MINISTÉRIO PÚBLICO: ATUAÇÃO E LIMITES
Laura Beghine Claudiano
INTRODUÇÃO
O presente trabalho possui o escopo de analisar a instituição do
Ministério Público em todos os seus aspectos, desde a sua criação até a
sua “fiscalização”, realizada pelo recém criado Conselho Nacional do
Ministério Público.
Tendo sua origem na França, como os “Procuradores do Rei”, o
Ministério Público somente foi instituído no Brasil, como órgão de
cooperação governamental, com a Carta Maior de 1934. Porém o seu
status atual somente foi adquirido com o Constituinte de 1988, que o
colocou em capítulo próprio, determinando que tal instituição é função
essencial à Justiça.
Decorrente de tal tratamento tem-se que o Ministério Público é
permanente e essencial à atividade judiciária do Brasil. Suas funções
estão elencadas no artigo 129 da Constituição Federal de 1988. Dentre
eles, podemos citar a titularidade da ação penal pública, a defesa da
população indígena e também a defesa dos direitos da coletividade, que
serão pormenorizados a diante.
Como aos membros da magistratura, aos do Ministério Público
são conferidas mesmas garantias (inamovibilidade, irredutibilidade de
subsídios e vitaliciedade). Além de tais garantias, a própria Constituição
determina princípios inerentes ao Ministério Público, sendo eles:
indivisibilidade, independência funcional, unidade, autonomia funcional e,
finalizando, o princípio do promotor natural.
Por fim, a instituição do Ministério Público compreende o
Ministério Público da União, composto pelo Ministério Público dos
Estados, Federal, Militar, do Trabalho e do Distrito Federal e Territórios.
Sua chefia é composta pelo Procurador-Geral da República e pelos
Procuradores-Gerais de Justiça.
1. Conceito
Conceitua-se a instituição do Ministério Público, de acordo com o
artigo 127 da Constituição Federal do Brasil, como “instituição
permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a
defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais
e individuais indisponíveis”.
2. Origem e desenvolvimento histórico
Apesar de haver grande divergência doutrinária acerca da origem
do Ministério Público, a corrente mais pacífica é aquela que determina sua
origem na França, através dos “procuradores do Rei”, mencionados na
Ordenação Francesa de 1302. Como instituição o Ministério Público
surgiu, também na França, com a denominação de “parquet”1,
nomenclatura utilizada devido ao fato de que os membros do mesmo não
permaneciam em um piso elevado, como os juízes, durante uma
audiência. Tal situação nos lembra que, ao ficarem no “parquet”
demonstrava que o promotor ficava junto ao povo, de quem era defensor e
não à aristocracia.
Segundo Ricardo Rodrigues Gama, “o Ministério Público foi
introduzido no Brasil pelo direito lusitano, por meio das Ordenações do
Reino. A Constituição de 1924 não dispõe sobre o Ministério Público. Em
1828, por lei ordinária, foi criado o cargo de promotor de Justiça, o qual
acompanharia as relações jurídicas junto às comarcas. A Constituição de
1891 não dispensou atenção merecida à organização do Ministério
Público, limitando-se à nomeação do procurador-geral da República dentre
os membros do Supremo Tribunal Federal”2.
A Constituição de 1934 instituiu o Ministério Público como órgão
de cooperação nas atividades governamentais, sendo assim, parte do
Poder Executivo. Já na Magna Carta de 1937, não houve alteração
substancial no que tange à instituição do Ministério Público, somente
possibilitou a nomeação do procurador-geral da República pelo presidente
da República. Já a Lei Maior de 1967 integrou o Ministério Público ao
capítulo “Do Judiciário”, mas com a Emenda Constitucional n. 1/1967,
retornou ao Capítulo “Do Executivo”.
Porém foi com o Constituinte de 1988 que o Ministério Público foi
realmente organizado, sendo regulado em um capítulo à parte,
denominado “Das Funções Essenciais à Justiça”. Com isso, determina-se
uma instituição com autonomia funcional, ou seja, independente de
qualquer outro poder.
2
3. Princípios Constitucionais
Segundo Kildare Gonçalves Carvalho, “diz a Constituição Federal
que são princípios constitucionais3 do Ministério Público a unidade, a
indivisibilidade e a independência funcional, assegurada a autonomia
funcional e administrativa”4. Tais princípios encontram-se previstos no
artigo 127, parágrafo 1º, da Constituição Federal.
3.1 Unidade
O princípio da unidade diz respeito ao fato de ser o Ministério
Público “uno” como instituição. Entretanto, é inegável que a existência do
Ministério Público na esfera da União e do Ministério Público na esfera
dos Estados-membros, leva-nos à constatação que haverá unidade dentro
de cada um desses órgãos do Ministério Público, sem que haja a
subordinação ou até mesmo relação funcional entre eles. Desta forma, o
Ministério Público da União abrange o MP Federal, do trabalho, militar e
do Distrito Federal e territórios, todos chefiados pelo procurador-geral da
República, conservando, cada um deles sua unidade.
Cada Estado-Membro possui o seu Ministério Público, chefiado
pelo respectivo procurador-geral de Justiça, inexistindo qualquer relação
entre eles, embora todos façam parte da mesma Instituição em sentido
amplo.
3.2 Indivisibilidade
Tal princípio encontra-se previsto no artigo 127, parágrafo 1º, da
Constituição Federal e constitui no fato da Instituição do Ministério Público
possuir unidade, ou seja, ser única. Em conseqüência deste princípio temse que pode haver a substituição de um membro do Ministério Público em
um mesmo processo sem que haja nenhum prejuízo.
De acordo com Emerson Garcia, o princípio em estudo apresenta
“uma relação de continência com o da unidade”5, pois a instituição do
Ministério Público se apresenta como una e indivisível. A indivisibilidade
indica, ainda, que o posicionamento adotado por um de seus membros
vinculará toda a instituição6.
3.3 Independência ou autonomia funcional
Infere-se de tal princípio que cada membro do Ministério Público
possui total liberdade para a formação de seu convencimento técnico, não
sendo vinculado a nenhum outro órgão estatal, nem mesmo à vontade de
3
seus superiores hierárquicos. Porém vale lembrar que esta liberdade de
convencimento não é absoluta, devendo, assim, estar consoante com as
leis vigentes no país.
Com relação à autonomia, vale lembrar que, segundo Kildare
Gonçalves Carvalho, “não fala a Constituição expressamente em
autonomia orçamentária e financeira, restando, pois a controvérsia.
Entende, contudo, Hugo Nigro Mazzilli que o Ministério Público dispõe de
tal autonomia, que é inerente aos órgãos funcionalmente independentes”7.
Tal autonomia encontra-se estatuída no artigo 3º da Lei
8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público): “Ao Ministério
Público é assegurada autonomia funcional, administrativa e financeira...”.
3.4 Princípio do promotor natural
De acordo com Celso Spitzcovsky, “este princípio proíbe as
designações casuísticas efetuadas pela chefia da instituição com a
criação da figura do promotor de exceção. Desta forma, objetiva-se
garantir a imparcialidade da instituição, tanto em sua defesa como da
sociedade que representa”8.
4. Garantias
Aos membros do Ministério Público são asseguradas as mesmas
garantias conferidas à magistratura. Sendo elas: a vitaliciedade, a
inamovibilidade e a irredutibilidade de subsídios9.
4.1 Vitaliciedade
Consiste tal garantia no fato de que, após dois anos de exercício
do cargo dentro da instituição do Ministério Público, tal membro não pode
perdê-lo, senão em face de sentença judicial transitada em julgado.
Conforme o artigo 38 parágrafo 1º da Lei n.º 8625/1993 (Lei
Orgânica Nacional do Ministério Público) tem-se o seguinte:
“O membro vitalício do Ministério Público somente perderá o
cargo por sentença judicial transitada em julgado, proferida em ação civil
própria, nos seguintes casos:
4
I — prática de crime incompatível com o exercício do cargo, após
decisão judicial transitada em julgado;
II — exercício da advocacia;
III — abandono do cargo por prazo superior a trinta dias
corridos”.
4.2 Inamovibilidade
O membro do Ministério Público não pode ser removido ou até
mesmo promovido senão por iniciativa própria, “salvo por motivo de
interesse público e diante de decisão de ordem de colegiado competente
do Ministério Público, por voto de dois terços dos seus membros,
assegurada ampla defesa”10. Caso se trate do Ministério Público da
União, o órgão competente para tal deliberação é o “Conselho Superior no
Respectivo Ramo”11.
A inamovibilidade é importantíssima para assegurar o princípio da
autonomia funcional, ficando o membro do Ministério Público livre para
exercer suas funções sem temer ser removido contra a sua vontade.
4.3 Irredutibilidade de subsídios
Sendo pressuposto da independência dos membros do Ministério
Público, a irredutibilidade de subsídios representa a impossibilidade do
mesmo haver seus vencimentos diminuídos, por constituir direito
adquirido. Porém vale lembrar que tais subsídios estão sujeitos a
impostos, inclusive ao Imposto de Renda.
5. Vedações
A própria Constituição Federal, ao dispor acerca do Ministério
Público, além de garantias e princípios institucionais arrola também
vedações aos membros do Ministério Público, sendo elas: (i) receber, a
qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou
custas processuais; (ii) exercer a advocacia; (iii) participar de sociedade
comercial, na forma da lei; (iv) exercer, ainda que em indisponibilidade,
qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; (v) exercer
atividade político-partidária; (vi) receber, a qualquer título ou pretexto,
auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou
privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; (vii) exercer a
5
advocacia ou juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três
anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração”12.
6. Organização
A instituição do Ministério Público é composta pelo Ministério
Público da União e Ministério Público dos Estados13.
6.1 Ministério Público da União
Tal vertente do Ministério Público abrange:
I — o Ministério Público federal;
II — o Ministério Público do Trabalho;
III — o Ministério Público militar;
IV — o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
Seguindo o pensamento de Pinto Ferreira, “o Ministério Público
da União tem por chefe o procurador-geral da República, nomeado pelo
presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e
cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos
membros do Senado federal, para mandato de dois anos, permitida a
recondução”14.
Vale ressaltar que a destituição o procurador-geral da República
também será indicada pelo Presidente da república e deverá possuir votos
da maioria absoluta do Senado.
Já no Distrito Federal e nos territórios, é eleito um procuradorgeral de Justiça, que será a chefia do Ministério Público dos mesmos. Sua
eleição será feita mediante escolha em lista tríplice enviada pelo colégio
de procuradores e promotores de Justiça enviada ao presidente da
República. O mandato também será de dois anos, permitida a recondução.
A sua destituição será feita nos mesmos moldes da do procurador-geral da
República.
6.2 Ministério Público dos Estados
A chefia dos Ministérios Públicos Estaduais é realizada, em
consonância com Nelson Godoy Bassil Dower, pelo “procurador-geral de
Justiça, no âmbito de cada entidade federativa (estadual)”15. Sendo que
6
cada estado possui a faculdade de organizar seu Ministério Público,
mediante lei complementar de iniciativa dos procuradores-gerais.
6.3 A carreira no Ministério Público
A Lei 8.625/1993, disciplina a carreira dentro do Ministério
Público. Dentre seus comandos, destacam-se os seguintes:
Artigo 59. O ingresso nos cargos iniciais da carreira dependerá
da aprovação prévia em concurso público de provas e títulos, organizado
e realizado pela Procuradoria-Geral de Justiça, com participação da
Ordem dos Advogados do Brasil.
Parágrafo 1º É obrigatória a abertura do concurso de ingresso
quando o número de vagas atingir um quinto dos cargos iniciais da
carreira.
Parágrafo 2º Assegurar-se-ão ao candidato aprovado a nomeação
e a escolha do cargo, de acordo com a ordem de classificação no
concurso.
Parágrafo 3º São requisitos para o ingresso na carreira, dentre
outros estabelecidos pela Lei Orgânica:
I — ser brasileiro;
II — ter concluído o curso de bacharelado em Direito, em escola
oficial ou reconhecida;
III — estar quite com o serviço militar;
IV — estar em gozo dos direitos políticos.
Parágrafo 4º O candidato nomeado deverá apresentar, no ato de
sua posse, declaração de seus bens e prestar compromisso de
desempenhar, com retidão, as funções do cargo e de cumprir a
Constituição e as leis.
Artigo 61. A Lei Orgânica (estadual) regulamentará o regime de
remoção e promoção dos membros do Ministério Público, observados os
seguintes princípios:
I — promoção voluntária, por antigüidade e merecimento,
alternadamente, de uma para outra entrância ou categoria e da entrância
7
ou categoria mais elevada para o cargo de Procurador de Justiça,
aplicando-se, por assemelhação, o disposto no artigo 93, incisos III e VI,
da Constituição Federal;
II — apurar-se-á a antigüidade na entrância e o merecimento pela
atuação do membro do Ministério Público em toda a carreira, com
prevalência de critérios de ordem objetiva levando-se inclusive em conta
sua conduta, operosidade e dedicação no exercício do cargo, presteza e
segurança nas suas manifestações processuais, o número de vezes que já
tenha participado de listas, bem como a freqüência e o aproveitamento em
cursos oficiais, ou reconhecidos, de aperfeiçoamento;
III — obrigatoriedade de promoção do promotor de Justiça que
figure por três vezes consecutivas ou cinco alternadas em lista de
merecimento;
IV — a promoção por merecimento pressupõe dois anos de
exercício na respectiva entrância ou categoria e integrar o promotor de
Justiça a primeira quinta parte da lista de antigüidade, salvo se não
houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago, ou quando o número
limitado de membros do Ministério Público inviabilizar a formação de lista
tríplice;
V — a lista de merecimento resultará dos três nomes mais
votados, desde que obtida maioria de votos, procedendo-se, para alcançála, a tantas votações quantas necessárias, examinados em primeiro lugar
os nomes dos remanescentes de lista anterior;
VI — não sendo caso de promoção obrigatória, a escolha recairá
no membro do Ministério Público mais votado, observada a ordem dos
escrutínios, prevalecendo, em caso de empate, a antigüidade na entrância
ou categoria, salvo se preferir o Conselho Superior delegar a competência
ao procurador-geral de Justiça.
Artigo 62. Verificada a vaga para remoção ou promoção, o
Conselho Superior do Ministério Público expedirá, no prazo máximo de
sessenta dias, edital para preenchimento do cargo, salvo se ainda não
instalado.
8
Artigo 63. Para cada vaga destinada ao preenchimento por
remoção ou promoção, expedir-se-á edital distinto, sucessivamente, com a
indicação do cargo correspondente à vaga a ser preenchida.
7. Funções
As funções do Ministério Público estão dispostas no artigo 129 da
Constituição Federal e também na Lei de Organização Nacional do
Ministério Público (Lei 8.625/1993). Tais funções serão pormenorizadas a
seguir.
7.1 Ação penal pública
A promoção de tal ação penal é privativa do Ministério Público e
está prevista no artigo 129, I da Constituição Federal da seguinte forma:
“São funções institucionais do Ministério Público:
I — promover privativamente, a ação penal pública, na forma da
lei.”
Cabe única exceção a tal regra, também prevista na Constituição
Federal em seu artigo 5º, LIX, tratando-se da legitimidade subsidiária do
particular, ou seja, no caso de inércia do Ministério Público, ele pode
entrar com a ação penal sem que haja nenhuma irregularidade.
Caso o Ministério Público tenha requerido o arquivamento do
inquérito policial, não é facultado a parte o direito de pleitear em juízo seu
interesse, uma vez não configurando a inércia do Ministério Público, não
há que se falar em ação penal subsidiária da pública.
Vale lembrar que, segundo Hugo Nigro Mazzilli, “a Constituição
mitigou o princípio da obrigatoriedade nas infrações de menor potencial
ofensivo. Tanto para a conciliação como para a transação, é
imprescindível a deliberação do Ministério Público sobre se aceita a
conciliação ou transação, pois é o titular privativo da pretensão
punitiva”16.
Finalizando, tem-se que acrescentar que a propositura de uma
ação penal não está vinculada ao inquérito policial, podendo este,
somente servir como fundamentação da mesma.
9
7.2 O zelo pelos poderes públicos
Deve o Ministério Público “zelar pelo efetivo respeito dos poderes
públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados
nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua
garantia”17.
Mediante o artigo 27 da Lei Orgânica Nacional do Ministério
Público, em seu artigo 27, dispõe o seguinte:
“Cabe ao Ministério Público exercer a defesa dos direitos
assegurados nas Constituição Federal e estadual, sempre que se cuidar
de garantir-lhe o respeito:
I — pelos poderes estaduais ou municipais;
II — pelos órgãos da administração pública estadual ou
municipal, direta ou indireta;
III — pelos concessionários e permissionários de serviço público
estadual ou municipal;
IV — por entidades que exerçam outra função delegada do
Estado ou do município ou executem serviço de relevância pública.
Parágrafo único. No exercício das atribuições a que se refere
este artigo, cabe ao Ministério Público, entre outras providências:
I — receber notícias de irregularidades, petições ou reclamações
de qualquer natureza, promover as apurações cabíveis que lhes sejam
próprias e dar-lhes as soluções adequadas;
II — zelar pela celeridade e racionalização dos procedimentos
administrativos;
III — dar andamento, no prazo de trinta dias, às notícias de
irregularidades, petições ou reclamações referidas no inciso I;
IV — promover audiências públicas e emitir relatórios, anual ou
especiais, e recomendações dirigidas aos órgãos e entidades
mencionadas no caput deste artigo, requisitando ao destinatário sua
divulgação adequada e imediata, assim como resposta por escrito.
7.3 Ação civil pública
“A ação civil pública corresponde ao meio processual adequado
para a defesa de interesses transindividuais, assim entendidos os
interesses ou direitos difusos e coletivos”18.
10
Tem-se como direito difuso aquele que tem como seu titular toda
a sociedade, sem que entre os indivíduos haja uma vinculação jurídica.
Um exemplo é o controle da publicidade abusiva. Já os interesses
coletivos, são aqueles que possuem como titulares um grupo determinado
de pessoas, existindo uma relação jurídica que os une; exemplificando, o
condomínio.
Além da tutela de tais interesses, cabe ao Ministério Público
também promover tal ação para a defesa do patrimônio público e social,
além de promover a ação de responsabilidade civil decorrente de
infrações apuradas por comissões parlamentares de inquérito.
7.4 Ação de controle concentrado de constitucionalidade
Dentre as atribuições do Ministério Público, é importante ressaltar
a participação do procurador-geral da República nas ações originárias do
Supremo Tribunal Federal, dentro do controle concentrado de
constitucionalidade de leis e atos normativos, também chamado de
controle abstrato, quer como legitimado ativo universal para a propositura
de tais ações, quer como “custos legis”.
7.5 Defesa dos interesses da população indígena
Tal atribuição está prevista na Constituição Federal no seu artigo
129, V. Porém vale lembrar que “os próprios índios, suas comunidades e
organização são partes legítimas para ingressar em juízo na defesa se
seus interesses. Se não for autor, será o Ministério Público
interveniente”19.
Finalizando, tal procedimento é de competência da Justiça
Federal e não depende de prévia autorização da Funai.
7.6 Notificações e requisições
O órgão do Ministério Público possui a faculdade de realizar
investigações diretas, uma vez que é o titular da ação penal pública. Para
que possa realizar tal ato, necessita de expedir requisições e notificações.
11
As notificações e requisições são utilizadas quando necessita de
documentos ou informações pertencentes a processos administrativos ou
quando requer diligências ou até mesmo a instauração de inquérito
policial.
7.7 O Ministério Público e o inquérito policial
Tal tema é objeto de grande controvérsia uma vez que no artigo
129, III, está estabelecida a possibilidade do membro do Ministério Público
realizar o inquérito civil e não o policial. Porém foi concedida ao mesmo a
possibilidade de solicitar diligências ao delegado, requerer a instauração
do inquérito policial e até mesmo realizar seu controle externo. Tal
controle não delega ao Ministério Público a possibilidade de presidir um
inquérito, ou seja, substituir o delegado de polícia.
Tem-se um posicionamento do Supremo Tribunal Federal
colocando o seguinte “A requisição de diligências investigatórias de que
cuida o artigo 129, VIII, Constituição Federal, deve dirigir-se à autoridade
policial, não se comprometendo o poder da investigação do Ministério
Público fora da excepcional previsão da ação civil pública (artigo 129, III,
Constituição Federal). De outro modo, haveria uma Polícia Judiciária
paralela, o que não combina com a regra no artigo 129, VIII, Constituição
Federal, segundo o qual o MP deve exercer, conforme lei complementar, o
controle externo da atividade policial” (RE 205.473-AL, 2ª T., relator
Carlos Velloso, 15.2.1998, v.u., RTJ173/640).20
“Nada a objetar quando o representante do Ministério Público
acompanha o desenrolar das investigações policiais e isto porque ‘é o
Ministério Público o titular da ação pública, e ninguém melhor que ele para
acompanhar aquelas diligências policiais’. Mas entre acompanhar
diligências policiais e assumir, praticamente, a direção do inquérito policial
a distancia é grande. O inquérito é instrumento da denúncia, fato por
demais sabido, se disso e constantemente proclamado. Mas, sua direção,
é necessário que se insista, é da polícia judiciária. (...)
Em decorrência, não cabe ao representante do Ministério Público,
sem que haja oficialização da prova, colher pareceres ou obter informes
destinados a instruir o inquérito policial. Se o inquérito não se anula por
essa circunstância, perde, contudo, sua validade como instrumento apto a
instruir a propositura da ação penal. (...)
12
Não se pode deixar, repita-se, de levar em conta que todas as
provas nele produzidas só podem sê-lo através da policia judiciária ou,
excepcionalmente, do magistrado. Não se discute caber ao Ministério
Público a faculdade e o poder de requisitar diligência diretamente aos
órgãos da polícia judiciária. Mas estas atribuições não podem e não se
sobrepõe e nem hão de contrariar as normas processuais vigentes e bem
assim os preceitos constitucionais que garantem o contraditório”. (TJ-SP,
HC 99.018-3, São Paulo, 2.ª C., rel. Weiss de Andrade, 25.02.1991,
v.u.)21
7.8 Conflito de compêtencia
Seguindo os ensinamentos de Marcellus Polastri Lima, “o
Ministério Público, que tem destinação própria, pairando sobre os três
poderes estatais, exerce, indubitavelmente, função administrativa através
de seus órgãos de execução, e como tal, consoante ensinamento já de
uma década do professor Sérgio Demoro Hamilton:...os órgãos do
Ministério Público dispõem de atribuição, e, de conseqüência, o conflito
que entre eles ocorrer será sempre de atribuições”.22
Dar-se-á o conflito de atribuições negativo quando o Ministério
Público, apesar de não ser competente para praticar tal ato, o pratica.
Neste caso deve declinar a competência à autoridade competente, como
ocorre na presidência do inquérito policial.
Já o conflito positivo se encontra quando mais de um órgão do
Ministério Público se posiciona como competente para a realização do ato.
Podendo esta ocorrer dentro do mesmo Estado, entre Estados diversos e
até mesmo entre o Ministério Público Federal e o Estadual.
De acordo com o pensamento de Mirabete, “reconhecendo sua
incompetência, o juiz não deve receber a denúncia ou queixa, mas, se o
fizer, poderá, a qualquer momento, declinar dela, remetendo os autos ao
juiz competente”.23
Para a solução de tal conflito, se for entre membros do Ministério
Público de um mesmo Estado, deve-se encaminhar o fato à autoridade
superior competente, no caso, o procurador-geral de Justiça, para que ele
o solucione. O mesmo ocorre entre promotores do Ministério Público
13
Federal, porém deve-se cientificar o procurador-geral da República para
haja a solução.
Finalmente, caso o conflito envolva Ministérios Públicos diversos,
não há autoridade competente para dirimir-lo, cabendo assim, ao Superior
Tribunal de Justiça decidi-lo.
8. O Conselho Nacional do Ministério Público
Criado pela EC. Nº. 45 possui a finalidade de assegurar a correta
realização não só das atividades fim do Ministério Público, mas também
de suas atividades meio. Apesar de se parecer inadequada a criação do
CNJ e á sua semelhança o CNMP pelo Poder Constituinte derivado e não
pelo Poder Constituinte Originário, o STF admitiu sua constitucionalidade
através da Adin 3.367.
8.1 Composição
De acordo com José Afonso da Silva, “o conselho compõe-se de
quatorze membros nomeados pelo presidente da República, depois
aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um
mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: I- o procuradorgeral da República, que o preside; II- quatro membros do Ministério
Público da União, assegurada a representação de cada uma de suas
carreiras; III- três membros do Ministério Público dos Estados; IV- dois
juízes, indicados pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior
Tribunal de Justiça; V- dois advogados, indicados pelo Conselho Federal
da Ordem dos Advogados do Brasil; VI- dois cidadãos de notável parecer
jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e
outro pelo Senado Federal. Os membros do conselho oriundos do
Ministério Público serão indicados pelos respectivos Ministérios Públicos,
na forma da lei”.24
8.2 Competência
Dentre as competências atribuídas ao Conselho Nacional do
Ministério Público, podemos salientar as seguintes: (i) zelar pela
autonomia financeira e administrativa do Ministério Público; (ii) receber
reclamações de órgãos do Ministério Público; (iii) rever os processos
disciplinares dos membros do Ministério Público e, finalmente, (iv)
elaborar um relatório anual acerca das providências que precisam ser
tomadas sobre a situação do Ministério Público.
14
Vale lembrar que qualquer cidadão ou entidade pode acionar o
Conselho Nacional acerca de reclamações de membros da Instituição do
Ministério Público e também de seus serviços auxiliares.
Como exemplo da atuação do Conselho nacional de Justiça temse a seguinte resolução:
RESOLUÇÃO 8, de 8 de maio de 2006
Dispõe sobre impedimentos e vedações ao exercício de
advocacia por membros do Ministério Público com respaldo no parágrafo
3º do artigo 29 do ADCT da Constituição Federal de 1988.
O Conselho Nacional do Ministério Público, considerando o que
consta no Processo
n.º 0.00.000.000071/2005-25,
Resolve:
Artigo 1º. Somente poderão exercer a advocacia com respaldo no
parágrafo 3º do artigo 29 do ADCT da Constituição de 1988, os membros
do Ministério Público que integravam a carreira na data da sua
promulgação e que, desde então, permanecem regularmente inscritos na
Ordem dos Advogados do Brasil
Artigo 2º. Além dos impedimentos e vedações previstos na
legislação que regula o exercício da advocacia pelos membros do
Ministério Público, estes não poderão fazê-lo nas causas em que, por
força de lei ou em face do interesse público, esteja prevista a atuação do
Ministério Público, por qualquer dos seus órgãos e ramos (Ministérios
Públicos dos Estados e da União).
Artigo 3º. Esta Resolução entra em vigor na data de sua
publicação.
Brasília, 8 de maio de 2006.
Antonio Fernando Barros e Silva de Souza
Presidente
15
CONCLUSÃO
O Ministério Público talvez seja a instituição pública brasileira
que mais evoluiu nos últimos tempos. Há menos de 50 anos, a figura do
promotor público era restrita à de acusador na ação penal, com mais
algumas pouquíssimas incumbências, motivo pelo qual podia se dar ao
luxo de advogar e ter outras atividades profissionais.
A Constituição de 1988 ampliou extraordinariamente as suas
funções, particularmente quanto à defesa de interesses difusos,
permitindo, ainda, que legislação infraconstitucional pudesse também darlhe outras atribuições.
Na esfera da Justiça Federal, a atuação do Ministério Público no
combate aos crimes mais graves repercute socialmente cada vez mais,
dando munição a polêmicas sobre os limites de sua atuação, cabendo à
jurisprudência interpretar e delimitar tais limites.
Mas, sem dúvida nenhuma, o Ministério Público vai, com o tempo,
ganhando ares de um novo “poder”, ao lado dos tradicionais de
Montesquieu, pela importância e pela abrangência de sua atuação na
sociedade moderna.
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Revista dos Tribunais, 2006
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