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VILARINHO, Yuri Coutinho. A influência social na formação do indivíduo: aproximações entre as
teorias de Wilhelm Reich e de Lev Vygotski. In: ENCONTRO PARANAENSE, CONGRESSO
BRASILEIRO, CONVENÇÃO BRASIL/LATINO-AMÉRICA, XIII, VIII, II, 2008. Anais. Curitiba:
Centro Reichiano, 2008. CD-ROM. [ISBN – 978-85-87691-13-2]. Disponível em:
www.centroreichiano.com.br. Acesso em: ____/____/____.
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A INFLUÊNCIA SOCIAL NA FORMAÇÃO DO INDIVÍDUO:
APROXIMAÇÕES ENTRE AS TEORIAS DE WILHELM REICH E DE LEV VYGOTSKI
Yuri Coutinho Vilarinho
RESUMO
O objetivo do presente trabalho é investigar a possível aproximação teórica entre as
contribuições de Wilhelm Reich e a psicologia histórico-cultural de Lev Vigotsky. Tal
aproximação foi focada em função do embasamento filosófico materialista históricodialético do qual ambos partiram para construir parte de suas teorias, onde o homem é
entendido como um ser histórico, que atua diretamente sobre a realidade, modificando-a
e, concomitantemente, modificando a si mesmo. Ambos consideram que o processo de
formação do indivíduo está diretamente relacionado com a estrutura social na qual está
inserido. Procurou-se mostrar, assim, como estes pensadores explicaram as influências
que permeiam a relação entre sociedade e indivíduo.
Palavras-chaves: Psicologia Corporal; Psicologia Social; Reich; Vigotski
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O social em Wilhelm Reich
Reich afirma que a concepção materialista da história poderia se relacionar com a
psicanálise no ponto onde Marx e Engels ensinam que a atividade psíquica do homem
transforma-se necessariamente em uma forma qualitativamente outra do reflexo da
realidade – transforma-se em consciência, desde que esse homem esteja incluído num
sistema de relações sociais e aja em comum com outros homens; ou, em outras palavras,
desde que viva uma vida humana social. É neste ponto onde começam os problemas de
ordem psicológica. Em Materialismo dialético e psicanálise (1929), Reich coloca que a
sociologia marxista é o resultado da aplicação da dialética marxista ao âmbito do ser
social. A psicanálise tratando dos fenômenos psíquicos, e a sociologia, dos fenômenos
sociais, prestariam entre si mútua ajuda, na medida em que o meio social deve ser
explorado no psiquismo individual ou, inversamente, o psiquismo no ser social. Reich
empreende a defesa da psicanálise frente aos marxistas, sob o argumento de que seria
uma crítica radical da sociedade e de sua ideologia repressiva, e empreende também a
defesa do marxismo diante dos psicanalistas, enfatizando a importância das condições
materiais e sociais no estudo da profilaxia das neuroses e também de sua etiologia.
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teorias de Wilhelm Reich e de Lev Vygotski. In: ENCONTRO PARANAENSE, CONGRESSO
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Em Psicologia de massas do fascismo (1933/2001), Reich sustenta que o homem
é determinado tanto pelos processos instintivos como pelos processos socioeconômicos.
Neste sentido, a sociologia baseada na economia sexual resolveria a contradição que
teria levado a psicanálise a esquecer o fator social e o marxismo a esquecer a origem
animal do homem. Em Análise do Caráter (1933/1989), afirma que, do ponto de vista
social, a posição da psicoterapia individual é desanimadora. Conclui que as neuroses são
produzidas socialmente em grande escala, como resultado de uma educação familiar
patriarcal e repressiva no que se refere a questões sexuais.
A crítica da família é a chave de toda a crítica reichiana à educação repressiva. Ele
considera a família como responsável pela maior parte dos transtornos neuróticos dos
adolescentes. É a família quem transmite os valores e as idéias que marcam para sempre
a existência de um indivíduo. Os pais transmitem aos filhos, através da educação, as
repressões e inibições que sofreram no curso de suas vidas. O paradoxo, segundo Reich,
é que a estrutura familiar autoritária está longe de limitar-se à família burguesa, visto que,
muito freqüentemente, a família proletária reproduz a mesma repressão.
Reich empreende, pois, uma dura crítica dessa estrutura familiar autoritária (que
lhe parece ser a origem da maior parte dos transtornos neuróticos) e, sobretudo, da
ideologia burguesa, que fundamenta o sistema educacional. O propósito da educação é,
desde o primeiro momento, formar as crianças com vistas ao matrimônio e à família. O
sistema educativo nega e proíbe a sexualidade. É importante enfatizar o essencial desta
crítica: de que a família é uma das mais importantes fábricas de ideologia e uma das mais
violentas estruturas repressivas, perpetuando a repressão sexual e do que dela se derive.
É o último reduto da ordem social existente.
Cada organização social produz as estruturas de caráter de que necessita para
existir. Na sociedade de classes, a classe dominante assegura seu domínio com o auxílio
da educação e da instituição família, tornando sua ideologia dominante sobre todos os
membros da sociedade. Trata-se de um processo contraditório, envolvendo cada nova
geração de uma dada sociedade, com o fim de modificar e modelar estruturas psíquicas
em conformidade com a ordem social. Reich sustenta que, desde que a sociedade se
dividiu entre os que possuem os meios de produção e os que só dispõem da força de
trabalho, a ordem social passou a ser dirigida pelos primeiros, independentemente da
vontade e das inclinações dos últimos e, na verdade, quase sempre contra a vontade
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deles. Mas a partir do momento em que tal ordem social começa a moldar as estruturas
psíquicas de todos os membros da sociedade, ela reproduz-se nos dominados.
As estruturas caracteriológicas do povo de uma dada época ou de um determinado
sistema social são um reflexo desse sistema, representando sua fixação. A fixação,
responsável pela “tradição”, pode ser explicada em termos reichianos por uma rigidez
biológica (plasmática) e caracteriológica do sujeito. As estruturas social e econômica
agem sobre a formação do caráter de seus membros de modo indireto e complexo. A
estrutura sócio-econômica determina modos de vida familiar, os quais, por sua vez,
determinam padrões de sexualidade, na medida em que influenciam a vida pulsional da
criança e do adolescente.
Temos a destacar que as estruturas de caráter são adquiridas na primeira infância
e permanecem intactas, sem sofrer grandes alterações. Por outro lado, em face da
alteração da vida material, devido ao desenvolvimento das forças produtivas, faz-se
necessária nova adaptação do indivíduo, criando novas atitudes e formas de reação, que
se sobrepõem às características mais antigas – adquiridas primeiro - penetrando-as, sem
eliminá-las. Esses dois conjuntos de características, correspondentes a realidades
diferenciadas, colidem. Isto pode ser exemplificado com o caso, na Rússia Soviética, dos
camponeses médios que tiveram de se adaptar às novas relações de produção
(socialistas). Os soviéticos tiveram que superar tanto o atraso econômico quanto a
estrutura de caráter do camponês russo, herdada do czarismo. Se a antiga ideologia
correspondente a uma situação sociológica anterior não estivesse fixada na estrutura das
pulsões, ou na estrutura do caráter em si, como um modo de reação automático e crônico
que conta com o auxílio da energia da libido, tal ideologia seria capaz de se adaptar às
revoluções sociais de modo mais fácil e rápido. Assim, mostram-se evidentes os
mecanismos que fazem a ligação entre a situação econômica, a vida pulsional, a
formação do caráter e a ideologia do indivíduo.
O social em Vygotski
Vygotski construiu sua teoria sobre a base da filosofia marxista. Embora tenha
morrido em 1934, muitos de seus textos só foram publicados recentemente (década de
1960, nos EUA; década de 1970, no Brasil). Mesmo as traduções mais antigas, como, por
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exemplo, a primeira versão de Pensamento e linguagem em inglês, em 1962, não
permitem ao público conhecer a fundo a obra do autor soviético, uma vez que, no
processo de tradução muitas passagens foram omitidas, especialmente aquelas
relacionadas ao materialismo histórico-dialético (BEZERRA, 1999; DUARTE, 2001).
Vygotski não utiliza o conceito de cognição para se referir à linguagem, percepção,
memória, etc., substituindo-o pelo conceito de funções psicológicas (ou psíquicas, ou
mentais). Estas se diferenciam entre elementares e superiores, e, em seu conjunto,
constituem a personalidade, entendida como uma unidade dialética. Sua concepção da
psique humana desenvolveu-se a partir de muitas batalhas teóricas contra a
compreensão biologicista do psiquismo, concretizada pela reflexología pavloviana. A
reflexologia é uma corrente da psicologia - bastante influente na Rússia do século XIX que se constitui principalmente a partir dos estudos de I.P.Pavlov. Seu objetivo é estudar
a totalidade do comportamento humano tendo como base os reflexos (VYGOTSKI,
1931/2000, p.86). Segundo Vygotski, as funções psicológicas superiores são as que,
realmente interessam à Psicologia, na medida em que possuem origem social, sendo
próprias do homem. Para Vygotski, a diferença entre as funções elementares e as
superiores é fundamental para a compreensão adequada do problema. A confusão entre
elas fez com que, muitas vezes, na história da Psicologia, o homem e o seu psiquismo
fossem estudados do mesmo modo como estudamos o animal.
Vygotski, como grande parte dos psicólogos soviéticos dos anos 20, achava-se sob
forte influência dos trabalhos de Pavlov. Se em seus primeiros trabalhos, Pavlov era uma
referência importante, aos poucos foi sendo deixado de lado (VYGOTSKI, 1934/2001,
p.90). Da reflexologia interessa-lhe o materialismo, mas num novo sentido, sobre a base
da dialética. O homem não pode ser concebido apenas a partir do mecanismo linear
estímulo-resposta, como um organismo que responde aos estímulos do meio, como
queria a reflexologia. Como ser histórico, o homem atua sobre o meio, transformando-se.
As funções psicológicas elementares caracterizam-se por serem lineares e diretas. A
cada estímulo do mundo corresponde uma resposta. Estímulo e resposta são, neste
sentido, respectivamente, causa e efeito. Já as funções psicológicas superiores são
indiretas e apontam para uma circularidade, ou seja, pressupõem mediação entre o
sujeito e o mundo. Elas caracterizam-se pelo uso de signos e/ou instrumentos (ações
instrumentais). Nelas, a relação entre o estímulo e a resposta não é direta, significando
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que estímulo e resposta não desempenham papel de causa e efeito. A mediação
estabelece um intervalo no esquema S-R, fazendo aparecer a circularidade. Enquanto as
funções psicológicas elementares são de origem biológica, as superiores são de origem
social, ou seja, constituem resultados das ações instrumentais (ou mediações).
Vygotski também desenvolveu o conceito de situação social de desenvolvimento
(GONZALES-REY, 2000). Trata-se de uma combinação especial dos processos internos
do desenvolvimento da criança com as condições externas, particular em cada etapa, e
que condiciona a dinâmica do desenvolvimento psíquico durante o correspondente
período evolutivo e as novas formações psicológicas, peculiares, que surgem até o final
desse período. Este conceito evidencia a integração dos processos internos, constituídos
na história anterior do sujeito, com as influências que caracterizam cada um dos
momentos sociais do desenvolvimento. Nessa combinação, Vygotski representa o vínculo
constante do interno e do externo em cada um dos novos momentos do processo,
rompendo assim com a visão dicotômica, dominante até o momento na psicologia, sobre
a relação entre o externo e o interno. Cada nova situação social que o sujeito enfrenta
converte -se em via de desenvolvimento para novas formações psicológicas. A vivência é
uma unidade de desenvolvimento, como unidade da situação social do desenvolvimento,
entendendo-se por vivência a relação afetiva da criança com o meio. Para Vygotski, nesta
fase estão representados tanto o meio externo quanto o que a criança acumulou
internamente, representando, portanto, a unidade indissolúvel dos elementos externos e
internos, que se expressam integrada em aspectos cognitivos e afetivos.
A interação da criança com o adulto apresenta importância primordial para o
desenvolvimento da mesma, principalmente na primeira infância. Nesta interação, o papel
essencial corresponde aos signos, aos diferentes sistemas semióticos que, do ponto de
vista genético, tem primeiro uma função de comunicação e, em seguida, uma função
individual, como instrumentos de organização e de controle do comportamento. Este é
precisamente o elemento fundamental da concepção que Vygotski tem da interação
social: no processo de desenvolvimento desempenha um papel formador e construtor.
Conclusão
Propusemos neste trabalho uma articulação entre as teorias de Reich e Vygotski,
tomando como foco o embasamento filosófico materialista-histórico-dialético utilizado por
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ambos os autores. É evidente o destaque que ambos deram aos aspectos sociais
envolvidos na formação do indivíduo. Apesar de terem explicado diferentes aspectos
dentro do espectro da psique humana, tanto Reich quanto Vygotski colocam a formação
do indivíduo diretamente relacionada à estrutura social em que este se insere. Não
concebem o ser humano, portanto, como algo dado naturalmente, possuidor de uma
essência a priori. Segundo ambos, é a partir de uma relação dialética, dentro de um dado
momento da história, que este indivíduo se desenvolve. Ambos trataram menos de efetuar
uma simples adição, mecânica, de diferentes campos do saber do que realizar uma
articulação real, ou seja, uma ligação que se tornou necessária.
Para Reich e Vygotski, a perspectiva histórica é a única que possibilita o estudo do
humano, na medida em que consideram, com base no materialismo histórico-dialético,
que é apenas em movimento que um corpo (ser) manifesta sua existência e mostra o que
é. Assim, estudar algo historicamente é estudar o corpo em seu movimento. Para
Vygotski, o estudo histórico requer a aplicação da categoria de desenvolvimento à
investigação dos fenômenos psicológicos. Escreve que estudar algo historicamente
significa estudá-lo
em
movimento,
exigência
fundamental
do
método
dialético
(VYGOTSKI, 1931/2000, p.67). Reich também coloca que não basta explicar a cultura e a
sociedade com base em pulsões sexuais, sem levar em conta que as condições históricas
e sociais devem, primeiro, ter influenciado e mudado as necessidades humanas antes
que essas pulsões e necessidades transformadas possam começar a ter efeito como
fatores históricos (REICH, 1932/1989, p.4).
Reich nega categoricamente a concepção fatalista freudiana da pulsão de morte,
que coloca a infelicidade como algo inerente à condição humana e que o indivíduo nada
pode transformar (PALMIER, 1969). Também para Vygotski, a peculiaridade do humano
reside em que nele, evolução e história estabelecem entre si uma relação dialética. Ou
seja, o homem não é simplesmente um produto passivo da evolução, nem tampouco é
uma invenção subjetiva. Sua história escreve-se sobre o tênue equilíbrio entre o passivo e
o ativo, entre a regularidade biológica e a ativa produção de novidade (VYGOTSKI, 2000).
Vygotski possui uma concepção clara sobre o caráter social e histórico da personalidade
humana, para opor-se a concepções fatalistas em relação ao impacto dos defeitos
psíquicos na definição da personalidade humana.
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O desenvolvimento do sujeito, para esses autores, está, inicialmente, baseado na
relação do indivíduo com a estrutura familiar, sendo esta produto de uma ordem social. A
criança constrói suas crenças e modo de viver no mundo a partir da vivência familiar, para
depois reproduzir na sociedade.
O conceito vygotskiano de situação social de desenvolvimento evidencia a
importância da vivência da criança, vista como a relação afetiva com o seu meio.
Podemos estabelecer uma semelhança entre a vivência afetiva com o processo de
ancoragem da libido, que ocorre na transformação do aparelho pulsional da criança.
Ressalta -se, portanto, a importância dos sistemas educacional e familiar, visto serem os
principais estruturadores do caráter de um sujeito. A personalidade é um sistema
complexo integrador da vida psíquica individual, que dá sentido às experiências vividas
pelo sujeito. A personalidade não pode ser considerada, numa visão essencialista e
mecanicista, separada do social, mas, ao contrário, no processo social e histórico.
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Referências
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Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
DUARTE, N. Vygotski e o ‘aprender a aprender’: crítica às apropriações neoliberais e
pós-modernas da teoria vygotskiana. Campinas-SP: Ed. Autores Associados, 2001.
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II. Madrid: Visor, 2001.
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Yuri Coutinho Vilarinho/RJ - Graduando em Psicologia – Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ) e formação em Psicoterapia Reichiana em andamento, com o
professor Ernani Eduardo Trotta - Núcleo de Psicoterapia Reichiana.
E-mail: [email protected]
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