EXMO. SR. MINISTRO DIAS TOFFOLI – RELATOR DA RECLAMAÇÃO Nº 19.464 – E. SEGUNDA TURMA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Reclamação nº 19.464 ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS JORNAIS (“ANJ”), nos autos da reclamação em epígrafe, proposta em face da r. decisão proferida pelo MM. Juízo da 4ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, nos autos do processo nº 0007029-14.2011.4.03.6106, que afrontou diretamente a decisão proferida por esta E. Corte no julgamento da ADPF nº 130, vem a V. Exa., por seus advogados abaixo assinados, com fulcro no art. 317, §2º, do RISTF, requerer a reconsideração da r. decisão que cassou a liminar parcialmente deferida e negou seguimento à presente reclamação, e, caso assim não se entenda, o recebimento desta petição como agravo regimental, pelas razões expostas adiante. I – TEMPESTIVIDADE 1. A r. decisão que cassou a liminar e negou seguimento a esta reclamação foi disponibilizada no DJe nº 178, de 09/09/2015, reputando-se formalmente publicada em 10/09/2015, quinta-feira. Assim, o prazo de 5 (cinco) dias previsto pelo art. 317 do RISTF começou a fluir em 11/09/2015, sexta-feira, e chega a termo em 15/09/2015, terça-feira. É manifestamente tempestivo, portanto, o presente agravo regimental. 1 II – BREVE SÍNTESE DOS FATOS E DA R. DECISÃO AGRAVADA 2. Trata-se de reclamação ajuizada contra decisão judicial proferida pelo MM. Juízo da 4ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP nos autos do inquérito policial nº 0007029-14.2011.4.03.6106, que determinou a quebra do sigilo telefônico do jornalista Allan de Abreu Aio e do jornal Diário da Região com o objetivo de descobrir a fonte de notícias veiculadas no jornal e assinadas pelo jornalista, em franco descompasso com o que foi decidido pelo STF por ocasião do julgamento da ADPF nº 130 – precedente paradigmático na defesa do exercício livre e independente da imprensa. Explique-se melhor. 3. Nos dias 1º e 06/05/2011, o Diário da Região, de São José do Rio Preto (SP), publicou duas reportagens sobre a denominada Operação Tamburutaca, deflagrada pela Polícia Federal (“PF”). A operação investigava suposto esquema de corrupção na Delegacia do Trabalho daquele Município. A matéria foi assinada pelo repórter investigativo Allan de Abreu Aio, que divulgou trechos de conversas telefônicas interceptadas por ordem do MM. Juízo da 4ª Vara da Justiça Federal de São José do Rio Preto/SP, no bojo do processo nº 0000577-56.2009.403.6106, sob segredo de justiça. 4. A reportagem provocou a reação do Ministério Público Federal (“MPF”), que, em 30/06/2011, requisitou o indiciamento criminal1 do repórter Allan de Abreu Aio para apurar a prática do crime previsto no art. 10 da Lei nº 9.296/96. Segundo o Parquet, o jornalista teria divulgado informações confidenciais acerca da Operação Tamburutaca, sem a devida autorização judicial, em matérias publicadas no Diário da Região. 5. No inquérito policial, Allan de Abreu Aio confirmou a produção dos textos e a sua entrega aos responsáveis pela edição e publicação do jornal. No entanto, em cumprimento ao seu dever legal e ético-profissional, o repórter considerou-se impedido de revelar sua fonte, sob pena, inclusive, de cometer crime, nos termos do art. 154 do Código Penal. Em seu depoimento, o editor-chefe do Diário da Região, Fabrício Carareto Barciela Marques, 1 Inquérito policial nº 0245/2011-4/DPJ/SJE/SP; processo judicial nº 0007029-14.2011.403.6106. 2 enfatizou a relevância de informar a população sobre improbidades perpetradas por agentes públicos2. 6. Diante desses elementos, o Delegado da Polícia Federal, José Eduardo Pereira de Paula, concluiu, em 13/02/2014, pela atipicidade da conduta do jornalista Allan de Abreu Aio, encerrando o inquérito policial para remessa dos autos ao MPF e, posteriormente, ao juízo competente. 7. Discordando da conclusão do Delegado, o Parquet requereu, em 10/07/2014, autorização judicial, com quebra de sigilo, para que fossem acessados os dados referentes às linhas telefônicas registradas em nome do jornalista e da Empresa de Publicidade Rio Preto S.A. (Diário da Região). Com isso, o MPF pretendia – e ainda pretende – identificar a fonte das informações transmitidas ao jornalista investigativo. 8. Acolhendo tal pedido, o MM. Juízo da 4ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP determinou a expedição de ofício às operadoras de serviços telefônicos para que informassem as linhas registradas em nome do repórter e do jornal. 9. Contra essa decisão, o Diário da Região impetrou mandado de segurança3, com o objetivo de assegurar seu direito constitucional à preservação do sigilo da fonte. No entanto, o E. TRF-3ª Região indeferiu a liminar postulada, em decisão publicada no dia 30/12/20144. 10. Foi nesse contexto que a ora agravante ajuizou reclamação perante esse E. STF. Em sua petição inicial, protocolizada em 05/01/2014, a ANJ demonstrou que a decisão proferida pelo MM. Juízo da 4ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP viola 2 Sobre a fonte da informação, o editor comunicou que o jornalista recebeu de um desconhecido material contendo informações das conversas telefônicas interceptadas judicialmente na Operação “Tamburutaca”. Com o fito de colaborar com as investigações, o próprio editor juntou aos autos do inquérito policial o material entregue pelo desconhecido. 3 O writ impetrado perante o TRF-3ª Região foi autuado sob o nº 0032481-06.2014.4.03.0000. 4 O Des. Fed. Mauricio Kato, ao apreciar o pedido de liminar durante o plantão, salientou não ter restado caracterizada violação a direito líquido e certo da impetrante, porque o MS não foi instruído com cópia do inquérito policial instaurado para apurar a suposta prática do delito pelo jornalista Allan de Abreu Aio. Não foi feito nenhum juízo de valor, pelo TRF-3, acerca da inviolabilidade do sigilo de fonte. 3 frontalmente a autoridade da decisão proferida nos autos da ADPF nº 130, visto que o sigilo de fonte jornalística (CRFB, arts. 5º, XIV5, e 220, §1º6) consiste em conditio sine qua non para se assegurar, de maneira efetiva, as liberdades de informação e de expressão jornalística (CRFB, arts. 5º, IV7, IX8, e 2209). Tudo como reconhecido naquela paradigmática Arguição. 11. No dia 08/01/2015, durante o recesso judiciário, sobreveio decisão do Presidente deste E. STF, Min. Ricardo Lewandovski, concedendo parcialmente a liminar pleiteada para determinar a suspensão dos efeitos da decisão reclamada até ulterior análise do relator sorteado, Exmo. Ministro Dias Toffolli. Confira-se: “Examinados os autos, embora entenda presente a relevância dos fundamentos deduzidos na exordial, penso que a questão não pode ser decidida em um exame prefacial do processo, próprio da medida requerida, exigindo-se o regular aparelhamento dos autos, com a vinda das informações prestadas pelo órgão judiciário prolator da decisão aqui questionada e do parecer da Procuradoria Geral da República. Todavia, por cautela e a fim de resguardar eventual utilidade deste provimento judicial, penso ser necessária a suspensão da decisão impugnada até ulterior apreciação da questão de fundo. Ressalto, nesse sentido, que não há, a princípio, nenhum prejuízo na suspensão da decisão judicial ora combatida; ao revés, estar-se-á resguardando uma das mais importantes garantias constitucionais, a liberdade de imprensa, e, reflexamente, a própria democracia. Isso posto, defiro em parte a liminar, tão somente para suspender o ato impugnado até que os autos retornem da Procuradoria Geral da República e com as informações solicitadas, quando, então, o pleito deduzido poderá ser amplamente decidido pelo Relator sorteado” (grifou-se). 12. Ocorre que, recentemente, o Exmo. Ministro Dias Toffolli, relator do caso, decidiu (i) cassar a liminar parcialmente deferida e (ii) negar seguimento à reclamação, sob o 5 “Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. 6 “Art. 220. (…) § 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV”. 7 “Art. 5º. Omissis: (…) IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. 8 “Art. 5º. Omissis: (…) IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. 9 “Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”. 4 fundamento de que não haveria “identidade entre o debate travado na presente reclamação e o entendimento vinculante apto a instaurar o exercício da jurisdição, em sede reclamatória, pelo Supremo Tribunal Federal”. Segundo o eminente relator, “além de não se tratar de censura prévia exercida pelo Poder Judiciário sobre a atividade de comunicação desempenhada pela sociedade empresária e pelo jornalista, tem-se que a decisão reclamada não está fundamentada na lei de imprensa, mas sim em elementos de prova carreados nos autos originários”. Assim, em sua visão, não haveria “aderência estrita do objeto do ato reclamado” à decisão tomada por este E. STF nos autos da ADPF nº 130, razão pela qual “a via da reclamação não é [seria] cabível diante do caso concreto em discussão”. 13. Ainda de acordo com o Min. Dias Toffolli, “a [presente] reclamação, se conhecida, abrirá ao STF a obrigatoriedade de analisar todas as ações sobre a temática da liberdade de imprensa e de manifestação de pensamento em trâmite no Brasil”. Neste tocante, afirmou: “[e]staríamos atraindo para esta Corte Suprema a competência originária dada aos juízes e tribunais do país para o julgamento dos litígios interpessoais e intersubjetivos. Seria uma usurpação de competência às avessas, barateadora do papel desta Suprema Corte”. 14. Em que pese o imenso respeito e admiração que a ora agravante nutre pelo eminente Ministro Relator, a r. decisão monocrática, d.v., deve ser reformada por esta C. 2ª Turma, para que se dê seguimento à presente reclamação, que, ao final, deverá ser julgada procedente. Como se verá a seguir, o v. acórdão proferido por este E. STF nos autos da ADPF nº 130 não se limitou a vedar a censura prévia, embora tal questão tenha sido abordada com destaque no julgamento. Na verdade, o aludido precedente, que foi um marco na jurisprudência da Corte e na história do País, deve ser entendido de maneira mais ampla, no sentido de assegurar os requisitos mínimos para o exercício livre e independente da atividade jornalística. E dente esses se insere, indubitavelmente, o sigilo de fonte. Assim, nas hipóteses em que há violação ostensiva às condições mínimas necessárias à preservação da liberdade de imprensa – como no presente caso –, e tão-somente nessas hipóteses, este E. STF deve atuar de maneira firme quando provocado pela via da reclamação para garantir a autoridade do julgado proferido na ADPF nº 130. Trata-se do único entendimento compatível com o nobre 5 papel de guardião dos direitos fundamentais reservado a esse E. Tribunal. É o que se passa a demonstrar. III – MANIFESTO CABIMENTO DA PRESENTE RECLAMAÇÃO: INCOMPATIBILIDADE ENTRE A DECISÃO DE ORIGEM E O ACÓRDÃO PROFERIDO POR ESTE E. STF NO JULGAMENTO DA ADPF Nº 130 III.1. O sigilo de fonte como garantia institucional ao livre exercício da atividade de imprensa 15. Em seu art. 5º, XIV, a Constituição da República assegura a todos o acesso à informação e resguarda, sem excepcionar, “o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.” Não há dúvidas de que esse dispositivo consagra uma das mais essenciais garantias institucionais ao desenvolvimento da atividade jornalística. É que não há jornalismo sem proteção ao sigilo da fonte. Trata-se de pressuposto para o pleno exercício do direito à informação, tanto sob a ótica do direito de informar – isto é, de comunicar fatos objetivamente considerados – quanto sob a ótica do direito de ser informado – direito subjetivo do qual todo cidadão é titular. 16. Dito de forma singela, em um país onde não se resguarda o sigilo da fonte jornalística, o direito de todos os cidadãos de serem informados a respeito de fatos de interesse público resta permanentemente ameaçado (quando não esvaziado). Daí porque a proteção das fontes e da imprensa contra todo e qualquer tipo de interferência estatal é garantia institucional essencial ao desenvolvimento saudável da própria democracia. 17. Realmente, no bojo de um Estado Democrático de Direito, cabe à imprensa um papel central e proativo de controle das atividades dos órgãos públicos. Sua atuação é crucial para revelar ao público eventuais desvios na atuação daqueles que se encontram no poder. Nas palavras do Ministro Ayres Britto, “a Constituição destinou à imprensa o direito de controlar e revelar as coisas respeitantes à vida do Estado e da própria Sociedade”.10 10 STF, ADPF nº 130, Rel. Min. Carlos Britto, Tribunal Pleno, j. em 30/04/2009, DJ de 06/11/2009. 6 18. Esse direito, como se disse, só pode ser exercido se resguardado o sigilo da fonte, na medida em que, permitir a devassa das fontes da informação jornalística por meio de decisão judicial dá margem à restauração do controle estatal sobre a imprensa, uma das características mais marcantes do regime ditatorial, que o constituinte de 1988 pretendeu abolir. 19. Nesse sentido, não há dúvidas de que, sob a égide da Constituição de 1988, o sigilo da fonte jornalística deve prevalecer inclusive sobre eventuais ilícitos que tenham sido praticados antes da divulgação da notícia. Quando estiver em jogo a divulgação de informações relevantes ao público – como no caso da decisão reclamada, que envolvia denúncias sobre grave esquema de corrupção –, não se pode punir o jornalista pelo fato de um terceiro ter obtido a informação de maneira ilícita – mesmo que seja sua fonte. 20. Mais que isso, no cenário brasileiro, o jornalista possui verdadeiro dever de resguardar a identidade da fonte, sob pena de cometer um ilícito penal. É que a violação do segredo profissional foi tipificada como crime, nos termos do art. 154 do Código Penal1112 . Logo, para o jornalista, a proteção constitucional ao sigilo da fonte representa tanto um direito que lhe assegura o livre exercício de sua profissão, como um dever, cuja inobservância o sujeita a sanções criminais.13 21. Admitida a quebra do sigilo jornalístico, eventuais detentores de informações relevantes ao público simplesmente não as revelarão a jornalistas, com medo de eventuais retaliações. Grandes “furos” de reportagem, esquemas de corrupção e escândalos políticos 11 Confira-se: “Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa de um conto a dez contos de réis (…)”. 12 O Código de Processo Criminal da França também garante o sigilo profissional do jornalista em seu artigo 109 (“Article 109 – Tout journaliste, entendu comme témoin sur des informations recueillies dans l'exercice de son ctivité, est libre de ne pas en révéler l'origine”. Tradução livre: “Todo jornalista, entendido como testemunha das informações obtidas no exercício de sua atividade, é livre para não revelar a sua origem”). 13 Confiram-se, uma vez mais, as lições de Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho: “Na verdade, para o jornalista, o sigilo da fonte representa um dever de não divulgar a identidade desta, cujo descumprimento poderá tipificar o crime de violação de segredo profissional descrito no artigo 154 do Código Penal (…) A doutrina esclarece que não só a fonte está acobertada pelo direito, mas também tudo o que concorreu para a obtenção da informação junto à fonte, como filmes, gravações, documentos etc., o que compreenderia também os registros telefônicos”. (CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Op. Cit., p. 174-175; grifou-se). 7 correm o risco de deixar de ser divulgados, pois a simples possibilidade de quebra do sigilo possui o potencial de colocar a fonte em risco. O efeito silenciador é inegável. E o prejuízo para a democracia, irreparável.14 22. Não se pode perder de vista, por outro prisma, que a Constituição de 1988 trata do sigilo da fonte como regra constitucional, que não comporta nenhuma exceção, ao contrário dos demais sigilos (de dados, telefônicos, telegráficos etc.), que podem ser relativizados para fins de investigação criminal e processual penal. Isso evidencia que o sigilo da fonte constitui caso específico que só pode ser compreendido como uma exceção à possibilidade de quebra dos outros sigilos. É dizer, salvo quando puder comprometer o sigilo da fonte jornalística, os demais sigilos assegurados pela Constituição podem ser quebrados para fins de investigação criminal ou processual penal. 23. Some-se a isso o fato de que a quebra do sigilo telefônico permite a exposição de todas as fontes de um jornalista ou de um veículo de comunicação, indiscriminadamente. Afinal, o investigador terá acesso a todos os dados e conversas dentro do período em questão. Por sua natureza, a medida torna a imprensa vulnerável a todo tipo de pressão ou barganha e permite o conhecimento de fontes que nada tenham que ver com o objeto da investigação. 24. Por aí se vê que, muito ao contrário do que restou consignado na decisão reclamada, a quebra do sigilo telefônico do repórter investigativo Allan de Abreu Aio e do Diário da Região, com vistas à identificação da fonte das informações, não irá “trazer mais elementos para uma melhor prestação jurisdicional”. Trata-se, ao contrário, de determinação flagrantemente inconstitucional e incompatível com o sistema de liberdades consagrado na ADPF nº 130, razão pela qual deve ser imediatamente suspensa e, posteriormente, cassada por esse E. STF. 14 Nas palavras de José Cretella Neto, “[s]e o sigilo de fontes não fosse assegurado, não teriam os profissionais de imprensa acesso a expressivo manancial de informações, pois os detentores destas não iriam arriscar suas vidas ou de seus familiares em troca de indiscrições”. CRETELLA NETO, José. Comentários à lei de imprensa: Lei 5.250, de 09.02.1967 e alterações interpretadas à luz da Constituição Federal de 1988 e da Emenda Constitucional nº 36, de 28.05.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 78. 8 III.2. Da aderência inequívoca da decisão reclamada ao conteúdo do acórdão paradigma. A decisão proferida na ADPF nº 130 deve ser aplicada de forma abrangente, a fim de assegurar as condições institucionais necessárias ao exercício da liberdade de imprensa. 25. Tendo-se demonstrado que o resguardo do sigilo de fonte jornalística é garantia institucional essencial ao exercício pleno das liberdades de informação e de expressão jornalística (CRFB, arts. 5º, IV, IX, e 220), cumpre evidenciar em que medida a decisão reclamada, ao determinar a quebra do sigilo telefônico das linhas do jornalista Allan de Abreu Aio e do Diário da Região, contrariou o quanto decidido por este E. STF na ADPF nº 130, de modo a afirmar o inequívoco cabimento da presente reclamação. 26. Como se sabe, a reclamação é o instrumento processual voltado a assegurar a prevalência da competência do STF e da autoridade de seus julgados, “notadamente quando impregnados de eficácia vinculante, como sucede com aqueles proferidos em sede de fiscalização normativa abstrata”15. Assim, conforme destacado pela r. decisão recorrida, um requisito fundamental para o cabimento da reclamação é a aderência estrita do objeto do ato reclamado ao conteúdo das decisões paradigmáticas do STF. Daí porque, para estabelecer o cabimento da via reclamatória, é necessário delimitar anteriormente o escopo daquilo que foi decidido no paradigma apontado. 27. Como já indicado, a presente reclamação foi ajuizada com a finalidade de assegurar a autoridade da decisão vinculante proferida nos autos da ADPF nº 130, a qual declarou a não recepção, pela Constituição de 1988, da Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/1967). Quando do referido julgamento, esta E. Suprema Corte consignou que os veículos de comunicação não podem ser tolhidos em suas atividades e liberdades básicas, sob pena de se comprometer o próprio funcionamento da democracia. Portanto, qualquer imposição do Poder Público que, explícita ou implicitamente, de forma intencional ou não, interfira nessas liberdades, condicionando-as ou cerceando-as, não pode subsistir à luz da Carta Constitucional por violar aquele julgado. 15 STF, Rcl 1.722, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. em 26/02/2003, DJ 13/05/2005. 9 28. Firme na ideia de que a Constituição de 1988 fez uma opção bastante clara em defesa das liberdades de expressão e de imprensa, este Pretório Excelso destacou “a plena liberdade de imprensa” como “categoria jurídica proibitiva de qualquer tipo de censura prévia” de qualquer natureza; inclusive a judicial. 29. De toda forma, a amplitude da ADPF nº 130 revela-se muito superior à vedação da censura prévia. Em verdade, no referido julgado, esta E. Corte estabeleceu a impossibilidade de o Estado fixar quaisquer condicionamentos e restrições capazes de interferir com o exercício da profissão jornalística, fixando a necessidade de se assegurarem garantias mínimas para o exercício pleno das liberdades de informação e de expressão jornalística (CRFB, arts. 5º, IV, IX, e 220). 30. Neste diapasão, interpretar a decisão da ADPF nº 130 como mera vedação à censura prévia – em que pese a acentuada relevância dada a tal tema – reduz de forma injustificada, com as devidas vênias, a importância do julgado como paradigma para a delimitação do bloco constitucional concernente aos direitos fundamentais acima apontados. É justamente a partir dessa ótica que se deve avaliar a compatibilidade da decisão reclamada com a Constituição e com o acórdão proferido na ADPF nº 130. 31. Realmente, o exercício das liberdades de expressão e de imprensa não depende exclusivamente da ausência de censura prévia aos veículos de comunicação. Em verdade, tais liberdades só podem ser exercidas de forma plena se forem asseguradas a jornais e jornalistas outras garantias institucionais, tal qual o sigilo da fonte. Não por menos, o art. 5º, XIV, da CRFB protegeu de forma categórica o “sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.” Sem ele, não se pode falar na existência de uma imprensa livre, mas apenas em uma “imprensa oficial”, referendada e chancelada por órgãos do Estado. Afinal, um dos elementos essenciais para se exercer o jornalismo de forma isenta e imparcial é o resguardo do sigilo da fonte. Relativizá-lo abala os alicerces em que erigidas as liberdades de informação e de imprensa. 10 32. Não foi por menos que a decisão proferida na ADPF consignou expressamente que a “prerrogativa concernente ao sigilo da fonte, longe de qualificar-se como mero privilégio de ordem pessoal ou estamental, configura, na realidade, meio essencial de concretização do direito constitucional de informar”. E é justamente nesse sentido que o art. 5º, XIV, da CRFB e demais dispositivos que consagram as liberdades de expressão e de informação conformam um verdadeiro escudo contra “quaisquer órgãos ou autoridades do Poder Público, não importando a esfera em que se situe a atuação institucional dos agentes estatais interessados”16. A propósito, confira-se a ementa do referido decisum, com destaque especial ao respeitável voto da lavra do Min. Celso de Mello: “Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). Lei de imprensa. (…) regime constitucional da ‘liberdade de informação jornalística’, expressão sinônima de liberdade de imprensa. A ‘plena’ liberdade de imprensa como categoria jurídica proibitiva de qualquer tipo de censura prévia. A plenitude da liberdade de imprensa como reforço ou sobretutela das liberdades de manifestação do pensamento, de informação e de expressão artística, científica, intelectual e comunicacional. Liberdades que dão conteúdo às relações de imprensa e que se põem como superiores bens de personalidade e mais direta emanação do princípio da dignidade da pessoa humana. O capítulo constitucional da comunicação social como segmento prolongador das liberdades de manifestação do pensamento, de informação e de expressão artística, científica, intelectual e comunicacional. Transpasse da fundamentalidade dos direitos prolongados ao capítulo prolongador. (…) relação de mútua causalidade entre liberdade de imprensa e democracia. Relação de inerência entre pensamento crítico e imprensa livre. A imprensa como instância natural de formação da opinião pública e como alternativa à versão oficial dos fatos.” (trecho da ementa). “(…) Como se sabe, nenhum jornalista poderá ser constrangido a revelar o nome de seu informante ou a indicar a fonte de suas informações, sendo certo, ainda, que não poderá sofrer qualquer sanção, direta ou indireta, quando se recusar a quebrar esse sigilo de ordem profissional. Na realidade, essa prerrogativa profissional qualifica-se como expressiva garantia de ordem jurídica, que, outorgada a qualquer jornalista em decorrência de sua atividade profissional, destina-se, em última análise, a viabilizar, em favor da própria coletividade, a ampla pesquisa de fatos ou eventos cuja revelação se impõe como consequência ditada por razões de estrito interesse público. (…). Essa é a razão pela qual a Carta Política, ao proclamar a declaração de direitos, nela introduziu - enquanto verdadeira pauta de valores essenciais à preservação do Estado democrático de direito - a explícita referência à 16 ADPF 130, Rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, j. em 30/04/2009, DJe 06/11/2009. 11 indevassabilidade da fonte de informações, qualificando essa prerrogativa de ordem profissional como expressão de um dos direitos fundamentais que claramente limitam a atividade do Poder Público. A Constituição da República, tendo presente a necessidade de proteger um dos aspectos mais sensíveis em que se projetam as múltiplas liberdades do pensamento - precisamente aquele concernente ao direito de obtenção da informação -, prescreveu, em seu art. 5º, n. XIV, que ‘é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional’ (grifei). (…). Cumpre enfatizar - presente o quadro normativo em referência - que, mais do que simples prerrogativa de caráter individual ou de natureza corporativa, a liberdade de informação jornalística desempenha uma relevantíssima função político-social, eis que, em seu processo de evolução histórica, afirmou-se como instrumento realizador do direito da própria coletividade à obtenção da informação (JOSÉ AFONSO DA SILVA, ‘Curso de Direito Constitucional Positivo’, p. 246, item n. 15.3, 32º ed., 2009, Malheiros; JOSÉ CRETELLA JUNIOR, ‘Comentários à Constituição de 1988’, vol. I/283, item n. 184, 1989, Forense Universitária). A liberdade de imprensa, na medida em que não sofre interferências governamentais ou restrições de caráter censório, constitui expressão positiva do elevado coeficiente democrático que deve qualificar as formações sociais genuinamente livres. E a prerrogativa do sigilo da fonte, nesse contexto, constitui instrumento de preservação da própria liberdade de informação. Isso claramente significa que a prerrogativa concernente ao sigilo da fonte, longe de qualificar-se corno mero privilégio de ordem pessoal ou estamental, configura, na realidade, meio essencial de concretização do direito constitucional de informar, revelando-se oponível, em consequência, a quaisquer órgãos ou autoridades do Poder Público, não importando a esfera em que se situe a atuação institucional dos agentes estatais interessados. (…). Resulta claro, pois, que o juízo negativo de recepção da Lei de Imprensa não afetará a prerrogativa jurídica que assegura, ao jornalista, o direito de não revelar a fonte de suas informações, pois - insista-se - esse direito, agora, compõe o quadro da própria declaração constitucional de direitos e garantias individuais, não podendo sofrer qualquer tipo de restrição, nem legitimar, quando exercido, a imposição, ao jornalista, de medidas de caráter punitivo. O direito de preservar o sigilo da fonte representa prerrogativa de extração eminentemente constitucional, cujo fundamento reside em estatuto - a própria Constituição da República (art. 5º, inciso XIV) - impregnado do mais elevado coeficiente de positividade jurídica, a significar, por isso mesmo, que nenhuma sanção, direta ou indireta, poderá ser imposta ao profissional de imprensa, sob pena de tal medida punitiva ou restritiva de direitos incidir no vício de inconstitucionalidade. Esse direito público subjetivo, revestido de qualificação constitucional, além de inteiramente oponível a qualquer agente, autoridade ou instituição do Estado, propicia, ao jornalista, um campo de proteção e amparo muito mais abrangente do que aquele resultante de uma simples norma de caráter legal, como a inscrita no art. 71 da Lei de Imprensa. Em suma: a proteção constitucional que confere ao jornalista o direito de não proceder à ‘disclosure’ da fonte de informação ou de não revelar a pessoa de seu informante desautoriza qualquer medida tendente a pressionar ou a constranger o profissional 12 da imprensa a indicar a origem das informações a que teve acesso, eis que - não custa insistir - os jornalistas, em tema de sigilo da fonte, não se expõem ao poder de indagação do Estado ou de seus agentes e não podem sofrer, por isso mesmo, em função do exercício dessa legítima prerrogativa constitucional, a imposição de qualquer sanção penal, civil ou administrativa, tal como o reconheceu o Supremo Tribunal Federal (Inq 870/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 15/04/96)” (trecho do voto do Min. Celso de Mello). 33. Está claro, assim, que a decisão proferida na ADPF nº 130 é abrangente a ponto de proclamar uma sistemática constitucional de proteção especial à atividade jornalística, livre de quaisquer embaraços estatais que possam representar restrições ao seu pleno exercício, o que abarca, inequivocamente, a proteção ao sigilo de fonte, como, aliás, restou expressamente consignado no voto do Min. Celso de Mello. Daí porque a decisão reclamada, ao impor a quebra do sigilo telefônico do jornalista Allan de Abreu Aio e do Diário da Região com vistas à obtenção de informações sobre a fonte da notícia por eles veiculada, a contraria frontalmente. III.3. O cabimento da reclamação e a jurisprudência deste E. STF 34. À luz das considerações anteriores, não se pode afirmar, d.m.v., que, tendo por base a ADPF nº 130, a via reclamatória só seria cabível quando em causa hipóteses de censura prévia ou de aplicação expressa da Lei de Imprensa. Tal afirmação, aliás, não resiste à análise da jurisprudência deste E. STF. 35. Veja-se, a título de exemplo, o julgamento da medida cautelar na Reclamação nº 15.243. O referido caso tinha como objeto acórdão da 1ª Câmara Cível do TJRJ que, sem tomar por base a Lei de Imprensa, condenou o jornalista Paulo Henrique dos Santos Amorim ao pagamento de R$250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais) por suposta ofensa à honra do Sr. Daniel Dantas. Com acerto, ante o aparente excesso indenizatório e o legítimo exercício do direito de crítica pelo jornalista (matérias essas distintas da censura prévia, mas igualmente danosas à liberdade de expressão), esta C. 2ª Turma do STF deferiu, por unanimidade, a liminar pleiteada para suspender o acórdão lavrado pelo Tribunal 13 de origem.17 36. Situação similar, aliás, ocorreu em decisão monocrática proferida pela Exma. Min. Rosa Weber no âmbito da Reclamação nº 19.916, que tem por objeto acórdão lavrado pela 4ª Câmara Cível do TJMS, o qual majorou o quantum indenizatório imputável ao Correio do Estado para o valor atualizado de aproximadamente R$700.000,00 (setecentos mil reais), em decorrência da publicação de reportagens com conteúdo tido como ofensivo à autora da ação originária. Também considerando que o direito de crítica se insere no escopo do julgado proferido por esta Suprema Corte no âmbito da ADPF nº 130, a Min. Rosa Weber deferiu a medida cautelar pleiteada para suspender a decisão reclamada.18 37. O direito de crítica também tem sido utilizado como fundamento para a concessão de inúmeras medidas cautelares no âmbito de reclamações com base na ADPF nº 130, tais como na Reclamação nº 16.074, Rel. Min. Roberto Barroso, decisão proferida pelo Min. Ricardo Lewandowski, DJe 07/08/2013; na Reclamação nº 16.434, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 06/08/2014; na Reclamação nº 18.836, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 02/12/2014 (decisão monocrática), DJe 20/02/2015 (decisão final); na Reclamação nº 18.186, Rel. Min. Carmen Lúcia, decisão proferida pelo Min. Ricardo Lewandowski, DJe 08/08/2014; e na Reclamação nº 18.290, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 15/08/2014. 38. E há ainda outras reclamações que, embora não envolvessem censura prévia nem a aplicação direta da Lei de Imprensa, também não deixaram de ser conhecidas pelo STF. Quando do julgamento da medida cautelar na Reclamação nº 18.735, e.g., o Min. Gilmar Mendes enfatizou que “no julgamento da ADPF 130, esta Corte ressaltou que deve ser assegurado o gozo dos direitos de personalidade, traduzidos na ‘livre’ e ‘plena’ manifestação do pensamento e da informação”. Assim, tendo como paradigma a ADPF nº 130, o eminente Ministro deferiu o pedido liminar, ressaltando que o direito de resposta não pode ser exercido arbitrariamente, devendo guardar estreita correlação entre meios 17 STF, Rcl 15243 MC, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. em 18/11/2014, DJe de 02/12/2014. Participaram do julgamento os Ministros Teori Zavascki, Celso de Mello e Carmen Lúcia. 18 STF, Rcl 19916 MC, Rel. Min. Rosa Weber, j. em 10/04/2015, DJe de 15/04/2015. 14 e fins, o que, em um exame perfunctório, não estaria demonstrado na decisão reclamada.19 39. Em sentido similar, outras decisões judiciais que determinaram fosse publicada a condenação em veículos jornalísticos, ainda que não calcadas na Lei de Imprensa, também foram objeto de suspensão por decisões monocráticas proferidas no âmbito de reclamações constitucionais. É o caso, por exemplo, da Reclamação nº 15.681, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 24/02/2014; e da Reclamação nº 9.362, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 27/05/2010. 40. E mais: este E. STF já reconheceu situações em que a violação à autoridade do julgado da ADPF nº 130 decorreu de decisões judiciais que determinaram a retirada do conteúdo jornalístico do acesso ao público, seja pela via eletrônica ou pela via física (nesses casos, com o recolhimento dos exemplares). É o caso da Reclamação nº 21.504, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 24/08/2015; da Reclamação nº 20.985, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 16/06/2015; da Reclamação nº 18.566, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 17/09/2014; e da Reclamação nº 20.989, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 04/08/2015 – estas duas últimas, inclusive, afastando o segredo de justiça como fundamento relevante para a restrição à liberdade de expressão e informação. 41. Como se vê, afirmar que só há estrita aderência do objeto do ato reclamado quando a decisão reclamada resulta em censura prévia contraria toda a jurisprudência recente deste Pretório Excelso, freando, pois, os avanços conquistados, a duras penas, em matéria de liberdade de expressão e de imprensa. Em todos os casos mencionados acima, este E. STF suspendeu decisões judiciais que, embora não configurassem censura prévia ou não estivessem baseadas na Lei de Imprensa, produziam um efeito igualmente arrebatador sobre o exercício livre e efetivo das liberdades de informação e de imprensa. Em outras palavras, decisões cujos efeitos eram silenciar a atividade jornalística, em razão do esvaziamento de garantias institucionais essenciais ao seu exercício. 19 “Se é assim, ou seja, se não se revela possível comprovar a inverdade dos fatos descritos pela reportagem, antes o contrário, uma vez que a revista revela todas as fontes nas quais se baseou a matéria, então afigura-se bastante provável que o ato reclamado tenha, ao emprestar interpretação excessivamente limitadora da liberdade de imprensa, destoado das decisões proferidas por esta Corte na ADPF 130 e na ADI-MC-Ref 4.451, ambas de relatoria do Min. Ayres Britto”. (Rcl 18735 MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 02/10/2014, DJe de 06/10/2014). 15 42. De fato, nos casos envolvendo o direito de crítica, esta E. Corte reconheceu que condenar veículos de comunicação ou jornalistas ao pagamento de indenizações excessivas tem o efeito perverso de inibir a imprensa livre. O mesmo efeito é produzido por decisões que, indevidamente, reconhecem existir suposto direito de resposta ou impõem a publicação da condenação em veículos de comunicação. E também por decisões que, ainda que a posteriori, determinam a retirada de conteúdo jornalístico do acesso ao público. 43. Em todas essas situações, esta C. Corte reconheceu que houve violação à autoridade do decisum proferido na ADPF nº 130, mesmo que as decisões reclamadas não tenham sido fundamentadas na Lei de Imprensa. Tais conclusões só foram alcançadas, de sua vez, porque o Colegiado, precisamente, partiu da convicção de que o paradigma estabeleceu um marco no combate a todo tipo de medida estatal que, ex ante ou ex post, produza um mesmo e inconstitucional efeito: obstruir o exercício das liberdades de informar e de imprensa, seja diretamente, mediante proibições de veicular; seja indiretamente, por intermédio de determinações silenciadoras. 44. É exatamente nesse contexto que se insere a decisão ora reclamada. Do mesmo modo que os precedentes citados, a quebra do sigilo de fonte de um jornalista ou do veículo gera consequências deletérias sobre a liberdade de criação e elaboração de matérias. Sobretudo porque a medida, sob o pressuposto de identificar o autor de um crime, alcança todas as fontes do jornalista (inclusive aquelas sem qualquer relação com a investigação criminal), tornando o profissional e os informantes vulneráveis a todo tipo de pressão ou barganha. E foram justamente resultados silenciadores como esse que este E. STF, no acórdão da ADPF nº 130, pretendeu coibir. 45. Como já se disse, a Constituição de 1988 tratou do sigilo da fonte como regra, que não comporta exceção, ao contrário de outros sigilos previstos no texto constitucional (de dados, telefônicos, telegráficos etc.), que podem ser relativizados para fins de investigação criminal e processual penal. Em razão disso, é inadmissível a quebra de sigilos constitucionais quando isso puder comprometer o sigilo da fonte, que constitui garantia institucional 16 indispensável à existência de uma imprensa livre. 46. Daí porque se faz imperioso o provimento do presente agravo regimental por esta C. 2ª Turma para que, reconhecendo o cabimento desta reclamação, julgue-a procedente in totum, determinando-se a sustação do ato judicial reclamado, na forma do art. 17 da Lei nº 8.038/90 e do art. 161, III, do RISTF. IV – O PAPEL INSTITUCIONAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA PROTEÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 47. Há ainda um ponto da r. decisão agravada que merece ser esclarecido. O eminente Ministro Dias Toffoli, Relator, manifestou-se no sentido de que, se admitisse a presente reclamação, este E. STF passaria a julgar diretamente todos os casos concernentes à liberdade de imprensa. Destarte, o cabimento de reclamação em hipóteses diversas daquelas estritamente abrangidas pelo dispositivo da ADPF nº 130 importaria em afronta ao sistema processual recursal, pois o STF seria obrigado a apreciar toda e qualquer causa que envolvesse o tema. 48. O argumento, de cunho nitidamente consequencialista, evidencia uma preocupação legítima desta Corte em não banalizar sua atividade, que poderia ser inviabilizada pela inundação de casos triviais. Nada obstante, com as devidas vênias, esse entendimento merece reparos por três ordens de razões. A primeira delas é que, tal como demonstrado acima, (i) o raciocínio está pautado na adoção de premissa equivocada quanto ao escopo da ADPF nº 130, o qual, ao invés de abarcar apenas os casos estritos de censura prévia, inclui a repugnância a outras medidas capazes de afetar as garantias institucionais necessárias à liberdade de imprensa, e gerar efeito silenciador. 49. Para além do exposto, (ii) razões históricas evidenciam que a Constituição protege as liberdades de expressão e de imprensa de forma abrangente e robusta, não só em relação ao passado autoritário do País, mas também em virtude do reconhecimento da 17 excepcional importância destas para a democracia20-21. Apesar disso, em movimento contrário, (iii) é possível observar hoje inúmeros casos de censura judicial à imprensa e de restrições desproporcionais às liberdades comunicativas22. Casos esses que, infelizmente, multiplicam-se revestidos de diferentes matizes, nem sempre tão evidentes. E um deles remete, justamente, às hipóteses de violação inconstitucional à regra de proteção do sigilo da fonte. 50. Daí a importância da atuação deste Supremo Tribunal na hipótese em comento. O pronunciamento da Corte é fundamental para estabelecer uma diretriz firme e necessária quanto à proteção do sigilo da fonte jornalística. Embora o STF tenha inequivocamente decidido esse tema no julgamento da ADPF nº 130, diante do descumprimento do quanto decidido pelo juízo de piso, é urgente que a referida garantia seja enaltecida e reafirmada nesta oportunidade, evitando-se que tal violação se repita. E a reclamação constitucional é, sem dúvida, veículo idôneo para tal mister, alinhado ao papel da Corte de guardiã último dos ideais democráticos.23 51. Não fosse o bastante, a intervenção deste E. Supremo Tribunal Federal é indispensável para a garantia da ordem constitucional, conferindo unidade ao sistema 20 SARMENTO, Daniel. Constituição e sociedade: reclamação e liberdade de expressão. In: JOTA. Publicado em 1º/12/2014. Disponível em: http://jota.info/constituicao-e-sociedade-reclamacao-e-liberdade-de-expressao. Acessado em: 03/12/2014. 21 Com efeito, as Constituições, em geral, buscam demarcar as diferenças entre o regime deposto e aquele por ela arquitetado. Nesse sentido, v. KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional. São Paulo: Martins Fontes, 2003. Desse modo, o Judiciário, após 1988, ficou responsável também por zelar pelo cumprimento das promessas positivas feitas pela Constituição. 22 De fato, como já demonstrado, a despeito da clareza do entendimento vinculante adotado por este E. STF na ADPF nº 130, não é incomum verificar-se no âmbito dos Tribunais pátrios um sem-número de decisões judiciais que ousam contrariá-lo. E, nesses casos, esta E. Corte tem reconhecido incessantemente o cabimento da via reclamatória contra tais decisões judiciais. É o caso, v.g., da Rcl 18.186-MC, Rel. Min. Cármen Lúcia, decisão proferida pelo Min. Ricardo Lewandowski, DJe 08/08/2014; da Rcl 18.746-MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 08/10/2014; da Rcl 18.836-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 02/12/2014; da Rcl 18.638-MC, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 19/09/2014; da Rcl 15.681-MC, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 24/02/2014; da Rcl 18.290-MC, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 15/08/2014; da Rcl 16.074-MC, Rel. Min. Roberto Barroso, decisão proferida pelo Min. Ricardo Lewandowski DJe 07/08/2013; da Rcl 18.566-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 17/09/2014; da Rcl 16.434-MC, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 06/08/2014; da Rcl 15.243-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 20/03/2013; da Rcl 11.292-MC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 04/03/2011; da Rcl 9.362-MC, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 27/05/2010; dentre inúmeros outros já destacados acima. 23 Os tribunais constituem um meio mais confiável para garantir a segurança jurídica, estabilidade e previsibilidade do que legisladores democráticos, premidos por demandas "populistas" e necessariamente pouco eficientes, de uma perspectiva econômica. Nesse sentido, v. VIEIRA, Oscar Vilhena. O Supremo Tribunal Federal: Jurisprudência Política. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. 18 jurídico, no intuito de evitar decisões conflitantes sobre um mesmo tema 24. Nas palavras do ilustre Professor Daniel Sarmento, “(...) há situações em que a intervenção do STF, pela via de reclamação, se torna imprescindível para o exercício da sua função maior de guardião da Constituição. São hipóteses em que a recalcitrância do Judiciário ou da Administração Pública de se ajustarem aos precedentes da Corte compromete gravemente os valores mais básicos da Lei Maior” (grifouse)25. 52. A ampliação do escopo da reclamação se coaduna com a necessidade de atuação mais incisiva do Supremo Tribunal Federal, enquanto Poder responsável por emitir a última palavra sobre inúmeras questões da vida social. A Constituição transcendeu os temas propriamente constitucionais para regulamentar pormenorizadamente um amplo campo das relações sociais, econômicas e públicas, o que exige maior atuação do STF na definição dos valores sociais.26 53. A intervenção do STF, em casos como tais, revela-se como a melhor forma de coibir de modo efetivo e imediato as recalcitrantes violações perpetradas em julgados que insistem em se afastar da orientação firme e irrestrita da Corte pela inadmissibilidade de embaraços à liberdade de imprensa. A atuação do STF neste tipo de situação é de todo essencial como instrumento de pedagogia constitucional, voltada a erradicar práticas proscritas pela Constituição e fazer valer a jurisprudência vinculante desta Corte. Sob esta perspectiva, espera-se que este E. STF admita a presente reclamação, contribuindo, então, para o fortalecimento do Estado de Direito e do próprio constitucionalismo brasileiro. O que se pede é tão somente que esta Corte concretize os valores intrínsecos às liberdades de 24 Não há dúvidas, hoje, de que o STF está no centro de nosso sistema político. O tribunal também exerce o papel de criador de regras, acumulando a autoridade de intérprete da Constituição com o exercício intrínseco à atividade legislativa. 25 SARMENTO, Daniel. Constituição e sociedade: reclamação e liberdade de expressão. In: JOTA. Publicado em 1º/12/2014. Disponível em: http://jota.info/constituicao-e-sociedade-reclamacao-e-liberdade-de-expressao. Acessado em: 03/12/2014. 26 No direito comparado destaca-se uma nova forma de litigância cujo leading case é a decisão em Brown v. Board of Education. Nesse caso, a Suprema Corte dos Estados Unidos entendeu que a Constituição, mais do que estabelecer um modelo de Estado, identifica um conjunto de valores que transcendem os fins privados, de forma que a função do Judiciário não será apenas solucionar controvérsias, mas dar um significado concreto para esses valores. FISS, Owen. Um novo processo civil: estudos norte-americanos sobre jurisdição, Constituição e sociedade. Traduzido por Daniel Porto Godinho da Silva e Melina de Medeiros Rós. São Paulo: RT, 2004, pp. 111-112 e 119. 19 imprensa e de expressão, asseguradas na Constituição de 1988. V – O INTERESSE ESTATAL NA PERSECUÇÃO PROCESSUAL PENAL DO RESPONSÁVEL PELA QUEBRA DO SIGILO DO PROCESSO NÃO LEGITIMA A QUEBRA DO SIGILO DA FONTE 54. Como se disse, o Min. Dias Toffoli negou seguimento à presente reclamação ao fundamento de que não haveria aderência estrita entre a decisão reclamada e o precedente evocado como paradigma. No entender do eminente Relator, esta reclamação pretenderia cassar a decisão do MM. Juízo 4ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP sob o argumento de que o jornalista Allan de Abreu Aio não poderia ser condenado pelo vazamento de informações sigilosas. A ADPF nº 130, por outro lado, teria se limitado a declarar a inconstitucionalidade da censura prévia, possibilitando que o Poder Judiciário realize um controle a posteriori de eventuais abusos cometidos por jornalistas e veículos de comunicação no exercício da atividade de imprensa. Desse modo, na visão do eminente Min. Dias Toffoli, o STF, por ocasião do julgamento da ADPF nº 130, não teria condenado a atuação do Poder Judiciário no controle da conduta tipificada no art. 10 da Lei nº 9.296/96. 55. Tal raciocínio, concessa maxima venia, afigura-se equivocado. Com efeito, em nenhum momento na presente reclamação se pretendeu defender que o Poder Judiciário deva ser omisso diante de eventuais abusos relacionados ao vazamento de informações sigilosas. O objetivo visado é única e exclusivamente o de afastar decisão judicial que, a pretexto de dar prosseguimento à investigação criminal para identificar o responsável pelo vazamento de informações submetidas a sigilo, valeu-se de determinação incompatível com o sistema constitucional de liberdades de expressão e de informação jornalísticas, tal como consagrado por esta Corte quando do julgamento da ADPF nº 130. 56. Realmente, a realização de investigação criminal com intuito de identificar o responsável pela quebra do sigilo do processo não justifica ou autoriza a quebra do sigilo da fonte do veículo de comunicação e do jornalista. É verdade que a proteção assegurada constitucionalmente ao sigilo de fonte não significa que os veículos de comunicação e os 20 jornalistas possam violar o sigilo de processos judiciais. Mas a tutela da informação privilegiada também não autoriza sejam punidos aqueles que obtiveram, de forma lícita, informações resguardadas por sigilo. Afinal, ainda que as informações obtidas tenham sido extraídas por terceiros de processo sob segredo de justiça, isso não afasta a existência de interesse público na sua divulgação. 57. O que se quer dizer é que o interesse na descoberta e punição do responsável pela divulgação de informações processuais sigilosas não legitima a quebra do sigilo da fonte jornalística na tentativa de identificar o infrator, notadamente porque tal medida faria ruir o sistema constitucional de proteção da liberdade de expressão e de imprensa. Até porque, há outras formas de se chegar ao responsável pelo ilícito que não exigem a adoção de meio tão gravoso como a violação do sigilo da fonte. Interrogar todos aqueles que tiveram acesso às informações protegidas pelo sigilo, por exemplo, pode levar à identificação do infrator, sem comprometer a credibilidade do jornal e do jornalista em relação às suas fontes. 58. É evidente, portanto, a flagrante desproporcionalidade da medida determinada na origem. A uma, por não atender ao subprincípio da necessidade, porquanto existem meios menos gravosos igualmente eficazes para a consecução do fim que se objetiva alcançar. A duas, por ser desproporcional em sentido estrito, vez que os danos causados à liberdade de imprensa – com o comprometimento da credibilidade do veículo de comunicação frente as suas fontes – e à sociedade – em razão da maior dificuldade de divulgação de informações de interesse público – são muito superiores aos eventuais benefícios sociais advindos da punição do responsável pela violação do sigilo processual. 59. Em suma, diferentemente do que entendeu o eminente Min. Relator, o que se pretende com a presente reclamação não é a assegurar imunidade a jornalistas no exercício da sua profissão. O que se defende, aqui, é que, por força da posição privilegiada conferida à liberdade de imprensa no edifício constitucional erigido pela Carta de 1988, a restrição ao sigilo de fonte deve ser medida de caráter excepcionalíssimo, notadamente por conta das consequências e danos que pode acarretar àquela liberdade e à sociedade, dentre eles o de 21 silenciar e resfriar o debate público. Mesmo porque o maior ônus e dificuldade para a quebra do sigilo de jornalistas não obsta, evidentemente, o prosseguimento da investigação e a produção de outras provas capazes de ensejar a identificação, responsabilização e eventual punição do infrator. 60. Para além disso, não se pode perder de vista que, no caso dos autos, não houve qualquer prejuízo à investigação levada a efeito pela PF, como, inclusive, reconheceu o próprio magistrado reclamado. Segundo suas próprias informações, a divulgação das escutas não prejudicou a investigação, porquanto os investigados não ficaram sabendo delas durante a fase das interceptações. Na medida em que todos os investigados na Operação Tamburutaca foram presos, sem que a divulgação de informações submetidas a sigilo tenha colocado em risco o interesse público, simplesmente não se justificava (nem se justifica) a quebra do sigilo de fonte do jornal e do jornalista para a descoberta do responsável pela violação da lei. Conforme demonstrado, a quebra do sigilo de fonte jornalística não pode ser o meio ordinário para produção de provas para a responsabilização do infrator. 61. Em conclusão: não se pretende excluir do controle do Poder Judiciário os eventuais ilícitos praticados por jornalistas que interfiram com as persecuções penais. O que se quer, apenas, é proteger a liberdade de imprensa assegurada na Constituição, com os contornos e as garantias institucionais definidas no julgamento da ADPF nº 130. VI – NECESSIDADE URGENTE DE RESTABELECIMENTO DA LIMINAR 62. Embora a ora agravante tenha ciência de que o presente recurso, em regra, não possui efeito suspensivo (art. 317, §4º, RISTF), é certo que este E. STF reconhece a possibilidade de sua concessão, antes da apreciação do agravo regimental pelo Colegiado, a fim de garantir a eficácia da decisão final a ser proferida por este Tribunal. Confiram-se as seguintes decisões nesse sentido: “DECISÃO: Cuida-se de pedido de reconsideração de decisão que indeferiu efeito suspensivo ao agravo regimental em recurso extraordinário, provido em favor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, ao fundamento da 22 constitucionalidade do depósito recursal prévio como pressuposto para admissibilidade de recurso administrativo. Syngenta Proteção de Cultivos Ltda. alega que a matéria objeto do recurso extraordinário encontra-se pendente de exame no Plenário, tendo o julgamento sido adiado em face do pedido de vista de Joaquim Barbosa, nos autos dos RREE nos 389.383/SP e 390.513/SP, rel. Marco Aurélio (Informativo 323). No entanto, com o provimento do recurso extraordinário do INSS, houve ‘a reforma da decisão judicial que garantia à Agravante o direito de não recolher o citado depósito recursal e dada a iminência do julgamento do recurso administrativo no Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, não restou outra alternativa senão a propositura da presente medida cautelar, cujo objetivo é a concessão de efeito suspensivo ao agravo interposto na demanda principal, assegurando-lhe, até o julgamento definitivo da questão pelo Plenário desta Corte Suprema, não seja exigida tal exação como condição para o conhecimento dos recursos administrativos interpostos’. Sustenta a ‘necessidade de revisão do apregoado no artigo 317, § 4º, do Regimento Interno deste ª Tribunal, dado o conflito com o ordenamento processual vigente "artigos 557 e 558 do CPC, introduzidos pelas Leis 9.756 de 17.12.1998 e 9.139 de 30.11.95’. E, ao final, pede a reforma da decisão que indeferiu o pedido liminar, para que seja atribuído efeito suspensivo ao agravo. Posteriormente, a agravante trouxe aos autos certidão da 2a Câmara do Conselho de Recursos da Previdência Social que noticia a inclusão do seu processo administrativo (Notificação Fiscal no 35.040.139-0), na sessão de julgamento do dia 23.08.2004 (fls. 165). Assim, reconsidero a decisão de fls. 64-66 e defiro o efeito suspensivo, ad referendum da Turma, até final julgamento do tema pelo Plenário. Comunique-se, com urgência, à 2ª Câmara do Conselho de Recursos da Previdência Social.”27 “DECISÃO: Trata-se de medida cautelar incidental, com pedido de liminar, em que a requerente pede seja conferido efeito suspensivo ao agravo regimental que interpôs no Recurso Extraordinário 226.453-6, no qual se discute o direito da contribuinte de proceder à compensação integral dos prejuízos fiscais e da base de cálculo negativa, relativos ao imposto de renda e à contribuição social sobre o lucro, sem a restrição de 30% (trinta por cento) imposta pelos artigos 42 e 58 da Lei 8.981/95. 2. O cerne da controvérsia foi dirimida por ocasião do julgamento dos RE 250521-SP, Moreira Alves, DJ de 30.06.2000; RE 256273-MG e 247633RS, Ilmar Galvão, DJ 16.06.2000 e 01.12.2000, respectivamente, e em casos similares, em que se discutia da data de validade da lei, tendo em consideração o dia 31 de dezembro, nos AgRE 203486-RS, Maurício Corrêa, DJ de 19.12.86; RE 225061, Sydney Sanches, DJ de 09.04.1999; RE 197790-MG, Ilmar Galvão, DJ 21.11.97. No entanto, aprouve ao eminente Ministro Marco Aurélio afetar ao Pleno desta Corte a apreciação do RE 344.994-0, conforme publicação no DJU de 27 de agosto de 2004. Assim, tenho presentes os requisitos necessários à concessão do provimento cautelar, razão por que defiro a medida liminar, para conceder efeito suspensivo ao agravo regimental no Recurso Extraordinário 226.453-6. 27 STF, AC 374 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 20/08/2004, DJ de 30/08/2004; grifou-se. 23 Intime-se. Comunique-se.”28 63. A propósito, em decisão monocrática proferida nos autos da Ação Cautelar nº 3257, julgada em 12/11/2012, o Exmo. Ministro Dias Toffoli salientou a possibilidade de atribuição de efeito suspensivo ao agravo regimental. Trata-se, como bem observado pelo eminente Ministro Dias Toffoli, de corolário do “poder de cautela inerente ao ato de julgar”, desde que “demonstrada [sua necessidade] nos argumentos apresentados pelo requerente”.29 É exatamente este o caso em apreço. 64. Além de comprovada, pelos argumentos já desenvolvidos, a incompatibilidade frontal da r. decisão reclamada com a decisão proferida por este E. STF na ADPF nº 130 (fumus bonis iuris), o periculum in mora também salta aos olhos. Com efeito, após a cassação da liminar, nada impede que as operadoras de serviços telefônicos Tim, Oi, Vivo, Claro e Telefônica S.A. recebam, a qualquer momento, os ofícios do MM. Juízo da 4ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP determinando que as empresas informem as linhas telefônicas registradas em nome do jornalista Allan de Abreu Aio e do Diário da Região. 65. Ocorre que, como se viu, a decisão reclamada dá azo para que a fonte da informação do repórter Allan de Abreu Aio seja revelada, o que esvaziaria por completo a decisão final do presente agravo regimental e, também, da própria reclamação. Afinal, quebrado o segredo telefônico do jornalista e do jornal, o sigilo de sua fonte estará irremediavelmente comprometido, pois impossível retornar ao status quo ante após a divulgação dos dados protegidos pelo art. 5º, XII, da Constituição da República. Daí porque é imprescindível, para assegurar a eficácia do provimento final, a atribuição de efeito suspensivo ativo ao presente recurso. 66. Como já se disse acima, a decisão reclamada tem o potencial de gerar danos irreparáveis a todas as associadas da ora reclamante, em razão do efeito silenciador que produz. O efeito intimidatório ao livre exercício do jornalismo é evidente. Isso sem contar os 28 STF, AC 422 MC, Rel. Min. Eros Grau, j. em 17/09/2004, DJ de 23/09/2004; grifou-se. 29 STF, AC 3257, Rel. Min. Dias Toffoli, j. em 12/11/2012, DJ de 22/11/2012. 24 danos ao direito à informação da sociedade, que conta com o ativismo investigativo dos meios de comunicação no combate a práticas imorais e ilegais eventualmente praticadas por autoridades públicas. Sem dúvida, o prejuízo à democracia é irreparável e imensurável. Não existe jornalismo nem liberdade de imprensa sem sigilo de fonte. E não existe democracia sem essas garantias. 67. Aliás, diante de cenários de ofensa à liberdade de imprensa, o STF tem reiteradamente determinado a suspensão de decisões judiciais quando verificada a plausibilidade das alegações em torno de possível violação à ADPF nº 130. Vejam-se, e.g., as decisões na Rcl 18.566, na Rcl 20.989, na Rcl 19.916, na Rcl 15.243, na Rcl 18.735, na Rcl 15.681, na Rcl 18.687, na Rcl 21.504, na Rcl 20.905, na Rcl 9.362, na Rcl 11.292, na Rcl 16.074, na Rcl 18.638, na Rcl 16.434, na Rcl 11.292, na Rcl 18.186, na Rcl 18.290, na Rcl 18.746, na Rcl 18.836 e na Rcl.19.164. 68. Assim, presentes a relevância do fundamento jurídico e a possibilidade concreta de a ora agravante e suas associadas sofrerem, a qualquer instante, dano grave e irreparável, requer-se a concessão de efeito suspensivo ativo ao presente agravo regimental a fim de suspender, cautelarmente, a eficácia da decisão proferida pelo MM. Juízo da 4ª Vara da Justiça Federal de São José do Rio Preto/SP nos autos do processo nº 000702914.2011.4.03.6106, para (i) afastar a quebra do sigilo telefônico do repórter Allan de Abreu Aio e do jornal Diário da Região e (ii) determinar nova expedição de ofícios às operadoras de telefonia TIM, OI, VIVO, CLARO e TELEFÔNICA S/A para que NÃO divulguem as informações determinadas na decisão reclamada, sob pena de multa e de responsabilização criminal. VII – CONCLUSÃO E PEDIDOS 69. Por todo o exposto, presentes a relevância do fundamento jurídico e a possibilidade concreta de a ora agravante, suas associadas e o jornalista Allan de Abreu Aio sofrerem, a qualquer instante, dano grave e irreparável, requer-se a concessão de efeito suspensivo ativo ao presente agravo regimental a fim de suspender, cautelarmente, a eficácia 25 da decisão proferida pelo MM. Juízo da 4ª Vara da Justiça Federal de São José do Rio Preto/SP nos autos do processo nº 0007029-14.2011.4.03.6106, para (i) afastar a quebra do sigilo telefônico do repórter Allan de Abreu Aio e do jornal Diário da Região e (ii) determinar nova expedição de ofícios às operadoras de telefonia TIM, OI, VIVO, CLARO e TELEFÔNICA S/A para que NÃO divulguem as informações determinadas na decisão reclamada, sob pena de multa e de responsabilização criminal. 70. No mérito, a Reclamante pede e espera que V. Exa. reconsidere sua decisão, na forma do §2º do art. 317 do RISTF, para conhecer da presente reclamação. Caso não seja esse o entendimento de V. Exa. – o que se admite apenas para argumentar – a Reclamante pede que a presente petição seja recebida e processada como agravo regimental, e submetida, com a maior brevidade possível, ao julgamento da 2ª Turma deste E. STF, nos termos do art. 8º, I, c/c art. 9, I, “c”, do Regimento Interno do STF. Nestes termos, Pede deferimento. Do Rio de Janeiro, RJ, para Brasília, DF, 14 de setembro de 2015. GUSTAVO BINENBOJM OAB/RJ Nº 83.152 ALICE VORONOFF OAB/RJ Nº 139.858 RAFAEL L. F. KOATZ OAB/DF Nº 46.142 26