A QUIMIOTERAPIA
Guia prático
Com este manual pretendemos prestar informações e esclarecimentos ao doente oncológico,
referenciado ao Serviço de Oncologia Médica.
Abordamos também conceitos básicos sobre o cancro e o seu tratamento, nomeadamente
a quimioterapia e focamos aspectos de carácter prático para que se sinta familiarizado com
a sua situação oncológica, quando comparecer à primeira consulta de oncologia médica.
Esta informação é muito geral e destina-se a promover a comunicação com o médico e a
equipa que segue o doente, para uma melhor compreensão da doença e do tratamento que
irá efectuar e facilitar uma boa adesão à terapêutica.
É natural que ao longo do tratamento surjam dúvidas. Pode contar sempre com a nossa
disponibilidade para o ouvir e esclarecer.
Esperamos que esta informação lhe seja útil, agradecendo desde já a sua opinião e as sugestões
que achar oportunas.
Esperamos que se sinta bem no nosso serviço e desejamos um rápido restabelecimento da
sua saúde.
A Directora do Serviço de Oncologia Médica
Maria Helena Gervásio
Existem outros tratamentos para o cancro?
Compreender o cancro e a quimioterapia
O corpo humano é constituído por órgãos e tecidos, que por sua vez são formados por
pequenas unidades a que chamamos células. A sua reprodução, numa pessoa em perfeito
estado de saúde, efectua-se de uma maneira regular e harmoniosa.
Por vezes, este processo de reprodução é perturbado, havendo um crescimento descontrolado de células, que não desempenham correctamente as suas funções. Este grupo de
células anormais é denominado, vulgarmente, como cancro ou tumor.
Todos os tipos de cancro são tratáveis, embora nem todos sejam curáveis. O tratamento do
cancro exige uma abordagem multidisciplinar, integrada por uma equipa de vários especialistas, por exemplo, cirurgião, radioterapeuta, oncologista, etc.
A quimioterapia é o tratamento com medicamentos chamados citostáticos, que actuam
nas células malignas, de modo a destruir o tumor, a impedir o seu crescimento e/ou a sua
disseminação pelo organismo.
A quimioterapia pode ser feita com um só medicamento ou vários medicamentos associados, que actuam por diferentes mecanismos na destruição do tumor e na diminuição da
sua resistência ao tratamento. A escolha dos medicamentos depende das características do
tumor (o tipo de tumor, “comportamento”, localização e extensão), assim como das características do doente (idade, existência de outras doenças, estado funcional do organismo,
etc), pretendendo-se sempre que possível um tratamento personalizado.
O oncologista é o médico que trata o doente com cancro através da quimioterapia, embora
o possa fazer também com outros medicamentos. É da sua responsabilidade o estudo do
doente oncológico, a avaliação da indicação e a verificação das condições do doente, para
o tratamento da sua doença por quimioterapia.
Como o cancro é uma doença que exige a abordagem por várias especialidades, o seu
tratamento é igualmente multidisciplinar, não passando apenas pela quimioterapia, mas
englobando várias modalidades.
A cirurgia é um tratamento local que consiste na remoção do tumor através de uma operação.
Esta pode ser total, quando o tumor é retirado na sua totalidade, ou parcial, quando só é
possível retirar apenas uma parte dele, por contactar com estruturas importantes que não
podem ser danificadas.
A radioterapia é um tratamento loco-regional que utiliza radiações de alta energia, para matar
as células cancerosas. As radiações podem ser emitidas por uma máquina (radiação externa) ou
por um aparelho colocado dentro do tumor ou na sua proximidade (radiação interna).
A quimioterapia é um tratamento sistémico e não local, isto é, os medicamentos circulam
na corrente sanguínea, percorrendo todo o organismo, destruindo assim as células malignas
que se encontram distantes do local de origem do tumor. A quimioterapia pode ser feita
antes ou depois do tratamento local com cirurgia e/ou radioterapia, ou pode ser feita,
simultaneamente, com a radioterapia.
Qual é a finalidade de quimioterapia?
O tratamento por quimioterapia actua, fundamentalmente, destruindo as células tumorais
e impedindo a sua reprodução. Assim, dependendo do tipo de tumor e do seu estádio de
desenvolvimento, a quimioterapia pode ser utilizada com as seguintes finalidades:
Curar a doença;
Estabilizar a doença;
Impedir a disseminação da doença;
Aliviar os sintomas causados pelo tumor.
Como pode ser administrada a quimioterapia?
A vida do doente altera-se?
A maioria dos tratamentos de quimioterapia é feita por via endovenosa, podendo ser administrados por um sistema de soros directamente na veia ou através de um catéter com
câmara, colocado por baixo da pele, na região torácica, permitindo o acesso contínuo a
uma veia de grande calibre.
Pode continuar a ter uma vida normal. Muitas pessoas conseguem conciliar o tratamento
com as suas actividades normais. No entanto, outras pessoas têm necessidade de reduzir o
seu ritmo de vida, aproveitando este período para descansar, o que às vezes se torna necessário visto que o tratamento pode fazê-lo sentir-se um pouco debilitado.
No entanto, existem outras formas de administrar a quimioterapia:
Via oral - a administração é feita através de cápsulas ou comprimidos;
Via intra-tecal - a administração é feita por injecção de medicamentos no canal medular
(localizado na coluna vertebral);
Intra-arterial - a administração do medicamento é feita directamente numa artéria;
Intra-cavitária - a administração é feita para dentro de uma cavidade, como o tórax, abdómen,
bexiga ou pleura;
Intra-lesional - a administração do medicamento é feita directamente no interior do tumor;
Tópica - aplicação directa da substância na zona tumoral, por exemplo, na pele.
Porém, não deve ficar excessivamente preocupado com a falta de força durante a quimioterapia, pois para além de ser um efeito absolutamente normal, pode aproveitar para se
dedicar a actividades que, não requerendo muito esforço, goste de fazer.
Procure trocar impressões com o médico oncologista e/ou enfermeiro no sentido de saber
se as actividades a que gosta de se dedicar são compatíveis com o seu tratamento.
Qual a duração do tratamento?
A duração do tratamento é variável consoante o tipo de tumor e o tipo de tratamento de
quimioterapia prescrito pelo seu médico oncologista.
O esquema de quimioterapia e a sua duração depende, por um lado, das doses dos medicamentos a administrar e eventuais combinações com outros tratamentos (por exemplo,
cirurgia ou radioterapia) e, por outro lado, das condições de saúde do doente.
Os esquemas de quimioterapia utilizados no Serviço de Oncologia Médica do I.P.O.F.G,
C.R.O.C – S.A. são, normalmente, actualizados segundo as normas internacionais para o
tratamento das doenças oncológicas.
É sempre necessário ser internado?
Nem sempre é necessário o internamento do doente. Muitos doentes fazem quimioterapia
em regime de Hospital de Dia e outros fazem os tratamentos em casa.
Por vezes, o tipo de quimioterapia que irá efectuar exige internamento, que pode ter uma
duração variável, dependendo dos tratamentos a efectuar.
Podem ser tomados outros medicamentos?
Se está a tomar outra medicação e vem pela primeira vez à consulta de oncologia médica,
deve comunicá-lo ao médico, informando-o do nome dos medicamentos, doses e frequência de administração. É importante que o faça, pois alguns medicamentos podem interferir
com os efeitos da quimioterapia.
Para além da medicação farmacológica é também importante alertar o médico sobre o uso de
produtos de ervanária e/ou medicinas alternativas, de modo a ser aconselhado nesse aspecto.
Se tiver necessidade de tomar qualquer medicamento em casa, não o faça por iniciativa
própria. Contacte o médico oncologista que o segue ou o seu médico de família.
Alguns medicamentos são fornecidos, gratuitamente, aos doentes oncológicos pelo hospital.
A alimentação
Aspectos psicológicos
É muito importante manter um bom estado nutricional durante o tratamento de quimioterapia, através de uma dieta equilibrada que contenha alimentos indispensáveis para as
necessidades corporais (carne, peixe, fruta, hortaliça, cereais) para ajudar a regeneração da
pele, cabelo, músculos e órgãos.
O diagnóstico de um cancro e o tratamento com quimioterapia implicam algumas alterações na
sua vida, que se reflectem nas rotinas diárias e no relacionamento com familiares e amigos. Pode
sentir ansiedade, ter alterações de humor (por ex. tristeza, melancolia, irritabilidade).
É importante também que beba muitos líquidos para manter um funcionamento renal adequado durante o tratamento.
Estas alterações são muito importantes, merecem especial atenção e podem exigir o apoio
de uma equipa alargada de profissionais (médico, enfermeiro, psicólogo, assistente social)
e da própria família.
As bebidas alcoólicas podem interferir com o tratamento de quimioterapia. O médico assistente
esclarece sobre esta matéria.
O que poderá sentir durante o tratamento?
É natural que antes de iniciar o tratamento se sinta apreensivo. Conversar com o médico ou
o enfermeiro sobre o que o preocupa pode ser uma boa ajuda.
A sexualidade
O tratamento de quimioterapia, pode causar um declínio no interesse sexual, umas vezes
provocado pelo stresse emocional e físico inerente à doença e ao tratamento, outras vezes
pela fadiga e alterações hormonais provocadas pela quimioterapia.
O tratamento por quimioterapia não é mais doloroso do que uma simples injecção. Se for
administrado por via endovenosa, é natural que as suas veias se tornem mais sensíveis, podendo ficar mais endurecidas e dolorosas. Se isto acontecer, fale com o médico ou enfermeiro.
Deve informar, imediatamente, o médico ou enfermeiro no caso de sentir dor, sensação de
queimadura ou formigueiro durante o tratamento.
É difícil falar sobre este assunto, mas é muito importante expô-lo ao médico oncologista
que providencia o apoio necessário.
Principais efeitos da quimioterapia
e como reduzi-los
A gravidez
Durante a quimioterapia a gravidez é possível, mas não é aconselhável e deve ser eficazmente evitada, porque alguns citostáticos podem causar alterações no feto.
Se o cancro é diagnosticado durante a gravidez, a quimioterapia pode ser adiada até ao nascimento
do bebé ou iniciada à 12ª semana de gestação. Caso se trate de uma situação em que é urgente
iniciar o tratamento por quimioterapia, pode ser considerada a interrupção da gravidez.
Pode planear uma gravidez após conclusão da quimioterapia. O médico oncologista aconselha sobre esta matéria.
A quimioterapia pode causar alterações no seu organismo que são temporárias. Os benefícios que se espera obter com o tratamento compensam os eventuais incómodos.
Os efeitos secundários provocados pela quimioterapia nem sempre são sentidos por todos
os doentes e a sua intensidade varia de pessoa para pessoa e com o tipo de quimioterapia.
Alguns efeitos surgem numa fase inicial, enquanto outros só se revelam numa fase mais
avançada do tratamento.
É importante informar o seu médico sobre o aparecimento de novos sintomas para que
possa ser ajustada a sua medicação.
A lista de efeitos que a seguir descrevemos não deve preocupá-lo em excesso. As recomendações que fazemos não substituem a ajuda do seu médico assistente.
EFEITOS DO TRATAMENTO E RECOMENDAÇÕES
2 -CABELO, PELE E UNHAS
A quimioterapia pode, em certos casos, levar à queda de cabelo.
1 - SISTEMA DIGESTIVO
É frequente surgirem náuseas ou vómitos na sequência do tratamento, mas existem medicamentos disponíveis que permitem ultrapassar estas situações. Evite, também, comer
refeições pesadas, imediatamente antes ou depois do tratamento.
Pode sentir a boca dolorosa e inflamada. É muito importante manter uma boa higiene oral,
de maneira a reduzir o risco de infecções. Se tiver feridas na boca, use uma escova macia
e evite alimentos condimentados ou excessivamente quentes ou frios. O seu médico e/ou
enfermeiro têm, certamente, mais sugestões a dar.
Este efeito preocupa os doentes, mas é temporário. O uso de lenço ou cabeleira ajudam a
ultrapassar este incómodo. O Serviço Social da instituição dá-lhe informação a este respeito.
Também podem surgir alterações da cor das unhas ou unhas mais quebradiças.
Pode notar alterações da cor da pele ou irritação, sobretudo se usar roupa ajustada. Esta
última reacção pode aparecer na zona onde lhe foi introduzida a agulha se está a fazer
quimioterapia por via endovenosa.
Se sentir ardor na pele durante a injecção ou dor durante o tratamento, alerte o médico ou
o enfermeiro.
Algumas pessoas notam alterações do cheiro e do paladar. Constituem efeitos temporários
que podem ser ultrapassados.
Podem ainda surgir alterações intestinais: diarreia ou prisão de ventre. Se sentir alguns destes efeitos fale com o seu médico, pois algumas medidas dietéticas e medicação de suporte
ajudam a diminuir estes efeitos.
Faça um esforço por se alimentar bem, mesmo que sinta pouco apetite.
Algumas sugestões:
Faça refeições ligeiras e frequentes;
Procure comer os alimentos que mais lhe agradam desde que não prejudiquem a sua saúde;
Coma devagar e mastigue bem os alimentos, para facilitar a sua digestão;
Evite o excesso de açúcar e gorduras;
Beba muitos líquidos.
podem surgir alterações nas unhas
uso de lenço ou cabeleira ajudam a
ultrapassar este incómodo
pode notar alterações na pele
Se sentir ardor na pele durante a injecção ou dor durante
o tratamento, alerte o médico ou o enfermeiro.
3 - ALTERAÇÕES SANGUÍNEAS
4 - FADIGA
A medula óssea, localizada no interior dos ossos, é o órgão onde são fabricadas as células
que constituem o sangue:
os glóbulos vermelhos, responsáveis pela oxigenação dos tecidos;
os glóbulos brancos, responsáveis pela defesa contra as infecções;
as plaquetas, responsáveis pela coagulação e prevenção de hemorragias.
A fadiga é um dos efeitos mais comuns da quimioterapia. Pode variar, desde uma sensação
de cansaço muito ligeira a uma sensação de falta de forças e incapacidade forte para a realização de actividades da vida diária que antes executava sem dificuldade.
A quimioterapia provoca a destruição de parte das células da medula óssea, diminuindo, assim, a produção das células sanguíneas, podendo levar à anemia, à infecção e às hemorragias.
Algumas recomendações em relação à fadiga:
Descansar durante vários períodos ao longo do dia;
Realizar, regularmente, alguns exercícios leves;
Manter uma alimentação equilibrada e uma ingestão abundante de líquidos;
Limitar as suas actividades e pedir ajuda aos familiares e amigos na realização das tarefas.
A anemia é provocada pela diminuição do número de glóbulos vermelhos e pode manifestar-se por fadiga, tonturas, respiração rápida, tendência a sentir frio.
As infecções, devidas à diminuição dos glóbulos brancos, podem surgir em qualquer parte
do organismo e o seu risco pode ser reduzido através de algumas medidas de higiene, tais
como: lavagem frequente das mãos, evitar alimentos crus ou confeccionados em locais públicos, não partilhar objectos de uso pessoal e manter uma boa higiene oral e corporal.
A fadiga tende a ser mais acentuada no início e no fim de cada tratamento de quimioterapia, mas tende a desaparecer após ter concluído os tratamentos.
Os problemas de coagulação e hemorragias são devidos à diminuição do número de plaquetas
e podem manifestar-se de diferentes formas: perda de sangue não explicada ou provocada pelo
esforço (pela urina, fezes, boca, nariz, etc), ou pelo aparecimento de pequenos pontos vermelhos na pele. Nestas situações, deve ter em conta as seguintes recomendações:
Evitar a ingestão de bebidas alcoólicas;
Usar uma escova de dentes suave;
Evitar agressões da pele (depilação, fazer a barba);
Evitar traumatismos e queimaduras;
Evitar desportos ou actividades violentas;
Evitar a administração de anti-inflamatórios não esteróides.
5 - ALTERAÇÕES RENAIS
Alguns tratamentos de quimioterapia podem irritar a bexiga ou causar lesão renal permanente ou temporária e provocar alterações na cor e no cheiro da urina.
O seu médico assistente informa se a quimioterapia pode provocar estas alterações.
Avise o seu médico se notar algumas das seguintes alterações:
Dor ou ardor ao urinar;
Urinar muito frequentemente;
Presença de sangue na urina;
Febre ou calafrios.
É muito importante beber uma quantidade abundante de líquidos (pelo menos 2 lt. de água
por dia), de modo a permitir um bom funcionamento renal.
6 - FERTILIDADE
O que são ensaios clínicos?
A quimioterapia pode trazer algumas alterações na fertilidade e algumas preocupações
devem ser esclarecidas com o seu médico assistente.
A investigação médica evolui constantemente e tem reflexos significativos em oncologia
médica, com o aparecimento, muito frequente, de novos medicamentos e novas formas de
tratamento que necessitam ser avaliados. Estas avaliações são efectuadas através de ensaios
clínicos.
No entanto, adiantamos algumas informações que podem antecipar a resposta a algumas dúvidas.
Os doentes podem participar nestes ensaios desde que dêem o seu consentimento, com
base em informação pormenorizada do seu médico (riscos, benefícios, seguro, etc).
Na Mulher:
Na mulher, a quimioterapia pode provocar irregularidades menstruais e, inclusivamente,
pode haver paragem da menstruação durante o tratamento.
Pode ter sintomas semelhantes aos da menopausa, como calores, rubor facial, secura vaginal e outros. Pode haver também maior propensão para infecções vaginais.
Pode perturbar a fertilidade, mas este efeito depende do tipo de quimioterapia, da sua dose
e da idade da doente.
Evite a gravidez durante o período de tratamento por quimioterapia. Se por acaso já estiver
grávida, informe o médico assistente. Após os tratamentos, não há qualquer impedimento
para que possa engravidar.
No Homem:
No homem, a quimioterapia pode provocar uma produção menor ou alterada de espermatozóides e, consequentemente, uma diminuição da fertilidade. É importante discutir este
aspecto com o médico antes do início da quimioterapia, pois consoante o caso, pode ser
considerada uma colheita de esperma, para utilização futura.
A alteração dos espermatozóides pode permanecer algum tempo após a quimioterapia.
Não é aconselhável gerar uma criança quer durante o período de tratamento, quer durante
alguns meses após o tratamento.
ABRIL 2005
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Guia Prático de Quimioterapia