OS MOVIMENTOS SOCIAIS PELA MORADIA E SEUS CONFLITOS FRENTE À
ESTRUTURA SOCIAL VIGENTE
Jonas Feitosa Rodrigues
[email protected]
Universidade Regional do Cariri -URCA.
Vinicius Augustos de Alencar Almeida
[email protected]
Universidade Regional do Cariri-URCA
INTRODUÇÃO
O trabalho que aqui apresentamos é um singelo e breve produto de pesquisas realizadas
com objeto delimitado nos movimentos sociais e suas interligações com o Direito, precisamente o
que pretendemos é demonstrar de maneira breve as dificuldades enfrentadas por estas
manifestações populares, tendo como obstáculos não apenas os problemas que os originaram, mas,
em atenção ao sofrimento que passam frente ao Direito posto, ao sistema econômico e político ao
qual estão inseridos e a sua rejeição perante aos ouvidos do judiciário
Delimitamos especialmente aos movimentos sociais pela moradia, sendo estes bastante
comuns entre os movimentos sociais urbanos, iniciando por um breve histórico da origem de seu
estudo acadêmico e realizando uma análise das possíveis dificuldades encontradas na efetivação
dos Direitos e garantias fundamentais prevista na nossa Constituição Federal de 1988 e os textos
legislativos em que tais manifestações obtiveram conquistas significativas.
Utilizamos uma metodologia de pesquisa bibliográfica e em campo, a fim de podermos
formular uma crítica que nos conduza a uma análise sistemática, e um aprofundamento teórico e
prático sobre tais questões. No entanto compreendemos a dimensão gigantesca da realidade e
sabemos que este trabalho apenas é um início de um vasto campo de estudo.
OS MOVIMENTOS SOCIAIS
Freqüentemente indivíduos organizam-se em busca de uma solução comum diante de um
problema comum, este seria o embrião de um fenômeno complexo conhecido na Sociologia
acadêmica por movimentos sociais. Este termo, utilizado pela primeira vez por Lorenz Von Stein,
por volta de 1840, representava um modelo semântico que indicava a busca sistêmica para englobar
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todo o arcabouço de organização, linhas invisíveis que unem vários indivíduos, sujeitos ativos, de
forma a comporem um só corpo que lutam constantemente para solucionar uma problemática
comum, desta forma, o termo representava a definição sucinta do movimento operário francês, do
comunismo e o socialismo emergente.
Iniciado na Europa do século XIX, o termo movimentos sociais adquire caráter científico,
e ao longo dos séculos representa objeto de grande significância na sociologia, Antropologia,
Direito e demais ciências do campo social Maria da Glória Gohn define Movimentos Sociais:
Como sendo aquelas organizações que possuem uma identidade, tem um opositor e
articulam ou se fundamentam num projeto de vida e de sociedade. Historicamente
se observa que eles têm contribuído para organizar e conscientizar a sociedade
apresenta conjuntos de demandas via práticas de pressão e mobilização e têm certa
continuidade e permanência. (GOHN 2004)
Na academia, é conhecida uma divisão entre tal fenômeno; definido como velhos e novos
movimentos sociais, os velhos movimentos sociais indicam o fenômeno surgido no século XIX,
como o movimento operário francês e as idéias ligadas ao socialismo. A partir da segunda metade
do século XX, surgem nos EUA e Europa movimentos com os mesmo laços de união e luta, mas
caracterizados por objetos de conquistas diferentes, é neste período que está englobado os
movimentos que defendem a ecologia, o movimento feminista, em defesa de grupos
marginalizados da sociedade por questões de cor, raça, opção sexual etc. Alain Touraine cit. Por
Herkenhoff (2004: 15) leciona:
“(...) Vê Os novos movimentos sociais como ações coletivas tendentes a obter mudanças na esfera social e
cultural. Essas ações são dirigidas contra um opositor que resiste”.
Assim os movimentos sociais, sempre terão um caráter de luta e esperança, um movimento
sócio-politizado almejando a modificação da realidade encontrada, ligando os indivíduos por laços
de igualdade, solidariedade e humanização.
No Brasil, é conhecido como pertencentes a esta última classificação, todos os movimentos
surgidos após o regime militar, estes caracterizados especialmente pelas reivindicações por terras
urbanas e rurais diante de um modelo social, que os marginalizam da terra, privilegiando as áreas
urbanas para os detentores de capitais e excluindo várias famílias do direito a habitação, gerando
assim a necessidade de modificação de um determinado modelo de sociedade que não atende ao
equilíbrio necessário para garantir a todos um mínimo de vida digna e humanizada. Assim é
inevitável que estes indivíduos mais afetados, sofredores oprimidos, organizem-se com o fim de
alterar este quadro posto.
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Os anseios manifestados pelos “novos movimentos sociais” (dos ecologistas, das
feministas, dos negros. Dos jovens, dos homossexuais etc.) não podem a meu ver
ser satisfeito dentro de uma sociedade fundada em relações de produção capitalista.
Sociedades Capitalistas não conduzem a uma vida de autêntica significação
existencial. (HERKENNHOFF 2004:17)
Desta feita, torna-se elemento fundamental a colocação da esperança em combate a
opressão posta pela estrutura vigente, estrutura esta composta pelos mais diversos meios,
principalmente os de natureza midiática, que banalizam os movimentos sociais, em especial os
que lutam pela terra, sendo oportuno desde já, citarmos trecho da nota pública em defesa dos
movimentos sociais pela moradia e contra a criminalização da luta pela moradia lançada pela
confederação nacional das associações de moradores (2007)
Se a questão não for tratada corretamente, poderá ser um pretexto para criminalizar
o movimento social que reivindica de forma legítima o direito à moradia adequada
e à cidade. São legítimos os mecanismos de pressão da sociedade organizada junto
ao Estado, garantidos pela Constituição e por instituições internacionais. “Mas,
muitas vezes, a luta por direitos é confundida com criminalidade”
Problema de relevância nacional trata-se da questão da habitabilidade, o crescente processo
de urbanização acompanhado por medidas excludentes gira em torno da necessidade de lutas por
moradias, bem como de terras para cultivá-las. Neste cenário de conflitos, os movimentos sociais
tornam-se autores de Direitos, criam normas.
OS MOVIMENTOS SOCIAIS E O DIREITO
Os movimentos sociais criam Direitos, por representarem fatos que não podem passar
despercebidos aos olhos do legislador. Relembrando a teoria tridimensional do Direito, proposto
por Miguel Reale, jus filósofo brasileiro, os movimentos sociais, ao criarem um fato social podem,
desta forma criar normas que busquem resguardar estes valores.
A correlação entre aqueles três elementos é de natureza funcional
e dialética, dada a “implicação-poliridade” existente entre fato e
valor, de cuja tensão resulta o momento normativo, como solução
superadora e integrante nos limites circunstanciais de lugar e de
tempo (concreção histórica do processo jurídico, numa dialética
de complementaridade). (REALE 2005:57) Grifos do original.
Deste processo dialético entre fato e valor. Assim refletimos que necessariamente os
movimentos sociais possuem legitimidade e capacidade para a criação e modificação do Direito. O
que nos parece contraditório, é presenciarmos a atual situação, em que os movimentos sociais
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acabam sendo visto como inimigos da paz pública observem o que leciona em suas sábias palavras
o prof. João Baptista Herkenhoff:
Os movimentos sociais não se submetem aos padrões do Direito estabelecido.
Sobretudo em sociedades como a brasileira, onde milhões de pessoas estão à
Margem de qualquer Direito, num estado de permanente negação da cidadania, os
movimentos sociais estão sempre a criar Direito à face de uma realidade
sociopolítica surda aos apelos de direito e dignidade humana. (HERKENHOFF
2004:25)
O poder judiciário, assim como a maior parte da população brasileira, mostra-se falhos na
receptividade aos clamores de luta. Assim se manifestou Gilmar Mendes, presidente do Supremo
Tribunal Federal:
Isso vale para qualquer movimento. Se for invasão de propriedade, destruição de
bens, impedimento de afazeres de órgão públicos, já ultrapassou os limites que a
Constituição estabelece. (2008)
Este abismo existencial mostra exatamente as falhas de um sistema jurídico posto,
imperativo, que não conseguem de fato proteger a todos, e tampouco conseguem resgatar os
marginalizados para a real condição de cidadania.
Os Direitos e Garantias fundamentais garantidos por nossa constituição Federal de 1988,
não conseguem, após 20 de anos de promulgação, descer até as camadas mais baixas da sociedade e
dar-lhes a proteção humana para sobreviverem, analisando especialmente aqui o Direito a moradia.
Um dos maiores problemas encaradas nas cidades, é a condição de viverem dignamente
debaixo de um teto, muitas famílias vivem sem possuírem um abrigo, em contraste com alguns
poucos que detêm sobre seu domínio grandes extensões de terras, mantendo-as improdutivas, e com
a única finalidade da especulação imobiliária. Os movimentos sociais pela moradia buscam a
liberdade deste cenário perturbador, inúmeros pessoas são privadas de uma habitação digna, por
contas de poucos, que, com poderes pecuniários, alicerçados numa estrutura jurídica preocupada em
proteger o patrimônio individual, mostra-se ineficaz para solucionar conflitos da grande massa
oprimida. Em um Estado nacional do tamanho geográfico do Brasil, seus preceitos de Direitos e
Garantias fundamentais, escritos na Constituição do Brasil de 1988, mostram-se de eficácia
questionável na solução desta drástica realidade.
DIREITO SOCIAL A MORADIA
Os direitos sociais elencados em nossa Carta Magna seguem uma tradição do
constitucionalismo contemporâneo, onde o Estado Social-Democrata mostra-se em sua estrutura
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normativa uma peculiar preocupação com os menos favorecidos da sua comunidade. Os direitos
sociais representam uma prestação positiva do poder soberano para com os seus cidadãos, visando
solucionar os problemas que atingem o corpo social. “(...) os Direitos sociais visam a uma melhoria
das condições de existência, através de prestações positivas do Estado, que deverá assegurar a
criação de serviços de educação, saúde, habitação, dentre outros, para a sua realização”
(CARVALHO. 2004 :443).
O Direito a moradia, citado no Art. 6º da Constituição Brasileira de 1988, reflete uma das
mais básicas necessidades do ser - humano, o indivíduo, para que viva dignamente e mantenha-se
numa ótima qualidade de vida faz necessário o seu habitat, não penas um pedaço de terra, mas, toda
a infra-estrutura para manter o sujeito com as necessidades básicas atendidas, como saneamento,
iluminação e vias de acesso eficaz.
É indispensável à efetivação da dignidade da pessoa humana, um dos preceitos garantidos
por nossa Carta magna em seu Art. 1º III, de forma em que milhares de pessoas descobertas de uma
das necessidades tão básicas, ao lado da alimentação, que é a moradia, assim, se constituindo um
grande desafio para o poder soberano na efetivação de seus objetivos elencados no Art. 3º da
Constituição Brasileira de 1988.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação
E o art. XXV da Declaração universal dos Direitos Humanos, ao declara o direito a habitação como
Direito universal da humanidade.
A dignidade da pessoa humana como comando constitucional será observada
quando os componentes de uma moradia adequada forem reconhecidos pelo poder
público e pelos agentes privados, responsáveis pela execução de programas e
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projetos de habitação e interesse social, como elementos necessários à satisfação do
Direito a moradia. (SAULE JÚNIOR 2004:149 cit. BUZANO.org.2006:223)
Absurdamente, após doze anos de promulgação da Carta Magna, ainda que com
pouquíssima utilidade fática, o legislador constituinte derivado inclui através da emenda
constitucional nº 26/2000 o Direito social a moradia ao art. 6º. Na verdade pouco se faz de
diferença, tendo em vista que desde a promulgação os Art. 23 e 24 atribuem as competências entre
união, estados e municípios na responsabilidade de trabalharem tendo em vista o equilíbrio e o
bem-estar da sociedade, dentre este objetivo inclui-se programas de habitação popular.
Verdadeiramente, a emenda nº 26/2000 com essa inclusão da moradia nada significou de
mudança real nos projetos de habitação popular. Uma medida demagoga, em que somente
modificando um texto normativo, nada se realiza de concreto.
Talvez a EC nº 26 seja isto: lembraram-se de colocar ali mais uma coisa que não
existe para a grande massa populacional brasileira, algo que não se trabalha para
que exista, algo que é bom lembrar ao povo que ele não tem. (DOUGLAS e
MOTTA 2004: 159)
Enquanto alguns pensam que as leis são os meios únicos de se mudar a sociedade,
refletimos sobre a realidade contemporânea, a esperança de muitos que sonham com uma vida
digna, e o desespero de famílias que se deparam com uma decisão judicial de uma ação de
reintegração de posse, que são despejadas por não possuírem “um justo título”, uma sentença que
possui forças para tirá-los do local, mas que á incapaz de sensibilizar-se com a situação de exclusão
dos mesmos.
Vários movimentos sociais urbanos passam por experiências semelhantes, não
conseguindo o seu objeto inicial, e tão logo que consegue algo, já se encontram em muitas outras
necessidades, os movimentos sociais pela moradia geralmente começam por uma ocupação em
terrenos improdutivos, e que logo em seguida são reclamados pelo seu proprietário ocorrendo quase
sempre despejo das famílias que ali se instalaram necessariamente os laços de solidariedade e
resistência, unem os indivíduos partícipes de tal sofrimento a lutarem por condições dignas de vida
e equilíbrio social.
Os
movimentos
sociais
pela
moradia
possuem
uma
forte
tendência
de
se
institucionalizarem, levando-os a uma grande organização de tarefas entre os membros, bem como a
escolhas de seus líderes e os caminhos e meios necessários para a consecução do fim almejado.
Acreditamos que o maior número de reinvidicaçõe oriundos destas organizações representa o
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quanto à sociedade está desamparando os mais necessitados, o poder público torna-se o maior vilão
deste confronte, pois historicamente não foi capaz de apaziguar os problemas de massa, que só se
acumularam e ganharam forças, O estatuto das Cidades, lei 10.257/2001, instrumento legal capaz se
solucionar diversas injustiças, ainda possui muitas dificuldades de serem efetivamente aplicados, e
assim não nos conduz a verdadeira função social da cidade, desde já os movimentos populares
continuam na luta incansável da aplicabilidade de dispositivos previsto em tal lei federal,
principalmente no que tange as questões da regularização fundiária, não tão somente esta, mas
como o Decreto-lei 271 de 1967, que regulariza a Concessão do Direito Real de Uso, em especial
para fins de moradia prevista na medida provisória 2.220/01, mas, restrições são feitas a este
respeito pela própria medida. O importante é a mobilização social, meio eficaz de se atingir o fim
desejável na criação de novos Direitos, assim como tantos já foram conseguidos, observemos:
Para qualquer iniciativa de regularização fundiária dar certo é indispensável que a
comunidade envolvida esteja participando ativamente do processo [...] A
comunidade tem condições de atuar para conquistar não só direito a moradia, mas,
todos os direitos de que carece...(NUHAB 2006:16)
A mobilização popular representou e representa um forte instrumento de conquistas e lutas
das camadas mais oprimidas da sociedade, na efetivação das ações por parte do poder estatal em
prol daquela coletividade, os mecanismos utilizados pela máquina pública ainda são lentos e por
muito tempo assim permanecerão.
CONCLUSÃO
Acima do que foi explicitado, podemos compreender as enormes dificuldades enfrentadas
pelos movimentos sociais que reivindicam a moradia, dificuldades encontradas em diversos
momentos, não apenas na resolução dos problemas que possui, mas abrangendo, o desprestígio que
diversas entidades governamentais e midiáticas os atribuem, entendemos tais acontecimentos como
algo proposital que objetiva cada vez mais criar um entendimento na grande maioria da população
brasileira que os movimentos sociais são grupos de “baderneiros” e “criminosos”.
Podemos afirmar que os movimentos sociais possuem poderes para criarem Direitos, e isso
ao nosso entender representa algo de grande perigo para aqueles que se beneficiam do atual estado
caótico que aí se apresenta. Ao longo dos anos o crescente processo de urbanização acabou por
privilegiar aqueles sujeitos detentores de capitais, que ao adquiriram vultosas áreas de terras, as
tornaram improdutivas e conseqüentemente marginalizaram diversas pessoas da efetivação de um
dos direitos tão básicos que é a moradia. O Direito social a moradia previsto na Constituição
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Federal do Brasil de 1988, bem como outros dispositivos infraconstitucionais ainda mostra-se
ineficazes e inaplicáveis na realização do bem social.
Entendemos que a luta pela moradia realizada por mobilização social é uma luta válida,
legítima e de boa credibilidade, sabemos que as dificuldades são imensas, mas, acreditamos que
através das lutas populares será possível atingir grandes conquistas, e desde já ressaltamos o desafio
de com um trabalho árduo e contínuo, modificarmos a imagem corroída que determinados setores
da comunidade com seus interesses particulares atribuíram as manifestações populares de
reivindicações.
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HERKENHOFF, João Baptista. Movimentos Sociais e Direito. Porto Alegre: Livraria do
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Disponível
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>acesso em: 29 abr. 2008.
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