A educação financeira nos livros do ensino fundamental Rony Sá Barreto Rodrigues Montenegro Escola do Recife Brasil [email protected] José Roberto da Silva Campus Nazaré da Mata, Universidade de Pernambuco Brasil [email protected] Maria Aparecida da Silva Rufino Campus Nazaré da Mata, Universidade de Pernambuco Faculdades Integradas da Vitória de Santo Antão – Pernambuco Brasil [email protected] Resumo A utilização de situações cotidianas trazidas de fora do ambiente escolar para favorecer a compreensão do conhecimento acadêmico e vice-versa tornou-se uma realidade e hoje auxilia bastante o propósito da formação educativa do cidadão. Daí, a necessidade escolar de priorizar a cidadania na formação básica, dentre outros aspectos positivos, contribuiu para o surgimento de campos como a Educação Matemática, que viabiliza emergir outros a exemplo da Educação Financeira objeto de interesse deste estudo. O marco metodológico é o qualitativo, em especial, o chamado Estudo de Caso Educativo Descritivo pela intenção de planificar uma melhor compreensão da ação educativa, no caso, entender segundo duas coleções de livros do Ensino Fundamental, se suas abordagens propiciam ou não uma Educação Financeira. A análise caracterizou que ambas as coleções focalizam mais na direção dos conteúdos matemáticos em si, do que pontuar considerações desse conhecimento evidenciando sua importância na formação do aluno enquanto cidadão. Palavras chave: ensino fundamental; educação financeira; matemática financeira; formação do cidadão; livros didáticos. XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 2 Introdução O cenário mundial tem privilegiado valores materiais e o ser humano como consumidor, gira em torno de uma crise ou, como pontua Chossudovsky (2000), uma guerra financeira em que, alguns países, para obterem vantagens econômico-financeiras sobre outros terminam transformando-os em reféns de suas imposições. Consequentemente, inúmeros países acabam abrindo mão de sua autonomia política e passam a ser controlados por aqueles “supostamente” superiores. Quadro análogo à descrição anterior se reflete na vida do cidadão comum. Pois, diariamente, as pessoas se deparam com situações e vocabulários, que, por falta de informações adequadas, tornam-se vítimas de um dado sistema, mas que, sem duvida, poderiam adquiri-las em sua formação escolar básica. Por exemplo, no âmbito do sistema financeiro, o cidadão se depara com diversas situações que, por algum tipo de desinformação, não sabe ao certo se numa compra a incidência de juros, descontos, multas por atraso, número de prestações, etc. afetam ou não, dignamente, o valor final de um bem a ser adquirido. Há muitos fatores relacionados à compra de um bem por um cidadão, mas, de uma forma ou de outra, o mercado procura influenciar, ao máximo, sua decisão e, quando motivado pelo poder aquisitivo do empréstimo este fica exposto às empresas de financiamento (financeiras, bancos, empresas de cartão de crédito, ...) e, caso desconheçam pequenos detalhes das operações financeiras, podem ser facilmente convencidos a realizá-las. Assim, por não saber mensurar devidamente as despesas a pagar, a maioria da população brasileira perde muito dinheiro e, como os países endividados, transformam-se em escravos financeiros, lembrando que o despreparo os torna vítimas fáceis de diversas armadilhas como propagandas enganosas, contratos obscuros em seus detalhes, etc. Para fugir de tais armadilhas, mas reconhecendo respeitosamente a qualidade do conhecimento escolar cabe trazer segundo Donelon (1996) que os antigos povos latinos já tinham em si o objetivo principal da educação, quando postulavam que se deve aprender não para a escola e sim para a vida. No caso da matemática, para Skovsmose (2006) esta educação ajuda na formação de um cidadão crítico e sua falta pode excluí-lo da sociedade, uma vez que está presente em toda parte. Portanto, somente através de uma boa educação matemática, a escola formará cidadãos mais reflexivos, críticos e criativos. Desse modo, os procedimentos educativos para contemplar a educação como posta anteriormente carecem levar em consideração diversos fatores, em especial, pode-se destacar a potencialidade da contextualização em termos de viabilizar a compreensão almejada a partir da articulação entre as situações escolares e as vivenciadas fora da escola. Com isso acredita-se que a aquisição dos conteúdos escolares, ao invés de repudiados por parte dos alunos como ocorre frequentemente com o conhecimento matemático, pode passar a ser interessante. Dentre outras formas, convém argumentar que explorar adequadamente situações financeiras segundo a articulação anterior, atribuindo a devida importância às múltiplas necessidades de consumo, seguramente, contribui para a formação do cidadão. Neste contexto, educar para a vida exige a inclusão de uma matemática financeira com propósitos mais claros e precisos no currículo escolar voltados para a formação do cidadão. Diante disso, conceitos, definições e resoluções de situações bem sistematizados precisam ser trabalhados desde as bases do Ensino Fundamental Séries Finais (EFSF), destacando a matemática financeira na direção de algo que, neste estudo, resolveu se chamar de Educação XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 3 Financeira. Tal decisão se deve ao fato de não almejar um ensino com foco direcionado exclusivamente nos conceitos, definições e resoluções em si, e sim, investir também em oportunizar, aos alunos, condições de fazerem usos conscientes dessas informações tanto na escola como, em suas próprias vidas. Pois, sem uma educação financeira adequada, o cidadão não consegue analisar criticamente as várias opções de pagamento na aquisição de alimentos, carros, casas, e outros bens. Com foco no ensino fundamental, mostraremos que o ensino formal não está conseguindo construir um indivíduo com uma educação financeira apropriada à sua realidade. E que, mesmo sendo orientados, a prepararem os jovens, não para a escola e sim para a vida, todo o sistema educacional está ausente quanto ao ensino da matemática financeira, causando grandes problemas ao cidadão no futuro, pois estes, logo serão enganados e sofrerão muito por causa do desconhecimento. Neste trabalho, indicaremos as falhas cometidas em cada etapa do sistema educacional, com a finalidade de mostrar a todos que os problemas sofridos por vários cidadãos podem ser corrigidos, apenas numa mudança da escola a partir dos anos iniciais. Servindo também, este trabalho, para conscientizar a população no intuito de estes cobrarem dos devidos responsáveis essa mudança. Alusão à relevância da educação financeira A matemática financeira conforme Morgado (1993) não deve ser vista como um mero conjunto de fórmulas exóticas usadas para calcular juros sem considerar a potencialidade de seus métodos de decisões entre alternativas de investimento e financiamento. Por sua vez, para Hazzan (2006), ela serve para analisar os procedimentos sobre pagamentos de empréstimos e os métodos da análise de investimentos. Para outros, como Assaf Neto (1998) e Zentgraf (2003), esta parte da matemática fundamenta-se na relação tempo e dinheiro, envolvendo as chamadas aplicações. Estas dentre outras idealizações procuram contemplar uma visão sobre esse tipo de conhecimento matemático, mas como outras ideias dessa área também não se permitem desvendar facilmente. No entanto, cabe lembrar que, seja nas sociedades antigas como os babilônicos 2000 a.C ou mais atual como a sul-americana, aspectos inerentes à matemática financeira como empréstimos já existiam e seus pagamentos, inclusive com juros, são respectivamente efetuados com sementes, moedas correntes, etc. Isso demarca a importância de se conhecer mais sobre a matemática financeira, enquanto ferramenta essencial que auxilia a tomada de decisões conscientes, minimizando, e até mesmo evitando, prejuízos financeiros, comprometedores da renda, do bem-estar pessoal, familiar e social. No caso das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, 1996), observa-se que, nesse documento, em muitos momentos, a formação do cidadão chega a ser enfatizada de forma diversificada. Por exemplo, determina que, no Ensino Fundamental, faça-se necessário promover “A compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade” (p.10), bem como “O fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância” (p.10). A LDB, apesar de não fazer referência direta à educação financeira em determinações como as anteriores, acaba deixando margens pertinentes para que ela possa ser vista como ferramenta capaz de auxiliar a compreensão de certos fatores sociais como as mudanças de classe em função do poder aquisitivo. Em acréscimo, pode-se destacar contribuições da educação financeira desde a menor célula social, no caso, modificar relações familiares, uma vez que XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 4 jovens podem adquirir consciência de sua participação na movimentação financeira da família. Na intenção de ilustrar a necessidade de uma educação financeira podem-se trazer, inclusive, discussões presentes em jornais de circulação como Navarro (2010), ao comentar questões relacionadas ao uso de cartões de crédito e Toledo (2010) que, entre outros aspectos, aponta que 80% dos pais são influenciados pelos filhos na hora da compra. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998), no terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental, recomendam adequação do trabalho escolar à atual realidade e lembra que a matemática se faz presente em diversos setores da sociedade, portanto, a escola carece apresentálo na intenção de formar cidadãos participativos, críticos e autônomos. Neste contexto, pontua que a formação escolar precisa viabilizar condições para o aprendiz compreender e transformar o seu mundo, inclusive, reconhecer as “armadilhas financeiras”, encontrando apoio em estudos recentes como o de Lima & Pereira de Sá (2010). Presentemente, diante do pouco que foi pontuado neste estudo até agora, mesmo tentando destacar a importância da educação financeira, faz-se oportuno lamentar que esta seja trazida de forma sutil como pano de fundo para ilustrar certos conteúdos já consagrados. Isto pode ser observado segundo os PCN’s (op. cit.): É importante que os alunos percebam essas conexões. A proporcionalidade, por exemplo, que já vem sendo trabalhada nos ciclos anteriores, aparece na resolução de problemas multiplicativos, nos estudos de porcentagem, de semelhança de figuras, na matemática financeira, na análise de tabelas, gráficos e funções. Para a compreensão da proporcionalidade é preciso também explorar situações em que as relações não sejam proporcionais – os contraexemplos (p. 84). A importância do conceito de proporcionalidade, enquanto conteúdo em si e suas devidas utilizações seja para o próprio conhecimento matemático, inclusive, nas interfaces com a matemática financeira, outras áreas do conhecimento ou mesmo para dar conta de situações não acadêmicas tem sido algo incontestável. No entanto, seria injusto passar a ideia de que a educação financeira não chega sequer a ser lembrada nos PCN’s (op. cit.), mas o que está em questão é libertar tal idealização de um mero conteudismo e atribuir a ela um status digno de sua relevância o que, segundo o recorte abaixo, ainda é muito pouco. Para compreender, avaliar e decidir sobre algumas situações da vida cotidiana, como qual a melhor forma de pagar uma compra, de escolher um financiamento etc. é necessário trabalhar situações-problema sobre a Matemática Comercial e Financeira, como calcular juros simples e compostos e dividir em partes proporcionais pois os conteúdos necessários para resolver essas situações já estão incorporados nos blocos (p. 86). Na intenção de ser mais claro com esta última colocação, mesmo ainda sem o devido reconhecimento do que viria a ser uma educação financeira, mas almejando que a Matemática Financeira, ao menos, enquanto conteúdo figurasse entre os chamados blocos nos PCN’s (1998) como Números e Operações e Tratamento da Informação. No entanto, reconhecendo que há sim tentativas interessantes a serem consideradas sobre o ensino da matemática financeira, mas estas precisam ser analisadas cuidadosamente para desenvolver algo mais voltado para uma educação financeira, pode-se recorrer a uma situação-problema para os alunos de terceiro e quarto ciclos em que o professor pode discutir temas relacionados à matemática financeira (op. cit., p. 120): XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 5 O dono da loja decidiu dar um desconto de 10% sobre o preço a varejo para quem comprar suas mercadorias no atacado e elaborou uma tabela com o preço de custo, o preço no varejo e o do atacado para cada um dos produtos. Produto I II III IV V P: Preço de Custo (R$) 5,80 7,10 9,45 12,95 15,00 V: Preço no varejo (R$) A: Preço no atacado (R$) O professor pode solicitar aos alunos que façam a sequência de operações para obter os preços no varejo e no atacado e depois determinarem a expressão algébrica que permite calcular o preço no atacado em função do preço de custo. Preço de custo: P Preço no varejo com 40% de acréscimo sobre o preço de custo: V = 1,4 P; Desconto de 10% sobre o preço no varejo: 0,1 x 1,4 P = (0,1 x 1,4) P = 0,14 P; Preço no atacado com o desconto: A = 1,4 P - 0,14 P = (1,4 - 0,14) P = 1,26 P. Nesta situação, os estudantes a ela submetidos ainda não experimentaram situações reais em que variáveis como: custo, desconto, atacado, varejo etc. aparecem, com isso, observa-se que a linguagem técnica empregada não está devidamente apropriada. Diante disso, nota-se que de fato, a orientação dos PCN´s (1998) acabam por privilegiar o treinamento algébrico dos alunos, muito embora também haja intenção de contemplar ideias correlatas de matemática financeira: No exemplo discutido, pode-se explorar a noção de variável e de incógnita. Além disso, seu contexto possibilita que os alunos pesquisem e ampliem seus conhecimentos sobre matemática comercial e financeira: taxas, juros, descontos, fatores de conversão, impostos etc. Esse trabalho propicia conexões com os temas transversais Trabalho e Consumo e Ética. (p. 121). Diante destas ideias apresentadas, contata-se que nos PCN’s (op. cit.) tanto as intenções dos propósitos pedagógicas e dos conteúdos em si como a contextualização adequada, envolvendo uma educação financeira carecem ser cuidadosamente revisadas e reformuladas. Daí se faz necessário buscar, em outros documentos, informações sobre a educação financeira. Nas orientações teórico-metodológicas do Ensino Fundamental no estado de Pernambuco (2008), o problema parece ser maior ainda. O termo “educação financeira” também não aparece em nenhum momento, mas conteúdos voltados para a matemática financeira como nos PCN’s (op. cit.) seguramente podem ser encontrados. Isto acontece, por exemplo, na quarta unidade do 8º ano e na primeira e terceira unidades do 9º ano, no bloco Números e Operações, onde a orientação do professor está voltada para Resolver situações-problema que envolvam juros simples e casos de juros compostos, construindo estratégias variadas, particularmente as que fazem uso da calculadora. Além disso, nenhuma característica que remeta de fato à educação financeira dos estudantes como levar em consideração a “quantidade” e a “forma” como esses assuntos possam ou não interferir no bem-estar familiar econômico e ocasionar implicações na esfera social e política. XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 6 Reconhecer o desconto como incentivo de compras a vista, grandes quantidades, antecipação de pagamentos de parcelas, ou outro motivo qualquer, além de outras ideias como estas inerentes às operações de mercados são fundamentais para aqueles que as realizam, conheçam adequadamente tanto as fórmulas em si quanto os motivos que as valida. O educador, ao se reportar ao desconto carece deixar explicito o que pretende como coloca D’Ambrósio (1987), referindo-se ao abatimento de uma dívida antes do valor de seu vencimento. Metodologia Ao longo do século XX como assinala Alves-Mazzotti & Gewandsznajder (1998), a metodologia da investigação, em educação, tem sido polarizada em dois enfoques principais: o enfoque quantitativo e o enfoque qualitativo. Na intenção de aludir acerca desses enfoques podese recorrer a vários estudiosos, inclusive, os já citados anteriormente, mas se optou aqui em trazer tais informações de Sampieri et al. (2003) que, em linhas gerais, informa que o enfoque quantitativo usa a coleta de dados para provar hipóteses com base na medição numérica e análise estatística para estabelecer padrões de comportamento. Por sua vez, destaca que o enfoque qualitativo utiliza a coleta de dados, mas sem a necessidade de medição numérica para descobrir ou afinar perguntas de investigação e pode ou não provar hipóteses em seu processo de interpretação. Em acréscimo, ainda na visão de Sampieri et al. (op.cit.) há uma terceira opção metodológica, modelo misto, no qual uma mesma investigação se aplica à análise quantitativa e qualitativa. Metodologicamente, este estudo se situa no âmbito da investigação qualitativa, particularmente, nos chamados estudos de caso educativo que, para Stake (apud ANDRÉ, 1998), são extremamente úteis para conhecer os problemas, ajudar a entender a dinâmica da prática educativa e lembra que uma investigação desta é uma descoberta preciosa que retrata um problema educacional em toda sua complexidade individual e social. Dentre as formas de estudos de caso pode-se dizer que por ter como interesse desenhar uma melhor compreensão da ação educativa, esse estudo está mais voltado para os chamados Estudo de Caso Educativo Descritivo, tendo como foco entender se o fenômeno relacionado às formas de abordagens recomendadas por autores de duas coleções de Livros de matemática do Ensino Fundamental Séries Finais estão mais voltadas para trabalhar os fundamentos da Matemática Financeira e/ou de uma Educação Financeira. Aspectos metodológicos No momento, apesar de não mais se tratar de unanimidade, muitos como Rios (2010), dentre os materiais escolares, destacam os livros didáticos por influírem diretamente no processo de ensino-aprendizagem, inclusive, em muitos casos, eles servem de orientação para as aulas de muitos professores. Daí emerge, neste estudo, o interesse em analisar como a educação financeira e/ou os conteúdos de matemática financeira estão sendo trazidos nos livros didáticos do Ensino Fundamental. A presença da matemática financeira na vida do cidadão nos dias atuais, seguramente, cada vez mais passa a ser considerada relevante para sua formação. O desenvolvimento desta análise toma como base observar se os conceitos de matemática geral e/ou financeira que estão sendo abordados nos livros didáticos levam em consideração, ao menos, os poucos aspectos pontuados na breve revisão deste estudo. Em termos de conteúdos em si, são destacados segundo dois blocos, um mais voltado para idealizações matemáticas gerais como Proporcionalidade e XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 7 Porcentagem e outros assuntos mais específicos da matemática financeira como juros (simples e juros compostos), acréscimos, descontos, capital e montante. Foram analisadas 2 coleções de livros de matemática dirigidos ao Ensino Fundamental Séries Finais, a coleção Matemática: fazendo a diferença de Bonjorno, Azenha e Olivares (2006) e a coleção Matemática e Realidade de Iezzi, Dolce e Machado (2005). A opção por estas coleções se deve ao fato de continuarem sendo utilizadas por escolas públicas e privadas da região metropolitana do Recife e terem sido devidamente aprovadas pelo Programa Nacional do Livro Didático. Há outro fator que deve ser trazido sobre tais coleções é que cada uma delas possui quatro volumes, em que os volumes, em si representam um ano ou série. Critérios de análise Foram utilizadas como base para análise dos livros didáticos as orientações dadas pelas: Leis de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB, 1996); os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s, 1998) e as Orientações Teórico-Metodológicas do Ensino Fundamental no Estado de Pernambuco (OT-MEFEPE, 2008). As Leis de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB, 1996), como já foi tratado neste estudo não indicam de forma direta sequer conteúdos para serem trabalhados. No entanto, determinações como “O pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (p. 1), serve de embasamento para se conceber a necessidade da Educação Financeira, por ser algo completamente inerente ao cotidiano dos alunos em suas atividades vivenciadas, enquanto indivíduo, família, sociedade. No caso dos PCN’s, (op. cit.), identificar se a Matemática Financeira, de forma indireta, ocorre junto a outros conteúdos como proporcionalidade (PR), porcentagem (PO), e de forma mais direta se existe recomendação como desenvolver situações-problema, envolvendo juros simples (JS), juros compostos (JC), na intenção de preparar os alunos a lidarem com a tomada de decisão, de forma correta, em seu cotidiano se cumpre. Por fim, se as OT-MEFEPE (2008), mesmo sem se reportarem a Matemática Financeira, determinam por cada série ou ano que os seguintes conteúdos sejam trabalhados: 6º ano - 5ª série Unidade 4: “Resolução de problemas que envolvam a ideia de proporcionalidade, incluindo os cálculos como porcentagens pelo uso de estratégias não convencionais.” (p. 51). 7º ano - 6ª série Unidade 2: “Resolução de problemas que envolvam a ideia de proporcionalidade, incluindo os cálculos como porcentagens pelo uso de estratégias não convencionais.” (p. 54). 8º ano - 7ª série Unidade 4: “Resolução de problemas que envolvem juros simples e casos de juros compostos, construindo estratégias variadas, particularmente as que fazem uso de calculadora.” (p. 63). 9º ano - 8ª série Unidade 1: “Resolver situações problema que envolvam juros simples e casos de juros compostos, construindo estratégias variadas, particularmente as que fazem uso da calculadora.” (p. 64). XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 8 Unidade 3: “Resolver situações problema que envolvam juros simples e casos de juros compostos, construindo estratégias variadas, particularmente as que fazem uso da calculadora.” (p. 68). Em síntese, estes critérios trazidos a partir da LDB (1996), dos PCN’s (1998) e, das OTMEFEPE (2008) têm o propósito de servir de base para formalizar convencimento sobre as formas adotadas nos livros didáticos estarem mais voltados para a Matemática Financeira em si, para uma Educação Financeira ou nenhuma destas. A matemática financeira nos livros escolares A análise das duas coleções do Ensino Fundamental Séries Finais, em síntese, procura subsidiar informações que viabilizem entender, se a forma de apresentação dos conteúdos (PR), (PO) e (JS), (JC) está mais voltada para o campo da Matemática Financeira em si, para uma Educação Financeira ou nenhuma destas. Análise por Coleção Nesta parte da análise, as considerações sobre as formas de abordagens dos conteúdos conforme pontuados anteriormente são observadas livro a livro num total de oito, sendo que cada coleção se constitui de quatro livros. Coleção 1 (Matemática: fazendo a diferença) Conteúdos/PCN’s x OT-MEFEPE Critério/ano C1 / 60 ano C1 / 70 ano C1 / 80 ano C1 / 90 ano PR sim sim sim sim PCN’s PO JS sim não sim sim sim não sim sim JC não sim não sim PR sim sim --sim OT-MEFEPE PO JS sim --sim ----não sim sim JC ----não sim Quadro 1. Conteúdos Recomendados nos PCN’s e na OT – MEFEPE presentes nos Livros da Coleção 1 Notas: Conteúdos relacionados (sim), não relacionados (não) e não aparece indicação (---). Diante dos registros acima observa-se que os conteúdos de proporcionalidade (PR) e porcentagem (PO) aqui qualificados como forma mais indireta diante de suas relações com a matemática financeira do 6º ao 9º ano da coleção 1 estão presentes conforme os PCN’s e no caso da OT-MEFEPE, isto não ocorre apenas no 6º ano. Por sua vez, os conteúdos de juros simples (JS) e juros compostos (JC) mais próximos da matemática financeira no âmbito dos PCN’s, apesar de serem encontrados no 7º e 9º ano, no 6º e 8º ano aparecem de forma não relacionada. No caso da OT-MEFEPE (PR) e (PO) ocorrem 6º, 7º e 9º ano, mas no 8º ano sequer há tais conteúdos e quanto (JS) e (JC) no 6º e 7º ano não são trazidos em momento algum, no 8º ano, aparece sem que haja relações e, no 9º ano, além de se fazer presente, possui relações. Coleção 2 (Matemática e Realidade) Conteúdos/PCN’s x OT-MEFEPE Critério/ano C1 / 60 ano C1 / 70 ano C1 / 80 ano C1 / 90 ano PR sim sim não não PCN’s PO JS sim não sim sim não não não não JC não não não não PR sim sim ----- OT-MEFEPE PO JS sim --sim ----não --não JC ----não não Quadro 2. Conteúdos Recomendados nos PCN’s e na OT – MEFEPE presentes nos Livros da Coleção 2 Notas: Conteúdos relacionados (sim), não relacionados (não) e não aparece indicação (---). Nos PCN’s, conforme os dados da tabela 2, os conteúdos (PR) e (PO) estão presentes e relacionados de forma mais indireta com a matemática financeira no 6º e 7º ano da coleção 2 e XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 9 próximo disto a OT-MEFEPE no 6º e 7º ano se fazem também presentes e relacionados, mas, no 8º e 9º ano, estes conteúdos não são trazidos. No caso dos conteúdos (JS) e (JC) mais próximos da matemática financeira no que se refere aos PCN’s aparecem sem que haja relações em todos os anos do 6º ao 9º, porém, no 7º ano (JS), além de ocorrer também se identificam relações e sobre a OT-MEFEPE isto não ocorre apenas no 6º e 7º ano e acontece sem apresentar relações no 8º e no 9º ano. Análise Global A coleção 1 quanto aos propósitos inerentes ao que se caracterizou com os conteúdos (PR) e (PO) como algo que se aproxima mais dos objetos de estudos básicos para a matemática financeira se mostraram contemplados tanto os recomendados pelos PCN’s como os do OTMEFEPE por sua vez, nessa mesma direção, a coleção 2 foi análoga aos comentários anteriores apenas no 6º e 7º ano. No caso dos propósitos dos conteúdos mais próximos aos interesses da matemática financeira tanto a coleção 1 como a 2 deixam a desejar seja nos aspectos trazidos dos PCN’s como os do OT-MEFEPE, mas cabe informar que conforme os PCN’s os conteúdos (JS) e (JC) foram satisfeitos. Por fim, observou-se que a coleção 1 mostrou-se bem mais consistente que a coleção 2 para contemplar os propósitos que se aproximam mais de uma educação financeira e, dentre todos os livros das duas coleções, o do 9º ano da coleção 1 se sobressai dos demais. O que sustenta esta consideração é o fato de que os propósitos educativos recomendados pelos PCN’s (1998) e os da OT-MEFEPE (2008) com suas intenções voltadas para o cumprimento legal da LDB (1996) em formar o cidadão terem sido mais freqüentes na coleção 1. Considerações educacionais Nos livros didáticos analisados, foi possível identificar que a contextualização envolvendo aspectos sociais ganhou espaço tanto nos problemas como nos exercícios propostos, mas carece avançar também nesta direção na apresentação dos conteúdos, sejam estes os (PR) e (PO) ou os (JS) e (JC), destacando aspectos que justifiquem a importância da educação financeira. Portanto, tais aspectos devem explorar as contribuições que a educação financeira pode ocasionar no individuo, na família, no estado, no país, no continente e por que não dizer no mundo. Seguramente as informações anteriores deixam claro que já existe, por parte dos autores de livros didáticos, a intenção de viabilizar um ensino que subsidie as ideias básicas no que se refere à matemática financeira enquanto campo. Entretanto, quanto à exploração dessas idealizações básicas e suas contribuições para o desenvolvimento do homem como ser social, reivindicando a partir delas seus direitos de cidadão, isto ainda carece avançar muito. No entanto, torna-se relevante lembrar que muitas investigações educacionais além de se ocuparem do que, e de como, algo deve ser ensinado muitas outras têm seus interesses voltados para a formação do professor em si. Neste último, o leque de possibilidades investigativas se torna importante e, nelas, podem-se encontrar aspectos curiosos como saber que, em muitos cursos de graduação de Licenciatura em Matemática, sequer há uma disciplina de Matemática Financeira. Isto junto a outros aspectos compromete a formação do professor que passa a não se sentir preparado para lidar com a sistematização de situações financeiras que exigem domínio além do conhecimento apropriado de conceitos e definições com ênfase no uso adequado de fórmulas. Trata-se da necessidade de qualificação para fazer articulações relevantes entre o XIII CIAEM-IACME, Recife, Brasil, 2011. A educação financeira nos livros do ensino fundamental 10 conhecimento acadêmico e aquele adquirido com as vivências fora da realidade escolar, portanto, isto redimensiona a complexidade na formação do professor. Referências bibliográficas Alves-Mazzotti, A. J. & Gewandsznajder, F. (1998). O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. São Paulo: Pioneira. André, M. E. D. A. (1998). Etnografia da prática escolar. 2ª ed. São Paulo: Papirus. Assaf Neto, A. (1998). Matemática Financeira e suas aplicações. 4ª ed. São Paulo: Editora Atlas. Bonjorno, J. R.; Bonjorno, R. A.; Ayrton, O. (2006). Coleção: Matemática: fazendo a diferença (Ensino Fundamental). 1ª ed. São Paulo: FTD, 2006. Brasil, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Fundamental. (1998). Parâmetros Curriculares Nacionais: Terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental. 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