A PROVA PERICIAL MÉDICA NO PROCESSO DO TRABALHO Chrystian Sobania Wowk1 Antonio Assad Mansur Neto 2 Introdução: Ao iniciarmos o presente trabalho, destaquemos como essência e foco principal de nosso estudo, o artigo 420 e seguintes do Código de Processo Civil - CPC, notadamente sob o prisma da prova pericial médica, dispositivos legais de plena aplicação ao processo trabalhista, tal como preconiza o artigo 769 da Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT. A prova pericial lugar quando certos fatos que interessam para o deslinde da controvérsia posta em juízo dependam, para sua percepção e análise, de conhecimentos técnicos, assim entendidos como aqueles que não estão no rol dos homens comuns. Antonio Bueno Neto conceitua perícia como “toda operação ordenada pela autoridade judiciária ou policial, que se destina a ministrar esclarecimentos a Justiça”.3 Nestes casos, o juiz deverá nomear, entre aqueles que, na localidade, possuam habilitação técnica para exercício do mister que lhe foi destinado, perito, que funcionará como verdadeiro auxiliar do Juízo. A prova pericial não pode ser confundida com a prova testemunhal. A primeira tem como objetivo a averiguação de fatos presentes, cuja análise, como dito, dependa de exija conhecimento técnico. A segunda, por sua vez, visa a reconstrução de fatos já passados e percebidos pela testemunha sem a necessidade de qualquer conhecimento qualificado. Humberto Theodoro Júnior, sobre a prova pericial, ensina que: 1 Advogado, OAB/PR 48.996; Bacharel em Direito pela PUC-PR. Advogado, OAB/PR 39.283; Bacharel em Direito pela PUC-PR, Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Faculdade de Direito de Curitiba. 3 BUENO NETO, Antonio. Perícia e Processo Trabalhista. Curitiba: Editora Gênesis, 1995, p. 44. 2 1 A perícia, destarte, meio probatório que, de certa forma, se aproxima da prova testemunhal e no direito antigo os peritos foram, mesmo, considerados como testemunhas. Mas, na verdade, há uma profunda diferença entre esses instrumentos de convencimento judicial. O fim da prova testemunhal é apenas reconstituir o fato tal qual existiu no passado; a perícia, ao contrário, descreve o estado atual dos fatos; das testemunhas, no dizer de Lessona, inova-se a memória, dos peritos a ciência. 4 Deve ser ressaltado que, nos termos do art. 145 do CPC, o juiz deverá nomear expert. É que, do ordenamento processual se extraí a conclusão de que, ainda que possua conhecimentos técnicos para análise da controvérsia, não pode o magistrado figurar no processo como perito, sob pena de ofensa ao princípio da imparcialidade. Neste sentido, vejamos a lição do eminente processualista Manoel Antonio Teixeira Filho: Ainda que, eventualmente, o Juiz possuísse conhecimentos técnicos a respeito da matéria, não lhe seria permitido agir como perito, pois estaria, em última análise, funcionando como espécie de assessor do litigante, cuja parcialidade seria sobremaneira censurável. Esses conhecimentos especializados, o Juiz poderia utilizar na apreciação do laudo, a fim de convencer-se, ou não, da conclusão a que chegou o perito. Aliás, a possibilidade de o Juiz atuar como perito está vedada, dentre outros dispositivos legais, pelo art. 145 do CPC, cuja expressão é imperativa: “Quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico, o Juiz será assistido por perito, segundo o disposto no art. 421”.5 Theotonio Negrão compartilha da mesma opinião, ensinando que “Não pode o magistrado valer-se de conhecimentos pessoais de natureza técnica para dispensar a perícia (RT 606/199)”. 6 Tal como preconiza o art. 420 do CPC, três são as espécies de prova pericial: exame, vistoria e avaliação. Na primeira, como ensina Manoel Antonio Teixeira Filho, a atividade do perito consiste em inspecionar pessoas, coisas móveis e semoventes. A 4 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume I. 24ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 477-478. 5 TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. A Prova no Processo do Trabalho, 385/384 6 NEGRÃO. Theotonio. Código de Processo Civil Comentado. 40. Ed.: São Paulo – Saraiva., 2008. p. 543. 2 segunda tem como objetivo a inspeção de imóveis. A terceira, por sua vez, tem como fito a aferição de valores de coisas. A prova médica pericial, por evidente, se enquadra na primeira das espécies. O Juiz, todavia, como preconiza o art. 436 do CPC, não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos. O Perito: Como dito, sendo necessária a produção prova pericial, o Juiz deverá nomear, dentre os profissionais com conhecimento técnico-científico, perito de sua confiança. Manuel Antonio Teixeira Filho, citando Moacyr Amaral Santos, defini a atividade do Perito: “no meio pelo qual, no processo, pessoas entendidas e sob compromisso verificam fatos interessantes à causa, transmitindo ao Juiz o respectivo parecer.”, restando claro que o conhecimento técnico da causa é fato preponderante para que seja realizada a nomeação do profissional que auxiliará o juízo ao deslinde do processo. 7 Entende-se como conhecimento técnico-científico aquele obtido formalmente, em nível universitário, consoante determina o § 1º do art. 145 do CPC: Art. 145. Quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico, o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no art. 421. § 1º Os peritos serão escolhidos entre profissionais de nível universitário, devidamente inscritos no órgão de classe competente, respeitado o disposto no Capítulo VI, seção VII, deste Código. (Parágrafo acrescentado conforme determinado na Lei nº 7.270, de 10.12.1984, DOU 11.12.1984) § 2º Os peritos comprovarão sua especialidade na matéria sobre que deverão opinar, mediante certidão do órgão profissional em 7 SANTOS, Moacyr Amaral. Comentários. p. 335 Apud TEIXEIRA FILHO, Manuel Antonio. Curso de Direito Processual do Trabalho Vol. II. São Paulo: LTr, 2009, p. 1133. 3 que estiverem inscritos. (Parágrafo acrescentado conforme determinado na Lei nº 7.270, de 10.12.1984, DOU 11.12.1984) § 3º Nas localidades onde não houver profissionais qualificados que preencham os requisitos dos parágrafos anteriores, a indicação dos peritos será de livre escolha do Juiz. (Parágrafo acrescentado conforme determinado na Lei nº 7.270, de 10.12.1984, DOU 11.12.1984) Neste diapasão, a primeira indagação que surge é: nos casos de perícia médica, quais são os profissionais que poderão figurar como perito? Ora, por óbvio, a prova pericial produzida por profissional não habilitado to é imprestável. Corroborando com este entendimento Theotonio Negrão anota que “É inidonea a prova se o perito não tem conhecimento técnico necessário a elaboração do laudo.” 8 Há diversos casos, como é de conhecimento daqueles que militam na Justiça do Trabalho, onde outros profissionais da área de saúde, tal como fisioterapeutas, sendo nomeados como peritos em Reclamatórias Trabalhistas que versam sobre acidente do trabalho e doença ocupacional. Como determina os artigos supramencionados no presente trabalho, o perito deve ter conhecimento técnico, e, desta forma, na prova para averiguar a doença do trabalho ou ocupacional e acidente de trabalho, tal profissional deverá ser médico do trabalho ou, na falta deste, médico devidamente escrito no Conselho de Medicina, posto que para acompanhamento de determinados atos, tal especialidade se mostra a mais adequada. O eminente processualista Carlos Henrique Bezerra Leite vai além. Segundo seu entendimento, quando a prova pericial for de natureza médico legal, o perito deverá ser, preferencialmente, servidor público com que exerça cargo técnico junto à órgãos da Administração Pública, ou seja, médico perito do INSS:9 8 9 NEGRÃO. Theotonio. Código de Processo Civil Comentado. 40. Ed.: São Paulo – Saraiva, 2008. p. 531 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, p. 557/558 4 “Quando se tratar de exame que tenha por objeto a autenticidade ou falsidade de documento (v.g., exame grafotécnico), bem como matéria de natureza médico-legal, a escolha do perito deverá recair preferencialmente entre servidores públicos que exerçam os correspondentes cargos técnicos nos órgãos da Administração Pública.” Ressalte-se o fato de que, no âmbito do Processo do Trabalho, os exames periciais serão realizados por um único perito, nos termos do art. 3º da Lei 5.584/70, o que constitui mais um motivo para que se prefiram os médicos do trabalho atuando como perito, na medida em que estes profissionais são o que têm mais afinidade com rotina do ambiente de trabalho. Destacamos a Resolução 1488/98 do Conselho federal de Medicina, que determina o seguinte: Art. 2º - Para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar: I - a história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal; II - o estudo do local de trabalho; III - o estudo da organização do trabalho; IV - os dados epidemiológicos; V - a literatura atualizada; VI - a ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas; VII - a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros; VIII - o depoimento e a experiência dos trabalhadores; IX - os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde. (grifo nosso) 5 Vale lembrar, também, que tal resolução definiu ainda obrigações tanto do Perito, como do Assistente Técnico, ambos médicos nos seguintes termos: Artigo 10º - São atribuições e deveres do perito-médico judicial e assistentes técnicos: I - Examinar clinicamente o trabalhador e solicitar os exames complementares necessários. Atuar, visando essencialmente a promoção da saúde e prevenção da doença, conhecendo, para isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da empresa; II - O perito-médico e assistentes-técnicos ao vistoriarem o local de trabalho devem fazer-se acompanhar, se possível, pelo próprio trabalhador que está sendo objeto da perícia, para melhor conhecimento do seu ambiente e função. Atuar, visando essencialmente a promoção da saúde e prevenção da doença, conhecendo, para isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da empresa; III - Estabelecer o nexo causal, considerando o exposto no Artigo 4º e incisos. (grifo nosso) Ressaltamos que o sigilo médico e dos documentos pode somente ser aberto mediante prévia autorização do assistido, no caso o Autor ou Reclamante, tal como previsto no artigo 9º. da Resolução nº. 1.488/98 do CFM nos seguintes termos: “Em ações judiciais, o prontuário médico, exames complementares ou outros documentos poderão ser liberados por autorização expressa do próprio assistido”. Especialmente quanto à perícia elaborada por fisioterapeutas, com intuito de se averiguar acidente do trabalho ou doença equiparada, diversos Tribunais têm as julgado nulas, com fulcro no Decreto-Lei 938/69. É que este Decreto-Lei é o que regulamenta a profissão de fisioterapeuta, prevendo, em seu art. 3º, que: “É atividade privativa do fisioterapeuta executar métodos e técnicas fisioterápicos com a finalidade de restaurar, desenvolver e conservar a capacidade física do ciente.” Vejamos um destes julgados: “PERÍCIA. AFERIÇÃO DE DOENÇA PROFISSIONAL. 6 FISIOTERAPEUTA. INVALIDADE. No processo do trabalho, a perícia para apuração de doença profissional deve ser realizada, preferencialmente, por Médico do Trabalho, por aplicação do art.195, caput, da CLT, e, onde não houver, por médico regularmente inscrito no órgão de classe, aplicando-se o art.146, § 3º, do CPC. O profissional de fisioterapia não detém habilitação para realização de perícia com o objetivo de constatar doença profissional de LER/DORT e o respectivo nexo causal, pois esta profissão detém habilitação privativa para executar métodos e técnicas fisioterápicos com a finalidade de restaurar, desenvolver e conservar a capacidade física do paciente (art.3º do Decreto-lei n. 938, de 13.10.1969).”( Processo TRT 15ª Região n. 948-2003073-15-00-4 RO, Rel. JOÃO BATISTA DA SILVA Os psicólogos, por sua vez, podem fazer diagnósticos e perícias exclusivamente em matéria psicológica, conforme reza o art. 13 da Lei 4.119/62 e o art. 4º do Decreto que a regulamentou, o de nº 53.464/64, o que estreita muito a atuação destes profissionais no âmbito da Justiça do Trabalho. Não podemos deixar de citar o fato de que se encontra em tramitação perante o Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 25/2002, cujo objetivo primário é a regulação do chamado Ato Médico. Caso aprovada, a legislação encerrará qualquer dúvida sobre o que ora se discute, já que, em seu art. 3º, prevê ser atividade privativa do médico os trabalhos periciais que tenham ligação com procedimentos médicos: Art. 3º - As atividades de coordenação, direção, chefia, perícia, auditoria, supervisão, desde que vinculadas, de forma imediata e direta a procedimentos médicos e, ainda, as atividades de ensino dos procedimentos médicos privativos, incluem-se entre os atos médicos e devem ser unicamente exercidos por médicos. Por fim, vale lembrar que, nos termos do art. 429 do CPC, o perito e os assistentes técnicos podem “utilizar-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder da parte ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenhos, fotografias e outras quaisquer peças.” 7 Procedimento: Em que pese do nosso entendimento ser o de que a prova pericial não é obrigatória nos casos em que se discute a responsabilidade por acidente de trabalho, ao contrário dos casos em que se pretende caracterização de atividade periculosa ou insalubre10, sua feitura é altamente desejável, já que, quase a totalidade das lides de natureza acidentária exigem conhecimento técnico-científico para a constatação do nexo de causalidade e da extensão dos danos. Não entraremos no mérito da questão relativa ao ônus da prova, sua inversão, presunções ou responsabilidade do empregador, por não ser este o foco do presente estudo. Desta feita, a prova pericial poderá ser requerida pela parte interessada ou, até mesmo, determinada de ofício pelo juiz, como disposto no art. 130 do CPC.11 O juiz, entretanto, poderá indeferir a produção da prova pericial quando não atendido o disposto no art. 145 do CPC, bem como nas hipóteses em que for desnecessária ou impraticável. Assim ensina Carlos Henrique Bezerra Leite12: O juiz indeferirá a perícia quando: a) a prova do fato não depender de conhecimentos especial de técnico; b) for desnecessária em vista de outras provas produzidas; c) a verificação for impraticável. Deferida a prova pericial, o juiz nomeará perito devidamente habilitado, como já abordado no item anterior, o qual poderá recusar o encargo por motivo legítimo, no prazo de 5 dias contados de sua intimação ou de quando tomou conhecimento de eventual impedimento. Aceito o encargo, tem dever de empregar toda sua diligência, bem como o de observar os prazos legais. Vejamos o que rezam os arts. 146 e 423, ambos do CPC: 10 Por força do art. 195 da CLT “A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo de Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrados no Ministério do Trabalho.” 11 Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. 12 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. p. 558 8 Art. 146. O perito tem o dever de cumprir o ofício, no prazo que lhe assina a lei, empregando toda a sua diligência; pode, todavia, escusar-se do encargo alegando motivo legítimo. Parágrafo único. A escusa será apresentada, dentro de cinco dias, contados da intimação ou do impedimento superveniente, sob pena de se reputar renunciado o direito a alegá-la (art. 423). (Parágrafo com redação determinada na Lei nº 8.455, de 24.8.1992, DOU 25.8.1992) Art. 423. O perito pode escusar-se (art. 146), ou ser recusado por impedimento ou suspeição (art. 138, III); ao aceitar a escusa ou julgar procedente a impugnação, o juiz nomeará novo perito. (Artigo com redação determinada na Lei nº 8.455, de 24.8.1992, DOU 25.8.1992) O autor Antonio Bueno Neto ensina, ainda, que o perito médico deve ter “conhecimento técnico, matéria básica de conhecimento médico; espírito jurídico, com propósito de sempre servir a Justiça, classe e orgulho profissional; juízo critico, agindo com fidelidade, clareza e simplicidade na descrição dos fatos e afirmar o que demonstrar cientificamente”. 13 Por se tratar prova técnica, faculta-se às partes, no prazo de 5 dias após a nomeação do perito, a apresentação quesitos técnicos e indicação de assistentes com especialidade no assunto, que acompanharão os atos que o perito realizar a fim de elaborar o seu laudo. Antonio Bueno Neto ensina, conceitua o assistente técnico como o profissional que elabora, auxilia e questiona o Perito, representando assim as partes em tal ato probatório. Theotonio Negrão, quanto aos quesitos, ao comentar o artigo 435 do CPC, ensina que não se admitem os genéricos (RT 482/136, JTA 95/38), pois, sendo 13 BUENO NETO, Antonio. Perícia e Processo Trabalhista. Curitiba: Editora Gênesis, 1995, p. 44. 9 formulados por técnicos, não é possível admitir de tais profissionais questionamentos leigos. 14 Considerando que a nomeação do Perito é realizada em audiência, as partes, cientes do ato, deverão em prazo comum e preclusivo de 05 (cinco) dias, formular os quesitos e indicar seu o Assistente Técnico, sendo ônus da parte, devidamente intimada, lhe dar ciência dos atos periciais subseqüentes, já que os assistentes técnicos, na Justiça do Trabalho, não serão intimados de tais atos. Ao contrário do perito, os assistentes, por atuar no interesse da parte, não prestam qualquer compromisso, pois tal exigência só se verifica a nomeação do profissional de confiança do juízo, nos termos do artigo 827 da CLT. Por isso, somente o perito está sujeito ao mesmo regramento do juiz no que tange as hipóteses de suspeição e impedimento. A parte sucumbente na pretensão relativa ao objeto da perícia é a responsável pelo pagamento dos honorários periciais, entendimento da Súmula 236 do E. Tribunal Superior do Trabalho – TST.15 Não há previsão legal, no processo do trabalho, para que se exija adiantamento dos honorários periciais. Eventual decisão no sentido contrário poderá ser desafiada por meio de mandado de segurança. Neste sentido a Orientação Jurisprudencial 98 da Seção de Dissídios Individuais II do TST: Nº 98. Mandado de Segurança. Cabível para atacar exigência de depósito prévio de honorários periciais. (nova redação, DJU 22.8.05) É ilegal a exigência de depósito prévio para custeio dos honorários periciais, dada a incompatibilidade com o processo do trabalho, sendo cabível o mandado de segurança visando à realização da perícia, independentemente do depósito. 14 NEGRÃO. Theotonio. Código de Processo Civil Comentado. 40. Ed.: São Paulo – Saraiva., 2008., p.543. 15 Nº 236. Honorários periciais. Responsabilidade: A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão relativa ao objeto da perícia. 10 O TST, entretanto, tendo em vista as inovações trazidas pela Emenda Constitucional nº. 45, editou a Instrução Normativa nº. 27, a qual, no parágrafo único do 6º. artigo, prevê que: “Faculta-se ao juiz, em relação à perícia, exigir depósito prévio dos honorários, ressalvadas as lides decorrentes da relação de emprego.” Nestes casos, o adiantamento será de responsabilidade da parte que requereu a perícia. Se a prova pericial for requerida por ambas as partes ou pelo juízo, o adiantamento deverá ser efetuado pelo autor (art. 33 do CPC). Determinada a perícia, o juiz fixara prazo para entrega dos trabalhos. Após a entrega, dará vistas as partes para manifestação. Carlos Henrique Bezerra Leite, interpretando o art. 848 da CLT, entende que a prova pericial deve ser produzida antes da audiência de instrução. Vejamos:16 Embora não haja regra clara na CLT, a interpretação lógica, e não gramatical, do art. 848, §2º, da CLT, autoriza dizer que a prova pericial e sempre produzida antes da testemunhal, pois se, na audiência, o perito será ouvido depois da testemunhas, é obvio que o laudo pericial já consta dos autos antes mesmo da tomada do seu depoimento. Ousamos discordar de tal entendimento. Deve o juiz, escutando as partes e levando em conta sua experiência, verificar se é oportuna a elaboração da prova pericial antes da testemunhal, afim de que se evite a produção de atos inúteis. Dada a importância desta prova, é plenamente possível a determinação, de ofício de nova perícia sempre que necessário para o deslinde da controvérsia, nos termos do art. 437 do CPC: Art. 437. O juiz poderá determinar, de ofício ou a requerimento da parte, a realização de nova perícia, quando a matéria não lhe parecer suficientemente esclarecida. (grifo nosso) 16 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. p. 559 11 Theotonio Negrão, inclusive, assevera que “É viável determinar, de ofício inclusive em 2º. Grau, a realização de nova perícia, quando a matéria não estiver suficientemente esclarecida”. 17 Para ilustrar, citamos caso de acidente de trabalho onde se determinou a realização de perícia em 2º grau: PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEIO DE DEFESA. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA. NEXO CAUSAL ENTRE DOENÇA E ACIDENTE DO TRABALHO. IMPRESCINDIBILIDADE. Compulsando-se os autos observa-se que não obstante depoimentos em sentido contrário, certo é que as informações prestadas pelas duas testemunhas do autor, ainda que contraditadas, confirmam a alegação do obreiro de que foi atingido por um galho de café em seu olho esquerdo, enquanto trabalhava para o reclamado, no final de julho de 2005. Contudo, para se reconhecer a responsabilidade do réu resta saber se aquele incidente causou a doença acometida ao obreiro, qual seja, úlcera de córnea no olho esquerdo. Considerando que a doença que acomete o reclamante pode ter sido causada por uma infecção bacteriana, e a queda do galho de café no olho do reclamante pode ter provocado a dita infecção, antes de excluir o nexo causal, imprescindível a produção da perícia médica a fim de avaliar se tais possibilidades têm fundamento no caso concreto. Nesse sentido, o art. 130, do CPC permite ao juiz determinar, de ofício, as provas necessárias à instrução do processo. Dessa forma, acolhe-se a prefacial para declarar a nulidade da sentença, determinando-se o retorno dos autos à vara de origem, para realização da prova pericial médica, a fim de apurar a existência de nexo causal entre a doença acometida pelo obreiro e o incidente ocorrido durante o contrato de trabalho firmado com a reclamada. (TRT 17ª R.; RO 00877.2007.101.17.00.7; Ac. 4321/2008; Rel. Juiz José Carlos Rizk; DOES 27/05/2008; Pág. 15) CPC, art. 130 Insta salientar, por derradeiro, que, nos casos onde se determine a realização de novas perícias, as produzidas subseqüentemente não substituirão as antecedentes, cabendo ao juiz, embora não adstrito a nenhuma delas, fixar seu entendimento analisando toda a prova produzida. 17 NEGRÃO. Theotonio. Código de Processo Civil Comentado. 40. Ed.: São Paulo – Saraiva., 2008., p.531. 12 Direito Comparado De forma a robustecer mais nosso trabalho, faremos pequena analise da questão sob o enfoque do direito comparado, onde verificamos a existência de comandos muito semelhantes aos da nossa legislação. O Código de Processo Civil da Itália prevê, no seu artigo 20118, que as partes podem indicar seus próprios assistentes técnicos, chamados “consulentes técnicos” os quais participam da audiência de esclarecimento da perícia e podem, inclusive, indagar o perito do juízo sobre as questões técnicas objeto da prova. Também ocorre uma audiência de instalação de perícia, na qual o consulente presta juramento de bem se cumprir seu encargo e às partes a facultado acompanhar a produção da prova, formular perguntas ao consulente técnico e de lhe pedir esclarecimentos. No direito português, o Código de Processo Civil é, ainda, mais explícito no que tange à participação das partes na prova pericial. De acordo com o artigo 568, do Código de Processo Civil Português, “as partes são ouvidas sobre a nomeação do perito, podendo sugerir quem deve realizar a diligência; havendo acordo das partes sobre a identidade do perito a designar, deve o juiz nomeá-lo, salvo se fundamentadamente tiver razões para por em causa a sua idoneidade ou competência”. Prevê ainda no direito processual português a figura da perícia na forma de um colegiado, realizada por até três peritos, desde que o caso se revista de especial 18 O Código de Processo Civil Italiano dispõe, no seu artigo 201, sobre o consulente técnico da parte: “Il giudice instruttore, com l’ordinanza di nomima del consulente (191), assegna alle parti un termine entro il quale possono nominare, com dichiarazione ricevuta dal cancelliere, un loro consulente tecnico (97, att.145). Il consulente della parte, oltre ad assistere a norma dell’articolo 194 alle operazioni del consulente del giudice, partecipa all’udienza e alla camera di consiglio ogni volta che vi interviene il consulente del giudice, per chiarire e svolgere, com l’autorizazione del presidente, le sue osservazioni sui risultati delle indagini techiche (att.91)” 13 complexidade ou exija o conhecimento de matérias distintas. Ainda, a fim de preserva o interesse das partes, dispõe a lei que, no caso discordância sobre a nomeação dos peritos para a formação do colegiado de experts, cada parte escolherá um dos peritos e o juiz nomeará o terceiro. Alguns dispositivos do Código de Processo Civil Português merecem destaque: Art. 580. 1- – No próprio despacho em que ordene a realização da perícia e nomeie os peritos, o juiz designa a data e local para o começo da diligência, notificando as partes. Art. 582. 3 – As partes podem assistir à diligência e fazer-se assistir por assessor técnico, nos termos previstos no art. 42º 19, salvo se a perícia for susceptível de ofender o pudor ou implicar quebra de qualquer sigilo que o tribunal entenda merecer protecçáo. 4 – As partes podem fazer ao perito as observações que entendam e devem prestar os esclarecimentos que o perito julgue necessários; se o juiz estiver presente, podem também requerer o que entendam conveniente em relação ao objecto da diligência. Art. 585. 1 – Quando a perícia não possa logo encerrar-se com a imediata apresentação do relatório pericial, o juiz fixa o prazo dentro do qual a diligência há-de ficar concluída, que não excederá 30 dias. 2 – Os peritos indicam às partes o dia e hora em que prosseguirão com os actos de inspeção, sempre que lhes seja lícito assistir à continuidade da diligência. Art. 587. 1 – A apresentação do relatório pericial é notificada às partes. 2 – Se as partes entenderem que há qualquer deficiência, obscuridade ou contradição no relatório pericial, ou que as conclusões não se mostram devidamente fundamentadas, podem formular suas reclamações. 3 – Se as reclamações forem atendidas, o juiz ordena que o perito complete, esclareça ou fundamente, por escrito, o relatório apresentado. 19 O artigo 42 do Código de Processo Civil Português, estabelece que: “Quando no processo se suscitem questões de natureza técnica para as quais não tenha a necessária preparação, poderá o advogado fazerse assistir, durante a produção da prova e a discussão da causa, de pessoa dotada de competência especial para se ocupar das questões suscitadas.” 14 Art. 588. Quando alguma das partes o requeira ou o juiz o ordene, os peritos comparecerão na audiência final, a fim de prestarem, sob juramento, os esclarecimentos que lhes sejam pedidos. Nota-se que o processo civil português, no que se refere à produção da prova pericial, preocupa-se deveras em preservar o interesse das partes. Garantindo sua participação desde a nomeação do perito. Podem, também, efetivamente acompanhar sua produção, uma vez que são notificadas do início da perícia e, até mesmo, do seu prosseguimento, caso o perito não conclua o seu trabalho no prazo previamente estabelecido. O estudo do direito português, em especial, e as diferenças que apresenta em relação ao nosso próprio sistema processual, nos pontos aqui destacados, faz com que tendamos a criticar o nosso modelo por ser ele ofensivo de uma das garantias básicas das partes: a ampla defesa. Diante do exposto, a prova pericial médica é de suma importância, devendo ser realizada por profissional credenciado no órgão de classe, bem como, de acordo com a especialidade requerida no ato pericial e ainda, com especialização em medicina do trabalho, visto a profusão de temas e funções que são levantadas no laudo pericial, bem como nas patologias que podem ser desencadeadas. Bibliografia: BUENO NETO, Antonio. Perícia e Processo Trabalhista. Curitiba: Editora Gênesis, 1995. LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. NEGRÃO. Theotonio. Código de Processo Civil Comentado. 40. Ed.: São Paulo – Saraiva, 2008. TEIXEIRA FILHO, Manuel Antonio. Curso de Direito Processual do Trabalho Vol. II. São Paulo: LTr, 2009. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Volume I. 24ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1998. Lei Federal n º. 4.119/62 e Decreto Legislativo nº. 53.464/64. Consolidação das Leis Trabalhistas 15 Código de Processo Civil Brasileiro Código de Processo Civil Italiano Código de Processo Civil Português Resolução 1.488/1998 do Conselho Federal De Medicina Orientações e Súmulas do Colendo Tribunal Superior Do Trabalho 16