UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS FUNDAÇÃO DE MEDICINA TROPICAL DR. HEITOR VIEIRA DOURADO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA TROPICAL MESTRADO EM DOENÇAS TROPICAIS E INFECCIOSAS Wuchereria bancrofti EM IMIGRANTES HAITIANOS NO MUNICÍPIO DE MANAUS, AMAZONAS, BRASIL. EDSON FIDELIS DA SILVA JÚNIOR MANAUS 2014 EDSON FIDELIS DA SILVA JÚNIOR Wuchereria bancrofti EM IMIGRANTES HAITIANOS NO MUNICÍPIO DE MANAUS, AMAZONAS, BRASIL. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Medicina Tropical da Universidade do Estado do Amazonas em Convênio com a Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado, para obtenção grau de Mestre em Doenças Tropicais e Infecciosas. Orientadora: Profª. Drª. Marilaine Martins Co-orientadora: Profª. Drª. Maria Paula Gomes Mourão MANAUS 2014 Ficha Catalográfica S586w Silva Júnior, Edson Fidelis da. Wuchereria bancrofti em imigrantes haitianos no município de Manaus, Amazonas, Brasil. / Edson Fidelis da Silva Júnior. -Manaus : Universidade do Estado do Amazonas, Fundação de Medicina Tropical, 2014. 62 f. : il. Dissertação (Mestrado) apresentada ao Programa de PósGraduação em Medicina Tropical da Universidade do Estado do Amazonas – UEA/FMT, 2014. Orientadora: Profa. Dra. Marilaine Martins Co-orientadora: Profa. Dra. Maria Paula Gomes Mourão 1. Filariose linfática 2. Wuchereria bancrofti 3. Imigrantes 4. Amazônia Brasileira I. Título. CDU: 614.4 Ficha Catalográfica elaborada pela Bibliotecária Maria Eliana N Silva, lotada na Escola Superior de Ciências da Saúde - UEA FOLHA DE JULGAMENTO Wuchereria bancrofti EM IMIGRANTES HAITIANOS NO MUNICÍPIO DE MANAUS, AMAZONAS, BRASIL. EDSON FIDELIS DA SILVA JÚNIOR “Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de Mestre em Doenças Tropicais e Infecciosas, aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-Graduação em Medicina Tropical da Universidade do Estado do Amazonas em convênio com a Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado”. Banca Julgadora: __________________________________________ Profª Drª Marilaine Martins __________________________________________ Profº Drº Rajendranath Ramasawmy __________________________________________ Profº Drº Gilberto Fontes DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a vocês que sempre acreditaram na realização dos meus sonhos e trabalharam muito para que eu pudesse realizá-los, meus pais, Edson, Maria, meus irmãos Eder, Ermesson, Ana Isabely, Helen, Hericsen, Hericson, meus filhos Bianca e João Gabriel. A você Luciana, companheira no amor, na vida e nos sonhos, que sempre me apoiou nas horas difíceis e compartilhou comigo as alegrias. AGRADECIMENTOS Registro meus agradecimentos a todos que compartilharam o trilhar de mais uma etapa da minha vida profissional. Contribuindo, direta ou indiretamente, para que eu realizasse esta pesquisa, auxiliando-me e dando-me forças nos momentos em que mais precisei. Minha gratidão, em primeiro lugar, a Deus, por estar comigo em todos os momentos, iluminando-me, sendo meu refúgio e fortaleza nos momentos mais difíceis. Agradeço, especialmente, à minha família, pelo apoio para que eu concretizasse essa pesquisa: minha mãe, meu pai, que sempre acreditaram em meus sonhos e em especial, a minha esposa, Luciana Fidelis, minha filha Bianca, que esteve sempre ao meu lado, entendendo-me nos momentos de ausência, dando-me apoio e carinho. Às professoras doutora Marilaine Martins, minha orientadora e a professora doutora Maria Paula Gomes Mourão, minha co-orientadora que me possibilitaram aprendizagens únicas, por meio do grande incentivo e orientação que me foram concedidos durante essa jornada. A irmã Santina representando a Pastoral do Imigrante em Manaus que foi interprete e guia, possibilitando a comunicação com os imigrantes para realização da pesquisa. Aos colegas e professores do mestrado, por tudo que com eles aprendi e contribuíram para construção de novos conhecimentos. A todos da Gerência de Parasitologia da Fundação de Medicina Tropical – Doutor Heitor Vieira Dourado, que sempre estavam dispostos na realização das atividades do estudo, em especial ao Ademir, Vilma, Alessandra, Elisa e Amaral. Muito obrigado RESUMO A filariose linfática é endêmica em 72 países, na Ásia, África e nas Américas, com o número de pessoas afetadas estimado em 120 milhões, sendo 108 milhões delas infectadas com Wuchereria bancrofti e 12 milhões com Brugia malayi ou B. timori. Nas Américas a doença é causada exclusivamente por W. bancrofti com transmissão ativa no Haiti, República Dominicana, Guiana, Brasil e Haiti, este último com maior prevalência. O agente etiológico dessa doença uma vez presente no vetor pode ser reintroduzido e/ou introduzido em regiões onde não existe. No final de 2010, imigrantes haitianos atraídos pela perspectiva de trabalho e da economia expansão no Brasil, começaram chegar à Amazônia Ocidental Brasileira através de Tabatinga e Brasiléia, cidade do Amazonas e Acre. Este estudo tem com objetivo avaliar a frequência do parasito W. bancrofti em imigrantes haitianos, alojados pela Pastoral do Imigrante, na cidade de Manaus-AM, no período de junho de 2013 a junho de 2014. Para o diagnóstico laboratorial as técnicas utilizadas foram gota espessa de sangue, filtração de sangue em membrana de policarbonato e imunocromatografia rápida. Na cidade de Manaus foram mapeados seis alojamentos, que acolheram os imigrantes onde receberam suporte humanitário. Os haitianos avaliados tinham média de idade 34 + 8,4 anos, 74,2% eram do gênero masculino e 25,8% do gênero feminino, sendo 72,1% solteiros e 27,9% casados, 47,1% apresentaram ensino fundamental incompleto e 3,3% superior completo. Foi diagnosticado um (0,4%) caso positivo para W. bancrofti entre os 244 imigrantes avaliados, com carga parasitária de 9mf/mL de sangue. Entre os entrevistados, 11,5% afirmaram ter participado do tratamento para filariose no Haiti. Quatro rotas migratórias foram utilizadas pelos imigrantes haitianos para chegar ao Amazonas/Brasil. O resultado mostra que apesar da estratégia de administração do medicamento em massa para filariose no Haiti, ainda é necessário adotar um processo de vigilância epidemiológica eficiente para filariose linfática nas cidades que recebem imigrantes haitianos, a fim de notificar os casos e evitar a reintrodução/introdução do parasito. Também é necessário realizar estudos para avaliar a real situação do parasito W. bancrofti, na cidade de Manaus no Estado do Amazonas. Palavras Chaves: Filariose linfática, Wuchereria bancrofti, imigrantes, Amazônia Brasileira, Brasil ABSTRACT Lymphatic filariasis is endemic in 72 countries in Asia, Africa and the Americas, with the number of people affected estimated at 120 million, of which 108 million are infected with Wuchereria bancrofti and 12 million with Brugia malayi or B. timori. In the Americas the disease is caused exclusively by W. bancrofti with active transmission in Dominican Republic, Guyana, Brazil and Haiti, the latter with the highest prevalence. The pathogen, once the vector is present, could be reintroduced or introduced in regions where none exists. In late 2010, Haitian immigrants, attracted by the prospect of work and the economy expanding in Brazil, began arriving at the western Brazilian Amazon through Tabatinga and Brasiléia municipalities from Amazonas and Acre States respectively. This study aims to assess the frequency of W. bancrofti in Haitian immigrants, hosted by Ministry of Immigrant, in Manaus-AM, from June 2013 to June 2014. For laboratory diagnosis the techniques used were thick smear, filtration of blood in polycarbonate membrane and quick immunochromatography. Six lodgings, responsible for humanitarian support, were mapped in Manaus. Haitians evaluated had mean age of 34 + 8.4 years, 74.2% were male and 25.8% female, 72.1% were single and 27.9% married, 47.1% had incomplete elementary school and 3.3% higher education. One (0.4%) subject was diagnosed for W. bancrofti among 244 immigrants evaluated with parasitic load 9mf/mL. Among respondents, 11.5% said they were treated for filariasis in Haiti. Four migratory routes were used by Haitian immigrants to arrive to the Amazon/Brazil. The result shows that despite of the practice of massive drug administration for filariasis in Haiti, it is still necessary to adopt an efficient epidemiological surveillance process for lymphatic filariasis in the places that receive Haitian immigrants in order to notify cases and avoid the reintroduction/introduction of the parasite. It is also necessary to conduct studies to assess the real situation of the parasite W. bancrofti in the city of Manaus in Amazonas State. Palavras Chaves: lymphatic filariasis, Wuchereria bancrofti, immigrants, brazilian amazon, Brazil LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Vermes adultos de Wuchereria bancrofti ........................................................... 03 Figura 2 – A - Esquema da morfologia de Wuchereria bancrofti; B – Foto da microfilária de Wuchereria bancrofti corada pelo Giemsa ...................................................................... 04 Figura 3 - Momento da saída do parasito da probóscida do vetor na forma larval L3 para infectar o ser humano (400x) ................................................................................................ 05 Figura 4 - Larva infectante (L3) de Wuchereria bancrofti junto à probóscida de fêmea de Culex quinquefasciatus (400X) ............................................................................................ 06 Figura 5 – Ciclo evolutivo do parasito Wuchereria bancrofti ............................................. 06 Figura 6: Porcentagem de microfilaremia média e porcentagem de pacientes com exames positivos................................................................................................................................ 07 Figura 7 – Vetor de W. bancrofti causadora da filariose linfática, Culex quinquefasciatus 09 Figura 08 - Linfangite filarial aguda (LFA) ........................................................................ 11 Figura 09 - Adenite inguinal ............................................................................................... 12 Figura 10 – Manifestações Clínicas crônicas da filariose linfática bancroftiana ................ 13 Figura 11 – Gota espessa de sangue corado por Giemsa..................................................... 14 Figura 12 – Membrana de Policarbonato ............................................................................ 15 Figura 13 - Esquema visual do teste de imunocromatografia rápida (ICT): A - Teste Negativo (somente a banda do controle reagiu) B – Teste Positivo (Banda do controle e do teste reagiram) ..................................................................................................................... 16 Figura 14 – Distribuição do tratamento para Filariose Linfática no mundo, 2011 ............. 20 Figura 15 – Punção digital, com lanceta descartável .......................................................... 29 Figura 16 – Punção venosa usando sistema de coleta à vácuo ............................................ 30 Mapa 1 - Distribuição espacial dos seis alojamentos na cidade de Manaus-AM ................ 34 Mapa 2 - Rotas migratórias, utilizadas pelos imigrantes haitianos, para chegarem a Manaus-AM.......................................................................................................................... 38 Mapa 3 – Estados do Brasil para onde migram os haitianos após deixarem Manaus ......... 39 Mapa 4 – Distribuição dos imigrantes haitianos, por sede de origem que chegaram a Manaus-AM.......................................................................................................................... 40 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Distribuição dos imigrantes haitianos examinados, por faixa etária e gênero nos alojamentos da pastoral do imigrante na cidade de Manaus-AM, no período de junho de 2013 a junho de 2014....................................................................................... 35 Tabela 2 - Distribuição quanto gênero, estado civil e grau de escolaridade, dos imigrantes haitianos alojados na cidade de Manaus-AM ............................................... 35 Tabela 3 – Métodos utilizados para o diagnóstico de Wuchereria bancrofti, nos imigrantes haitianos por faixa etária no município de Manaus-AM .............................. 36 Tabela 4 - Imigrantes haitianos, alojado em Manaus, que receberam tratamento para filariose linfática no Haiti ............................................................................................... 37 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Filarioses humanas ao redor do mundo, sistema acometido, localização das microfilárias e quadro clínico.........................................................................................02 Quadro 2 - Periodicidade das microfilárias em relação à geografia do Parasito............................................................................................................................08 LISTA DE ABREVIATURAS, SÍMBOLOS E UNIDADES DE MEDIDA µg – Micrograma µL - Microlitro µm – Micrômetro DEC – Dietilcarbamazina DLAA – Dermatolinfoangiodenite DNERu – Departamento Nacional de Endemias Rurais FL – Filariose Linfática FMT-HDV – Fundação de Medicina Tropical – Doutor Heitor Vieira Dourado FVS – Fundação de Vigilância em Saúde GE – Gota Espessa ICT – Imunocromatográfico Kg – Quilograma LAF – Linfangite Aguda Filarial MDA – Tratamento de administração em Massa mg – Miligrama MS – Ministério da Saúde OMS – Organização Mundial de Saúde PGEFL – Programa Global de Eliminação da Filariose Linfática PNEFL – Programa Nacional de Eliminação da Filariose Linfática RMR – Região Metropolitana de Recife WHA – Assembleia Mundial de Saúde SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 1 1.1. Filariose Linfática Bancroftiana ............................................................................ 1 1.2. Morfologia do Parasito .......................................................................................... 2 1.3. Ciclo Biológico ...................................................................................................... 4 1.4. Vetor ...................................................................................................................... 8 1.5. Manifestações Clínicas da Filariose Linfática ....................................................... 9 1.5.1. Manifestação Aguda ...................................................................................... 10 1.5.2. Manifestações Crônicas................................................................................. 11 1.6. Diagnóstico .......................................................................................................... 12 1.6.1. Diagnóstico Clínico ....................................................................................... 12 1.6.2. Diagnóstico Laboratorial Parasitológico ....................................................... 12 1.7. Tratamento ........................................................................................................... 15 1.7.1. Tratamento em Massa - Interrupção da Transmissão.................................... 16 1.8. Epidemiologia ...................................................................................................... 17 1.8.1. Evolução histórica da distribuição geográfica no mundo ............................. 17 1.8.2. Evolução histórica da distribuição geográfica da Wuchereria bancrofti no Brasil ....................................................................................................................... 19 1.8.3. Programa Global de Eliminação da Filariose Linfática (PGEFL): Estratégias Alternativas ............................................................................................................. 22 2. OBJETIVOS ............................................................................................................. 25 2.1. Objetivo Geral ..................................................................................................... 25 2.2. Objetivos Específicos .......................................................................................... 25 3. METODOLOGIA..................................................................................................... 26 3.1. Modelo de Estudo ................................................................................................ 26 3.2. Local de Estudo ................................................................................................... 26 3.3. População Amostrada .......................................................................................... 26 3.4. Técnicas para colheita de sangue ......................................................................... 27 3.4.1. Punção Digital ............................................................................................... 27 3.4.2.. Punção Venosa ............................................................................................. 28 3.5. Técnicas de Diagnóstico ...................................................................................... 28 3.5.1. Gota Espessa de Sangue (GE) ....................................................................... 28 3.5.2. Teste de Imunocromatografia Rápida ........................................................... 29 3.6. Consentimento informado e Comitê de Ética em Pesquisa ................................. 30 3.7. Tratamento Específico ......................................................................................... 31 4. RESULTADO ........................................................................................................... 32 5. DISCUSSÃO ............................................................................................................. 38 6. CONCLUSÃO........................................................................................................... 44 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 45 8. ANEXOS E APÊNDICES ........................................................................................ 53 1 1. INTRODUÇÃO 1.1. Filariose Linfática Bancroftiana A filariose linfática é uma doença debilitante com um impacto social e econômico sério. Marcado por uma grande variedade de manifestações clínicas em humanos, ela está entre as chamadas doenças tropicais negligenciadas e é mais comum em populações carentes de serviços de saneamento e abastecimento de água tratada (1). É uma doença parasitária, exclusivamente humana, provocada por helmintos nematóides (Spirurida: Onchocercidae) das espécies Wuchereria bancrofti (Cobbold, 1877), Brugia malayi (Bucley & Edeson, 1956) e Brugia timori (Partono, 1977), sendo que entre estas a W. bancrofti é a única que ocorre no Brasil e nas Américas. Acreditase que a filariose linfática bancroftiana chegou ao continente Americano através do tráfico de negros da África (2). De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a infecção é endêmica em 72 países na Ásia, África e Américas, com o número de pessoas afetadas estimadas em 120 milhões, sendo que 108 milhões deles estão infectados com Wuchereria bancrofti e 12 milhões com Brugia malayi ou B. timori (3, 4). Na região das Américas, a doença é causada exclusivamente por W. bancrofti, com transmissão ativa no Haiti, na República Dominicana, Guiana e Brasil. O Haiti é o país que apresenta a maior prevalência da doença (3, 5). Segundo Paily et al (2009) (9), os principais vermes filariais que parasitam o ser humano são: W. bancrofti, Brugia malayi, B. timori, Onchocerca volvulus, Loa loa, Mansonella streptocerca, M. ozzardi, M. perstans e Dracunculus medinensis (Quadro 1). 2 Quadro 1 – Filarioses humanas ao redor do mundo, sistema acometido, localização das microfilárias e quadro clínico. PARASITO OCORRÊNCIA Wuchereria África, Ásia, bancrofti Américas LOCALIZAÇÃO DOS VERMES ADULTOS MICROFILÁRIAS VETORES DE TRANSMISSÃO PATOLOGIAS Culex Linfática Sangue quinquefasciatus, Anopheles sp, Aedes Linfangite spp Brugia malayi Ásia Linfática Sangue Mansonia spp Linfangite Brugia timori Indonésia Linfática Sangue An. barbirostris Linfangite Pele, nódulos subcutâneos Pele e olhos Simulium sp Tabanídeos Onchocerca volvulus África, América Central e do Sul, Yemen Dermatites, lesões oculares cegueira Edema,Calabar,Irrit Loa loa África Tecidos subcutâneos Sangue Mansonella América Central e Mesentério e Parede Sangue ozzardi Sul Abdominal Pele ação nos olhos, febre Mansonella América Central e perstans Sul Mansonella streptocerca África e Américas Dracunculus Américas, Ásia e medinensis África Simulium sp Edema linfoide, dor articular febre Tecido peritoneal cavidade pleural e Sangue Culicideos Tecido subcutâneo Pele e Sangue Culicideos Tecido subcutâneo Pele Dor articular, febre pericárdio Prurido, dor articular, febre Microcrustáceos Ulcerações na pele, (Cyclops) bolhas Paily et al., 2009 (6) 1.2. Morfologia do Parasito Os vermes adultos de W. bancrofti, possuem como habitat preferencial os vasos linfáticos, local no qual podem permanecer vivos por um período que varia de oito a 10 anos. Possui corpo longo e delgado, branco leitoso, opacos, com cutícula lisa e sexos distintos. O macho (Figura 1) mede de 3,5 a 4cm de comprimento e 0,1mm de diâmetro, com a extremidade anterior afilada e posterior enrolada ventralmente. A fêmea mede de sete a 10cm de comprimento e 0,3mm de diâmetro, possui órgãos genitais duplos, com exceção da vagina, que e única e se exterioriza em uma vulva localizada próximo a extremidade anterior do parasito. A reprodução é sexuada, possui dois tubos uterinos que ocupam grande parte do corpo. Os ovos são observados na porção mais posterior, enquanto que os embriões e as microfilárias imaturas mais próximas da vagina (7, 8). Fonte: MS, 2009. 3 Figura 1 - Vermes adultos de Wuchereria bancrofti As microfilárias são os embriões resultantes do acasalamento entre os vermes adultos. São liberados pelas fêmeas grávidas, de onde saem dos ductos linfáticos do hospedeiro e ganham a circulação sanguínea, onde se movimentam ativamente. Medem de 250 a 300μm de comprimento e possuem uma membrana de revestimento (bainha) que é flexível. A observação da bainha é importante, pois alguns filarídeos encontrados no sangue humano não possuem essa estrutura, sendo este um dos critérios morfológicos para o diagnóstico diferencial (Figura 2). Podem ser observadas vivas e em movimento ativo, em exame direto a fresco do sangue, logo após colhido de indivíduos parasitados. A microfilaremia pode persistir no organismo do hospedeiro definitivo por um período de cinco a 10 anos, sem que seja necessária a ocorrência de reinfecção (7, 8). As formas larvais são encontradas em três estádios no vetor transmissor. A primeira é a L1 que mede em torno de 300μm, as larvas L2 que têm tamanho aproximado de 700μm de comprimento e na última fase de desenvolvimento as larvas infectantes são denominadas de larvas L3 (Figuras 3 e 4), possuem comprimento entre 1,5mm e 2,0mm de comprimento (7, 8). Após a entrada da microfilária no vetor, em poucas horas, perdem a sua bainha de revestimento, atravessam a parede do estômago, alojam-se nos músculos torácicos e 4 transformam-se em L1. Seis a 10 dias após, ocorre à segunda muda transformando-se em L2. Esta cresce muito, e entre 10 e 15 dias sofre a terceira muda, e assume a forma infectante L3, que migra para a probóscida do inseto. O tempo de transformação de L2 para L3 pode variar em função da umidade e temperatura do ambiente (9). Morfologicamente as microfilárias apresentam grande quantidade de núcleos na região caudal (células germinativas caudais), dispostos em filas simples. As células somáticas constituirão o tubo digestivo e outros órgãos, participarão também, da formação do aparelho genital. Alguns espaços sem núcleos corresponderão a outras estruturas em formação, como anel nervoso, poro e célula excretora (6). A B Figura 2 – A - Esquema da morfologia de Wuchereria bancrofti; B – Foto da microfilária Wuchereria bancrofti corada pelo Giemsa ( Originais: A – Gilberto Fontes; B – Edson Fidelis). 1.3. Ciclo Biológico A Wuchereria bancrofti é um parasito heteroxênico e necessita de um estágio de maturação em artrópodes, como hospedeiros intermediários e o homem como hospedeiro definitivo para completar seu ciclo evolutivo (Figura 5) (7, 8). 5 O ciclo intrínseco ocorre a partir da penetração do estádio infectante (L3) (Figura 5) após ter sido depositada pelo mosquito sobre a pele do indivíduo, no ato da hemofagia. A larva migra através da circulação sanguínea e se instala nos vasos linfáticos ou linfonodos, onde realiza duas mudas até atingir a fase adulta. Aproximadamente entre nove e 10 dias após a sua penetração, o estádio L3, sofre a Fonte: Fontes e Rocha, 2005 primeira muda e transforma-se em L4 (6-8). Figura 3 - Momento da saída do parasito da probóscida do vetor na forma Fonte: Fontes e Rocha, 2005 larval L3 para infectar o ser humano (400x). Figura 4 - Larva infectante (L3) de Wuchereria bancrofti junto à probóscida de fêmea de Culex quinquefasciatus (400X). 6 O estádio L4 sofre um processo de desenvolvimento que pode durar dias ou meses, para somente após chegar a forma evolutiva final, a forma adulta. A longevidade de uma fêmea de W. bancrofti é em média de 10,2 anos, produzindo microfilárias por Figura: Adaptado por Edson Fidelis pelo menos cinco anos (6). Figura 5 – Ciclo evolutivo do parasito Wuchereria bancrofti A periodicidade das microfilárias, na corrente circulatória sanguínea periférica, pode obedecer a três padrões distintos. A periodicidade noturna que é caracterizada por apresentar picos de filaremia entre 22:00h e 1:00h. Na sub periodicidade noturna as microfilárias podem estar presente durante todo o dia sendo, porém a maior concentração no período noturno. E na periodicidade diurna a microfilaremia pode ser diagnosticada durante todo o dia, com picos entre as 12:00 e 20:00h (6). A microfilaremia coincide com o horário de maior atividade hematofágica do mosquito vetor. No Brasil, foi realizado pesquisa onde encontrou que o pico de concentração das microfilárias na corrente sanguínea periférica dos hospedeiros, realizada na cidade de Maceió, mostrou que em 42 parasitados examinados, 80% apresentou maior concentração de microfilárias no sangue entre 23:00h e 1:00h (Figura 6) (10). 7 Densidade de microfilárias Percentagem de indivíduos positivos 120 100 60 40 20 0 08.00 12.00 15.00 18.00 20.00 23.00 01.00 06.00 08.00 Horários de colheita de sangue Fonte: Fontes et al, 2000. Porcentagem 80 Figura 6: Porcentagem de microfilaremia média e porcentagem de pacientes com exames positivos. Os resultados foram baseados em análise de gota espessa de sangue quantitativa para microfilárias de Wuchereria bancrofti, ao longo de 24 horas, em microfilarêmicos (Fontes et al., 2000). Essa variação da concentração das microfilárias no sangue periférico, durante as 24 horas do dia, independe do gênero ou da carga parasitária do hospedeiro (10). Chandra (2008) demonstrou que existe uma correlação entre as taxas de transmissão e o sincronismo entre o período de maior proliferação do vetor, a temperatura, umidade do ar e a evolução das formas larvais da W. bancrofti. Nos períodos onde a umidade do ar e temperaturas favorecem a proliferação do vetor, muitas vezes não coincide com o melhor período de desenvolvimento das formas larvais L2 para L3, podendo ser tão longo quanto seis semanas, inviabilizando dessa forma a transmissão do parasito (9). Quadro 2 - Periodicidade das microfilárias em relação à geografia do parasito. PARASITO FORMA PERIÓDICA Wuchereria bancrofti Periódica Noturna Wuchereria bancrofti Noturno subperiódico Wuchereria bancrofti Periodicidade Diurna OCORRÊNCIA Ásia, África, Malásia, Filipinas, Américas Tailândia Pacifico Sul, Ilhas Nicobar e Andaman 8 Índia, China, Malásia, Brugia malayi Periodicidade Noturna Indonésia, Filipinas, Japão e Coréia Brugia malayi Noturno subperiódica Brugia timori Periódica Noturna Malásia, Indonésia, Filipinas Ilhas do Timor Paily et al., 2009 (6) 1.4. Vetor Os vetores dos agentes etiológicos da filariose linfática são mosquitos do gênero Culex, Anopheles, Aedes e Mansonia spp, dependendo da região (11). O Culex é o principal gênero de vetor nas regiões onde a microfilaremia periférica é noturna, coincidindo com o seu período de hemofagia sendo também o mosquito que ingere a maior quantidade de sangue o que significa que ingere o número maior de microfilárias (12, 13). No Brasil a FL é transmitida por mosquitos da espécie Culex quinquefasciatus (Figura 7). Apenas as fêmeas são vetores do parasito, porque somente estas são hematófagas. Nenhuma espécie de culicideo dos gêneros Aedes e Anopheles foi incriminada como vetor em nosso meio, embora transmitam a FL em outras partes do mundo (7). Sobre o mecanismo de reprodução do mosquito C. quinquefasciatus (Figura 7), inicia com a ovoposição em águas paradas e poluídas, encontrando nesse meio ambiente as condições perfeitas de proliferação, principalmente se houver infraestrutura precária de saneamento e esgoto (14). O município de Manaus tem sofrido consideráveis alterações ambientais causadas pelo crescimento desordenado da sua área urbana e pela implementação de projetos agrícolas desorganizados na sua zona rural, aumentando o número de registros de diferentes enfermidades transmitidas por vetores. A distribuição das duas espécies 9 vetoras mais frequentes no Amazonas revelou a presença do Culex quinquefasciatus e Fonte: Rocha e Fontes, 2009. Culex declarator (14). Figura 7 – Culex quinquefasciatus, vetor do agente etiológico de filariose linfática. 1.5. Manifestações Clínicas da Filariose Linfática A filariose linfática causada por Wuchereria bancrofti não possui sinal clínico patognomônico, sendo a enfermidade caracterizada por um amplo espectro de manifestações como febre, linfangite, quilúria, hidrocele e elefantíase. Porém, encontrase mais associada a quadros mórbidos crônicos de hidrocele e elefantíase, que são as duas manifestações mais estigmatizantes, que possui na maior parte das vezes, um caráter irreversível tornando o indivíduo impossibilitado para o trabalho, além de afastálo do convívio social, o que origina graves consequências socioeconômicas (15-17). As manifestações clínicas podem ser derivadas tanto dos vermes adultos quanto das microfilárias. Enquanto os vermes adultos causam lesão, primariamente no vaso linfático, as microfilárias são as responsáveis pela produção de manifestações extralinfáticas (18, 19). 10 A filariose linfática pode apresentar manifestações clínicas agudas, como malestar, estados recorrentes de hipertermia, associados com quadros de linfadenite, uma reação inflamatória aguda nos linfonodos, comuns nas regiões inguinal, axilar e epitrocleana, e/ou com linfangite retrógrada, inflamação dos vasos linfáticos no sentido da raiz do membro para a sua extremidade (8, 20). 1.5.1. Manifestação Aguda 1.5.1.1. Linfangiectasia subclínica A linfangiectasia é a dilatação dos vasos linfáticos, de causa não obstrutiva sem qualquer reação inflamatória, está presente em indivíduos portadores de vermes adultos vivos. Quando essa linfangiectasia progride, pode ser palpada e vai gerar consequências diferentes, dependendo da região anatômica em que as filarias adultas estejam (7, 21). 1.5.1.2. Linfangite filarial aguda (LFA) Com o incremento no conhecimento da fisiopatologia da filariose linfática. Essa evolução permitiu uma abordagem clínica mais acurada e terapêutica dos pacientes, principalmente no reconhecimento das duas síndromes agudas: a Linfangite Aguda Filarial (LAF) e a Dermatolinfoangioadenite Aguda (DLAA) (22). A LFA (Figura 8) é causada pela reação inflamatória que decorre da morte de vermes adulto espontâneo ou após o tratamento, enquanto que a DLAA é causada pela dilatação dos vasos linfáticos e pelas reações inflamatórias causadas pelas substâncias imunomoduladoras produzidas pelos vermes adultos (22). 1.5.1.3. Linfadenopatia A linfadenopatia é causada pelo enfartamento dos gânglios linfáticos comprometidos, os quais formam uma massa palpável compacta de superfície irregular, na qual não se identificam os gânglios isoladamente. Essa massa geralmente e indolor e 11 localiza- se preferencialmente nas regiões inguinal (Figura 8), epitróclear e axilar. A linfadenopatia pode acometer indivíduos de todas as faixas etárias, sendo mais frequente em crianças.(23). B A Figura 08 – Linfangite filarial aguda (LFA); Adenite inguinal (Originais A – Ana Maria Aguiar dos Santos; B – Abraham Rocha) 1.5.2. Manifestações Crônicas Na sua forma crônica, a filariose é responsável pelas principais alterações físicas incapacitante do paciente, principalmente nos casos de elefantíase – que decorre das reinfecções recorrentes da área com linfangiectasias. O linfedema (Figura 9) é um dos quadros mórbidos corriqueiramente observados entre portadores de W. bancrofti. Ocorre por uma disfunção do sistema linfático superficial, gerado pela sobrecarga causada pelo acúmulo de líquidos e proteínas no tecido. Uma de suas complicações é o fibroedema, caracterizado pelo endurecimento na textura da pele e do tecido subcutâneo devido à alta concentração de proteínas presentes no líquido acumulado. A elefantíase (Figura 9) é uma manifestação crônica normalmente irreversível, com repercussões sociais e econômicas negativas para seu portador, uma vez que provoca deformidade estética, e em casos mais graves pode determinar a incapacidade profissional ou até o isolamento social do indivíduo (24). 12 Figura 9 – Manifestações Clínicas crônicas da filariose linfática bancroftiana. A – Membro inferior esquerdo com linfedema; B – Sinal de Cacifo (setas), normalmente observado após a compressão digital no membro afetado com linfedema; C – Elefantíase (Originais: B – Dr. Abraham Rocha; C – Professores Dr. Gilberto Fontes e Dra. Eliana M. M. da Rocha). 1.6. Diagnóstico 1.6.1. Diagnóstico Clínico O diagnóstico clínico é difícil, pois os sinais e sintomas apresentados pelos infectados são semelhantes às alterações clínicas comuns a várias outras doenças. Para auxilio desse diagnóstico, é recomendada uma anamnese minuciosa do paciente, um exame físico detalhado, associados ao diagnóstico laboratorial, principalmente se o paciente apresentar um quadro de febre recorrente associado à adenolinfangite e eosinofilia pulmonar tropical (8, 21, 23). 1.6.2. Diagnóstico Laboratorial Parasitológico 1.6.2.1. Gota Espessa de Sangue (GE) A gota espessa de sangue (Figura 10) é muito utilizada em inquéritos epidemiológicos para a pesquisa de microfilárias no sangue periférico do hospedeiro por 13 ser uma técnica de baixo custo e simplicidade para realização do exame. Esta técnica permite a identificação das diferentes espécies de filarias, através da observação de características morfológicas específicas das microfilárias. O teste apresenta uma boa sensibilidade em indivíduos com microfilaremia acima 10mf/mL de sangue, sendo recomendada a confecção de mais de uma lâmina para cada examinado. O uso desta técnica é aconselhável inclusive em áreas onde existe a possibilidade de ocorrer infecções mistas (8, 15, 25). Estudo realizado em Maceió demonstrou que a sensibilidade da gota espessa de sangue em indivíduos microfilarêmicos com mais de 10mf/mL, foi de 98,5% e para indivíduos parasitados com menos de 10mf/mL, foi de 60% (26). Para realização dessa técnica, são colhidos de 60µl a 80µl de sangue por punção capilar digital, durante a noite, obedecendo à periodicidade das microfilárias no sangue periférico dos Fonte: Fidelis, 2014. hospedeiros, entre as 22h00 e 24h00h (10, 15). Figura 10 – Gota espessa de sangue corado por Giemsa 1.6.2.2. Filtração de Sangue em Membrana de Policarbonato A filtração de sangue em membrana de policarbonato (FM) (Figura 11) tem como objetivo aumentar a sensibilidade do exame pela concentração das microfilárias presentes no sangue do indivíduo parasitado. A técnica consiste na utilização de membranas com poros de 3μm ou 5μm de diâmetro, apropriados para reter as microfilárias que por acaso estejam presentes na amostra de sangue (8, 26). Esta é a técnica de escolha para realizar o diagnóstico de indivíduos que apresentam uma baixa densidade de microfilárias e para o controle de cura dos 14 pacientes submetidos ao tratamento específico, procedimento que normalmente elimina Fonte: Fidelis, 2014. ou reduz drasticamente a microfilaremia (27, 28). Figura 11 – Membrana de Policarbonato 1.6.2.3. Teste de Imunocromatografia Rápida O teste de Imunocromatografia rápida (ICT), por meio do anticorpo monoclonal AD12, identifica antígenos dos vermes adultos ou microfilárias de W. bancrofti (29). Esse é o primeiro teste rápido para pesquisa de antígeno filarial é utilizado como recomendação da OMS em programas de eliminação da filariose linfática implantados pelo mundo, para mapeamento e monitoramento de áreas endêmicas. O teste de ICT utiliza um anticorpo monoclonal conjugado a ouro coloidal que é mais estável do que os conjugados e substratos encontrados no ensaio imunoenzimático (ELISA). A sensibilidade variou de 84,5% a 98,5% e a especificidade de 72,4% a 100% (29-32). O teste de imunocromatografia rápida pode ser realizado em campo, com a visualização do resultado qualitativo após 10 minutos da realização do teste, com a opção de serem identificados e armazenados os dados após o uso (29). O teste é provido de um controle que assegura a confiabilidade do mesmo, pois se não executado corretamente a banda de controle da membrana não aparece (Figura 12). A B Fonte: Fidelis, 2014. 15 Figura 12 - Esquema visual do teste de imunocromatografia rápida (ICT): A - Teste Negativo (somente a banda do controle reagiu) B – Teste Positivo (banda do controle e do teste reagiram) 1.7. Tratamento O tratamento da filariose baseia-se nos efeitos da medicação sobre: a) as microfilárias; b) clareamento da antigenemia; c) efeito sobre as macrofilárias (vermes adultos); e d) prevenção das alterações e complicações clinicas da filariose (33). A escolha das medidas mais adequadas para o tratamento dos pacientes portadores de filariose linfática requer o conhecimento das diversas manifestações clínicas, assim como os seus diferentes mecanismos patogênicos. Para o tratamento da filariose linfática, a Organização Mundial da Saúde (OMS), preconiza a administração via oral do Citrato de Dietilcarbamazina (DEC), utilizando uma posologia padrão de 6mg/Kg de peso durante um período de 12 dias (34). Ocorrendo falha no tratamento com a DEC pelo fato do paciente apresentar vermes adultos não susceptíveis e continuar produzindo microfilárias e reaparecendo sinais clínicos, é utilizado a coadministração da DEC com a ivermectina (6mg/kg e 400µg/kg de peso). Essa indicação tem como objetivo a melhor ação microfilaricida da combinação das duas drogas e consequentemente a obtenção de um maior tempo de clearance das microfilárias circulantes (34, 35). 16 1.7.1. Tratamento em Massa - Interrupção da Transmissão. Durante os últimos 20 anos, novos tratamentos, estratégias e ferramentas de diagnóstico mudaram drasticamente as perspectivas de controle da filariose linfática a partir do lançamento do Programa Global de Eliminação da Filariose Linfática (GPELF). A meta principal é interromper a transmissão do filariose linfática através da administração de medicamentos em massa (36). O tratamento individual da infecção filarial é indicado em todos os indivíduos com evidência de infecção ativa, independente de manifestação clínica. O esquema recomendado pela OMS para o tratamento individual dos microfilarêmicos é o de 6mg/kg de peso durante doze dias. Já para atuar nos vermes adultos, a dose de DEC utilizada é de 6mg/kg em dose única, pois seu efeito macrofilaricida é dose independente (34). A ivermectina é uma droga que atua diretamente sobre as microfilárias. Com uma única dose, de 200 a 400 μg/kg, e mesmo após um ano, os níveis de microfilaremia são reduzidos e comparam-se ao DEC. Não existe ação da ivermectina sobre os vermes adultos. Essa droga também é usada para o tratamento da oncocercose e tem ação sobre outros parasitas, tanto intestinais como pediculose e escabiose (37). O tratamento em massa com ivermectina ou DEC, em combinação com albendazol é o recomendado pelo PGEFL. A combinação DEC e albenzadol é indicada como primeira opção para o tratamento em massa, apresentando como benefícios para a população, além da redução da infecção filarial, a redução da infecção por helmintos, como ascaridíase, tricuríase e ancilostomíase (38, 39). Na África, onde pode existir a infecção por Onchocerca ou por Loa loa, com exceção do Egito, há o risco potencial de reações adversas severas com o uso da DEC, tornando impossível sua distribuição nas regiões endêmicas de bancroftose. Nessas áreas, a coadministração de ivermectina e albendazol é o tratamento de escolha (40). Para as drogas mencionadas e suas diversas combinações, o nível de cobertura populacional e a duração do tratamento requerido para interromper a transmissão, não 17 foram ainda estabelecidos de forma precisa nas áreas endêmicas com diferentes espécies de vetores e com diferentes cargas de microfilaremia (40-43). 1.8. Epidemiologia 1.8.1. Evolução histórica da distribuição geográfica no mundo Consiste em uma doença parasitária originária da Polinésia, sendo posteriormente introduzida na China e em outras regiões da Ásia e em seguida, no continente africano. Acredita-se que a parasitose tenha sido introduzida nas Antilhas e na América do Sul através do tráfico de escravos (44). Por volta dos séculos XVII e XVIII, por ocasião da descoberta das ilhas do Pacífico, a elefantíase já era frequentemente registrada na Polinésia Oriental e Ocidental, o que veio a ser posteriormente confirmado pelos missionários que lá chegaram (44). Do Leste Pacífico, através da migração, a W. bancrofti teria sido introduzida na Ásia (44). Na região do Pacífico, a parasitose se distribui por 24 países (45). Nessa região cerca de 1,8 milhão de indivíduos são portadores da infecção (46). Destacam-se, aqui, as ilhas Filipinas, onde aproximadamente 20 milhões de pessoas vivem em áreas de risco em 58,5% das províncias do arquipélago são endêmicas para a bancroftose, com um total estimado de 645.232 portadores da parasitose (47). Na Ásia a W. bancrofti distribui-se nas áreas de clima tropical e subtropical, com exceção das áreas do deserto (11). A situação da filariose linfática na região do sudeste encontra-se configurada através da endemicidade comprovada em oito países, com cerca de 62,4 milhões de pessoas infectadas (46). Somente a Índia detém 44% do total de casos da região e possui cerca de 454 milhões de pessoas vivendo em áreas de risco, sendo 113 milhões residentes de áreas urbanas (45). Encontram-se relatos da infecção filarial na Índia desde o século VI A.C., também, pode ser encontrada descrição dos sinais e sintomas da doença século VII D.C. e a elefantíase nas pernas foi descrita em Cochin por Clarke (1709). A microfilária foi diagnosticada no sangue periférico em um homem hindu por Lewis em 1872 (11). 18 Acredita-se que a introdução da filariose bancroftiana na África tenha ocorrido devido ao movimento forçado de africanos na condição de escravos durante o século XIX. Outra teoria menos provável, relaciona a introdução da parasitose com a peregrinação dos viajantes do Cairo a Meca (rota de comércio) (44). No continente africano 84,76% dos países que compõem a região são endêmicos para filariose linfática, estimando-se em 420 milhões o número de pessoas residentes em áreas de risco e em 50,6 milhões o quantitativo de infectados pela doença, com taxa média de prevalência de 9% (48). No Egito a endemia é conhecida desde os tempos dos faraós (45). Estudo realizado com 325.000 mil residentes de 314 aldeias da região do delta do Nilo revelou taxa de prevalência de 20% em 1993 (49). Em 1951esse índice era de 1% e encontravase em alguns focos (49). Atualmente estima-se que aproximadamente 3,7 milhões de pessoas vivam em áreas de risco e que dessas, 242.400 mil já estão infectadas (49). Nas Américas, os primeiros relatos de filariose linfática por W. bancrofti foram encontrados na América do Norte, cidade de Charleston, Carolina do Sul (EUA); presumivelmente, a introdução do parasito ocorreu pela imigração das Índias Ocidentais (50). Na América do Sul, a introdução do parasito, provavelmente, deu-se através do Fonte: WHO, 2013. tráfico de escravos de Barbados para o Suriname (44). Figura 13 – Distribuição do tratamento para Filariose linfática no mundo, 2011. 19 Haiti é um dos quatro países endêmicos nas Américas e apresenta cerca de 90% da carga da doença por FL na região. Wuchereria bancrofti apresentou prevalência entre zero a 45% em crianças e em 88% dos seus 120 municípios avaliados apresentou prevalência maior que 1% (51). Antígenos circulantes do parasito foram detectados pelo uso do ICT em 87,9% em crianças de 133 comunidades no Haiti. Apesar de ter distribuição nacional, as maiores prevalências foram diagnosticadas em Leogane e em Porto Príncipe (51, 52). Estudo realizado por MADSEN (2004), no Haiti foram identificados resultados inesperados, em comunidades diferentes no “planalto do Departamento Central” (51). Apesar da localidade apresentar muitos canais de água poluída, onde as larvas do mosquito são abundantes, a prevalência do antígeno filarial na comunidade de Hinche foi baixa (1%). Em contraste, a comunidade rural de Saut d'Eau nas colinas, a uma altitude de 614 metros, teve antígeno circulante para o parasito 44% (51) 1.8.2. Evolução histórica da distribuição geográfica da Wuchereria bancrofti no Brasil No Brasil, o primeiro a encontrar a microfilária foi o pesquisador Otto Wucherer, na Bahia, em 1866, estudando a esquistossomose ele encontrou na urina hematoquilosa de um paciente do Dr. Silva Lima (53). Em 1877, o Dr. Silva Araújo denominou o verme adulto de Wuchereria bancrofti, homenageando o Dr. Otto Wucherer (descobridor da microfilária) e o Dr. Joseph Bancrofti (descobridor do verme adulto) (54). Alguns estudos investigativos foram conduzidos no Brasil sobre a filariose bancroftiana, anteriores aos estudos sistematizados da década de 1950. O primeiro desses estudos foi efetuado por Patterson (1878), na cidade de Salvador, que identificou um índice de microfilaremia de 8,4% (55). O trabalho seguinte foi realizado por Oliveira, em 1908, na mesma cidade, no qual 400 pessoas foram examinadas, com prevalência de 9,5% (55). 20 Em 1922, Coqueiro realizou estudo na cidade de Maceió, encontrou 17% de positividade, sendo que 46,5% apresentavam manifestações clínicas da doença (55). No período de novembro de 1942 a dezembro de 1943, foram realizados exames hemoscópico em 5.000 pessoas de Belém-PA, com 10,8¨% de casos da infecção filarial e 1,3% deles com elefantíase (56). No ano de 1948, entre os meses de junho a setembro foi realizado inquérito para verificar a prevalência de Wuchereria bancrofti na população da cidade de Manaus-AM. O total de 2.405 lâminas foram examinadas, sendo que 2% dos examinados foram positivo para microfilária de W. bancrofti e em 0,6% para as microfilárias de Mansonella ozzardi (57). Até a década de 1950, as informações disponíveis sobre a prevalência e a distribuição espacial da filariose linfática no Brasil, eram provenientes de inquéritos hemoscópicos isolados, como os de Paterson (1878), Oliveira (1908), Magalhães (1928), todos na cidade de Salvador-BA (56), na cidade de Belém-PA, o de Coqueiro (1922) e em Maceió-AL (55). A partir da criação da campanha contra a filariose linfática pelo Ministério da Educação e Saúde, em 1951, é que foram realizados inquéritos epidemiológicos sistemáticos em todo o país. A responsabilidade pela realização dessa campanha foi atribuída ao Serviço Nacional de Malária e, posteriormente, ao Departamento Nacional de Endemias Rurais – DNERu, e a coordenação coube a René Rachou (55). A principal tarefa consistia na consecução de estudos sobre a prevalência e a distribuição geográfica da doença no país, promovendo simultaneamente as ações necessárias ao seu combate (27, 55, 58). Entre 1951 e 1958, foram efetuados inquéritos epidemiológicos em 538 localidades, sendo encontrados portadores de microfilaremia em 89 delas. No entanto, em apenas 11 dessas localidades ficou comprovada a transmissão ativa, através do encontro simultâneo de mosquitos com larvas infectantes e indivíduos portadores de microfilaremia (55). Entre as localidades, Manaus-AM, Belém-PA, São Luís-MA, Recife-PE, Maceió-AL, Salvador-BA, Castro Alves-BA, Florianópolis-SC, Ponta 21 Grossa-SC, Barra de Laguna-SC e Porto Alegre-RS, com prevalências que variavam de 0,1% em Porto Alegre a 14,5% em Ponta Grossa (55, 59) Segundo Rachou (1960), entre as cidades acima citadas os de maior importância médico-sanitária foram de Belém (9,8%) e o de Recife (6,9%), estimando com cerca de 50.000 e 80.000, respectivamente, o número de portadores da parasitose. Segundo os resultados desses inquéritos a distribuição geográfica da filariose linfática é fundamentalmente focal e urbana, incidindo mais fortemente em cidades litorâneas (55, 59). Em 1985, o Ministério da Saúde (MS), considerando o declínio apresentado nos índices de microfilaremia em Recife (6,9% em 1954 para 0,7% em 1984) e Belém-PA (9,8% em 1952 para 0,03% em 1983), concluiu que a endemia estava sendo controlada de forma satisfatória e não oferecia a mesma gravidade do passado (60). Entretanto, estudos realizados nas cidades de Maceió-AL e Recife-PE questionavam o fato da endemia esta devidamente controlada (61). Em Maceió-AL Dreyer et al. (1991), examinaram 731 militares, encontrando dois casos positivos autóctones da localidade de Jacintinho. O inquérito realizado por Fontes et al.(1998) com 10.857 estudantes de escolas públicas estaduais de Maceió-AL, no período noturno revelou 0,7% de casos de infecção filarial autóctones (27, 62). Os resultados das pesquisas conduzidas por Fontes et al. (1994) indicaram que aproximadamente 80% dos parasitados detectados entre os escolares estavam concentrados em duas regiões vizinhas, Feitosa e Jacintinho, com prevalências de 5,25% e 1,24% (63) . Rocha et al. (2000), ao realizarem um inquérito epidemiológico nos mesmos bairros estudados por Fontes et al.(1994) em Maceió-AL, foram examinadas 10.973 pessoas, encontram 226 casos de positividade, com taxas de prevalência que variaram de 0,0% em Chã de Jaqueira até 5,4% em Feitosa, com prevalência média de 2,5%, indicando que a situação da filariose linfática necessitava do acompanhamento das autoridades de saúde locais (64). 22 A situação da filariose linfática em Belém, capital do estado do Pará, foi considerada sob controle, com gradativo declínio nos índices de positividade (19,9% em 1952; 5,4% em 1959; 1,2% em 1969; 0,35% em 1979; 0,03% em 1989 e 0,001% em 1999), concomitantemente a uma redução das manifestações crônicas da doença (65). Entre 1999 e 2004, nenhum caso autóctone foi diagnosticado entre 612.679 pessoas examinadas em toda a cidade (1, 65). Na Região Metropolitana do Recife (RMR), durante a década de 1990, foram realizados diversos estudos, tanto em áreas reconhecidamente endêmicas, quanto em áreas indenes, encontrando-se taxas de prevalência de até 15% em alguns bairros carentes (58). Portanto no Brasil a filariose continua a ser de importância significativa local no Estado de Pernambuco, especialmente no Recife (capital do Estado) e suas áreas metropolitanas, Olinda, Jaboatão dos Guararapes e Paulista. Estudos entomológicos mostraram que C. quinquefasciatus taxas de infecção de 0,6% em Recife e mais de 1,0% nas cidades de Olinda e Jaboatão dos Guararapes. Estes dados indicam que há transmissão de FL ativa em Recife, e em cidades da região metropolitana. O programa atual para interromper a transmissão da FL nessas áreas, que abrange 0,8% da população nacional, é baseado na administração de medicamentos em massa (MDA), utilizado com sucesso para o controle da filariose em alguns países endêmicos da África e Ásia (1). 1.8.3. Programa Global de Eliminação da Filariose Linfática (PGEFL): Estratégias Alternativas Após resolução da Assembleia Mundial de Saúde em maio de 1997, a Organização Mundial da Saúde lançou o Programa Global de Eliminação da Filariose Linfática (PGEFL) em 1998, para eliminação desta endemia como problema de saúde pública até o ano 2020 (1). 23 O PGEFL, para atingir seu pleno êxito, deve necessariamente alcançar dois objetivos: interrupção da transmissão e a prevenção e alívio de incapacidades associadas à filariose linfática (36). Para o planejamento das ações de interrupção da transmissão é essencial à delimitação das áreas endêmicas da bancroftose (66). As ferramentas mais utilizadas para este fim são os inquéritos parasitológicos através da técnica de gota espessa de sangue e pesquisa antigênica por Binax NOW Filariasis® que apesar de eficazes, têm custo operacional elevado e no caso da gota espessa, há a inconveniência do horário de coleta e processamento demorado (67). Diversos estudos de prevalência de microfilaremia e morbidade têm sido realizados em várias áreas endêmicas de bancroftose. No entanto, acredita-se que o número de casos de indivíduos portadores de doença seja subestimado e apesar dos recentes avanços no conhecimento sobre a morbidade filarial e seu tratamento, permanece a necessidade de assistência dirigida a esta população (68). Seguindo as orientações da OMS, que tem metas de eliminação para FL, baseado nas estratégias de tratamento em massa anual, conseguirá minimizar a presença da microfilária circulante no organismo humano. Acredita-se que para eliminação FL seja necessária que 65% da população faça parte da estratégia de tratamento em massa. Segundo as diretrizes é necessário até cinco rodadas anuais de MDA, cada alcançar o resultado esperado (69). Em 2011, todas as áreas do Haiti, onde FL é endêmica tinha recebido MDA, inclusive Porto Príncipe, que é considerada a área mais desafiadora, teve inicio a rodada de tratamento em massa a partir de novembro 2011 até fevereiro de 2012 (69). O MDA é um grande passo em direção à eliminação de FL no Haiti, mas deve ser seguido por rodadas de MDA para manter a cobertura adequada (69). No Brasil, a partir da proposta da OMS, implantou o Programa Nacional de Eliminação da Filariose Linfática (PNEFL) (1997) com as mesmas premissas do PGEFL(1998) (70, 71) . Na Região Metropolitana do Recife (RMR-PE), desde 2003, vêm sendo realizados tratamentos coletivos com Dietilcarbamazina® em áreas de maior 24 prevalência nos municípios de Recife e Olinda. A cobertura inicial de 18.000 tratamentos anuais foi expandida para 55.000 tratamentos anuais em 2005. O Brasil já teve êxito interrompendo a transmissão de filariose linfática em outros Estados como Alagoas, Bahia, Pará, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Atualmente no Brasil os únicos focos ativos de filariose linfática concentram-se nas cidades de Recife, Olinda, Paulista e Jaboatão dos Guararapes (1, 72). A Amazônia foi considera área endêmica de FL no passado e apresenta fatores ambientais adequados para reintrodução do parasito. Desde o inicio da recente imigração de haitianos para o Brasil, o Amazonas tem sido porta de entrada de possíveis parasitados através da cidade de Tabatinga, de onde foram confirmados 14 casos de portadores de microfilária de W. bancrofti . Entre esses imigrantes, 13 deles tiveram adesão ao tratamento e um evadiu-se, sendo 4 diagnosticados em Manaus/Lacem e tratados na Fundação de Medicina Tropical- Doutor Heitor Vieira Dourado (FMTHDV), segundo informações fornecidas pela Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS) (Informação verbal, Dr. Bernardino – Diretor Presidente FVS). De acordo com essas informações faz-se necessário seguir as orientações da nota técnica do Ministério da Saúde (2013), que para o controle de novos focos da doença é necessária vigilância efetiva que garanta a investigação precoce e tratamento rápido dos casos, em razão da possível migração de doentes provenientes de outros países, bem como da migração interna no Brasil (73). 25 2. OBJETIVOS 2.1. Objetivo Geral Identificar a frequência de Wuchereria bancrofti entre imigrantes haitianos no município de Manaus, Amazonas, Brasil. 2.2. Objetivos Específicos 1 – Mapear a distribuição dos alojamentos onde os imigrantes haitianos residem no município de Manaus – AM; 2 - Descrever o perfil social dos imigrantes haitianos no município de Manaus - AM; 3 - Avaliar a carga parasitária dos acometidos por Wuchereria bancrofti nos imigrantes haitianos no município de Manaus - AM; 4 – Identificar a rota migratória internacional e nacional dos imigrantes haitianos. 26 3. METODOLOGIA 3.1. Modelo de Estudo Esta pesquisa trata-se de um estudo seccional desenvolvido em Manaus, capital do Estado de Amazonas, durante o período de junho de 2013 a junho de 2014, especificamente com os imigrantes haitianos de ambos os sexos, maiores de idade acima de 18 anos, acolhidos nos alojamentos da Pastoral do Imigrante em diferentes bairros da cidade de Manaus. As técnicas de diagnóstico utilizadas nesse estudo foram a gota espessa de sangue periférico, para identificação morfológica de microfilárias do parasito, filtração do sangue na membrana de policarbonato para quantificação de microfilárias e o teste de imunocromatografia rápida (ICT) para pesquisa de antígeno filarial. 3.2. Local de Estudo O estudo foi realizado no município de Manaus, capital do Estado do Amazonas, que apresenta uma população de 1.982.179 habitantes, de acordo com estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em 2013, sendo também a sétima cidade mais populosa do Brasil e a 131ª mais populosa do mundo. A cidade aumentou gradativamente a sua participação na composição do PIB brasileiro nos últimos anos, passando a responder por 1,4% da economia do país (74). 3.3. População Amostrada Segundo a Pastoral do Imigrante no ano de 2010 entraram na cidade de Manaus 920 imigrantes haitianos, em 2011 foram 2.842 imigrantes haitianos, no ano de 2012 foram 910 imigrantes haitianos, em 2013 foram 2.100 e em 2014 até o mês de maio foram 1.000 imigrantes haitianos. 27 No estudo foi utilizado amostra de conveniência, onde os imigrantes foram convidados a participar, os que aceitaram assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) (Apêndice A) e responderam ao questionário (Apêndice B) para obtenção de informações sobre os dados pessoais, com auxilio da interprete Irmã Santina Peri. As coletas de sangue foram realizadas a partir das 23:00h, onde de cada imigrante foram confeccionadas duas lâminas de gota espessa, retirado 5mL de sangue total em tubo contendo EDTA e houve a realização do teste de imunocromotografia rápida (ICT card test BINAX). 3.4. Técnicas para colheita de sangue 3.4.1. Punção Digital O sangue para execução da gota espessa e o teste de imunocromatografia rápida Foto: Edson Fidelis foi obtido por punção capilar digital, usando lancetas descartáveis (Figura 14) (28). Figura 14 – Punção digital, com lanceta descartável. 28 3.4.2.. Punção Venosa O sangue utilizado para a técnica quantitativa de diagnóstico parasitológico, filtração em membrana de policarbonato foi obtido por punção venosa usando sistema Foto: Edson Fidelis de coleta à vácuo (Figura 15). Figura 15 – Punção venosa usando sistema de coleta à vácuo 3.5. Técnicas de Diagnóstico 3.5.1. Gota Espessa de Sangue (GE) Procedimentos de coleta de sangue, coloração e armazenamento do material biológico seguiram informações do Manual de Coleta de Amostras Biológicas para Diagnóstico de Filariose Linfática por Wuchereria bancrofti (28). A coleta do material biológico foi realizada de acordo com o protocolo indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para inquéritos populacionais. Foram retirados aproximadamente 60μL – 80μL de sangue capilar, na qual foram 29 confeccionadas as gotas espessas sem o uso de anticoagulante, para evitar a perda de microfilárias (7). Para a confecção da GE o sangue foi obtido utilizando lancetas descartáveis, por punção digital, após antissepsia do local com álcool a 70%. O dedo indicador da mão esquerda era preferencialmente escolhido para o procedimento. Após a coleta, o sangue obtido era disposto em duas lâminas de vidro com ponta fosca, previamente identificada com o nome e o código do imigrante cadastrado. Aproximadamente 12 horas após a coleta, tempo que as lâminas confeccionadas encontram-se adequadamente secas a temperatura ambiente, o material coletado era submetido ao processo de desemoglobinização, com azul de metileno e depois corado com Giemsa por cerca de 10 minutos. Após a lavagem das lâminas e sua secagem em temperatura ambiente foi realizado a leitura. A leitura de todas as lâminas preparadas era realizada em microscópio óptico, utilizando objetiva de 10X (aumento de 100X). Para a confirmação do diagnóstico, e/ou para dirimir qualquer dúvida durante o exame da lâmina, eram utilizadas as objetivas de 40X e 100X (imersão), o que proporcionava um aumento de 400X e 1000X respectivamente. Todas as GE coletadas eram submetidas a três leituras, por três microscopistas diferentes, ou seja, o controle de qualidade foi realizado em 100% das lâminas confeccionadas. 3.5.2. Teste de Imunocromatografia Rápida As amostras de sangue foram processadas utilizando-se o cartão para pesquisa de antígeno de W. bancrofti, por imunocromatografia rápida (ICT card test BINAX). O teste de imunocromatografia rápida foi feito de acordo com especificações do fornecedor: O kit era mantido no laboratório, na geladeira a uma temperatura de 4ºC a 8ºC. Para os trabalhos de campo, foi utilizado isopor juntamente com gelox para preservar a temperatura para manutenção dos kits para o teste. 30 As amostras de sangue foram obtidas por meio da punção digital, posteriormente retirada com um tubo capilar (heparinizado) 100µl de sangue, depositadas na parte superior da almofada. O cartão foi fechado após ser colocado o sangue, que juntamente com o anticorpo policlonal e antígeno do parasito, percorrem uma membrana de nitrocelulose contendo anticorpo monoclonal. É possível visualizar o resultado qualitativo após 10 minutos da realização do teste. 3.5.3. Filtração em Membrana de Policarbonato Para a filtração foi coletado, em uma seringa 1ml de sangue venoso, onde foi diluindo na proporção de 1:10 em solução salina tamponada e depois filtrada, pressionando levemente o êmbolo da seringa contra uma membrana de policarbonato de 13mm de diâmetro e poros de 3m, montada em um suporte de filtro apropriado, adaptado na extremidade da seringa. Após a filtragem, a seringa foi preenchida com cerca de 10ml de solução salina tamponada que foi usada para lavar o filtro. A membrana foi removida do suporte e colocada sobre uma lâmina de vidro. Após sua secagem, a membrana foi fixada com metanol e corada pela técnica Giemsa. A contagem de microfilárias foi realizada com o auxílio de um microscópio óptico (aumento 100X) e os resultados foram expressos em número de microfilárias/ml de sangue. 3.6. Consentimento informado e Comitê de Ética em Pesquisa O projeto de pesquisa foi aprovado pelo comitê de ética da Fundação de Medicina Tropical - Doutor Heitor Vieira Dourado, sob o número CAAE: 16765313.9.0000.0005, que permitiu sem restrições a execução do estudo. Inicialmente foi obtido de cada participante, o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (Apêndice A), no qual constaram dados relevantes sobre a pesquisa de forma clara e objetiva. Além das informações escritas, ainda se fez detalhada explanação sobre o conteúdo do documento, ficando a critério de cada sujeito sua 31 inclusão ou não no estudo. Da mesma forma que lhe foi permitido sua retirada a qualquer momento, sem nenhum ônus ou perdas. 3.7. Tratamento Específico Imigrantes positivos para W. bancrofti, receberam o tratamento específico com Dietilcarbamazina, conforme preconizado pela OMS, com a devida prescrição, orientação e acompanhamento da equipe de saúde. 32 4. RESULTADO No período de junho de 2013 a junho de 2014, foram identificados seis alojamentos distribuídos em diferentes bairros da cidade de Manaus como Parque 10 de Novembro, Centro, Praça 14 de Janeiro, Zumbi dos Palmares II, Parque das Laranjeiras Mapa: Vanderson Sampaio e Dom Pedro com capacidade máxima para 235 pessoas (Mapa 1). Mapa 1 - Distribuição espacial dos seis alojamentos nos bairros da cidade de ManausAM. Foram examinados 244 imigrantes haitianos, que estavam na faixa etária entre 18 - 68 anos, com média de idade 34 anos (desvio padrão de 8,4). Entre os examinados foram encontrados 74,2% (181/244) do sexo masculino e 25,8% (63/244) do sexo feminino. O maior número de examinados pertenceu à faixa etária entre 28-32 anos com 28,69% (70/244) participantes do estudo, sendo 19,7% (48/244) do sexo masculino (Tabela 2). 33 Tabela 2 – Distribuição dos imigrantes haitianos examinados, por faixa etária e gênero nos alojamentos da pastoral do imigrante na cidade de Manaus-AM, no período de junho de 2013 a junho de 2014. Faixa Etária 18-22 23-27 28-32 33-37 38-42 43-47 48-52 53-57 > 58 Total Número de Examinados 15 42 70 43 40 17 13 2 2 244 % 6,1 17,2 28,7 17,6 16,4 7,0 5,3 0,8 0,8 100,0 nº 4 11 22 10 6 5 5 0 0 63 Feminino % 1,6 4,5 9,0 4,1 2,5 2,0 2,0 0,0 0,0 25,8 Masculino nº % 11 4,5 31 12,7 48 19,7 33 13,5 34 13,9 12 4,9 8 3,3 2 0,8 2 0,8 181 74,2 Entre os examinados, 52,5% (128/244) eram solteiros do sexo masculino e entre eles 38,9% (95/244) tinham o ensino fundamental incompleto. As mulheres, 19,7% (48/244) eram solteiras e 8,2% (20/244) tinham o ensino fundamental incompleto (Tabela 3). Tabela 3 – Distribuição quanto gênero, estado civil e grau de escolaridade, dos imigrantes haitianos alojados na cidade de Manaus-Am Foram examinadas 244 amostras pelas técnicas da gota espessa de sangue e pela filtração em membrana de policarbonato, sendo 32% dessas amostras também foram realizados o teste de imunocromatografia rápida. 34 Entre os examinados, 0,4% (1/244) apresentou microfilárias de W. bancrofti (Figura 16) diagnosticado através da gota espessa do sangue periférico, coletado as 23 Foto: Edson Fidelis horas, com carga parasitária de 9mf/mL de sangue (Tabela 4). Figura 16 - Microfilária de Wuchereria bancrofti corado pelo Giemsa Tabela 4 – Métodos utilizados para o diagnóstico de Wuchereria bancrofti, nos imigrantes haitianos por faixa etária no município de Manaus-AM. Faixa Etária 18-22 23-27 28-32 33-37 38-42 43-47 48-52 53-57 > 58 Total Número de Examinados 15 42 70 43 40 17 13 2 2 244 GE MF ICT 15 42 70 43 40 17 13 2 2 244 15 42 70 43 40 17 13 2 2 244 7 12 15 14 14 6 7 2 1 78 Nº de Infectados nº % mf/mL 0 0 0 0 0 0 1 0,4 9 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 GE – Gota Espessa MF – Membrana Filtrante ICT - Imunocromatografia Vinte e oito (11,5%) dos imigrantes albergados em Manaus-AM, referiram terem sido tratados pelo programa de eliminação da filariose linfática, preconizado pela OMS no Haiti (Tabela 5). 35 Tabela 5 - Imigrantes haitianos, alojado em Manaus, que receberam tratamento para filariose linfática no Haiti. Gênero N % Participantes do tratamento em massa no Haiti/Ano 2009 2010 2011 2012 2013 2014 nº Total % Masculino 181 74,2 0 1 1 3 9 3 17 7,0 Feminino 63 25,8 2 1 1 3 3 1 11 4,5 Total 244 100 2 2 2 6 12 4 28 11,5 Diferentes rotas migratórias foram utilizadas pelos haitianos para chegarem ao Brasil, sendo a mais utilizada, para chegar a Manaus-AM, à República Dominicana, seguindo para Colômbia, Equador e Peru com 170 imigrantes (Rota Verde). A rota menos utilizada foi à República Dominicana, seguindo para o Panamá, Colômbia, Figura: Edson Fidelis Equador e Peru com 17 imigrantes (Rota Vermelha) (Mapa 2). Mapa 2 - Rotas migratórias, utilizadas pelos imigrantes haitianos, para chegarem a Manaus-AM. 36 Segundo a Pastoral do Imigrante em Manaus, os imigrantes haitianos permanecem nos alojamentos em média seis meses e após esse período eles têm que ser capaz de manter economicamente, com isso muitos se deslocam para outros municípios/Estado do Brasil em busca de novas oportunidades. Os Estados da federação mais procurados pelos haitianos. (após deixarem Manaus) foram os do Rio Grande do Figura: Edson Fidelis Sul, Paraná, São Paulo, Santa Catarina (Mapa 3). Mapa 3 – Estados do Brasil para onde migram os haitianos após deixarem Manaus. 37 Entre as cidades de origem no Haiti, a capital Porto Príncipe foi a localidade que originou maior número de imigrantes com 40 haitianos. Seguida pelas cidades de Aquin (19), Cabaret (17), Anse-a-Galets (15), St-Louis du Sud (15), Croux des Bouquets (14) Figura: Edson Fidelis e Gonaives (12) (Mapa 3). Mapa 4 – Distribuição dos imigrantes haitianos, por sede de origem que chegaram a Manaus-AM. O imigrante positivo para W.bancrofti era do sexo masculino, com 29 anos, exercia a profissão de vendedor e era natural da cidade Gonaives, no Haiti. O mesmo não apresentava qualquer sinal clínico de filariose linfática. O tratamento foi realizado pelo médico do projeto Dr. Marcus Lacerda, com administração via oral do Citrato de Dietilcarbamazina, utilizando posologia padrão de 6mg/Kg de peso durante um período de 12 dias de acordo com o preconizado pelo Ministério da Saúde do Brasil. Não foi possível acompanhar o tratamento do paciente, pois o mesmo já estava com passagem marcada para cidade de São Paulo. 38 5. DISCUSSÃO No final da década de 1940, Deane et al (1949), realizou estudo sobre a incidência de filárias humanas em Manaus, Estado do Amazonas. Na época foi encontrado (2%) (48 das 2.405 lâminas) com presença de microfilárias de W.bancrofti sendo todos casos autóctone. Medidas necessárias foram realizadas para o tratamento dos infectados, porém o grande fluxo migratório de indivíduos do Estado do Pará, considerado endêmico para o parasito na época , contribuiu para o surgimento de novos casos na cidade (57). No entanto, após o estudo sistemático realizado por Rachou (1950), mostrou que em 11 cidades no Brasil havia transmissão de FL ativa, dentre elas Manaus, examinou 10.889 pessoas sendo 25 positivas para W. bancrofti, apresentando taxa de prevalência de 0,2% (75). Desde então nada mais foi realizado em relação à prevenção da doença ou mesmo qualquer estudo acerca da ocorrência de FL em Manaus-AM. A resolução 50.29, da Assembleia Mundial da Saúde definiu metas para eliminação da FL como problema de saúde pública mundial até o ano de 2020. A OMS, através do Programa Global para Eliminação da Filariose Linfática (GPELF), vem se empenhando em atingir os objetivos propostos (36, 76). Em Salvador - BA no ano de 1954, registrou casos de infecção por filariose linfática nos bairros de Uruguai e São Domingos. Desde então, poucos estudos foram realizados para monitorar a taxa de prevalência. Recentemente no período de 2005 a 2009, foram realizados inqueridos parasitológicos, sorológicos e entomológicos na referida cidade, para atualizar as informações sobre a prevalência desta infecção. Os resultados de todas as análises foram negativas para o antígeno filarial ou presença de microfilária (1). Em Belém-PA, no norte do Brasil, a tendência histórica da prevalência de FL, os primeiros casos apresentaram taxa de 8,2% na década de 1950, com o passar de quatro décadas, ocorreu redução da taxa de prevalência para 2,6%, 0,7%, 0,16% e 0,02%. Entre 1999 e 2004, não foram diagnosticado nenhum caso autóctone na região (1). 39 Na avaliação de programas de eliminação da FL em países endêmicos, uma área é considerada livre de transmissão quando a antigenemia, determinada pelo ICT, é inferior a 0,1% utilizando crianças de 6 a 10 anos, que para a OMS são consideradas indicativas de infecções recentes (77). Em 1950 a cidade de Maceió - AL apresentou prevalência de 0,3% para FL, e com a realização de medidas preventivas a parasitose foi considerada extinta para essa doença (1). Mas em 1990, foram encontrados três casos autóctones na região e estudo realizados com estudantes noturnos, obteve taxa de 0,7% de microfilarêmicos (1, 27). O resultado causou surpresa, pois Maceió era considerada como foco extinto de FL. Posteriormente foi realizado estudo para determinar a distribuição espacial da FL na cidade de Maceió e em mais nove cidades do Estado de Alagoas e foram encontrados casos autóctones somente em três bairros da cidade de Maceió com prevalência de 2,5% (1, 64). No Sri Lanka imigrantes infectados pelo parasito causador da FL foram responsáveis pela introdução da doença em áreas anteriormente desconhecidas (1, 78, 79). Isto ocorreu também na região metropolitana de Recife, onde os casos da parasitose apareceram em áreas anteriormente não afetadas (1, 62, 80). Milhões de pessoas oriundas de países endêmicos migram para áreas não endêmicas, dentro ou fora de seus países. Uma parte considerável deles são trabalhadores semiqualificados que migram de países endêmicos para FL para outros países da região do Golfo Pérsico, o Sudeste da Ásia, Europa e América do Norte (81). Uma investigação entre os trabalhadores imigrantes no Kuwait mostrou que a antigenemia para FL foi entre 18% - 20% e microfilaremia de 3,0% (81, 82). Na Arábia Saudita apresentou taxa de 3,5% entre os imigrantes examinados, os mesmo tinham origem de cinco países do Sudeste Asiático (81, 83). Quase um quarto dos imigrantes examinados em hospitais na Espanha foram encontrados infectados com LF (84, 85). Muitos países europeus e os Estados Unidos são os destinos para esses imigrantes, muitos acabam fixando moradia em países em desenvolvimento. A Nova Zelândia é o destino para os migrantes das Ilhas Cook e outras nações insulares da região do Pacífico 40 Sul, onde são endêmicas para Aedes que transmite a W. bancrofti diurna subperiodica (81). Um dos exemplos mais conhecidos da ameaça representada pela FL é migração transfronteiriça entre Tailândia e Mianmar. As áreas de fronteira são endêmicas para FL e representam um desafio para os esforços de eliminação por parte da Tailândia. Na área de frontreia da Tailândia foram encontradas taxas de microfilaremia de 6,0%, e a de antigênemia foi de entre 22,0% - 36,8% (86) . Embora as informações sobre a migração transfronteiriça é escassa, parece ser mais importante do que imaginava e coloca um problema no Sudeste da Ásia, África e regiões do Pacífico Sul (81). Estudo recente sobre a FL foi realizado nas cidades de Porto Velho, GuajaráMirim e Humaitá, tendo em vista que desde 1960 não havia dados sobre nenhuma pesquisa havia sido realizada para determinar se as proximidades das cidades poderiam ser áreas silenciosas para transmissão de FL. As condições climáticas destas áreas na Amazônia favorecem a transmissão da W. bancrofti na região. Além disso, por causa da falta do saneamento básico, sabe-se que o vetor do parasito estava presente nas áreas examinadas, onde foram diagnosticados casos de FL no passado. O estudo não detectou resultados positivo para FL (87). No entanto, não há consenso entre os pesquisadores que tentam prever a ocorrência de um novo caso de infecção de microfilárias em humanos . Em lugares onde a densidade de microfilárias é mantida abaixo de 5mf/60mL de sangue, não é considerado como risco de transmissão (87, 88). Em Maceió - AL foi demonstrado que a carga filarial de um paciente é um dos fatores determinantes para manter o foco da transmissão da FL. E a carga parasitária pode ser um dos fatores que determinam a disseminação da doença. Foi constatado que um indivíduo microfilarêmicos procedente de uma área endêmica, residia há mais de 10 anos em uma área não endêmica, sendo assim o mesmo não foi capaz de induzir a formação de um novo foco de bancroftose, embora a nova área exibisse as condições ambientais apropriadas. Uma das possibilidades consideradas pelos pesquisadores foi que a infecção por microfilária do indivíduo infectado era leve com 4 mf/mL de sangue. (89). 41 Atualmente no Brasil os únicos focos ativos de filariose linfática concentram-se nas cidades de Recife, Olinda, Paulista e Jaboatão dos Guararapes (1). Na atualidade sabe-se que o Haiti, representa 78,7% dos casos de filariose linfática causado por W. bancrofti nas Américas, o vetor transmissor nessa região é o Culex quinquefasciatus (69). No ano de 2010, quando ocorreu um terremoto que destruiu grande parte do país, milhares de haitianos iniciaram um processo migratório para outros países em busca de uma melhor qualidade de vida. No final de 2010, imigrantes haitianos começaram chegar a postos de fronteira nos rios da Amazônia Ocidental Brasileira. Atraídos pela perspectiva de trabalho e da economia em expansão no Brasil, milhares de haitianos pagaram grandes somas a traficantes de pessoas, conhecidos como “coiotes'', para organizar sua viagem para o Brasil. Eles entraram no País através das cidades fronteiriças de Tabatinga-AM e Brasiléia-AC (90). A abordagem realizada por Rawlinson et al (2014), sobre questões de saúde pública relacionadas a recente migrações de haitianos para o Brasil e Amazonas por diferentes vias de transportes (ar, estradas, barco e a pé), mostrou que cerca de quatro a seis mil haitianos chegaram desde Brasil desde 2010 . Nesse estudo os autores abordaram a possibilidade da reintrodução da cólera e filariose linfática, doenças que estão sob controle no País e mostraram que Manaus apresenta desafios consideráveis para o controle das doenças infecciosas, devido à sua mistura dinâmica de ambientes urbanos, florestais e favelas (90). Pesquisa realizada em 2009, no Haiti mostrou que a cobertura vacinal em crianças foi de apenas 40% e houve altas taxas de infecções por malária, tuberculose, cólera e filariose linfática. Os agentes etiológicos dessas doenças podem ser reintroduzidos e/ou introduzidos em regiões onde não existe (90, 91). 42 No Brasil, uma das principais atividades tem sido em reduzir a carga de várias doenças infecciosas por programas de controle e através das altas taxas de cobertura na imunização (90) Para que se estabeleça um foco da filariose da linfática quatro fatores são necessários: 1- Quantidade de portadores de W. bancrofti; microfilárias nestes indivíduos; 2- Densidade de 3- Presença do mosquito vetor em potencial; 4 – Características individuais da população de vetores e das condições socioambientais adequadas para disseminação tanto do vetor quanto do parasito (87). O presente estudo colaborou com a investigação da frequência de imigrantes haitianos com microfilária circulante e/ou antigemina de W. bancrofti. Os métodos de diagnóstico utilizados, gota espessa de sangue, membrana de policarbonato e ICT card foram os preconizados pelo MS. Nesse estudo foi encontrado um caso positivo para microfilárias de W. bancrofti, entre os imigrantes haitianos examinados. O caso positivo recebeu tratamento imediato na Fundação de Medicina Tropical – Doutor Heitor Vieira Dourado, independentemente de sintomas. Esse dado deve ser considerado de grande importância pelos setores de Vigilância Epidemiológica de todas as Unidades Federadas onde devem se manter atentos e oportunamente atuantes para detectar e controlar precocemente todas as ocorrências, conforme orientações da Nota Técnica 09/2013 MS (Anexo 1). O caso foi notificado no setor de epidemiologia da FMT-HDV, mas o mesmo foi incluído no sistema SINAN como filariose não especifica tendo em vista que o Estado do Amazonas não possui em seu sistema a ficha de notificação para Wuchereria bancrofti . Faz-se necessário adotar a ficha de notificação para filariose linfática por Wuchereria bancrofti nas cidades onde recebem os imigrantes haitianos, a fim de registrar os casos confirmados morfologicamente. O imigrante positivo para W. bancrofti, diagnosticado no estudo apresentou carga parasitária de 9mf/mL de sangue . Estudos experimentais realizados por Brito et al (1998) mostraram que mosquitos do gênero Culex quinquefasciatus infectados com baixa parasitemia (4mf/20mL de sangue), é capaz de desenvolver larva L3. Há 43 evidências de que os indivíduos com baixa microfilaremia podem ser importante fonte de infecção para os mosquitos. Há importância epidemiológica da baixa microfilaremia, especialmente em pacientes que ainda não desenvolveram sintomas da filariose linfática (92), sendo necessários estudos complementares para definir se essa carga é capaz de induzir a formação de um novo foco da doença em Manaus. Apesar do número de parasitado ter sido de um caso positivo para W. bancrofti, há fluxo continuo de imigrantes haitianos para Manaus e muitos deles relataram não terem recebido tratamento prévio para o controle do parasito, bem como há possibilidade da chegada de novos imigrantes positivos, com maiores cargas parasitárias, o que pode aumentar a possibilidade de infecção do vetor aqui existente. É necessária a realização de estudos posteriores para certificação da eliminação do parasito Wuchereria bancrofti na cidade de Manaus. Diferentes estudos chegam a conclusões distintas sobre o risco potencial de reintrodução FL, já que a literatura é escassa e o risco é difícil de ser quantificado, sendo essencial que haja a vigilância contínua (90). As estratégias adotadas nos últimos anos para eliminação da FL no Haiti, tem um papel importante, pois é o país que apresenta maior taxa de prevalência da doença nas Américas. O MDA é uma medida que está contribuindo para diminuir a taxa de incidência na região. Foi observado no estudo que uma parcela dos imigrantes que chegaram a Manaus, participaram em alguma fase, da medida de tratamento em massa no Haiti e que mesmo através do teste imunocromatográficos e membrana de policarbonato não foi possível identificar antígeno ou parasito de W. bancrofti. Talvez por isso tenha sido encontrado no estudo somente um imigrante parasitado, mostrando que essa medida esteja sendo eficiente e eficaz ao tratamento de FL. 44 6. CONCLUSÃO Entre os imigrantes haitianos examinados foi encontrada positividade de Wuchereria bancrofti no município de Manaus –AM. Foram identificados alojamentos onde os imigrantes haitianos residem, distribuídos em diferentes bairros da cidade de Manaus-Am. O perfil dos imigrantes haitianos na cidade de Manaus-AM, em sua maioria são do gênero masculino, com faixa etária entre 28 – 32 anos, solteiros, com ensino fundamental incompleto. A carga parasitária do imigrante positivo foi considerada uma baixa parasitemia. Foram identificadas quatro rotas migratórias utilizadas pelos imigrantes haitianos para chegarem à cidade de Manaus-AM, Brasil. 45 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Fontes G. Leite AB. de Lima AR. Freitas H. Ehrenberg JP. da Rocha EM. Lymphatic Filariasis in Brazil: Epidemiological situation and outlook for elimination. Parasites & Vectors. 2012;5:272. 2. Orihel TC. Filariae. In: Animals Agents and Vectors of Human Disease (P. C. Beaver & R. C. Jung, orgs.). 1985:171-91. 3. World Health Organization. Global Programme to Eliminate Lymphatic Filariasis: Progress report on mass drug administrations in 2007. Wkly Epidemiol Rec 2008, 83(37):333–348. 2007. 4. World Health Organization. Global Programme to Eliminate Lymphatic Filariasis: Progress report on mass drug administration, 2010. Wkly Epidemiol Rec 2011, 86(35):377–388. 2010. 5. Pan American Health Organization. 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Este documento lhe fornece as informações sobre o problema de saúde em estudo, a maneira de como agir e como serão realizados os exames nesta pesquisa, assim como benefícios e riscos que poderão acontecer durante a sua participação no estudo. Você participando do estudo poderá afastar-se a qualquer momento, sem que este fato venha causar qualquer constrangimento ou penalidades por parte da Instituição de Ensino e Pesquisa. A filariose é uma doença causada por vermes, conhecidos como “filárias”, frequente em regiões tropicais. Esses parasitos podem morar em diversas partes do corpo, podendo causar febre, dores no corpo e mal-estar geral, inchaço nas pernas e braços. As filárias produzem microfilárias (embriões) que vivem no sangue, que ficam disponíveis a noite e por isso podem ser sugadas pelos mosquitos (Culex quinquefasciatus também conhecido como carapanã, muriçoca), e assim serem inoculadas, pela picada desses insetos, em pessoas sadias. Para saber se você é portador desse verme, será realizado o exame de rotina que é chamado método da gota espessa do sangue. Para isso será feito um pequeno furo na ponta do seu dedo, com auxilio de uma agulha (lanceta) e o sangue que sair será colocado em uma lâmina de vidro, que após secar será corado com um produto químico de cor azul (Giemsa) e/ou através da retirada de uma pequena quantidade de sangue da veia do seu braço será realizado o mesmo. Existem outros meios de exames para filária, porém não sabemos qual deles é melhor para ser utilizado. Meios que avaliam o número de vermes que possam existir por mililitro de sangue (Knott) e 54 métodos específicos para o exame da espécie do verme (morfológico) e de biologia molecular em que é retirado o DNA do verme para estudar as características moleculares específicas. Todos os exames que forem realizados nesse estudo serão gratuitos para você. Os pesquisadores poderão interromper sua participação a qualquer momento, por razões médicas ou técnicas onde serão fornecidos aconselhamento e orientação. Antes de assinar este TERMO, o(a) Sr(a), deve informar-se sobre o estudo não deixando de formular perguntas sobre qualquer assunto que julgar conveniente esclarecer. É importante estar ciente das seguintes informações: Benefícios: Após a realização dos exames laboratoriais se for identificado o verme em seu sangue, você receberá o tratamento específico com a medicação indicada pelo Ministério da Saúde receitada pelo médico participante do projeto. Você estará contribuindo para melhoria no diagnóstico e controle da doença no estado da Amazônia. Riscos: Durante a coleta de sangue você poderá sentir um pouco de dor mas deve parar dentro de alguns minutos. Caso a limpeza do local não seja realizada corretamente, pode ter uma inflamação, mas isto é muito raro. Os pesquisadores responsáveis pelo trabalho acompanharam todos os riscos que possam acontecer. O volume de sangue a ser coletado não representa risco para sua saúde. Após a coleta de sangue na veia do seu braço, pode acontecer um sangramento local que pode resultar em um pequeno inchaço (hematoma). Entre em contato com os responsáveis do estudo em caso de inchaço ou inflamação no local onde a agulha furou. Nestes casos, sendo necessário você receberá tratamento. A coleta de sangue será feita por pessoas com treinamento e experiência para diminuir qualquer desconforto. A sua participação neste estudo não levará a riscos futuros para a saúde. Ressarcimento/ Indenização: Participando do projeto você tem direito a ressarcimento das despesas (transporte e alimentação) que envolva a participação na pesquisa pela instituição patrocinadora caso seja necessário. Quanto à forma de indenização você tem direito, somente se ocorrer algum problema referente a qualquer procedimento relacionado a esse projeto. Sigilo dos Dados confidenciais: As amostras de sangue que estão sendo fornecida para este estudo, serão utilizadas para realização de exames (hematológicos, bioquímicos, pesquisa de hemoparasitos e biologia molecular). Se você declarar estar ciente do que foi informado nesse TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO, decidindo participar da investigação proposta, depois de ter realizado perguntas e ter recebido respostas satisfatórias sobre elas, você poderá voltar a fazer perguntas que achar necessárias a qualquer tempo. Seu consentimento permanecerá arquivado de uma forma confidencial (codificado), para proteger sua identidade. Se você concordar a amostra de sangue coletado vai ser armazenado em biorrepositório na Gerência de Parasitologia sobre a responsabilidade dos pesquisadores envolvidos no projeto, para 55 utilização em projetos futuros como melhoria de técnicas de diagnósticos morfológicos e de biologia molecular. Caso aceite participar desse estudo poderá ainda retirar essa autorização a qualquer momento sem qualquer prejuízo. Você será consultado para participar de novas pesquisas a serem realizadas com sua amostra de sangue armazenada em biorrepositório na Gerência de Parasitologia, bem como as novas pesquisas que serão submetidas as avaliações do Comitê de Ética em Pesquisa FMT-HVD. Sempre que for necessário esclarecer alguma dúvida ou quaisquer informações sobre o estudo, você deverá buscar contato com o coordenador da pesquisa EDSON FIDELIS DA SILVA JÚNIOR, no endereço: AV. PEDRO TEIXEIRA, 25, DOM PEDRO, Manaus-AM, CEP: 69040-000, na Gerência de Parasitologia, de segunda a sexta de 09:00h às 12:00h e 13:30h às 15:00h. Ou a qualquer momento, conforme necessidade, pelo telefone: (92) 9130-9085, e e-mail: [email protected]. Caso o mesmo não esteja poderá entrar em contato com a Profª. Drª. MARILAINE MARTINS, orientadora do projeto no endereço: AV. PEDRO TEIXEIRA, 25, DOM PEDRO, Manaus-AM, CEP: 69040-000, na Gerência de Parasitologia de segunda a sexta de 08:00h às 12:00h e 14:00h às 18:00h ou a qualquer momento, conforme necessidade, pelo telefone: (92) 2127 3434/ 2127 3433. Esse projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado (CEP FMT/HVD), qualquer informação sobre esse projeto procura a sala do CEP FMT/HVD, no endereço: AV. PEDRO TEIXEIRA, 25, DOM PEDRO, Manaus-AM, CEP: 69040-000. Aceito que minha amostra de sangue seja armazenada em biorrepositório para estudos futuros Não aceito que minha amostra de sangue seja armazenada em biorrepositório para estudos futuros somente para esse projeto. Nome do Voluntário:___________________________________________________________________ Assinatura:____________________________________________________ Data: _____/_____/____ Assinatura do Pesquisador: ______________________________________________________________ Impressão datiloscópica 56 Apêndice B - QUESTIONÁRIO Estudo de prevalência da Wuchereria bancrofti em imigrantes haitianos no municipio de Manaus, Amazonas - Brasil Questionário PRONTUÁRIO CÓDIGO REQUISIÇÃO Identificação do Imigrante 1. Data da Coleta: Nacionalidade H a i t i 2. Nome do Imigrante: 3. Nome da Mãe: 4. Nome do Pai: 5. Data de Nascimento: 6. Estado civil: Sexo: Solteiro(a) Casado(a) Viúvo(a) Masculino Feminino Filhos: 7. CPF/RG/Passaporte: Data da emissão: 8. Naturalidade: 9. Endereço: 10. Grau de escolaridade: Fundamental Incompleto Fundamental completo Ensino médio Incompleto Ensino médio completo Superior Incompleto Superior completo Não Alfabetizado 11. Profissão: 12. Rota Migratória: HAITI REPÚBLICA DOMINICANA EQUADOR PERU PANAMÁ BRASIL 13 Tomou algum medicamento para fiariose no Haiti: COLÔMBIA Outro país Sim Não Qual ano: Exames Laboratoriais 13. Foram coletadas 2 lâminas: Sim Não 14.Foram coletados 2 tubos de sangue: Sim 15. Resultado preliminar da gota espessa: Negativo Wuchereria bancrofti Outra filária 16. Resultado de ITC Card: Negativo Não realizado Positivo 17. Resultado da Membrana Filtrante: Positivo 18. Hemograma realizado: Não Assinatura do Voluntário: Assinatura do pesquisador: Sim Negativo Não realizado Não 57 Apêndice C – CIDADES PARA ONDE MIGRAM OS HAITIANOS QUANTO SAEM DE MANAUS RIO GRANDE DO SUL Ana Rech Canoas Encantado Estrela Garibaldi Marau Nova Roma Rio Grande Porto alegre Serafina Correa Três de maio Antônio Prado Carlos Barbosa Erechim Farroupilha Gravataí Nova Bassano Paraí Santa Clara Venâncio Aires Bento Gonçalves Caxias do Sul Espumoso Flores da Cunha Lajeado Nova Prata Passo Fundo Sarandi Vila Maria PARANÁ Arapongas Cândido Rondon Cianorte Londrina Marmeleiro Campo Largo Cascavel Curitiba Maringá SÃO PAULO Campinas Guarulhos Rio Claro São Paulo Cidades do ABC Jundiaí São José do rio Preto SANTA CATARINA Florianópolis Joinvile Tubarão Chapecó Rio do Oeste RIO DE JANEIRO Angra dos Reis BELO HORIZONTE Uberlândia TOCANTINS Gurupi Rio de Janeiro 58 ANEXO 1 – NOTA TÉCNICA - ORIENTAÇÕES QUANTO A VIGILÂNCIA DA FILARIOSE LINFÁTICA MINISTÉRIO DA SAÚDE SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE DEPARTAMENTO DE VIGILÂNCIA DAS DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS COORDENAÇÃO-GERAL DE HANSENÍASE E DOENÇAS EM ELIMINAÇÃO Setor Comercial Sul, Quadra 04, Bloco A, Edifício Principal, 3º Andar, Sala s/nº 70.304-000 - Brasília-DF Tel. (61) 3213.8205 / 3213.8189 NOTA TÉCNICA Nº 09/2013/CGHDE/DEVEP/SVS/MS Assunto: Orientações quanto à Vigilância da Filariose Linfática. Devido às suas características epidemiológicas, a Filariose Linfática (FL) é uma das doenças com potencial para eliminação. Em decorrência desta situação, a Organização Mundial da Saúde (OMS), na 5ª Assembléia ocorrida em 1997, conclamou os países endêmicos para a adoção do Plano Global de Eliminação da Filariose Linfática (PGEFL). Na região das Américas, Brasil, Guiana, Haiti e República Dominicana ainda apresentam focos ativos da doença. Estes quatro países aderiram ao PGEFL, o que implica em possuírem adequados serviços de diagnóstico, tratamento e vigilância epidemiológica. Atualmente considera-se que no Brasil a área com transmissão de FL seja urbana e nitidamente focal. Casos da doença têm sido detectados apenas em quatro municípios da Região Metropolitana de Recife/PE: Jaboatão dos Guararapes, Paulista, Olinda e Recife, o que torna possível o alcance da meta de eliminação da Filariose Linfática no país até 2015. Para o controle de novos focos é necessária uma vigilância efetiva que garanta a investigação precoce e tratamento rápido dos casos, em razão da possível migração de doentes provenientes de outros países, bem como da migração interna no Brasil. O objetivo desta nota é orientar para a rápida e adequada detecção, tratamento e cura de casos eventualmente comprovados em áreas até então indenes. Os setores de Vigilância Epidemiológica de todas as Unidades Federadas devem se manter atentos e oportunamente atuantes para detectar e controlar precocemente 59 todas as ocorrências. Para tanto, é necessário que sejam realizadas as ações descritas a seguir para diagnóstico, tratamento e avaliação de cura. 1. Diagnóstico1: Técnica da gota espessa (GE) Uma característica deste parasito é a periodicidade noturna das microfilárias no sangue periférico do hospedeiro. O pico da parasitemia periférica coincide, na maioria das regiões, com o horário preferencial de repasto do vetor (entre 23h00 e 01h00 da manhã). Durante o dia, essas formas se localizam nos capilares profundos, principalmente nos pulmões e, durante a noite, aparecerem no sangue periférico, com maior concentração em torno da meia-noite, decrescendo novamente até o final da madrugada, conforme demonstrado na figura abaixo. Figura 1: Curva de periodicidade das microfilárias de Wuchereria bancrofti no sangue periférico do hospedeiro humano. Fonte: Fontes, Rocha, 2005 Horário ideal para coleta: entre 23h00 e 1h00 da manhã. Material biológico: sangue capilar. Modo de coleta: recomenda-se que a punção seja realizada no dedo anelar, preferencialmente da mão esquerda para os indivíduos destros, e vice-versa (vide o manual – nota de rodapé 1). • Com o profissional de saúde sentado e o paciente em pé, procede-se a limpeza do local a ser puncionado com algodão hidrófilo embebido na solução desinfetante (álcool a 70%; álcool isopropilico70 %; álcool iodado a 0,1 %; entre outros); • Utilizando-se lancetas descartáveis, realizar a punção que deve ser feita de forma rápida e precisa, na borda lateral da extremidade digital e nunca diretamente na polpa digital; • Deixar fluir três gotas grandes de sangue, correspondendo a aproximadamente a 60μl em uma lâmina sobre uma superfície plana e nivelada; 60 • Imediatamente espalham-se as gotas de sangue com a extremidade da própria lanceta utilizada para punção, formando um retângulo homogêneo de bordas regulares. O espalhamento sanguíneo devera ter uma espessura que permita uma boa visualização após o processamento. • Devem ser feitas, no mínimo, 2 lâminas para cada pessoa. Figura 2: Sequência de passos para coleta sanguínea e confecção das lâminas. Fonte: Brasil, 2009 Após a coleta deve-se deixar o sangue secar sobre a lâmina, ao abrigo de insetos e poeira, até que as bordas estejam secas. Não é aconselhado o uso de ventilador e nem estufa para acelerar o processo de secagem. As lâminas após secas devem ser acondicionadas em caixas de madeira ou similar e enviadas para exame até o máximo de 24 horas após a coleta. Para a identificação da amostra na lâmina, colocam-se pelo menos os seguintes dados: nome e sobrenome da pessoa, data e horário da coleta. O volume de sangue correto (aproximadamente 60μl) bem como o horário da coleta, são pontos importantes, que devem ser respeitados para a obtenção de um diagnóstico correto. A não observação dessas duas recomendações poderá acarretar um resultado Falso Negativo do exame. Todos os indivíduos microfilarêmicos, deverão realizar a identificação morfológica do parasito (classificação da espécie filarial) antes do tratamento específico. Este procedimento poderá ser realizado por meio do encaminhamento de material biológico para o Laboratório do Serviço de Referência Nacional em Filarioses (SRNF) Centro de Pesquisas Aggeu Magalhaes (CPqAM). 1. Tratamento1: Para os casos em que a presença do parasito é detectada, o tratamento antifilarial específico deve ser adotado, com vistas a debelar a infecção. Para tanto, a droga de escolha é a Dietilcarbamazina. No período pré-tratamento deve-se realizar a quantificação da carga parasitária, por meio da coleta do sangue venoso (sangue total com EDTA), através da técnica de filtração em membrana de policarbonato, bem como o seguimento do antígeno 61 circulante filarial por meio dos testes de AD12 (cartão ICT) e Og4C3-ELISA (coleta de soro). Para esta análise a amostra de sangue deverá ser encaminhada para o SRNF/CPqAM. Dietilcarbamazina (DEC) A DEC é um derivado da piperazina utilizada atualmente no Brasil, na forma de comprimidos de 50mg da droga ativa. Sua administração é por via oral e apresenta rápida absorção e baixa toxicidade. Esta droga tem efeito micro e macro filaricida, com redução rápida e profunda da densidade das microfilárias no sangue. O esquema padrão de tratamento com DEC, recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), é de 6mg/Kg/dia por 12 dias, podendo-se dividir a dose total diária em três subdoses. Porém, deve-se evitar sua administração em crianças com menos de dois anos de idade e gestantes. Se indicado, a solicitação desse medicamento deverá ser feita pela Secretaria Estadual de Saúde, via sistema SIES – Sistema de Informação Insumos Estratégicos. 1. Controle de Cura: O seguimento de cura deverá ser monitorado por meio de 10mL de sangue venoso coletado no horário de pico de parasitemia e analisado pela técnica de filtração em membrana de policarbonato nos períodos de 30 e 90 dias após o tratamento com a DEC. Para esta análise a amostra de sangue deverá ser encaminhada para o SRNF/CPqAM. Brasília, 02 de julho de 2013. Rosa Castália França Ribeiro Soares Coordenadora-Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação De acordo. Em / / Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis 62 Contatos: ·CGHDE/DEVEP/SVS/MS Coordenação-Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis/Secretaria de Vigilância em Saúde Endereço: Setor Comercial Sul, Quadra 4, Bloco A, Ed. Principal, 3º andar Brasília/DF CEP: 70.304-000 Fone: 61 3213-8205, fax 3213-8233/[email protected] · SRNF/CPqAM/ Fiocruz-PE Serviço de Referência Nacional em Filarioses Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães Departamento de Parasitologia Endereço: Av. Moraes Rego s/n, Campus da UFPE, Cidade Universitária – Recife/PE. CEP: 50.670-420 Fone: 81 2101-2575, fax 2101-2671