Cultura Visual Iconosfera (Roman Gubern) Pictorial Turn (Mitchel) Visão e visualidade Ver e olhar Intertextualidade Mediasfera (Régis Debray) Ocularcentrismo (Martin Jay) The centrality of the eye in Western culture (Chris Jenks) Mediapaisagens (Appadurai) Imagem “Iconosfera Imagética” Que são imagens? Senão células das minhas vidas Que se mixam Infinitamente Num suco originalis Com o Outro? (outras Vidas em colisão) Expressões Impressões Conexões Visões Literatura Poéticas Digitais Plasma em corrente sanguínea Que se impregnam de infinitude Cada vez que se encontram com o olhar do artista Nosso olhar O olhar de todos Na tela da alma do mundo. Ana Paula Perissé, Recanto das letras, 14.09.2008 Imagem Na segunda metade do século XX, a imagem parece reinar na nova sociedade e parece ser o seu elemento caracterizador. Tal fenómeno foi já descrito como: “cultura da imagem” (Pierre Guiraud), “civilização da imagem” (Gilles Deleuze; Enrico Fulchignoni), “era da simulação” (Jean Baudrillard; Doménec Font), “galáxia Marconi” (Martine Joly), “sociedade do espetáculo” (Guy Debord), Ou “cultura visual” (W.J.T. Mitchel). As imagens deixam de pertencer ao domínio humano espácio-temporal e passam a circular, pela reprodutibilidade técnica (Walter Benjamin), no quotidiano da comunicação de massas, destoando a sua autenticidade. A obra de arte perde, assim, a sua unicidade, a sua redoma sacra de exclusividade, vendo-se reproduzida massivamente. Iconosfera Roman Gubern introduz o termo “iconosfera”* em 1959, para definir o mundo mediatizado pelas linguagens icónicas, as formas comunicativas da imagem, o mundo das imagens e as suas relações com o cinema e a televisão. Faz uma analogia com a palavra “semiosfera”**, cunhada por Iúri Lótman*** que, segundo Gubern, designa o espaço cultural habitado por signos – em que a iconosfera constituiria uma das suas capas ou componentes –, o espaço de encontro entre diferentes culturas. * Atribui a autoria do termo a Gilbert Cohen-Séat, o fundador do Instituto de Filmologia de Paris. ** “o habitat e a vida dos signos no universo cultural” (Irene Machado, 2007: 16). *** Termo apresentado em: ''O semiosfere''. Semeiotuké. Trudy po znakovym sistemam. Tartu Rükliku Ulikooli Toimetised, núm. 17, 1984, pp. 5-23. Iconosfera Segundo Muniz Sodré, na “iconosfera (universo das imagens)”, o receptor perde, especialmente, em imaginação, já que a imagem é uma realidade trabalhada. As imagens, por serem plenas de significados, sugerem muito mais que o simples fluxo verbal. A representação surge completa no seu significado, dando pouco espaço de raciocínio ao espectador e podendo tocá-lo na parte menos vigiada pelo intelecto (Diana Paula de Souza, 2005: 3). O pensamento não é proibido, mas é desnecessário. Para Sodré, “a sensação tende a predominar sobre a consciência, fazendo apelo a todos os sentidos, mas enfraquecendo-os” (1992: 59-60). Cultura Visual É de destacar que a emergência dos estudos sobre a cultura visual está marcada pela intersecção com os estudos culturais. No começo dos anos 80, o estudo da cultura tornou-se central para as Ciências Humanas e conduziu a uma revisão do estatuto do social. Neste enquadramento, o lado subjetivo das relações sociais conquistou um lugar e cimentou uma tendência, que passou a enfatizar a forma através da qual a cultura – o sistema de representações – impulsionava as forças sociais de um modo geral. A cultura visual seria, assim, um desdobramento do movimento geral de questionamento também sobre a cultura em si (Knauss, 2006: 107). Cultura Visual Mirzoeff (1999) encara a cultura visual mais como uma táctica e menos como uma disciplina. “Uma área de pesquisa e uma iniciativa curricular que trata da imagem visual como o ponto focal no processo através do qual o significado é formado num contexto cultural” (Margarita Dikovitskaya, 2005: 1). É uma estrutura interpretativa fluida, que intenta a análise e entendimento da relação diária dos sujeitos com os diversos media visuais*. Inclina-se mais para a perspectiva do consumidor – das suas práticas, significados, desejos e prazeres – do que do produtor. * Os media são, na prática, media mistos, combinando uma série de linguagens e estimulando distintamente os nossos sentidos. Cultura Visual O conceito de cultura visual abarca toda a “diversidade do mundo das imagens, das representações visuais, dos processos de visualização e de modelos de visualidade” (Mello; Pires-Alves). Mitchel, um dos seus representantes, recorre à expressão “pictorial turn”* para referir a discussão teórica à volta da imagem, os aspectos da cultura que se apoiam em imagens visuais, o entendimento dos estudos da cultura visual como o estudo das construções culturais pela experiência visual na vida quotidiana, assim como nos media, representações e artes visuais. Assim, a cultura visual refere-se ao peso das imagens visuais na cultura e ao contributo desta na leitura das imagens e nas construções imagéticas. A cultura passa a ser o óculo interpretativo e criador das imagens visuais e estas passam a erguer e alimentar a cultura. * Termo cunhado a partir da expressão “linguistic turn”, referida pelo filósofo Richard Rorty, para retratar o fenómeno que emergiu subsequentemente ao fim da década de 1950: a ênfase, na crítica das artes e das formas culturais, aos diversos modelos de textualidade e discurso. Cultura Visual Pode ser perspectivada como um “sistema em que os modos de olhar, de visualizar e representar visualmente, são histórica e culturalmente modelados”, “um sistema composto por um conjunto de universos e sub-universos, com os seus agentes, objectos e processos particulares de produção, difusão e recepção de objectos visuais”. Pode ainda ser visto como “um sistema não estático, mas em constante renovação, fruto da velocidade de transformação dos agentes, dos processos tecnológicos e das forças de poder que determinam relações de cooperação e conflito”. É “uma cosmovisão, uma forma particular de percepcionar e retratar a realidade, aliada não apenas a modos de ver, mas a modelos sensoriais e modos de retratar a realidade que apelam a diferentes linguagens, capacidades cognitivas e modelos sensoriais” (Ricardo Campos, 2007: 59). Cultura Visual Pode-se pensar no poder exercido pelas imagens ou complexidade da cultura contemporânea, reconhecendo que a visão é culturalmente construída, e as práticas visuais contribuem para a formação de conceitos e ideários, capazes de deflagrar processos subjetivos e identitários de um determinado contexto (Elkins, 2003). Resumindo, a cultura visual, ainda emergente, é um “campo amplo, múltiplo, em que se abordam espaços e maneiras como a cultura se torna visível e o visível se torna cultura” (Martins, 2005: 135). Visual Culture Muitos estudiosos da cultura visual, como Chris Jenks, Nicholas Mirzoeff, Gillian Rose, John Walker e Sarah Chaplin, distinguem a visão como as possibilidades fisiológicas dos olhos e a visualidade como a construção social dos nossos olhares, “o visual no entrelaçamento entre representação e poder cultural” (Margarita Dikovitskaya, 2005: 227). Outros ainda, como Laura Mulvey (Visual Pleasure and Narrative Cinema, 1975), Lisa Cartwright, Margarita Dikovitskaya (Visual Culture: The Study of the Visual after the Cultural Turn), Gail Finney, Martin Jay (The State of Visual Culture Studies), Marita Sturken (Practices of Looking: An Introduction to Visual Culture, 2007), Kelli & Patrick Fuery (Visual Culture and Critical Theory, 2003) dedicaram-se à cultura visual como objecto de estudo. Esta problemática tem-se tornado relevante em estudos religiosos, por via de trabalhos de David Morgan, Sally Promey, Jeffrey Hamburger e S. Brent Plate (Religion, Art, and Visual Culture, 2002). Visualidade http://bocaberta.org/2012/02/barbie-da-vidareal-dakota-rose.html Sailor Moon http://www.tvsinopse.kinghost.net/s/sailo r%20moon.htm Polegar virado para baixo – Que significado? Pollice Verso (1872), pintura de Jean-Léon Gérôme. Cultura Visual Martin Jay (Brennan; Jay, 1996: 1-14) aflora o papel dos “modos de ver” e a experiência visual como paradigma da nossa época, em que o modelo tradicional de leitura de textos sucumbe face a um novo modelo: o da visualidade e de espetadores. Há que não tomar a visão como um dado natural e há que questionar a universalidade e homogeneidade da experiência visual: portanto, reconhecer a especificidade cultural da visualidade e contextualizar a visão. O advento da cultura visual seria produto da não apartação ou do arreigamento dos objetos visuais ao seu contexto (Mello; Pires-Alves). Cultura Visual Ver e olhar são processos diferentes da actividade de descoberta do mundo. “Ver é um processo automático, passageiro, mecânico, ao acordar abrimos os olhos e vemos. Mas olhar, de forma artística para o mundo, produz emoção, exige contemplação, alteração de sentidos, exige fechar os olhos para poder enxergar. É uma janela aberta para a vida que percebe o sensível, o nosso desequilíbrio interior. É a ousadia de se olhar e perceber caravelas, como disse a poeta Roseaba Murray. É desamarrar o olhar das cruezas da vida e do real” (Rodrigo da Costa Araújo, 2006). Jean-Jaques Wunenburguer refere que “a visão afecta mais o sujeito do que a verbalização, que necessita de uma aprendizagem, uma descoberta progressiva e uma inibição do pathos”. Cultura Visual Um conceito em voga, com o advento da cultura visual, é o de intertextualidade*. A interrogação sobre a autonomia, emancipação e limites do visual é colocada no pressuposto de que a visão deve ser tratada como matriz que inclui outros sentidos. Aquilo a que se chama de texto multimodal (Kress; van Leeuwen, 1996), que combina diferentes códigos semióticos. É assim que Mitchell condena a separação do verbal e do visual e propõe um diálogo permanente entre representações pictóricas e verbais, considerando que as pictóricas incluem-se num conjunto entrelaçado de práticas e discursos. * O diálogo de textos/contextos. Este diálogo pode manifestar-se em diversas áreas do conhecimento, não se restringindo a textos literários. Exige um universo cultural muito abrangente e complexo. Cultura Visual O estudo da imagem é visto como um jogo complexo de relações entre representações, corpos, figuras, aparatos, tecnologia, instituições, discurso, simbologia, em que a imagem ganha vida não só em termos materiais, sensoriais, como também de significação. Régis Debray (1993) denuncia as novas tendências: uma visão do mundo que está mergulhada no visível e que se aclama como detentora da verdade e da realidade. Cada espectador admite como real, factual e certo o que vê, que os seus olhos absorvem a verdade que lhe chegam. Num dualismo entre visível e invisível, em que este é tido como falso e irreal, Debray questiona-se como se pode perceber o invisível, os códigos invisíveis e subliminares do visível. De facto, cada esfera particular de mediações, cada mediasfera, como rotula Debray, age em conformidade com a sua própria visão do mundo, com o seu sistema de crenças. Através do óculo com o qual vê e interpreta o mundo, concebe os seus critérios de validação do real, dividindo-o de uma forma binária (verdadeiro vs. falso) e demarcando-o do irreal. Cultura Visual Os produtos culturais nunca usaram tanto a visão como o seu sentido prioritário de exteriorização, entrando num ciclo de saturação de imagens e geração de percepções diversas. É a isto que se refere Martin Jay, com o termo “ocularcentrismo”, Chris Jenks (The Centrality of the Eye in Western Culture) e Appadurai com o termo “mediapaisagens” (2004). Bibliografia A. Appadurai (1998). Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. Minneapolis: University of Minnesota Press. Ana Paula Perissé (2008). “Iconosfera Imagética”, Recanto das letras, 14.09. Chris Jenks (2002). “The Centrality of the Eye in Western Culture”. In Chris Jenks. Visual Culture. USA, Canada: Routledge. David Morgan, Sally Promey, Jeffrey Hamburger e S. Brent Plate (2002). Religion, Art, and Visual Culture. Diana Paula de Sousa (2005). “Jornalismo e Criminalidade: a produção midiática da violência e suas implicações nas leis penais brasileiras”, Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, XXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Uerj. 5 a 9 de Setembro. Enrico Fulchignoni (1969). La civilización de l´image. Paris: Payot. Fonte Domènec (2002). Paisajes de la modernidad. Barcelona: Paidós Sesión Continua. G. Kress, T. Van Leeuwen (1996). Reading images: the grammar of the design visual. London: Routledge. Bibliografia Gilles Deleuze (1990). A imagem-tempo. São Paulo: Braziliense. Gillian Rose (2007). Visual Methodologies: An Introduction to the Interpretation of Visual Materials. Los Angeles, London, New Delhi, Singapore, Washington DC: Sage. Guiraud Pierre (1999). A Semiologia. Lisboa: Presença. Guy Debord (1997). A sociedade do espetáculo. Trad. Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: Contraponto. Irene Machado (org.) (2007). Semiótica da Cultura e Semiosfera. São Paulo: ANNABLUME editora. Iúri Lotman (1984). 'O semiosfere''. Semeiotuké. Trudy po znakovym sistemam. Tartu Rükliku Ulikooli Toimetised, núm. 17, pp. 5-23. Iúri Lotman (1990). The Universe of the Mind. A Semiotic Theory of Culture. Bloomington: Indiana University Press. J. Elkins (2003). Visual Studies: A Skeptical Introduction. 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