A SRA. MARIA HELENA BARROS DE OLIVEIRA (REPRESENTANTE DA
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ – FIOCRUZ) – Bom-dia. Quero saudar a
todos
que
compõem
a
Mesa,
aos
presentes
na
pessoa
do
Excelentíssimo Ministro Gilmar Mendes; agradecer ao convite
feito à Fundação Oswaldo Cruz em nome de seu Presidente,
Doutor Paulo Gadelha; e dizer que gostaríamos de destacar o
ineditismo e a importância desta Audiência Pública não só
por todos os temas que aqui estão sendo colocados - e que
continuarão a ser colocados nos dias subsequentes -, mas,
fundamentalmente,
porque
esta
Corte
Suprema,
o
espaço
máximo deste País, está abrindo as suas portas para que a
população
brasileira,
técnicos,
os
as
pessoas
profissionais,
os
comprometidas,
gestores,
os
enfim,
os
brasileiros comprometidos com o País por melhores condições
de saúde possam ter acesso a determinadas informações que,
por exemplo, hoje tão ricamente foram colocadas, agora pela
manhã, pelos que me antecederam.
Como
pesquisadora
da
Escola
Nacional
de
Saúde Pública Sérgio Arouca, Advogada, Doutora em Saúde
Pública, coordeno o Grupo Direitos Humanos e Saúde Helena
Besserman, que tem como objetivo privilegiado a construção
de um novo campo do conhecimento que nominamos de direito e
saúde através da realização de pesquisas, da formação de
recursos
stricto
humanos,
sensu,
e
a
nível
também
tanto
do
atividades
lato
de
sensu
como
extensão.
do
Isso
significa
dizer
que
nós
estamos
aqui
no
sentido
de
referendar, reafirmar todos os princípios do SUS.
Na
verdade,
o
movimento
pela
saúde
engendrado a partir da reforma sanitária, em que a FIOCRUZ
teve
especial
Sanitarista
participação
Doutor
Sérgio
com
a
Arouca,
presença
foi
do
um
ilustre
movimento
extremamente exitoso, e hoje temos no Brasil, como uma
experiência
ímpar,
produto
desse
movimento
social,
político, o SUS - Sistema Único de Saúde -, cuja concepção
de saúde tem que ser entendida como um direito humano. O
que significa dizer que, ao realizarmos qualquer ato em
saúde, estamos obrigatoriamente nos colocando no plano do
princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Portanto, partindo desse conceito de saúde
como um direito humano, daí decorrem alguns pontos que
precisam ser aprofundados neste processo que ora se inicia
com a convocação desta Audiência Pública pela Corte Suprema
brasileira.
Ponto
Um:
nós
gostaríamos
de
trabalhar
a
questão da desmistificação do conceito de judicialização da
saúde.
Temos
que
ter
clareza
que
não
vamos
avançar
estrategicamente e nem efetivamente em relação às demandas
que precisam ser enfrentadas na relação Poder Judiciário,
Poder Executivo e os indivíduos, através do SUS, se nós
seguirmos utilizando a expressão “judicialização da saúde”
como uma grande panacéia de todos os nossos conflitos e
necessidades.
Muitos
destes
temas
estão
sendo
e
serão
elencados nesta Audiência, daí a importância fundamental
desta Audiência.
É preciso refletir sobre as posturas, por
vezes pouco flexíveis, que colocam a prática do Judiciário
no
atendimento
às
demandas
da
sociedade,
por
vezes
é
qualificada de interventora e de que o mesmo está exercendo
a função de executor da política de saúde.
Por
outro
lado,
coloca-se
o
SUS
como
ineficaz e ineficiente em seu papel de executor da política
de
saúde.
É
fundamental
não
esquecer
que
conquistar
o
status constitucional da saúde como um direito de todos e
dever do Estado foi e precisa continuar sendo um avanço da
democracia, que se consolida na construção de uma cidadania
sanitária.
Não é possível reduzir o conceito de saúde à
liberação
de
medicamentos,
à
liberação
de
determinados
procedimentos médicos. Isso é reduzir o conceito que foi
construído
durante
longos
momentos,
durante
um
período
longo de construção da reforma sanitária que foi longamente
trabalhada no processo constituinte e que culminou na nossa
Constituição Federal.
Ponto Dois: gostaríamos de propor e discutir
a criação de espaços de consenso. Na verdade, não existe um
diálogo
permanente
entre
o
Poder
Judiciário
e
o
Poder
Executivo em relação à saúde, tendo como exceções pontuais
experiências exitosas. É preciso a criação de espaços de
consenso onde possa ser desenvolvida uma cultura em direito
e saúde. Existe uma interseção entre essas duas ciências,
as ciências jurídicas e as ciências da saúde. E nós não
podemos, pura e simplesmente, não olhar de frente para essa
interseção e caminhar por dentro dessa interseção.
A
iniciativa
de
continuamente
estarmos
discutindo, em vários setores da FIOCRUZ, as questões entre
direito
e
saúde
surgiu
exatamente
pela
necessidade
da
criação desses espaços de consenso. Cabe aqui destacar o
importante debate organizado pela FIOCRUZ, através do grupo
Direitos Humanos e Saúde Helena Besserman e a Escola da
Magistratura
do
Estado
do
Rio
de
Janeiro,
ocorrido
na
última quinta-feira com o tema “Judicialização da Saúde”,
em que o nobre Desembargador Nagib Slabi colocou, de modo
competente
resistência,
e
extremamente
a
contribuições
despojado
que
de
possam
qualquer
ajudar
na
diminuição das dificuldades que os juízes enfrentam para
tomar as decisões referentes à saúde, propondo, inclusive,
um diálogo com os mesmos no sentido de facilitar essas
tomadas de decisões. Assim, é necessário que usemos um
termo forte, é necessária a apropriação do Poder Judiciário
da
compreensão
das
políticas
públicas
para
a
saúde
e,
também, é necessário que o Poder Executivo aproprie-se da
compreensão do papel inafastável do Poder Judiciário de
aplicar o direito à saúde.
Ponto
Três:
reestruturação
dos
recursos
humanos da saúde e do direito. É interessante destacar que
não há qualquer formação de recursos humanos por parte das
graduações, tanto das ciências da saúde, como também das
ciências jurídicas em relação a essa área direito e saúde.
O ponto mais próximo a que chegamos foi com a incorporação
nos cursos de Bacharelado em Direito da disciplina Direito
Ambiental. Aqui, cabendo ressaltar um grave e equivocado
entendimento desta disciplina, na maior parte das vezes,
que praticamente se dissocia da saúde, como se o ambiente
em que vivemos, o ambiente em que trabalhamos não impusesse
consequências
diretas
em
nossa
saúde.
Alguns
breves
destaques ainda em relação ao Direito Previdenciário.
Enfim,
ainda
não
tivemos
uma
formação,
a
nível das graduações das duas citadas ciências, em que a
Saúde
e
o
Direito
ocupem
um
lugar
privilegiado
de
aprendizado, e isso precisa ser construído.
Inicia-se um tênue movimento de Direito e
Saúde a nível do lato e stricto sensu. Há uma busca – nós,
na Fundação Oswaldo Cruz, sentimos isso, e uma formação
também até de juízes, promotores, desembargadores - por
mestrados e doutorados para discutir questões nessa área.
Com, também, na área da saúde pública, alguns começam a
procurar os cursos de lato e stricto sensu para uma melhor
construção, para um maior aprimoramento e até entendimento
das questões do Direito.
Ponto Quarto: nós gostaríamos de destacar o
papel da FIOCRUZ. A FIOCRUZ assume um papel privilegiado e
facilitador por ser uma instituição secular. Há mais de cem
anos nós trabalhamos em saúde pública. Portanto, é possível
contribuir com o avanço das discussões aqui iniciadas, até
pela sua missão institucional de trabalhar com a produção
do
conhecimento
através
da
pesquisa
em
saúde
pública,
enfrentando os desafios da criação de novas tecnologias, na
produção de insumos, medicamentos e fundamentalmente em sua
missão mais destacada de formar recursos humanos.
Na
verdade,
a
Escola
Nacional
de
Saúde
Pública Sérgio Arouca, uma das Unidades da Fundação Oswaldo
Cruz, tem se voltado, nos últimos vinte anos, para formação
de recursos humanos para o SUS.
Fica
aqui
o
compromisso
assumido
institucionalmente de efetivamente contribuir de todas as
formas
possíveis
para
a
consolidação
de
espaços
de
consenso, por ser uma instituição a nível nacional que se
encontra presente em todos os Estados da Federação através
de suas atividades, com especial destaque para os Estados
em que temos extensões das físicas, inclusive, da FIOCRUZ,
como os Estados de Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Mato
Grosso,
Amazonas,
Piauí,
Ceará,
Pará,
Brasília,
entre
outros.
Para terminarmos a nossa participação nesta
importante e histórica Audiência, gostaríamos de citar as
palavras do Professor Sanitarista Doutor Nelson Rodrigues
dos Santos, no texto cujo título é “A REFORMA SANITÁRIA E O
SUS: TENDÊNCIAS E DESAFIOS APÓS 20 ANOS” - que foi enviada
para contribuir com este debate e se encontra no site do
Supremo
-,
literalmente
em
o
que
ele
seguinte:
encerra
“A
esse
sociedade
artigo
civil
dizendo
e
suas
entidades, incluindo as ligadas à reforma sanitária e aos
direitos sociais, certamente encontrarão e abrirão novos
caminhos”. Complementando nosso ilustre Sanitarista, temos
a esperança e acreditamos que poderemos criar espaços de
consenso juntamente com o Estado através dos seus Poderes
Judiciário, Executivo e Legislativo na construção de um
País mais justo e digno, onde princípios como a ética e a
dignidade da pessoa humana sejam os norteadores de nossas
políticas públicas para a saúde.
Muito obrigada.
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Maria Helena Barros de Oliveira