Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO B TURMA RECURSAL (PROCESSO ELETRÔNICO) Nº200770500148335/PR RELATORA RECORRENTE RECORRIDO : Juíza Luciane Merlin Clève Kravetz : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL : VIVIANE ALMEIDA DE FARIA SANTOS VOTO A autora pediu a condenação da Caixa Econômica Federal na obrigação de reparar danos material e moral decorrentes de furto das jóias que garantiam o contrato de penhor nº 0371.213.00016898-2. A sentença acolheu parcialmente o pedido e condenou a ré ao pagamento de indenização por dano material, no valor de R$ 3.315,00 (três mil, trezentos e quinze reais), descontados os valores já ressarcidos à autora, bem como os que ainda sejam devidos pelo empréstimo realizado. Somente a Caixa Econômica Federal recorreu. Pediu o afastamento da condenação, por não ter sido caracterizado o dano material. Sucessivamente, pleiteou a redução da indenização fixada na sentença. Razões de voto. A questão já foi enfrentada por esta 1ª Turma Recursal em diversos julgamentos. Firmou-se o posicionamento de que não há ilegalidade na cláusula que fixou a indenização de 1,5 (uma vez e meia) o valor da avaliação, no caso de furto de jóias dadas em garantia de penhor. Neste sentido foi o voto do Juiz Anderson Furlan Freire da Silva, proferido em sessão do dia 13/10/2008 (RCI 200670500090870): Em toda a jurisprudência e doutrina não há mais quem negue, desde há muito, que o brocardo pacta sunt servanda perdeu a força que ostentava à época do estado liberal. As intervenções estatais fizeram-se cada vez mais necessárias, desde a revolução industrial, época em que surgiram as massas, e via de conseqüência, os contratos de massa. As duas grandes guerras do último século confirmaram a necessidade de amenização dos pactos (Caso da Companhia de Gás de Bordeaux). No específico campo do consumo, o “abismo insuperável” inicial entre as partes deu ensejo ao florescimento da proteção do consumidor. Ao contrário do que possa parecer a uma primeira impressão, o contrato não é o causador de todos os males. O modo em que utilizado queda por reproduzir as desigualdades pré-contratuais, valendo a disciplina do direito como que uma tentativa para conduzir as partes a uma situação de igualdade material. Tal não deixa de conferir força obrigatória aos pactos, sem o que não há consumo e, concordemos, não há economia de mercado. 200770500148335 [FBK©/LMC] *200770500148335 200770500148335* 200770500148335 https://jef.jfpr.jus.br/download/700000000000018_700000013031868_705100007028564_1.DOC 1/3 Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO B Feita a introdução, cabe atentar ao direito positivo, que impõe interpretação favorável ao consumidor (Lei 8.078/90, art. 47), reputando nulas as cláusulas abusivas (Lei 8.078/90). Urge verificar se existe abusividade na disposição contida em contrato de adesão que estipula a indenização em 1,5 (uma vez e meia) do valor atribuído ao bem na avaliação pré-contratual. De imediato afasto a tese. A proteção ao consumidor não pode ensejar enriquecimento indevido. Não se está diante de vera cláusula de limitação de responsabilidade, em que a reparação restaria circunscrita a uma parcela do patrimônio reduzido pelo dano. Tudo o quanto se perdeu será recomposto, com acréscimo de metade. O próprio Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, por intermédio de sua 4.ª Turma, já teve oportunidade de se manifestar sobre outro caso de contrato de penhor, em que o objeto empenhado foi subtraído durante este mesmo assalto ocorrido em 27.10.2006, na agência da Caixa Econômica Federal do Bacacheri - Curitiba. Importa transcrever trecho do voto do então relator, Desembargador Edgard Lippmann Junior: “...Por meio do "Comunicado de Sinistro ao Cliente", incluso nos autos, a CEF noticia a ocorrência de assalto na agência do Bacacheri/PR em 27.10.2006, em que os objetos empenhados foram roubados e alerta para a disponibilidade à parte autora da indenização prevista no contrato de penhor. (...)Vale dizer: o mutuário receberá pelo noticiado roubo nada mais, nada menos, que uma vez e meia o preço do objeto empenhado. Preço, por sinal, que a parte concordou quando foi buscar o dinheiro de que necessitava junto à CEF. Preço, aliás, que foi obtido depois de análise criteriosa dos peritos da CEF, segundo classificação oficial disponível a tanto (peça reciclável, peça reciclável-comercial, peça comercial e peça fina). Não pode, agora, simplesmente pretender mudar as regras a que se submetera outrora, por sentir-se, talvez, numa condição privilegiada perante a CEF, que frisemos - também foi vítima do infortunado assalto.” (AC nº 2007.70.00.0094740/PR, 4ª T., j. 26-03-08, un., DJ 08-04-08) No mesmo sentido recente decisão da 3.ª Turma, ao apreciar idêntica questão envolvendo os mesmos fatos: CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONTRATO DE PENHOR. ROUBO DE JÓIAS EMPENHADAS EM AGÊNCIA DA CEF. ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA QUE LIMITA O VALOR DA INDENIZAÇÃO. INEXISTÊNCIA. APELO DESPROVIDO. 1. Não há ilegalidade ou abusividade na cláusula do contrato de empréstimo pignoratício celebrado entre as partes que fixa a responsabilidade da instituição financeira em 1,5 vezes o valor da avaliação das jóias dadas como garantia do penhor, devidamente atualizado, em caso de furto, roubo ou extravio. 2. Não comprovada pelos autores a apontada desproporção entre o valor de mercado dos bens e a avaliação feita pela Caixa Econômica Federal, bem como o alegado valor sentimental das jóias roubadas, não procedem os pedidos de indenização por dano material e moral. 3. Mantida a sentença de improcedência. (TRF4, AC 2007.70.00.024207-7, Terceira Turma, Relator Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 30/07/2008) 200770500148335 [FBK©/LMC] *200770500148335 200770500148335* 200770500148335 https://jef.jfpr.jus.br/download/700000000000018_700000013031868_705100007028564_1.DOC 2/3 Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO B Mesmo a inversão do ônus da prova não merece acolhida. O Código de Defesa do Consumidor a estabelece em seu artigo 6.º, VIII, para as hipóteses em que verossímil a alegação ou hipossuficiente o consumidor. Não se pode admitir como verossímil, sem que exista ao menos indício a respeito, que o valor das jóias subtraídas seja realmente superior ao valor da indenização contratual. Vale dizer, relações de consumo não são hábeis para, por si sós, revogarem por completo as normas do processo civil que impõem ao autor o ônus de provar os fatos alegados. Não merece prosperar, destarte, a pretensão da parte recorrente. A 1ª Turma Recursal julgou no mesmo sentido nos RCI 2007.70.50.013946-2, 2007.70.50.017818-2 e 2008.70.50.004989-1 (Rel. Juíza Silvia Regina Salau Brollo) e 2008.70.63.000612-0 (Rel. Juíza Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo). A tese também foi acolhida na 2ª Turma Recursal: RCI 2007.70.50.0014926 (Rel. Juíza Ana Carine Busato Daros) e 2007.70.50.00073-5 (Rel. Juíza Andréia Castro Dias). Da mesma forma vem julgando o TRF/4ª Região: RESPONSABILIDADE CIVIL. PENHOR DE JÓIAS. ROUBO DE AGÊNCIA BANCÁRIA. CLÁUSULA CONTRATUAL INDENIZATÓRIA. LEGALIDADE. 1. Não há ilegalidade ou abusividade na cláusula do contrato de empréstimo pignoratício celebrado entre as partes que fixa a responsabilidade da instituição financeira em 1,5 vezes o valor da avaliação das jóias dadas como garantia do penhor, devidamente atualizado, em caso de furto, roubo ou extravio. 2. Não comprovada a alegada desproporção entre a avaliação feita pela instituição bancária, no cotejo com o valor mercadológico, improcede o pedido reparatório por danos morais e materiais. 3. Apelação provida. (TRF4, AC 2007.70.00.026455-3, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Nicolau Konkel Júnior, D.E. 14/04/2010) Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO e afasto a condenação. Luciane Merlin Clève Kravetz Juíza Federal 200770500148335 [FBK©/LMC] *200770500148335 200770500148335* 200770500148335 https://jef.jfpr.jus.br/download/700000000000018_700000013031868_705100007028564_1.DOC 3/3