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A PRODUÇÃO CIENTÍFICA ACERCA DA HISTÓRIA DO ENSINO DA LÍNGUA
PORTUGUESA NO BRASIL
Danilo Morais Lima (PG-UEMS)1
[email protected]
Estela Natalina Mantovani Bertoletti (UEMS)2
[email protected]
RESUMO: O presente estudo pretende contribuir para a compreensão da produção científica
acerca da história do ensino da língua portuguesa no Brasil. Faz parte de pesquisa (em
andamento), cuja investigação preliminar objetiva fornecer, também, subsídios teóricometodológicos a um trabalho de dimensão mais aprofundada, que culminará na produção de
uma dissertação de mestrado acerca da história do ensino da língua portuguesa na Bahia. A
temática de que trata este trabalho justifica-se pelo fato de as pesquisas históricas em
educação terem alcançado, nas últimas décadas, abrangência e prestígio acadêmico. Neste
estudo, os trabalhos científicos: resumos de dissertações e teses do Banco de Teses da
CAPES, periódicos qualificados pela CAPES, disponíveis no meio eletrônico e Anais de
programas de pós- graduação em Educação e Letras / Linguística serão analisados numa
perspectiva da História Nova / História Cultural. Esta pesquisa insere-se num campo de
pesquisa denominado História das Disciplinas Escolares, que objetiva investigar as mudanças
ocorridas numa determinada área do saber ao longo dos anos. Os procedimentos
metodológicos adotados para a execução deste estudo são os que se seguem: levantamento
bibliográfico da produção científica acerca da história do ensino da língua portuguesa no
Brasil, mediante seleção e ordenação e leitura de tais produções científicas. Os resultados
parciais do exame das produções científicas em questão evidenciam que entre os anos de 1987
e 1999, estas restringem-se, em sua maioria, à análise sincrônica de concepções teóricas e
práticas escolares que caracterizam o ensino de língua portuguesa brasileiro contemporâneo.
Não há, claramente, um interesse pela abordagem histórica, com vistas a uma melhor
compreensão do presente. A partir dos anos de 2000, os trabalhos científicos, ainda escassos,
apresentam a adoção de uma perspectiva “panorâmico–evolucionista” em estudos que se
voltam para a análise de manuais didáticos adotados por escolas consideradas modelos ou
instituições escolares confessionais, história da leitura ou literatura. Há, em muitas dessas
pesquisas, interpretações marcadas pela desvalorização do passado, que é concebido como
“tradicional”, passível de uma substituição rápida pelo “novo”, “moderno”. À escola é dado
um caráter reducionista e reprodutivista. Existe uma demanda pela relevância de se pesquisar
as disciplinas escolares, produtos da cultura escolar, a partir de fontes, como: cadernos de
alunos, provas, exercícios escolares, material didático e iconográfico. Além disso, os estudos
de fundo histórico sobre o ensino da língua portuguesa recentes mostram que as concepções
teóricas e as práticas escolares são elementos indissociáveis.
Palavras – chave: Produção Científica. História das Disciplinas Escolares. Ensino de Língua
Portuguesa.
DISCIPLINAS ESCOLARES COMO CAMPO DE INVESTIGAÇÃO
Na contemporaneidade, os avanços tecnológicos e a globalização da economia
desencadeiam mudanças aceleradas nos diferentes campos da vida social. A rapidez e a
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agitação, características do nosso tempo, propiciam a crença de que tudo envelhece de
maneira célere.
Neste contexto, é atribuído ao passado um papel irrelevante para as novas gerações. O
comportamento imediatista peculiar à contemporaneidade propicia às pessoas a ideia de que o
passado representa experiências até dignas de conhecimento, porém condenadas ao
esquecimento.
No bojo das pesquisas educacionais de fundo histórico, tem crescido o interesse, nos
últimos anos, por um campo de estudos que pretende investigar as mudanças ocorridas, numa
determinada área do saber. Trata-se de um conjunto de conhecimentos que, vínculos à escola,
propiciam novas relações de saber por meio das ações dos seus agentes principais –
professores e alunos.
A produção científica acerca da história do ensino da língua portuguesa evidencia que,
apesar da propagação de pensamentos, ideias e conceitos inovadores e de aspectos específicos
de que a prática pedagógica em cada sociedade e época, aquilo que, contemporaneamente,
permeia o fazer pedagógico tem raízes históricas.
Um mapeamento a respeito das teses e dissertações que elegem como objeto de
investigação, a história do ensino da língua portuguesa defendidas no Brasil, entre 1987 e
2011, conforme resumos disponíveis no Banco de Teses da CAPES, em periódicos
qualificados pela CAPES e Anais de programas de pós-graduação em educação e
Letras/Linguística, aponta um quantitativo ínfimo de estudos nessa tendência teóricometodológica, porque a maioria das investigações dos meios eletrônicos pesquisados volta-se
para a análise de situações de ensino/aprendizagem sincrônicas. Não há, ainda, uma demanda
proeminente e clara pela pesquisa educacional de fundo histórico.
O movimento pela destruição do passado impõe a toda sociedade atual e,
especialmente, a quem se propõe ao estudo da pesquisa histórica, o combate ao esquecimento
e a promoção da preservação da memória coletiva. Por esta razão, o historiador possui a tarefa
de guardião da memória coletiva. A este respeito, Hobsbawm (1995, p. 13) assevera que:
A destruição do passado, ou melhor, dos mecanismos que vinculam a nossa
experiência pessoal à das gerações passadas, é um dos fenômenos mais
característicos e lugares do final do século XX. Quase todos os jovens de
hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação
orgânica como passado público da época em que vivem, por isso, os
historiadores cujo ofício é lembrar o que os outros esquecem, tornam-se
mais importantes que nunca no final do segundo milênio.
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Dois elementos são fundamentais ao estudo da História: o caráter humano que ela
possui e as relações que o passado e o presente mantêm entre si. O historiador March Bloch
em Introdução à História (1993) advoga que: “a incompreensão do presente nasce da
ignorância do passado”. Bloch ressalta, também, que não é válido conhecer o passado se nada
se souber acerca do presente. O fazer histórico não pode furta-se à necessidade de indagações
do tempo presente. Assim, no trabalho investigativo empreendido pelo historiador, deve haver
um método do duplo movimento: conhecer o passado por meio do presente e conhecer o
presente por meio do passado.
Todos os vestígios que fornecem informações sobre as ações humanas ao longo do
tempo são documentos que servem de fonte para os estudos históricos: documentos oficiais,
(livros, cadernos de alunos, portfólios, depoimentos orais, fotografias, desenhos, filmes,
objetos, roupas e inúmeras outras evidências da vida de sujeitos e de uma época).
Este estudo considera fundamentais as relações existentes entre a cultura escolar as
disciplinas escolares como componentes do sistema educativo. Dominique Julia (2001, p.10)
concebe a cultura escolar como:
[...] um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas
a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses
conhecimentos e a incorporação desses comportamentos; normas e práticas
coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas [...].
É possível notar como o tempo é fator relevante na questão da variação das normas e
práticas que atendem a certas finalidades. Além disso, é cultura escolar, segundo Julia (2001),
que demarca normas que, por sua vez, definem o que ensinar; condutas a adquirir, bem como
a operacionalização desses conhecimentos, propiciadora da transmissão de saberes, bem como
a assimilação de comportamentos.
Para uma melhor compreensão dos sentidos que, historicamente, foram atribuídos às
disciplinas escolares, podemos recorrer a André Chervel que, no artigo “História das
disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa”, publicado em 1990, evidencia
que, até o final do século XIX, o termo “disciplina escolar”, relacionava-se unicamente à
vigilância dos estabelecimentos e a repressão às más condutas. Posteriormente, a flutuação de
sentidos continuou sendo um traço característico dessas produções próprias da Escola e, em
1870, o termo fez par com o verbo disciplinar, denotando um sinônimo de ginástica
intelectual a disciplinar a inteligência das crianças. Nos dicionários do século XIX, não é
possível encontrar o termo designando conteúdos escolares. Nos primeiros anos do século
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XX, porém, adquire o significado de “matéria de ensino suscetível de servir de exercício
intelectual”. (CHERVEL, 1990, p. 179).
Após as primeiras décadas do século XX, período em que “a evolução da sociedade e
dos espíritos permite contrapor à disciplina literária uma disciplina científica” (CHERVEL,
1990, p. 180).
André Chervel (1990) afirma que a escola é possuidora de uma cultura própria, capaz
de empreender mudanças à cultura da sociedade. A escola, neste caso, é dotada de um poder
ativo e criativo. As disciplinas escolares são, portanto, produtos desse poder ativo e criativo,
que permeia a instituição escolar.
Julia (2001, p. 12-13), enfatiza a relevância das contribuições oferecidas pela história
das disciplinas escolares à pesquisa educacional, asseverando que:
Ela tenta identificar, tanto através das práticas de ensino utilizadas na sala de
aula como através dos grandes objetivos que presidiram a constituição das
disciplinas, o núcleo disso que pode constituir uma história renovada da
educação. Ela abre, em todo caso para retomar uma metáfora aeronáutica a
“caixa preta” da escola, ao buscar compreender o que ocorre nesse espaço
particular.
Os fenômenos sobre os quais a história das disciplinas escolares tem analisado estão
assentados numa base teórica, que leva em consideração o conceito de cultura escolar
(JULIA, 2001). Tais pesquisas atestam que a prática escolar é um elemento que,
historicamente, sofre poucas mudanças na história da educação. A despeito da disseminação
de conceitos, pensamentos e ideias inovadores e de aspectos específicos que assume em cada
sociedade e época, a prática escolar tem materializado certos papéis e ações que estão
arraigados em sua operacionalização cotidianística.
Galvão e Lopes (2010, p. 45), advogam a importância da história das disciplinas
escolares, no que tange à investigação da progressiva transformação da escola num espaço
nuclear de transmissão do saber nas diferentes épocas e sociedades:
O estudo das disciplinas e dos saberes escolares tem sido fundamental para
compreender o papel dos contextos culturais na definição daquilo, que deve
ser ensinado na escola e, em contrapartida, o papel da escola ao produzir e
reelaborar o conhecimento, principalmente pelos processos de didatização.
Esses estudos são comumente realizados por pesquisadores especializados
na teoria do currículo ou por professores que,instigados por questões da
pratica escolar contemporânea, se interessam em conhecer o passado dos
saberes com que lidam no cotidiano. A história das disciplinas e dos saberes
escolares, ao abordar os conteúdos de ensino, os programas, as provas, os
manuais e os exercícios escolares contribui para conhecer melhor o que
ocorria dentro da escola, relativizando as abordagens macrossociológicas.
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Por sua vez, os estudos sobre manuais escolares começam a tentar
compreender os procedimentos de seleção e transmissão de saberes
diferentemente do que ocorria há alguns anos, quando tinham como foco à
propagação de ideologias.
Os procedimentos de seleção e transmissão de saberes não são estanques, mas
dinâmicos. Segundo Vinão (2008, p. 2004), para o estudo das disciplinas escolares, é
interessante considerá-las organismos vivos, o que propicia concebê-las, também, como
campos de poder social e acadêmico de um poder a disputar, de espaços onde se mesclam
interesses e atores, ações e estratégias. Esta é, então, a concepção de disciplinar escolar que
este estudo adota.
A PRODUÇÃO CIENTÍFICA ACERCA DA HISTÓRIA DO ENSINO DA LÍNGUA
PORTUGUESA NO BRASIL: mapeando teses e dissertações
A produção científica acerca do ensino de diferentes corpos de conhecimentos,
disciplinas escolares, tem alcançado, nos últimos anos, uma franca expansão, principalmente
no que se refere às áreas de Educação Física e História. No artigo. “A produção em história
das disciplinas escolares escrita por pesquisadores brasileiros”, publicado na Revista
Brasileira de História da Educação, nº 23, p.225-221, maio/ago.2010, a doutoranda do
Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, Mariana
Tassab, faz um mapeamento da produção brasileira em história das disciplinas escolares. Os
resultados desse estudo apontam uma predominância de trabalhos voltados à história da
Educação Física Escolar em relação às demais disciplinas. No bojo da análise realizada por
Tassab (2010) dos 23 artigos mapeados, os quais tematizam a história das disciplinas
escolares, apenas 01 deles propõe-se a investigar o ensino da Língua Portuguesa no Brasil, o
que pode ser considerado um contingente ínfimo de pesquisas de fundo histórico, no campo
da HDE.
O artigo “Histórico das disciplinas escolares armazenadas nos arquivos da Escola
Estadual Maria Constança de Barros”, de autoria da pesquisadora e professora da
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) Eurides Pessanha, por meio de uma
análise das pesquisas produzidas no Observatório de Cultura Escolar grupo de pesquisa
cadastrado no Diretório de grupos de pesquisa - CNPq, criado em 2005 por pesquisadores da
linha de pesquisa Escola, Cultura e Disciplinas Escolares do Programa de Pós-graduação em
Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, destaca que, das doze pesquisas
realizadas no grupo, oito tiveram como lócus a Escola Estadual Maria Constança de Barros,
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referência na história da educação da cidade de Campo Grande-MS e, destas (oito), apenas
uma delas elege como objeto de estudo a história do ensino da Língua Portuguesa, o que
reforça a tese da escassez de pesquisas na área.
Não se busca, neste texto, esgotar as discussões a respeito da produção científica
acerca da história do ensino da Língua Portuguesa visto que, a despeito do número ainda
exíguo de dissertações e teses, que promovem, por meio de conceitos e ideias concernentes à
cultura escolar, à historia do currículo, à historia das disciplinas escolares, o crescente
aumento do número de programas de Pós-graduação em Educação e Letras/ Linguística em
diferentes estados brasileiros não permite abarcar todos os trabalhos acadêmicos publicados
no Banco de Teses da CAPES, periódicos disponíveis no meio eletrônico e Anais de
programas de pós-graduação em Educação e Letras/linguística, conforme atesta o quadro que
se segue:
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Dissertação/tese
Autor(a)
PUC SP
Ano de
Publicação
1987
UFG
1995
Rossana Guimarães Ramos
PUC SP
2005
A disciplina Língua Portuguesa nos trilhos
da lei, na prática dos livros didáticos e na
memória de alunos e professores em Campo
Grande – MS.
A proposta curricular para o ensino de
Língua Portuguesa no estado do Rio de
Janeiro no início do séc. XXI; uma orquestra
discursiva de vozes
Revisitando o ensino tradicional de Língua
Portuguesa
Histórias de professoras de Língua
Portuguesa e saberes da profissão docente
Rosemeri Silva Pereira
UFMS
2005
Vanessa Souza da Silva
UFF
2008
Primeiros
corrente.
Graziela Lucci de Angelo
UNICAMP
2005
Anos de 1970 e 1980
Campinas – SP.
Neurilene Martins Ribeiro
UNEB
2008
A história do ensino de Língua Portuguesa
nos livros didáticos brasileiros em dois
tempos: a obra de Hermínio Sargentim
(1974-199)
A tradição e os singulares – o ensino de
Português proposto nos livros didáticos por
professores universitários do Paraná (1944 –
1980)
Aspectos constitutivos da história do ensino
de Língua Portuguesa no Oeste do Paraná
(1960 – 1979)
Ioná Vieira Guimarães
Venturini
UFU
2004
Não
há.
As
professoras
entrevistadas possuem de um a
cinco anos de profissão.
1974-1980
Municípios
da
Chapada Diamantina
– BA.
Não há.
Suzete de Paula Bornatto
UFPR
2011
1944- 1980
Não há.
Carmen Teresinha
Baumgartner
UEL
2009
1960-1979
Não há.
A Linguística na escolarização do Português:
referências a uma obra didática construída entre
1965 e 2002.
Tany Mara Monfredini de Moura
UFMG
2005
1965-2002
Não há.
Novos caminhos para o ensino/aprendizagem
da Língua Portuguesa
Uma ressignificação do ensino de Língua
Portuguesa
Cartilhas: um paradigma didáticolinguístico da alfabetização
Maria Lygia de C. Barros
Cristovão Giovanni Burgarelli
I.E.S.
Recorte Temporal
Inexiste. (Estudo sincrônico das
relações textuais no discurso)
Inexistente.
No resumo do trabalho, há a
informação de as três cartilhas
analisadas são de décadas
distintas.
1960-1980
anos
da
década
Recorte Espacial
Não há.
Dois colégios
Goiânia – GO.
Não há.
de
Colégio
Estadual
Maria Constança de
Barros Machado.
Não há.
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A partir, portanto, da reunião e análise das dissertações e teses em questão, como
mediadoras dos objetivos que se pretende alcançar, pode-se evidenciar concepções teóricometodológicas desses trabalhos.
Durante o período compreendido entre 1987, ano a partir do qual os trabalhos
disponibilizados pela CAPES podem ser acessados e 1999 há um número significativo de
dissertações e teses que empreendem análises no ensino de Língua Portuguesa. Limitam-se,
porém, a aspectos constituídos sincrônicos, contemporâneos do ensino de língua materna. Há,
ainda, estudos acerca da formação histórica do português, os quais se pautam, somente, na
pretensão de investigar as estruturas interna e externa da língua. Desse modo, esses estudos
voltam-se para questões como supressão e acréscimo de elementos mórficos que,
historicamente, caracterizam as mudanças pelas quais o português contemporâneo passou.
Nesta investigação, constatou-se que a produção científica acerca do ensino de Língua
Portuguesa, no período de 1987 a 1999 não emprega a pesquisa histórica como
encaminhamento teórico-metodológico das dissertações e teses disponíveis no meio
eletrônico. Para ilustrar essa tendência, num universo de vários trabalhos produzidos nesses
moldes acadêmicos, recorremos a duas dissertações de Mestrado.
Na dissertação de Mestrado, intitulada Novos caminhos para o ensino-aprendizagem
de Língua Portuguesa, de autoria de Maria Lygia de Barros, defendida na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, em 1987, é possível notar um estudo sincrônico das
relações textuais no discurso. Não há, neste caso, recorte temporal, que propunha estudos
teóricos acerca de elementos que, historicamente, caracterizaram o ensino de um corpo
sistematizado de conhecimentos, a disciplina Língua Portuguesa.
De modo similar, na dissertação, Uma ressignificação do ensino de Língua
Portuguesa, de autoria Cristovão Giovanni Burgarelli, defendida na Universidade Federal de
Goiás (UFG), em 1995, propõe que o ensino dessa disciplina necessita desvencilhar–se da
tradicional ideia de que existem regras exatas e perenes para apropriar-se dos diversos usos da
linguagem.
Nos últimos dez anos, tem havido um interesse, no que tange à história e à descrição
da língua portuguesa, por estudos histórico-historiográficos, aplicando os princípios da
historiografia linguística às cartilhas utilizadas no processo de alfabetização no Brasil. A tese
de Doutorado, intitulada Cartilhas: um paradigma didático-linguístico da alfabetização no
Brasil, defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), em 2005
reflete tal inclinação teórico-metodológica.
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No mesmo ano de 2005, a dissertação de mestrado de autoria Rosimeri da Silva
Pereira, A disciplina Língua Portuguesa nos trilhos da lei, na prática dos livros didáticos e na
memória de alunos e professores em Campo Grande (1960-1980), defendida na Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), ancora-se no Campo da história das disciplinas
escolares, aliando a análise de livros didáticos adotados por uma escola considerada
referência, modelo, da cidade Campo Grande-MS, as disposições legais concernentes ao
ensino de Língua Portuguesa à memória de ex-alunos e ex-professoras da aludida unidade
escolar. Nas palavras – chave do trabalho em questão é citada como primeira delas, a
expressão “História das Disciplinas Escolares”, o que é um dado novo, visto que as produções
científicas anteriormente elencadas não fazem menção a tal campo de estudo.
A tese de Doutorado, A tradição e os singulares o ensino de português proposto em
livros didáticos por professores universitários do Paraná (1944-1980), de autoria de Suzete de
Paula Bornatto, apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade
Federal do Paraná, em 2011, objetiva investigar, a partir de obras didáticas de três gerações de
professores que atuaram tanto no ensino básico quanto no superior no estado do Paraná
,apoiando-se num conceito desenvolvido por Bakthin: o autor como organizador e
orquestrador de diferentes vozes sociais, o trabalho relativiza afirmações correntes sobre a
historia da disciplina, quando à sua falta de cientificidade, de atualidade e sua desvinculação
dos estudos linguísticos, comuns em estudos que atribuem à escola um papel, meramente
reprodutivista de conteúdos escolares e das mazelas sociais.
Na tese de Doutorado, A Linguística na escolarização do Português: referências a uma
obra didática construída entre 1965 e 2002, defendida na Universidade Federal de Minas
Gerais, no ano de 2005, por Tany Mara Monfredini de Moura, são apresentadas hipóteses
interpretativas acerca da trajetória das referências da Linguística na escolarização do
Português.Assim, neste trabalho, é estudado o caso de uma mesma autoria, representada por
cinco coleções didáticas , editadas ou reformuladas entre os anos de 1965 e 2002. No estudo
em questão, defende-se que, como um objeto de cultura, o português é escolarizado em
função das demandas sociais e do retorno que a escola pode dar ao qualificar esse objeto
como seu.
A dissertação de mestrado, intitulada “História de professoras de Língua Portuguesa:
dilema e saberes da profissão”, defendida por Meurilene Martins Ribeiro, orientada pelo
Professor Dr. Elizeu Clementino de Souza, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Educação e Contemporaneidade da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), vinculada ao
grupo de pesquisa (Auto)biografia, Formação e História Oral que, objetivando compreender
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as teias de relações constitutivas dos processos que forjam a construção das identidades e
subjetividades docentes que caracterizam o início da carreira professoral, a partir de histórias
de vida e narrativas orais e escritas, que tem como espaço empírico, municípios da Chapada
Diamantina/BA. Este trabalho, embora não se insira no campo da história das disciplinas
escolares, mas da História Oral reflete a escassez de produções científicas a respeito da língua
portuguesa na Bahia, uma vez que a maioria dos estudos existentes no meio eletrônico, que
tem como espaço empírico o Estado da Bahia, relaciona-se às disciplinas Educação Física
Escolar e História.
A dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação,
da Universidade Federal de Uberlândia, intitulada A história do ensino de língua portuguesa
nos livros didáticos brasileiros em dois tempos: a obra de Hermínio Sargentim (1974-199),
produzida por Ioná Guimarães Venturi, no ano de 2004, sob a orientação do professor Dr.
Décio Gatti Júnior investiga as mudanças e as permanências que os livros didáticos de língua
portuguesa de autoria de Hermínio Sargentim, dos anos de 1974 a 1999 apresentam em
relação ao ensino da disciplina na 5ª série do ensino fundamental.
Na tese de doutorado, Revisitando o ensino tradicional de língua portuguesa,
apresentada ao curso de Linguística Aplicada do Instituto de Estudos da Linguagem da
Universidade Estadual de Campinas, defendida por Gaziela Lucci de Angelo, orientada pela
professora Drª Raquel Salek Fiad, objetiva investigar que outros sentidos podem estar
vinculados ao ensino tradicional de língua portuguesa, além da imagem construída pelo saber
acadêmico. Para a recuperação dessa imagem, foram analisados seis textos de linguistas, dois
documentos oficiais voltados ao ensino de língua materna publicados nos anos de 1970 e
1980.
A dissertação de mestrado, A proposta curricular para o ensino de língua portuguesa
no estado do Rio de Janeiro no início do séc. XXI: uma orquestra discursiva de vozes,
apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal
Fluminense, em 2008, produzida por Vanessa Souza da Silva, orientada pela professora Drª
Cecília Maria Goulart, pretende, a partir da teoria da enunciação de Mikhail Bakhtin, analisar
como se organiza o discurso oficial da Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro
para o ensino da língua portuguesa nas escolas públicas do estado. Busca, também,
compreender como se articulam as vozes discursivas que organizam esse discurso,
considerando que o professor é leitor privilegiado. Para isso, toma-se como objeto de análise a
proposta curricular para o ensino de Língua Portuguesa, produzida no documento de
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Reorientação Curricular entregue às escolas em 2006, incluindo os materiais didáticos
elaborados pelos professores.
A tese de doutorado, intitulada Aspectos constitutivos da história do ensino de Língua
Portuguesa no Oeste do Paraná (1960 – 1979), produzida por Carmen Teresinha Baumgartner,
sob a orientação da professora Drª Alba Maria Perfeito, apresentada ao Programa de Pósgraduação em Estudos da linguagem, da Universidade Estadual de Londrina, no ano de 2009,
é ancorada na perspectiva sócio-histórica, em diálogo com a Linguística Aplicada e com uma
área da História da Educação, denominada História das Disciplinas Escolares. Há, nesse
estudo, a valorização de aspectos descritivos e percepções pessoais, com vistas a recuperar os
fios constitutivos da história da disciplina escolar em questão, no Oeste do Paraná, no período
de 1960 a 1979.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das reflexões aqui fomentadas, fica evidente que à escola, instituição social
permeada por um ativo e criativo, não deve ser atribuído um caráter reducionista ou
reprodutivista que limita as suas diferentes funções à reprodução de conteúdos escolares,
prescritos pela sociedade e pela cultura que a cercam. Sob esse prisma, a prática escolar, seria
alheia a uma cultura escolar capaz de selecionar, organizar e sistematizar os conteúdos das
disciplinas escolares.
A produção científica acerca da história do ensino da língua portuguesa, de acordo
com a análise empreendida a respeito das dissertações e teses mapeadas, neste estudo, que,
teórica e metodologicamente, podem ser inseridas no campo da História das Disciplinas
Escolares torna claro que, apesar da propagação de pensamentos, ideias e conceitos
inovadores e de aspectos específicos de que a prática escolar é dotada em cada sociedade e
época, aquilo que, contemporaneamente, permeia o fazer pedagógico tem raízes históricas,
não se constituindo, portanto, em algo novo e original. É preciso deixar claro, porém, que não
se busca com tal afirmação invalidar, cientificamente, o que, atualmente, é visto nas aulas de
língua portuguesa, mas evidenciar a existência de deslocamentos existentes na prática
pedagógica que, ora apontam para a manutenção, ora para a ruptura.
Nas décadas de 1980 e 1990, dissertações e teses que elegem o ensino de Língua
Portuguesa como objeto de investigação, em sua maioria, voltam-se para a análise de
situações de ensino-- aprendizagem sincrônicas. Não há, ainda, uma franca demanda pela
abordagem histórica nas pesquisas educacionais, com vistas a uma melhor compreensão dos
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aspectos constitutivos do ensino contemporâneo, a partir do passado. Há uma quantidade de
trabalhos nesses moldes, considerável. Este estudo vale-se, porém, de duas dissertações de
mestrado que exemplificam tal tendência teórico-metodológica.
No início dos anos 2000, há trabalhos que adotam uma perspectiva “panorâmicoevolucionista” e, de maneira intencional ou não, reforçam a desvalorização do passado, que é
concebido como “tradicional”, passível de uma substituição pelo “ novo”, “moderno”.
A partir de meados dos anos de 2000, as produções científicas já se inserem,
claramente, no campo da história das disciplinas escolares, incluem como palavra-chave tal
expressão. Nessa perspectiva, as disciplinas escolares são concebidas como produtos da
cultura escolar. Além disso, sob esse prisma, concepções teóricas e práticas escolares são
elementos indissociáveis.
A despeito do prestígio acadêmico alcançado pela pesquisa histórica em educação, nos
últimos anos, é inegável a existência de lacunas que podem propiciar novos estudos,
especialmente no campo da história das disciplinas escolares. A história do ensino da língua
portuguesa, neste contexto permeado pela escassez de investigações científicas, constitui-se
num terreno favorável e promissor aos desenvolvimentos de estudos que, sem suscitar
preconceitos
de
nenhuma
ordem,
inclusive
teórico-metodológica
contribuam,
significativamente, com o fazer científico.
1
Mestrando em Educação pela Universidade de Mato Grosso do Sul – UEMS. Membro do Grupo de Estudos e
Pesquisas em História e Historiografia da Educação Brasileira – GEPHEB.
2
Doutora em Educação pela Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho e Estágio de Pós-Doutorado pela
Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho; Docente da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul –
UEMS.
13
REFERÊNCIAS
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(Doutorado em Linguística Aplicada). UNICAMP, 2005.
BARROS, Maria Lygia C de. O desenvolvimento da linguagem: novos caminhos para o
ensino/ aprendizagem da língua portuguesa. Dissertação (Mestrado em Linguística ). PUCSP,
1987.
BAUMGARTNER, Carmem Terezinha. Aspectos constitutivos da história do ensino de
Língua Portuguesa no Oeste do Paraná (1960 – 1979). Tese. (Doutorado em Educação).
UEL, 2009.
BLOCH, March. Introdução à história. 6. ed. Mem Martins (Portugal): Publicações Europa
– América, 1993.
BORNATTO, Suzete de Paula. A tradição e os singulares: o ensino de Português proposto
nos livros didáticos por professores universitários do Paraná (1944 – 1980). Tese. (Doutorado
em Educação). UFPR, 2011.
BURGARELLI, Cristovão Giovanni. Uma ressignificação do ensino de língua portuguesa.
Dissertação (Mestrado em Letras). UFGD, 1995.
CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFA, Ronaldo S. (Orgs.). Domínios da história: ensaios
de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, l997.
CASSAB, Mariana. Revista Brasileira de História da Educação. n° 23, p. 225-251,
maio/ago. 2010.
HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos: o breve século XX (1914 – 1991). São Paulo:
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