimentar, pois, segundo Silva Júnior (2005), este deve ser utilizado para controlar, eliminar ou diminuir o número de microrganismos durante o processamento, amanipulação e a distribuição dos alimentos para consumo. A ausência de lavatório exclusivo para a higienização das mãos em 93,3% das padarias deste estudo também foi verificada em 95% dos estabelecimentos pesquisados por Bramorski et al. (2004), ao avaliarem cozinhas indústrias de Joinvile-SC e em 100% das cozinhas de hotéis analisadas por Dotta e Lima (2009). Em relação à entrevista realizada com os proprietários das padarias, os resultados estão apresentados no Tabela 3. As questões 2, 6 e 14 foram discursivas. A pergunta referente ao conhecimento sobre BPF obteve 93,3% de respostas positivas, os seja, a maior parte dos proprietários afirma ter conhecimento sobre o assunto. Quando questionados sobre o que entendiam por boas práticas de fabricação, a maioria dos entrevistados disse se tratar de “práticas de higiene e qualidade dos produtos e serviços”. Somente um proprietário não soube dar nenhuma definição de BPF, embora tenha dito que apresenta conhecimento sobre o assunto. A maior dificuldade encontrada pelos entrevistados no que se refere à efetiva implantação das boas práticas foi a falta de mão de obra qualificada, o que também foi constato por Michalczyszyn et al. (2008) em estudo de caso que avaliou as BPF em empresa de produtos orgânicos na cidade de Ponta Grossa-PR. No presente estudo, em somente 6,7% dos estabelecimentos pesquisados, há um responsável técnico comprovadamente capacitado, sendo que a padaria que apresenta esse profissional foi a que obteve o maior índice de conformidade. Tal fato também foi evidenciado em estudo realizado por Cardoso et al. (2005), que demonstraram que as padarias que possuíam no quadro funcional um técnico especializado na área de alimentos apresentaram melhores condições, o que ressalta a importância desses profissionais. O treinamento dos funcionários foi realizado em 53,3% das panificadoras e 60% dos proprietários disseram ter cursos de capacitação específicos na área de panificação. No entanto, somente 33,3% dos proprietários afirmam que a VISA costuma oferecer cursos para as padarias, o que precisa ser ampliado para a efetiva capacitação de todos os manipuladores de alimentos. Isso mostra que muitos estabelecimentos percebem a necessidade de qualificação e buscam cursos de capacitação em órgãos particulares, mas ainda não sentem a necessidade de contratação de Tabela 3. Resultado da entrevista realizada com o proprietário ou o responsável pela padaria. Pergunta Descrição Sim % (N) 1 Apresenta conhecimento sobre BPF 93,3 (14) 3 Possui Manual de BPF 13,3 (2) 4 Possui Alvará Sanitário 100 (15) 5 Tem curso de capacitação 60 (9) 7 Funcionários têm treinamentos 53,3 (8) 8 Vigilância Sanitária faz inspeções 100 (15) 9 Vigilância Sanitária oferece cursos 33,3 (5) 10 Possui material escrito sobre BPF 33,3 (5) 11 Conhece a RDC 216/2004/ANVISA 40 (6) 12 Possui interesse em implantar BPF 86,7 (13) 13 Tem qualificação em padarias 53,3 (8) 15 Tem responsável técnico 6,7 (1) Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 58-64, jan./mar. 2011 Não % (N) 6,7 (1) 86,7 (13) 0 40 (6) 46,7 (7) 0 66,7 (10) 66,7 (10) 60 (9) 13,3 (2) 46,7 (7) 93,3 (14) 62 www.ital.sp.gov.br/bj Adequação das boas práticas de fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS SCHIMANOWSKI, N. T. L. e BLÜMKE, A. C. responsável técnico com capacidade de treinar e orientar os colaboradores. Em contrapartida, sabe-se que uma das atribuições mais importantes da VISA é a atividade de orientação e educação sanitária, visando a assegurar produtos de qualidade, seguros e eficazes (LANGE et al. 2008). Lange et al. (2008) verificaram na pesquisa realizada na Região Sudeste da Grande São Paulo a importância dos treinamentos oferecidos aos estabelecimentos pela VISA. Segundo o estudo, após o treinamento, houve melhoria significativa em vários aspectos, tais como: higiene dos manipuladores, colocação de proteção em portas e janelas, colocação de revestimentos e manual de BPF. Segundo Germano (2003), a eficiência da VISA depende da incorporação do caráter educativo que ela representa, por meio de realização de treinamentos e capacitações que devem visar à aquisição de conhecimento, mas também à mudança de comportamento. A maioria dos proprietários entrevistados apresenta um bom nível de escolaridade, sendo que 53,3% possuem o segundo grau completo (Tabela 4). Pelo nível de escolaridade dos proprietários, pode-se afirmar que não haveria grandes dificuldades dos mesmos em interpretar a legislação vigente e nem dificuldades na escrita de procedimentos e criação de monitoramentos de processos para garantia da segurança alimentar dos produtos elaborados. Quanto à frequência de inspeções ou visitas da Vigilância Sanitária municipal, 40% dos proprietários afirmaram que a frequência de auditorias é anual, 33% trimestral e 27% semestral. Verifica-se, portanto, que no município investigado as inspeções são realizadas anualmente na maioria dos estabelecimentos. A falta de funcionários é um dos problemas enfrentados por muitas equipes de VISA, o que acaba por dificultar as inspeções periódicas e também as orientações aos estabelecimentos. Cabe ressaltar que a VISA fiscaliza não só os estabelecimentos de alimentos, mas também o setor ambiental, de águas (vistorias em piscinas e poços artesianos) e a área de saúde, englobando todos os consultórios médicos, as farmácias, os laboratórios, os salões de beleza, entre outros. Desta forma, de janeiro a dezembro de 2009, foram vistoriadas 29 padarias do município investigado, praticamente todas para a renovação de alvará ou por denúncias. Piovesan et al. (2005) verificaram que entre os fatores que reduzem a efetividade das ações de controle sanitário estão a insuficiência de recursos humanos e a baixa qualificação técnica dos profissionais, além de evidenciarem os fatos de os registros da VISA estarem desatualizados (62,5%) e não informatizados (100%) e das equipes desconhecerem as atribuições legais do setor. Vale ressaltar, novamente, o caráter educativo que a VISA possui no sentido de orientar e especialmente sensibilizar os proprietários dos estabelecimentos quanto à impor tância e à responsabilidade que os mesmos possuem na garantia de qualidade dos alimentos produzidos, devendo estes serem multiplicadores dos princípios de segurança alimentar. Dessa forma, a partir do momento em que a VISA passa a utilizar mais o caráter de orientação, diminuem as ações de punição entre suas ações. Em todos os estabelecimentos pesquisados, os proprietários afirmaram que a Vigilância Sanitária, durante as inspeções, não faz menção ao fato de ser obrigatório o Manual de Boas Práticas e os Procedimentos Operacionais Padronizados. Isto torna evidente a teoria de que o proprietário somente cumprirá tais normas se for cobrado por parte dos órgãos fiscalizadores. Tal fato não é isolado, uma vez que em estudo realizado por Stangarlin et al. (2009) em Santa Maria-RS, foi verificado que somente 5% dos serviços de alimentação pesquisados foram fiscalizados pela VISA e cobrados quanto ao manual de boas práticas. 4 Conclusões Tabela 4. Distribuição dos proprietários ou responsáveis pelos estabelecimentos, segundo a escolaridade. Escolaridade Nº Percentual (%) Ensino Fundamental I completo 01 6,7 Ensino Fundamental II completo 08 53,3 Ensino Fundamental II incompleto 01 6,7 Superior incompleto 03 20 Pós-graduação 02 13,3 Total 15 100,0 Os resultados apontam que nenhuma das 15 padarias pesquisadas está em total adequação com a RDC 216/04/ANVISA, ou seja, nenhuma tem implantada de forma eficaz as boas práticas de fabricação. Somente uma das panificadoras pesquisadas obteve adequação de 80,1%, correspondendo à classificação “Bom”, sendo esta também a única a apresentar um responsável técnico comprovadamente capacitado. Assim, torna-se imprescindível a ação efetiva e mais criteriosa dos órgãos fiscalizadores, em especial a VISA do município, para assegurar o cumprindo da legislação, bem como a realização de capacitações periódicas sobre boas práticas aos profissionais e proprietários para que haja a conscientização dos mesmos no intuito de implantar efetivamente as BPF como uma importante ferramenta de garantia de qualidade e segurança alimentar. Sugere-se a realização de novos estudos sobre a implantação das BPF em outros serviços de alimentação do município e de pesquisas que demonstrem a importância de treinamentos tanto para o estabelecimento, constituindo um diferencial no mercado, como para o consumidor, garantindo a produção de alimentos seguros. Braz. J. Food Technol., Campinas, v. 14, n. 1, p. 58-64, jan./mar. 2011 63 www.ital.sp.gov.br/bj Adequação das boas práticas de fabricação em panificadoras do município de Ijuí-RS SCHIMANOWSKI, N. T. L. e BLÜMKE, A. C. 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