ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM EM PEQUENAS EMPRESAS: AS LEARNING ORGANIZATIONS E O PAPEL DO EMPREENDEDOR Maria Elisa Brandão Bernardes – École des Hautes Études Commerciales de Montreal Resumo Para as Pequenas Empresas Empreendedoras a realidade da concorrência globalizada as tornam ainda mais frágeis, uma vez que por sua própria natureza não contam com todos os recursos disponíveis pelas grandes empresas para sobreviverem e até interferirem significativamente no ambiente a seu favor. No entanto, modelos gerenciais de sucesso têm sido objeto de estudo de um número cada vez maior de pesquisadores que buscam oferecer a todo tipo de empresa e seus dirigentes caminhos que viabilizem seu destaque neste contexto. Dentre eles, o modelo Learning Organizations (Organizações de Aprendizagem) possui um coro de adeptos que acreditam que ele ofereça, através de sua filosofia de aprendizagem contínua, uma opção especialmente atraente para as PME’s. Podemos suspeitar, no entanto, que as peculiaridades dessas empresas exerçam diferentes efeitos na adoção de tal estratégia. Este artigo relata a pesquisa realizada em pequenas empresas empreendedoras de sucesso, cujas práticas se identificam com as preconizadas pelo modelo learning organization. Foram investigadas as principais fontes de dificuldades e de facilidades para a adoção das estratégias recomendadas e concluiu-se no determinante papel do proprietário/empreendedor para seu sucesso. 1- Introdução A globalização, levando à competitividade cada vez mais acirrada entre as empresas, faz com que o mercado esteja cada vez mais poderoso sobre as ações organizacionais. Para acompanhar este ritmo acelerado é preciso estar em constante processo de inovação. Para tal, modelos gerenciais calcados em estratégias de aprendizagem têm sido objeto de estudo de um número cada vez maior de pesquisadores no intuito de oferecer às empresas e seus dirigentes caminhos que as possibilitem se destacar neste contexto. Dentre as estratégias propostas, a conhecida como Learning Organization ou Organização de Aprendizagem se destaca por sua indicação de aprendizagem contínua, que não exige grandes investimentos em estruturas para ser colocado em prática. Em se tratando de exigência de investimentos, a situação das PME’s (pequenas e média empresas) no cenário atual é ainda mais crítica, considerando que, por sua própria natureza, não contam com todas os recursos utilizados pelas grandes empresas para se desenvolverem e/ou interferirem significativamente no ambiente a seu favor. A posição das empresas brasileiras então, é cercada de controvérsias, ainda mais em se tratando de adoção de novas estratégias de gestão. Muito ainda se protesta sobre a precariedade do país, tecnológica e socialmente, para apoiar grandes saltos empresariais. No caso das Pequenas Empresas, as bases institucionais oferecidas a elas ainda são muito inferiores às que contam suas equivalentes nos países mais desenvolvidos. E ainda assim elas são obrigadas a fazer frente ao cenário competitivo globalizado. Entretanto e apesar deste quadro, encontramos no país pequenas empresas em ritmo de forte crescimento, que se destacam por seu funcionamento dinâmico e otimizado. Explorar as peculiaridades destas empresas pode levar à compreensão dos elementos que favorecem, estrategicamente, as pequenas empresas 2 empreendedoras em geral. Foi com este intuito que foram pesquisadas duas pequenas empresas empreendedoras cujas práticas se assemelham muito às preconizadas pelo modelo de organizações de aprendizagem: são empresa que se sobressaem em um mercado altamente competitivo, adotando políticas de inovação constante e orientando-se para o futuro. Este artigo é o resultado da pesquisa que teve como objetivo averiguar a adoção de estratégias de aprendizagem por pequenas empresas empreendedoras. Mais especificamente procurou-se nestes casos investigar: quais as peculiaridades destas empresas que facilitam e quais dificultam a adoção do modelo de Organização de Aprendizagem? Para tanto apresentaremos nossa concepção do modelo, construído a partir da consolidação de vários autores (conforme Bernardes, 1999). Em seguida apresentaremos uma breve discussão sobre as implicações de sua adoção por pequenas empresas brasileiras e enfim apresentaremos os resultados e conclusões a propósito da transposição do modelo. Espera-se assim contribuir no enriquecimento dos estudos de adoção de estratégias de aprendizagem por pequenas empresas empreendedoras. 2- O modelo Learning Organization (Organização de Aprendizagem) Os estudos sobre Learning Organizations contam com grande número de abordagens desde sua grande voga nos anos 90, a linha assumida nesse trabalho porém, é a preconizada por Senge (1990), Schein (1996) e Garvin (1993) entre outros, que consideram a implantação do modelo como uma escolha e uma responsabilidade da organização. Senge (1990) define Learning Organizations como instituições onde as pessoas se voltam para a aprendizagem coletiva, comprometidas com resultados motivadores. Schein (1996b) trabalha enfatizando primordialmente a construção de uma cultura de aprendizagem nas organizações e Garvin(1993) preocupa-se em elucidar o significado de Learning Organization, como uma “organização habilitada na criação, aquisição e transferência de conhecimentos e que modifica seus comportamentos a fim de refletir os novos conhecimentos e insights”. Ao assumir as práticas de uma organização de aprendizagem, é de importância fundamental para uma empresa, que esta conte com um ambiente interno que incentive a aprendizagem, com informações fluidas e claras perpassando toda a estrutura organizacional, que os membros compartilhem do mesmo objetivo, que a empresa propague a visão sistêmica e que as ações de mudança e aprendizagem sejam monitoradas. São estas as dimensões que propomos explorar, por refletirem a prática de um gerenciamento priorizado no processo de aprendizagem, mesmo quando a organização não se autodefina assim. É ainda importante ressaltar que é o caráter processual que irá diferenciar uma Learning Organization de uma outra empresa que simplesmente realize Treinamento & Educação com alguma regularidade. As dimensões do modelo, apesar de distintas, se sobrepõem em várias instâncias (conforme procuramos retratar na FIG 1) e que serão melhor exploradas em seguida. 3 Ambiente que Incentive a Aprendizagem Democratização das Informações Ação Monitorada CULTURA Visão Sistêmica Objetivo Compartilhado FIGURA 1 - DIMENSÕES DE UMA LEARNING ORGANIZATION 2.1- Ambiente que Incentive a Aprendizagem O ambiente organizacional influencia no comportamento das pessoas, mas uma organização pode identificar e escolher comportamentos que deseja reforçar em seus membros através da adoção de estratégias específicas para tal. Em uma Learning Organization é característica a existência de um ambiente interno que facilite e incentive a aprendizagem. Assim, a organização define políticas tais onde a aquisição e a prática da aprendizagem sejam recompensadas como um comportamento inteligente (Peters, 1993), oferecendo estímulo para a troca de idéias, criatividade na solução de problemas (Wick W. & Léon 1995) e promovendo eventos designados primordialmente para revisões estratégicas em conjunto (Garvin, 1993). Além do mais, sendo o contexto externo imprevisível e turbulento, estruturas orgânicas (mutáveis, com tomada de decisão descentralizada, cargos sendo continuamente redefinidos, confiança nas comunicações informais, predomínio de interação horizontal e clima calcado no coleguismo) são consideradas mais inteligentes e inovadoras. De maneira mais objetiva, podemos enumerar maneiras onde a capacidade para aprender pode ser desenvolvida na organização (Fleury & Fleury 1995; Morris 1995; Tobin 1996): • Através da Prática – aprendizagem passiva, virtualmente automática e de menor custo; 4 • A partir da Mudança – na transição de uma rotina conhecida para outra nova e potencialmente melhor; • Através da Análise de Desempenho – através dos feedbacks das performances passadas; • Através do Desenvolvimento do Conhecimento – programas internos de treinamento e educação, contratando consultores, expandindo conhecimentos existentes na empresa; • Através da Contratação – de pessoas que já possuam conhecimentos e habilidades, de consultorias; obtendo assistência de centros de tecnologia e/ou educacionais; • A partir da Aquisição – pela transferência de tecnologia, estabelecendo parcerias ou comprando o serviço de empresas que possuam o conhecimento necessário. Práticas consagradas de aprendizagem, a partir de fontes externas à organização podem ser utilizadas, como o Benchmarking (Garvin, 1993; Wick & León, 1995) e Alianças Estratégicas (Child 1996) além da aprendizagem com os próprios clientes pela atualização de informações, comparações com concorrência, acompanhamento de mudanças nas preferências e pela busca de feedbacks imediatos sobre serviços e atendimento (Garvin, 1993; Wick & León, 1995). O ambiente que propicie a aprendizagem facilita a troca com o ambiente externo e reforça comportamentos receptivos não-defensivos. A aprendizagem também se operacionaliza através da recuperação e retenção (por meio de Bibliotecas, Banco de Dados, documentação de aprendizagens) intencional de conhecimentos vários, através da memória organizacional, que deve ser habilitada para salvar e armazenar os conhecimentos da organização, de modo a que a empresa aprenda com as experiências e não repita erros. É preciso atentar ainda para o armazenamento das aprendizagens nas rotinas, nos modelos de comportamentos reforçados e nas estratégias (Child, 1996). É esperado que os conhecimentos identificados e gerados pelos membros da organização sejam disponibilizados para todos, bem como que a empresa ofereça infra-estrutura e instalações físicas tais que propiciem clima de aprendizagem, de troca e de experimentação. 2.2 - Democratização das Informações Pode-se dizer que informações são dados considerados relevantes e úteis para algum propósito. Quando a informação é colocada em prática pode ser classificada como conhecimento. Quando as empresas lidam com novos tipos de informação e são capazes de colocá-las em prática, mudando seu comportamento, as empresas estão aprendendo. Ora, quando uma empresa pretende que muitas pessoas participem do processo de tomada de decisão é de se esperar que ela viabilize, para todas essas pessoas, o acesso às informações relevantes. A importância da democratização das informações para adoção do modelo Learning Organizations é ponto central da abordagem de Sligo (1996), que centra sua análise na relação entre aprendizagem, conhecimento e poder. Ele enfatiza que a aprendizagem só é possível em uma empresa cujo acesso às informações é livre para todos os níveis organizacionais, de forma que o staff esteja consciente de sua performance, o poder de decisão seja democratizado e os objetivos sejam verdadeiramente compartilhados. As informações que interessam às empresas são as mais variadas (Wick & León, 1995) desde que a divulgação seja livre e clara (não se admitindo que algumas informações possam ser reservadas apenas para o alto escalão gerencial). Interessam as informações externas (como a satisfação dos clientes, as novidades nos mais diversos campos, o que têm feito os concorrentes, entre outras) e as internas (conhecimento claro de seus pontos fortes e fracos). Fracassos e sucessos devem ser igualmente comunicados, revisados e esclarecidos em uma Learning Organization, (Garvin, 1993) com a finalidade de que o conhecimento seja espalhado rápida e eficientemente, registrando as 5 lições aprendidas indiscriminadamente. Como destaca Huber (1991), quando a informação é largamente distribuída na organização, fontes variadas aparecem, os esforços são recompensados e é provável que mais indivíduos e unidades se capacitem para aprender. Combinar informações de diferentes fontes não só leva a novas informações, mas a novas compreensões. É importante notar que a aprendizagem exige um ambiente receptivo (contrário a posturas defensivas) e aberto às críticas e más notícias, “cultivando a arte da abertura e da escuta atenta” (Garvin, 1993). Como também salienta Morgan (1997), há grande risco de perda do controle, mas a aprendizagem requer um grau elevado de abertura e ainda maior de autocrítica. 2.3 - Objetivo Compartilhado A importância de as empresas trabalharem orientadas para objetivos é grande, por isso muito se tem estudado sobre a melhor maneira de se determinar alvos que mobilizem o comprometimento dos membros da organização. Sabe-se que o grau de concordância com as metas e finalidade do grupo reflete no grau de coesão da equipe, influenciando conseqüentemente a eficácia da mesma. Senge (1990a) ressalta que a comunhão de propósitos em torno de objetivos concretos e legítimos leva as pessoas a se empenharem em conjunto e por livre vontade, despertando inclusive, um sentimento de companheirismo e pertença. Para que a empresa sinta estes efeitos, é preciso investir no desenvolvimento de inteligência e habilidades coletivas - que são maiores do que a soma das inteligências e habilidades individuais. Quando os membros da organização estão comprometidos e as equipes estão alinhadas com os objetivos estratégicos, as pessoas passam a entender seu papel de ajudar a empresa a alcançar estes objetivos, com vontade, entusiasmo, capacidade e utilizando apropriadamente os recursos que precisam para trabalhar e até superar as metas (Tobin, 1996). Assim, segundo Fulmer (1994) a determinação coletiva dos objetivos implica na visualização da empresa à médio ou longo prazo, no estabelecimento de programas detalhados para seu alcance, definindo resultados esperados concretos (vendas, lucros, novos produtos e serviços), em âmbitos processuais (pesquisa e desenvolvimento, tecnologia e ciclos de vida) e qualitativos (satisfação no trabalho, qualidade do trabalho em equipe, criatividade). Tais programações contribuem para objetivar as contribuições individuais e o comprometimento dos membros nas diferentes etapas da caminhada. É ainda importante ressaltar que o planejamento do futuro precisa sobretudo, contar com um sistema de acompanhamento e medição, pois este mantém a visão de futuro presa à realidade (Wick & Leon, 1995). As Learning Organizations trabalham cuidando da monitoração de seus progressos, de forma a direcionar suas responsabilidades. 2.4 - Visão Sistêmica Outra dimensão fundamental para a operacionalização de uma Learning Organization é a existência da visão sistêmica. Por Visão Sistêmica entende-se como um tipo de posicionamento dos membros da organização que sempre considere os impactos das ações individuais nos resultados setoriais e globais (e mesmo suas repercussões no ambiente). Implica na atenção para as conseqüências das ações externas dos componentes ambientais, de outras empresas, de outros setores internos e da própria atitude das pessoas para a organização. Além do mais a abordagem sistêmica considera a capacidade de auto-regulação das empresas, isto é, a capacidade de readeqüação a partir dos feedbacks recebidos (e do processamento dos mesmos) a fim de gerarem resultados cada vez mais otimizados. Buckley (1974) ressalta a importância dos intercâmbios para que tal sistema seja eficaz e Senge (1990a) enfatiza a interdependência bem como a necessidade 6 de colaboração entre as partes. Nonaka & Takeuchi (1995) e Morgan (1997) assinalam ainda o papel da redundância, como a capacidade de as partes da empresa conterem informações umas das outras e serem capazes de exercerem o papel do todo, atentos ao sentido em que todos os membros da organização compartilhem a mesma identidade e a mesma orientação para a aprendizagem. Uma empresa pode adquirir a visão sistêmica encorajando a análise e solução de problemas complexos em conjunto e reconhecendo a importância da exploração de diferentes pontos de vista. Conforme salienta Morgan (1997), assuntos encarados pelas organizações em ambientes complexos são multidimensionais, assim, explorar várias questões, permitindo o conflito construtivo e o debate, é mais que enriquecedor e faz com que toda a empresa aprenda. 2.5 - Ação Monitorada. O significado de Learning Organization reside na aplicabilidade e na geração de mudanças provocadas pela aprendizagem (Garvin, 1993) que se reflete na modificação de comportamentos e práticas (Campbell & Cairns, 1994). Segundo Schein (1996b) a aprendizagem organizacional “é um processo social que ocorre em uma comunidade de prática” onde, portanto, as idéias em si não são suficientes. Uma aprendizagem só acontece quando resultar em uma ação modificada. E, adotando o modelo de Learning Organization as organizações aprendem através da experimentação, da viabilização de idéias e da persistência. Em quaisquer dos casos é preciso monitorar, para verificação não só da eficiência dos métodos (ou do quanto realmente tais processos contribuem para mudar os comportamentos) quanto da eficácia dos mesmos (se a aprendizagem ocorreu no sentido da melhoria de resultados). Por outro lado, um intenso processo de inovação pode gerar paralisia por parte dos membros por causa da insegurança do novo. Por isso a aprendizagem deve estar vinculada à ação monitorada - enquanto processo intenso e contínuo para oferecer frutos concretos (Figueiredo, 1994). Contar com um sistema de recompensas é também um instrumento de reforço, pois a organização precisa apresentar interesse claro e específico no desenvolvimento das pessoas, para que exista a aplicação prática e reforço do aprendido (Peters,1993). São importantes as avaliações e remunerações vinculadas à aprendizagem e de tal forma flexíveis que seja recompensado o talento e não o cargo (Galbraith, 1997). Em suma, aprender é aumentar a capacidade de agir eficazmente, logo, é função da empresa conduzir para tal otimização. O monitoramento da prática, segundo bem coloca Schein (1996b), mais do que uma opção é uma necessidade. Uma última ponderação a propósito do modelo diz respeito à abordagem adotada por Schein (1996a,b) que estuda as Learning Organizations inteiramente pelo prisma cultural. O autor ressalta que a cultura é tanto conseqüência das experiências e das aprendizagens das organizações quanto alicerce para sua capacidade ao contínuo aprendizado. Destacando a importância e riqueza desta abordagem, consideramos que adotá-la, mereceria atenção específica. Dessa forma, optamos neste trabalho, por considerar a cultura organizacional voltada para a aprendizagem como a base que permeia todo o processo de uma Learning Organization, vista através de seus aspectos operacionais (explorados em cada dimensão do modelo apresentado). Por isso ela está representada no centro e como interseção das dimensões, conforme FIG. 1. 7 Uma vez apresentada à concepção do modelo estratégico organizacional, podemos fazer algumas considerações sobre a viabilidade de sua adoção por pequenas empresas empreendedoras brasileiras. 3- A Pequena Empresa Brasileira O campo de estudo da PME não é um campo consensual. Definições do que venha a ser uma pequena empresa empreendedora tem sido motivo de grande debate. Oficialmente, os países, para determinar políticas públicas específicas, separam as PME’s das grandes empresas pelo viés do número de empregados. No entanto, para as pessoas que estudam as pequenas empresas empreendedoras, defini-las não é assim tão simples (Julien, 1997 ; Torrès, 1998). É bem verdade que todos trabalham com a premissa de que uma pequena empresa não é uma grande empresa em miniatura. Assim, acredita-se, que as pequenas empresas possuem características específicas tais, que seu tamanho reduzido implica em distinções na natureza das operações organizacionais e não simplesmente na escala de sua execução. Reconhecendo os debates em torno do conceito, adotamos a posição de Sexton (1987) que afirma que uma definição uniforme do que é uma PME é menos importante do que a definição de critérios adequados que delimitem a amostra da pesquisa. Ora, o interesse pela estratégia de pequenas empresas empreendedoras força a escolha de critérios que tenham maior impacto no processo estratégico - objeto de estudo. Assim, no escopo deste trabalho, uma pequena empresa se define por apresentar as seguintes características: • possuir um número reduzido de empregados - (Julien, 1997 ); • for altamente controlada pelo empreendedor/dirigente, com gestão altamente personalizada (Baumback, 1983; Bauer, 1983; Miller & Toulose, 1986 e Julien, 1997); • lidar com recursos restritos (Neilsen, 1974; Schuman & Seeger, 1986; Lounsbury & Glynn, 2001 e Anderson & Atkins, 2001 ); • possuir uma estrutura orgânica, pouco burocratizada, onde a relação entre as pessoas é basicamente informal (Starbuck, 1965; Julien, 1997 e Marchesnay, 1997 ) • estar em situação de grande dependência face ao ambiente externo, com grande importância acordada aos stakeholders (Starbuck, 1965; Marchesnay, 1997; {Lindsay & Rue, 1980; Borcieu, 2000 e Anderson & Atkins, 2001). Evidentemente, em se tratando de estratégias de PME’s não se pode deixar de mencionar o preponderante papel do empreendedor-dirigente. Com efeito, acredita-se que desde a criação da empresa ele possua uma idéia do tipo de organização que deseja construir e da cultura que queira infundir (Schein, 1983). Além do mais, em se interessando por estratégias de aprendizagem, é importante ressaltar que todas as definições de empreendedor o vinculam à inovação empresarial. Segundo Filion (1996) os processos de gestão dos empreendedores são necessariamente marcados pela criatividade, pela aprendizagem e pelo desenvolvimento integral da organização. No Brasil, as PME’s representam 99,35% das empresas constituídas e são responsáveis por 43,63% do PIB (Sebrae, 1995). Os índices de mortalidade, porém, são alarmantes. Uma pesquisa realizada no estado de Minas Gerais por Vale, Aguiar, et al. (1998) detectou que em cerca de 83% das empresas extintas, a mortalidade aconteceu antes de completarem 2 anos de vida. Além do mais, por estudos do SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro Pequenas Empresas) constatou-se que a maioria das pequenas empresas brasileira ainda está fracamente preparada para 8 enfrentar os desafios do complexo cenário mundial. Segundo o Sebrae (2000) somente 1,7% da receita das PME’s são investidas em pesquisa e desenvolvimento e menos de 1,5% são aplicados no treinamento e educação dos empregados. Enquanto as próprias empresas apontam que 27% das sugestões de melhoria da qualidade vêem dos empregados, o treinamento formal médio do pessoal nas pequenas empresas brasileiras é de 17 horas por ano, mais 10 horas por ano “on the job”. Ora, este quadro reflete muito das características de uma administração autoritária, inflexível e imediatista quanto aos resultados, identificada por Hickson & Pugh (1995). É uma situação que tem mudado, mas a passos lentos, considerando o contexto em que vivemos. Mas, podemos sim, identificar no cenário brasileiro, “Ilhas de excelência”, caracterizadas pela “cultura da qualidade” dos últimos anos (Fleury & Fleury, 1995). Vemos, no país, empresas que a despeito de uma série de fatores dificultadores, têm conseguido implantar modelos avançados de gestão, apresentando posturas compatíveis com as exigências da modernidade e alcançando resultados ótimos. Estas práticas são mais comumente associadas a aprendizagens defensivas para atender objetivos de curto prazo de correção de deficiências (Fleury e Fleury, 1995). No entanto a pesquisa que propomos aqui se interessa por uma forma mais pró-ativa de gestão de aprendizagens, representada pelo modelo learning organization elaborado anteriormente. Esperamos através dela compreender melhor a adoção de estratégias de aprendizagem por pequenas empresas empreendedoras de sucesso, que têm sido exceções em seu contexto institucional. São os detalhes desta pesquisa que descreveremos a seguir. 4 - Metodologia da Pesquisa O Método de Pesquisa adotado foi o de Estudo de Caso, que segundo Yin (1994) permite investigar um fenômeno contemporâneo dentro do seu contexto real. Apesar de não permitir generalizações, buscou-se aprofundar na análise dos fenômenos elencados, a fim de determinar a prática das estratégias a partir da compreensão das praxes das empresas. Foram escolhidas duas empresas que atuam em ramos diferentes, observando como características comuns à adoção de práticas de gestão que se aproximassem do modelo de Learning Organization: inovação constante, sucesso em um mercado altamente competitivo (cada qual em seu ramo) e orientação para o futuro, com planos de crescimento. Ambas são empresas de serviços e possuem menos de 50 empregados. A empresa A é jovem, criada em fevereiro de 1998 a partir da idealização de seus quatro sócios. A empresa B pertence a um só proprietário e já está madura com seus 10 anos de mercado. Ambas se localizam em Belo Horizonte (MG). Os dados foram coletados através de análise dos poucos documentos disponíveis e de entrevistas semi-estruturadas realizadas com os proprietários das empresas. Além do mais, todos os empregados de ambas as empresas responderam a questionários estruturados, elaborados parcialmente a partir das informações levantados nas entrevistas com os proprietários (de maneira a permitir o cruzamento de respostas). O que se tentou foi identificar, para cada dimensão do modelo elaborado de organização de aprendizagem, uma comparação com as organizações pesquisadas. Os resultados desta investigação serão apresentados abaixo. 5 - Apresentação e Análise dos Resultados 9 Apresentaremos, para cada empresa, os dados segundo as dimensões identificadas no modelo: quanto ao ambiente interno que incentive a aprendizagem, quanto à democratização das informações, à presença de visão sistêmica, de compartilhamento de objetivos e de monitoração das ações. 10 5.1 - Ambiente que Incentive a Aprendizagem As duas empresas pesquisadas estimulam a aprendizagem como um comportamento desejável, apresentando as seguintes características: Empresa A A empresa A atua em um mercado altamente competitivo e mutante, necessitando de intenso acompanhamento dos avanços tecnológicos. Como é uma empresa jovem, sua estrutura já sofreu várias alterações para poder se adequar melhor às respostas de demandas do mercado. Verificouse a presença de várias das formas de aprendizagem: • Através da Prática – os novos funcionários são sempre treinados pelos mais velhos ou pelo gerente técnico, no serviço; todos aprendem no dia-a-dia, buscando novas soluções para os problemas inusitados. Segundo os proprietários, o aumento do número de contratos obriga a todos a estarem sempre aprendendo e a serem cada vez mais autônomos na tomada de decisões. • Através da Análise de Desempenho – são realizadas reuniões semanalmente entre os sócios e destes com os funcionários, com a finalidade de análise de resultados, revisão de condutas e reajustes. • Através do Desenvolvimento do Conhecimento – o fato de a empresa ser pequena facilita com que o conhecimento adquirido por um seja amplamente difundido para todos. • Através da Contratação – hoje a empresa procura aplicar maior rigor nas contratações, buscando funcionários tecnicamente mais preparados, exigindo maior escolaridade e maiores responsabilidades do novato. • A partir da Aquisição – há constante transferência de tecnologia dos fornecedores. Outra característica de um ambiente interno que encoraje a aprendizagem é a freqüente prática do Benchmarking – principalmente com empresas de São Paulo. Mesmo a criação da empresa só ocorreu após visitas técnicas de um dos sócios a empresas similares nos Estados Unidos. A busca de atualização porém, tem permanecido restrita à área técnica, onde há assinatura de revista especializada internacional, contato constante com outras empresas e inclusive trocas de experiências via Internet com empresas do mundo todo. Já as áreas de administração e marketing são mais relegadas. Para se atualizarem nestas áreas, procuram revistas de grande circulação (em bancas) não-científicas, o que resulta em aplicação de várias experiências sem o conhecimento técnico adequado, como foi relatado o fracasso da tentativa de implantação do serviço de telemarketing. Dois dos quatro sócios mantêm seus empregos em tempo parcial em outras empresas que investem em cursos e atualizações para seus empregados. Estes sócios sempre aproveitam o que aprenderam nos cursos fornecidos por estas outras empresas para repassarem para os outros sócios e funcionários da empresa A, caracterizando assim um tipo de aprendizagem ou atualização sem ônus para eles, mas que não atende suas necessidades específicas. Quanto à monitoração da concorrência, ela já foi maior. Conforme relatado, na medida em que a empresa cresce e se firma no mercado a monitoração tem diminuído. E no que diz respeito ao armazenamento das aprendizagens, trabalha-se de tal maneira que, para cada problema discutido, são criadas respostas formais que ao serem aprovadas são transformadas em rotinas com uso de formulários, etc. Como a empresa A é uma empresa pequena, pode-se observar que as instalações propiciam a troca, apesar de não possuírem locais específicos para reuniões e/ou treinamentos: a proximidade física com sócios/gerentes permite agilidade na comunicação, trocas constantes e a conseqüente introdução de novas idéias e criatividade. Todas estas ações ocorrem isoladas, porém, não se integrando através 11 de uma política específica que favoreça a aprendizagem da organização, fazendo assim com que as mesmas percam em eficácia conjunta. Empresa B A empresa B há dez anos no mercado, também apresenta uma estrutura fluida e mutável. Apesar de ter apenas um dono, várias associações já foram feitas e desfeitas com o intuito de oferecer respostas mais otimizadas para o ambiente. A intenção da empresa é de estar constantemente inovando e de ser este o seu diferencial competitivo. Segundo o proprietário, ele lutou com dificuldade para romper com o conservadorismo do mercado, mas após passar a contar com o apoio da imprensa, é hoje procurado como referência nacional - para benchmarking e até para franquia em outras cidades do Brasil. É sua política todo mês oferecer pelo menos uma novidade aos seus clientes – e para tal recruta idéias dos funcionários. Exige que os funcionários realizem pelo menos um curso de reciclagem (à escolha) a cada três meses, pelo qual a empresa paga total ou parcialmente. Segundo as respostas no survey, tal prática é bem apreciada pelos membros da organização. Complementariamente os funcionários são orientados a repassarem o que aprenderam nos cursos para os colegas. Além disso, a empresa também aprende: • A partir da Mudança – com a proposta de inovação constante, estão sempre aprendendo/inventando novas maneiras de realizar o trabalho; • Através da Análise de Desempenho – são feitos acompanhamentos dos resultados das inovações; • Através da Contratação – está em andamento um trabalho com profissional de Recursos Humanos para buscar um gerenciamento mais eficaz dos funcionários. Como expusemos anteriormente, porque eles foram os primeiros a inovar em determinados segmentos, são mais procurados para fazerem benchmarking do que fazem em outras empresas. A aprendizagem com o ambiente externo, no entanto, é mais direcionada para cursos específicos – ou na competência técnica da empresa ou em gerenciamento – intensamente buscado pelo proprietário, principalmente no Sebrae ou CDL. Ele acompanha também feiras e congressos internacionais e busca a troca de informações com outros profissionais do ramo através de contatos em cursos e seminários. A empresa tem ainda realizado parcerias com outras empresas para desenvolver mais seu campo de atuação e incrementar a gama de serviços oferecidos aos clientes, bem como, na relação de reciprocidade, captar mais clientes. Não assinam nenhuma revista técnica especializada, mas o proprietário afirma realizar constantes pesquisas em livros e lançamentos. Alguns são disponibilizados para os funcionários. Segundo ele, antigamente ele chegava a cobrar a leitura dos seus colaboradores, através de provas testando seus conhecimentos, mas desistiu da prática ao constatar o clima negativo que tal atitude desencadeava. Quanto aos funcionários, todos responderam que é alto o nível de aprendizagem adquirido depois que entraram para a empresa. 5.2 - Democratização das Informações Como são empresas pequenas, o fluxo de informações é intenso. Os funcionários acompanham tudo, mas em geral, informalmente. Não foi detectada, em nenhuma das duas empresas, a intenção de promover a participação no processo decisório: ele continua centralizado nos proprietários. 12 Empresa A A empresa A procura realizar reuniões entre os sócios duas vezes por semana, onde todos se inteiram de tudo o que está acontecendo em todas as áreas. Também se reúnem todo sábado com todos os funcionários. Apesar dessa troca constante, ela não é sistêmica. Não há troca de informação sistematizada clara externa ou mesmo interna (pontos fortes x pontos fracos). Os fracassos são comunicados e todos buscam soluções para os problemas. Quanto ao sucesso, é esperado que os funcionários o percebam através das mudanças aparentes: troca de imóvel sede, melhoria das instalações e aumento no volume do trabalho. Não há comunicação formal a respeito. Não há também um critério definido para a escolha da informação que é comunicada ou não, aos funcionários. As diversas fontes de informação são pouco exploradas. Os sócios que têm outro emprego aproveitam fontes de sua empresa repassando clipings e material dos seminários gerenciais. Um sócio chegou a afirmar que “as informações vêem” justificando a passividade da empresa frente à sua captura. Utilizam um quadro mural para divulgarem informações ou práticas interessantes, mas apenas metade dos funcionários afirmou ler o mural com regularidade. A busca do conhecimento com os clientes, porém, é ininterrupta. Todos os clientes são contatados alguns meses após a prestação do serviço para avaliar seu grau de satisfação. Se há algum problema, há busca de solução imediata. No entanto não há uma sistematização desses dados em forma de relatório ou algo que transmita o conhecimento adquirido para toda a organização. A tomada de decisão decorrente é ágil, o repasse imediato, mas restritos à cúpula. Empresa B A empresa B busca informações externas através dos cursos e contatos constantes do dono com as associações. Também com alguma freqüência, mas não sistematicamente, levantam informações da clientela através do telemarketing. O tamanho da empresa facilita a troca entre os funcionários, mas sem sistematização. A participação formal dos funcionários nas decisões é nula. 5.3 - Objetivo Compartilhado As empresas pesquisadas nem sempre planejam claramente seu futuro e nenhuma delas convida os funcionários a participarem do processo de planejamento ou de decisão, conforme assinalamos anteriormente. No entanto, quando questionados, todos os funcionários de ambas as empresas afirmaram se sentir comprometidos com o sucesso da mesma, munidos de um forte sentimento de pertença. Empresa A O objetivo de crescimento da empresa A está claro para todos os sócios e funcionários, e todos se dizem comprometidos com este objetivo. No entanto a empresa não possui um plano estratégico claro, o que dificulta a compreensão, por parte dos funcionários, de seus papéis para consecução de um futuro determinado. As metas são traçadas sem qualquer participação do corpo funcional, o que afeta seu comprometimento. Interessante no entanto, é descrever que a necessidade deste norte, por parte dos funcionários é tão forte, que eles mesmos começaram a estabelecer objetivos para si, de produtividade e de crescimento, independente da orientação da empresa Apesar de tal prática ser do conhecimento da cúpula, nada é feito para integrar tais esforços a um plano estratégico global da empresa. O acompanhamento de resultados é apenas financeiro e de curto prazo, não possuindo as características necessárias para que todos trabalhem por um futuro desejado comum - mesmo porque ele é restrito ao conhecimento dos sócios. 13 Empresa B Apesar do dono planejar o futuro da empresa a curto e longo prazo, tal planejamento é centralizado: apenas ele toma as decisões. Ele afirma que tais decisões são claramente divulgadas aos funcionários a fim de buscar o comprometimento de todos. No entanto, a ausência de participação se reflete nas respostas dos funcionários aos questionários: apesar de todos assegurarem seu comprometimento com a empresa, a metade dos funcionários apontou um objetivo diferente ao relatado pelo dono, quando questionados. O acompanhamento do desempenho é feito por programa sofisticado de computação, mas não inclui a participação dos funcionários nem é apresentado a eles. Segundo o proprietário, há um acompanhamento motivacional e de “desenvolvimento pessoal e até do lado espiritual” realizado periodicamente por uma psicóloga, mas que de nenhuma forma está vinculado ao planejamento da empresa. 5.4 - Visão Sistêmica Como sublinhamos diversas vezes, o tamanho das empresas facilita a troca sistêmica e o conhecimento das diversas competências. O trabalho em equipe, porém, é muito limitado. Empresa A Todos os quatro sócios da empresa A são muito preocupados em compartilharem seus conhecimentos entre si e em tomarem decisões em conjunto. Eles realizam duas reuniões de cúpula por semana, além da reunião semanal com os funcionários, já mencionadas. Nesta reunião com todos os funcionários, cada semana uma pessoa é designada para falar aos outros sobre seu trabalho, suas dificuldades e suas dependências em relação ao trabalho dos outros. Esta atitude favorece enormemente a presença da visão sistêmica na organização. Além do mais, foi possível notar que os discursos dos quatro sócios quanto a objetivos, as idéias e mesmo os exemplos, são bem coerentes e mutuamente afinados. O trabalho em equipe, porém, existe muito incipiente, apesar de ter sido relatado um esforço para integração entre as diferentes tarefas dos funcionários. Todos os funcionários afirmaram no survey que aprendem com “todo mundo” na empresa, o que é um indício de que os funcionários vêem todos da empresa como fonte de aprendizagem. Tal atitude também favorece a troca sistêmica e a redundância. Empresa B A empresa B atua em uma atividade em que a natureza do trabalho dos funcionários é especializada e personalizada. Há troca de idéias informalmente entre eles, mas não há trabalho em equipe. Também não se detectou a consciência do impacto do trabalho individual para o sucesso de toda a empresa. Por outro lado, o conhecimento redundante acontece e a substituição é possível. Quanto às reuniões, elas só acontecem em caso extraordinário, pois o proprietário afirma que os funcionários têm preconceito contra reunião e que ele acredita mais nas conversas informais. 5.5 - Ação Monitorada O dinamismo dos mercados, o arrojo das pequenas empresas lidando com a experimentação, a atitude humilde quanto à aprendizagem e o caráter gerencial não punitivo, são fatores que contribuem para que a aprendizagem nestas empresas gere constante mudança. A insipiência da 14 monitoração, no entanto, acaba comprometendo a intencionalidade da aprendizagem e o conseqüente controle e direcionamento das mudanças conquistadas. Empresa A Há algum acompanhamento das mudanças e da aprendizagem por parte da empresa em questão, uma vez que ela se esforça para implantação de controles formais: há planos de trabalhos para resolução de problemas, atas de reuniões com acompanhamento de soluções, acompanhamento dos custos e receitas, acompanhamento de reclamações e satisfação dos clientes, relatórios sobre a produção e sobre a satisfação dos clientes. No entanto tais informações não são consolidadas e acompanhadas do ponto de vista do processo evolutivo da empresa. Os sócios mantêm uma atitude de aprendizagem com as experiências malsucedidas e a empresa consegue estimular um comportamento positivo em torno das experimentações e mudanças, em grande parte devido a sua atitude não-punitiva face às falhas. Não há ambiente de punição: admite-se que o erro é constante e leva a aprendizagem - procuram tratar o erro como inerente ao esforço desde que se busque soluções. Eles se dizem focados nas inovações e que seu maior objetivo a curto prazo é fazer com que o cliente seja bem atendido por todas as áreas da empresa, independente da responsabilidade direta técnica ou comercial. Também estariam buscando difundir uma filosofia de maior autonomia dos funcionários, independência e despersonalização das tarefas. Unanimemente os funcionários responderam que a empresa está “mudando para melhor” ao longo de tempo. Empresa B A experimentação, método defendido como importante em uma Learning Organization, vem sendo uma característica inconteste na empresa B. Estão continuamente alterando propostas a partir das informações do mercado. O acompanhamento é mensal e o planejamento semestral – com possibilidade de alterações da dinâmica para adaptação ao contexto, experimentando sem medo de erro ou punições. Os funcionários têm total liberdade para criatividade no trabalho e também afirmaram todos que a empresa tem mudado para melhor. 6- A Adoção de Estratégias de Aprendizagem por Pequenas Empresas Empreendedoras A partir do que acaba de ser apresentado, podemos inferir que algumas características do modelo Learning Organization é privilegiado em sua adoção por PME’s devido a algumas características intrínsecas dessas empresas. Podemos imaginar também que existem outros aspectos das pequenas empresas que acabam por constituir um obstáculo para a adoção deste tipo de estratégia. Ora, para fins de nossa pesquisa, consideramos como características intrínsecas às PME’s o fato de possuírem um numero reduzido de empregados; de serem controladas pelo empreendedor/dirigente com gestão altamente personalizada; de terem pouca disponibilidade de recursos; de possuírem uma estrutura orgânica, pouco burocratizada, onde a relação entre as pessoas é mais informal e de serem muito dependentes do ambiente externo. Assim, a partir desta concepção, podemos comparar os elementos propostos do modelo Learning Organization e sua relação com as características específicas das PME’s, tendo como base os casos pesquisados. Desta forma consolidaremos compreensões sobre as dificuldades e facilidades na adoção de estratégias avançadas de aprendizagem organizacional por pequenas empresas empreendedoras. Estas reflexões que procuramos representar no Quadro 1. Indicamos os principais elementos do modelo, sua presença ou ausência nas empresas pesquisadas e sua possível relação com as características de uma PME. 15 Evidentemente, o score computado não tem relação com a eficácia do modelo, uma vez que não exploramos pesos de cada elemento. QUADRO 1 - LEARNING ORGANIZATION NAS PEQUENAS EMPRESAS EMPREENDEDORAS ESTUDADAS: FACILIDADES E OBSTÁCULOS Elementos do Modelo Presença nas Empresas A B Características de Pequena Empresa Empreendedora Reduzido numero de empregados Recursos restritos Gestão personalizada centralizadora Estrutura orgânica e informal Dependente do ambiente externo Ambiente que Incentive a Aprendizagem • Estrutura orgânica • Exploração de diferentes formas de aprendizagem Adoção de políticas que incentivem aprendizagem contínua Instalações físicas que convidem à troca • • √ √ √ √ + + + √ + - Parcial - - Democratização das Informações • • Conteúdo rico (sucesso e fracasso) Fontes variadas • Fluxo mulitidirecional • Variedade de mecanismos para transmissão das informações Parcial - √ √ Parcial √ √ + + Objetivos Compartilhados • Planejamento • Comprometimento • Comunhão de propósitos √ - - + - Visão Sistêmica • • • Autoregulação a partir de feedbacks Interdependência entre as partes Redundância √ √ - √ + + + Parcial √ √ + + + Ação Monitorada • Experimentação • Monitoração regular Parcial • Geração de mudança √ √ √ √ 13 11 Score Legenda: + 4+ √ Elemento presente + favorece a adoção do modelo - prejudica na adoção do modelo 3+ / 2 - + - + + 5- 6+ / 3 - 4+ 16 7- Conclusões Alguns aspectos podem ser inferidos a respeito da adoção de estratégias avançada de gestão, particularmente de modelos de aprendizagem, por pequenas empresas empreendedoras a partir dos resultados desta pesquisa. Antes de qualquer coisa podemos afirmar que as empresas pesquisadas estão próximas do modelo, uma vez que apresentam mais de dois terços dos dezessete elementos identificados no modelo. Todavia, podemos também remarcar que os elementos menos presentes nas duas referem-se à democratização das informações. As empresas pesquisadas não têm preocupação de utilizar diferentes fontes nem diferentes mecanismos de difusão de informação para seus membros e, mais marcante, o conteúdo das informações não é priorizado. É interessante notar que apesar do número reduzido de membros favorecer à que as informações fluam facilmente por toda a empresa, a centralização da gestão por parte dos empreendedores-dirigentes impede as participações nas decisões, inibindo o compartilhamento de conhecimentos e de aprendizagens consolidadas pela organização. Por outro lado, o número reduzido de empregados facilita ainda a adoção de estratégias como as do modelo de learning organizations, favorecendo uma estrutura orgânica, o fluxo multidirecional das informações, o comprometimento e sentimento de pertença das pessoas na organização e a existência de redundância de funções. No que diz respeito à restrição de recursos, de um lado é claro que existem os efeitos negativos para adoção deste tipo de modelo: dificuldades de financiamento de projetos e políticas de aprendizagem, custos de treinamentos e de instalação de uma infra-estrutura que facilite as trocas entre as pessoas. Por outro lado, a restrição age com um desafio que obriga as empresas a explorarem novas formas de agir, a encorajarem a experimentação, a inovação e a criatividade, e a serem redundantes (no sentido de Nonaka & Takeuchi, 1995), isto é, ter pouca gente capaz de se responsabilizarem por praticamente tudo. Por possuírem estruturas informais e pouco burocratizadas, as PME’s podem absorver bem aspectos do modelo como: contar com uma estrutura orgânica, disseminar informações multidirecionalmente, ser capaz de gerar e absorver mudanças, além da adaptabilidade aos feedbacks do ambiente externo, de lidar bem com a interdependência das partes e com a redundância já mencionada. A falta de formalidade porém, torna-se um obstáculo quando dificulta a adoção de políticas contínuas que incentivem a aprendizagem, quando não exige a plena difusão do planejamento e quando as monitorações não são praticadas. Surpreendentemente, a forte dependência do ambiente externo, nas empresas pesquisadas, demonstrou exercer influencia benéficas para adoção de estratégicas de aprendizagem na medida em que ela obriga a empresa a explorar diferentes oportunidades de aprendizagem, a se auto-regular a partir dos feedbacks do mercado, a experimentar continuamente e a gerar mudanças eficazes. Interessante notar que alguns elementos de uma estratégia de aprendizagem, não se relacionam forçosamente a nenhuma característica da pequena empresa empreendedora. Por exemplo, o fato de a empresa utilizar fontes externas variadas de aprendizagem, independe do tamanho, mesmo que nenhuma das empresas pesquisadas utilize, não podemos atribuir tal fato à sua condição de PME. 17 No entanto, das análises que podemos extrair da pesquisa, o que mais se destaca é o obstáculo que pode representar para adoções de estratégias de aprendizagem, a personalização da gestão, por vezes demasiadamente centralizada, por parte dos empreendedores-dirigentes. É esta característica intrínseca às pequenas empresas empreendedoras a mais nociva à que estas adotem estratégias mais avançadas de gestão, centradas na aprendizagem contínua e desenvolvimento coletivo. Esta centralização faz com que as informações importantes se concentrem nas mãos do empreendedor dirigente e em conseqüência impede a democratização das decisões, dos conhecimentos e do compartilhamento de objetivos comuns. A centralização impede ainda a comunhão de esforços em torno de objetivos coletivos, onde os ânimos são todos direcionados aos mesmos fins. Paradoxalmente, como pudemos destacar dos estudos a respeito das pequenas empresas empreendedoras, é a capacidade inovadora dos empreendedores, uma de suas características mais marcantes. Concluímos assim, que é de sua responsabilidade e decisão fazer com que sua empresa se torne uma empresa que aprenda ou não, uma empresa de evolução coletiva ou uma empresa que tenha lances isolados de inovação. 8 - Referências Bibliográficas Anderson, A. and Atkins, M. (2001) Business Strategies for Entrepreneurial Small Firms. Strategic Change 10 (6):311-324. Bauer, M. (1983) Les patrons de PME: entre le pouvoir, l'entreprise et la famille, edn. Paris: InterÉditions. Baumback, C. (1983) Basic Small Business Management, edn. Prentice Hall. Bernardes, M. E. B. (1999) Learning Organization em Empresa Brasileira. Um estudo de caso Belo Horizonte: FACE/UFMG (Dissertação, Mestrado em Administração) Borcieu, S. (2000) L’internationalisation des PME: du déterminisme au volontarisme stratégique. Gestion 2 (1 printemps):12-22. Buckley, W. (1974) A Sociologia e a Moderna Teoria dos Sistemas, edn. São Paulo: Cultrix. Campbell, T. and Cairns, H. (1994) Developing and Measuring the Learning Organization - from buzz words to behaviors. Industrial and Commercial Training 26 (7):10-15. Child , J. (1996) Management of Organizational Learning with a Strategic Alliance. Conférence prononcé à 16 août à UFMG /FACE Belo Horizonte - Brésil (Abstract) Figueiredo, P.C.N. (1994) Gestão da Tecnologia em Organizações Brasileiras: na reta da competitividade ou tavolagem high-tech? Revista de Administração Pública 28 (4, outdez):163-185. Filion, L.-J. (1996) Différences dans les systèmes de gestion des propriétaires-dirigeants, entrepreneurs et opérateurs de PME . Revue canadienne des sciences de l’administration 13 (4):306-320. ASAC. Fleury, A. and Fleury, M.T.L. (1995) Aprendizagem e Inovação Organizacional: as experiências de Japão, Coréia e Brasil, edn. São Paulo : Atlas. Fulmer, R.M. (1994) A Model for Changing the Way Organizations Learn. Planning Review (May/Jun ):20-24. Galbraith, J. (1997) A Organização ‘Reestruturável’. In: HESSELBEIN et al. (Peter Drucker Foundation ), (Ed.) A Organização do Futuro, São Paulo: Futura] Garvin, D.A. (1993) Building a Learning Organization. Harvard Business Review (July- August ):78-91. 18 Hickson, D.J. and Pugh, D.S. (1995) Management Worldwide, edn. Harmonthsworth: Penguin. Huber, G.P. (1991) Organizational Learning: the contributing process and the literatures. Organization Science 2 (1, February): Julien, P.-A. (1997) Les PME : bilan et perspectives, 2e éd. edn. Cap-Rouge, Québec, Paris: Presses inter universitaires. Économica. Lindsay, W. and Rue, L.W. (1980) Impact of the Organization Environment on the Long-Range Planning Process: A Contingency View. Academy of Management Journal 23 (3):385-404. Lounsbury, M. and Glynn, M.A. (2001) Cultural Entrepreneurship: Stories, Legitimacy, and the Acquisition of Resources. Strategic Management Journal 22 545-564. Marchesnay, M. (1997) Le management stratégique. In: Julien, P.-A., (Ed.) Les PME : bilan et perspectives, pp. 100-126. Cap-Rouge: Presses inter universitaires. Économica Miller, D. and Toulose, J.-M. (1986) Chief Executive Personality and Corporate Strategy and Structure in Small Firms. Management Science 32 (11 - November):1389-1409. Morgan, G. (1997) Imagens da Organização, edn. São Paulo: Altas. Morris, L. (1995) Development Strategies for the Knowledge Era. In: Chawla, S. and Renesch, J., (Eds.) Learning Organizations: developing cultures for tomorrow's workplace, Portland, Oregon: Productivity Press Neilsen, E. (1974) Contingency Theory Applied to Small Business Organizations. Human Relations 27 (4):357-379. Nonaka, I. and Takeuchi, H. (1995) The Knowledge-Creating Company, edn. Oxford University Press . Peters, J. (1993) The Enterprise School of Management: turning dreams into reality. A revolutionary proposition of a learning organization. Management Decision 31 (1):4-9. Schein, E. (1983) The Role of the Founder in Creating Organizational Culture. Organizational Dynamics 12 (Summer):13-28. Schein, E. (1996a) Culture: The Missing Concept in Organizational Studies. Administrative Science Quarterly 41 229-240. Schein, E.H. (1996b) Organizational Learning: What is New ? invited address to The Third Biennial International Conference on Advances in Management, Sheraton Tara Hotel, Framingham, MA. June 28 (Abstract) Schuman, J. and Seeger, J. (1986) The Theory and Practice of Strategic Management in Smaller Rapid Growth Companies. American Journal of Small Business (Entrepreneurship: Theory and Practice) 11 (1 - summer ):7-18. Sebrae - "Serviço Brasileiro de Apoio as Micro e Pequenas Empresas - A Grande Dimensão da Pequena Empresa”, Sebrae, 1995 Sebrae, CNI e BNDES (2000) - Relatório da Competitividade da Indústria Brasileira Senge, P.M. (1990a) A Quinta Disciplina: arte, teoria e prática da organização de aprendizagem, edn. São Paulo: Best Seller. Senge, P.M. (1990b) The Leader’s New Work: Building Learning Organizations. Sloan Management Review, Fall pp. 7-23 Sexton, D.L. (1987) Advancing Small Business Research: Utilising Research from Other Areas. Entrepreneurship: Theory and Practice 11 (3 - Winter):25-29. Sligo, F. (1996) Disseminating Knowledge to Built a Learning Organization. The International Journal of Human Resource Management (May ): Starbuck, W. (1965) Organizational Growth and Development. In: March, J., (Ed.) Handbook of 19 Organization , pp. 451-533. Chicago, Rand Nyle Tobin, D.R. (1996) Transformational Learning, edn. Wiley & Sons. Torrès, O. (1998) PME: de nouvelles approches, Paris: Economica. Vale, G.G.M., Aguiar, M.A.S. and Andrade, N.A. (1998) Fatores Condicionantes da Mortalidade das Empresas, Belo Horizonte : Sebrae. Wick W. and Léon, L. (1995) From Ideas to Action: Creating a Learning Organization. Human Resource Management 34 (2, Summer):299-311 . Yin, R.K. (1994) Case Study Research: design and methods, edn. California : Sage.