MINISTÉRIO PÚBLICO: ATUAÇÃO E LIMITES Laura Beghine Claudiano INTRODUÇÃO O presente trabalho possui o escopo de analisar a instituição do Ministério Público em todos os seus aspectos, desde a sua criação até a sua “fiscalização”, realizada pelo recém criado Conselho Nacional do Ministério Público. Tendo sua origem na França, como os “Procuradores do Rei”, o Ministério Público somente foi instituído no Brasil, como órgão de cooperação governamental, com a Carta Maior de 1934. Porém o seu status atual somente foi adquirido com o Constituinte de 1988, que o colocou em capítulo próprio, determinando que tal instituição é função essencial à Justiça. Decorrente de tal tratamento tem-se que o Ministério Público é permanente e essencial à atividade judiciária do Brasil. Suas funções estão elencadas no artigo 129 da Constituição Federal de 1988. Dentre eles, podemos citar a titularidade da ação penal pública, a defesa da população indígena e também a defesa dos direitos da coletividade, que serão pormenorizados a diante. Como aos membros da magistratura, aos do Ministério Público são conferidas mesmas garantias (inamovibilidade, irredutibilidade de subsídios e vitaliciedade). Além de tais garantias, a própria Constituição determina princípios inerentes ao Ministério Público, sendo eles: indivisibilidade, independência funcional, unidade, autonomia funcional e, finalizando, o princípio do promotor natural. Por fim, a instituição do Ministério Público compreende o Ministério Público da União, composto pelo Ministério Público dos Estados, Federal, Militar, do Trabalho e do Distrito Federal e Territórios. Sua chefia é composta pelo Procurador-Geral da República e pelos Procuradores-Gerais de Justiça. 1. Conceito Conceitua-se a instituição do Ministério Público, de acordo com o artigo 127 da Constituição Federal do Brasil, como “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. 2. Origem e desenvolvimento histórico Apesar de haver grande divergência doutrinária acerca da origem do Ministério Público, a corrente mais pacífica é aquela que determina sua origem na França, através dos “procuradores do Rei”, mencionados na Ordenação Francesa de 1302. Como instituição o Ministério Público surgiu, também na França, com a denominação de “parquet”1, nomenclatura utilizada devido ao fato de que os membros do mesmo não permaneciam em um piso elevado, como os juízes, durante uma audiência. Tal situação nos lembra que, ao ficarem no “parquet” demonstrava que o promotor ficava junto ao povo, de quem era defensor e não à aristocracia. Segundo Ricardo Rodrigues Gama, “o Ministério Público foi introduzido no Brasil pelo direito lusitano, por meio das Ordenações do Reino. A Constituição de 1924 não dispõe sobre o Ministério Público. Em 1828, por lei ordinária, foi criado o cargo de promotor de Justiça, o qual acompanharia as relações jurídicas junto às comarcas. A Constituição de 1891 não dispensou atenção merecida à organização do Ministério Público, limitando-se à nomeação do procurador-geral da República dentre os membros do Supremo Tribunal Federal”2. A Constituição de 1934 instituiu o Ministério Público como órgão de cooperação nas atividades governamentais, sendo assim, parte do Poder Executivo. Já na Magna Carta de 1937, não houve alteração substancial no que tange à instituição do Ministério Público, somente possibilitou a nomeação do procurador-geral da República pelo presidente da República. Já a Lei Maior de 1967 integrou o Ministério Público ao capítulo “Do Judiciário”, mas com a Emenda Constitucional n. 1/1967, retornou ao Capítulo “Do Executivo”. Porém foi com o Constituinte de 1988 que o Ministério Público foi realmente organizado, sendo regulado em um capítulo à parte, denominado “Das Funções Essenciais à Justiça”. Com isso, determina-se uma instituição com autonomia funcional, ou seja, independente de qualquer outro poder. 2 3. Princípios Constitucionais Segundo Kildare Gonçalves Carvalho, “diz a Constituição Federal que são princípios constitucionais3 do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional, assegurada a autonomia funcional e administrativa”4. Tais princípios encontram-se previstos no artigo 127, parágrafo 1º, da Constituição Federal. 3.1 Unidade O princípio da unidade diz respeito ao fato de ser o Ministério Público “uno” como instituição. Entretanto, é inegável que a existência do Ministério Público na esfera da União e do Ministério Público na esfera dos Estados-membros, leva-nos à constatação que haverá unidade dentro de cada um desses órgãos do Ministério Público, sem que haja a subordinação ou até mesmo relação funcional entre eles. Desta forma, o Ministério Público da União abrange o MP Federal, do trabalho, militar e do Distrito Federal e territórios, todos chefiados pelo procurador-geral da República, conservando, cada um deles sua unidade. Cada Estado-Membro possui o seu Ministério Público, chefiado pelo respectivo procurador-geral de Justiça, inexistindo qualquer relação entre eles, embora todos façam parte da mesma Instituição em sentido amplo. 3.2 Indivisibilidade Tal princípio encontra-se previsto no artigo 127, parágrafo 1º, da Constituição Federal e constitui no fato da Instituição do Ministério Público possuir unidade, ou seja, ser única. Em conseqüência deste princípio temse que pode haver a substituição de um membro do Ministério Público em um mesmo processo sem que haja nenhum prejuízo. De acordo com Emerson Garcia, o princípio em estudo apresenta “uma relação de continência com o da unidade”5, pois a instituição do Ministério Público se apresenta como una e indivisível. A indivisibilidade indica, ainda, que o posicionamento adotado por um de seus membros vinculará toda a instituição6. 3.3 Independência ou autonomia funcional Infere-se de tal princípio que cada membro do Ministério Público possui total liberdade para a formação de seu convencimento técnico, não sendo vinculado a nenhum outro órgão estatal, nem mesmo à vontade de 3 seus superiores hierárquicos. Porém vale lembrar que esta liberdade de convencimento não é absoluta, devendo, assim, estar consoante com as leis vigentes no país. Com relação à autonomia, vale lembrar que, segundo Kildare Gonçalves Carvalho, “não fala a Constituição expressamente em autonomia orçamentária e financeira, restando, pois a controvérsia. Entende, contudo, Hugo Nigro Mazzilli que o Ministério Público dispõe de tal autonomia, que é inerente aos órgãos funcionalmente independentes”7. Tal autonomia encontra-se estatuída no artigo 3º da Lei 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público): “Ao Ministério Público é assegurada autonomia funcional, administrativa e financeira...”. 3.4 Princípio do promotor natural De acordo com Celso Spitzcovsky, “este princípio proíbe as designações casuísticas efetuadas pela chefia da instituição com a criação da figura do promotor de exceção. Desta forma, objetiva-se garantir a imparcialidade da instituição, tanto em sua defesa como da sociedade que representa”8. 4. Garantias Aos membros do Ministério Público são asseguradas as mesmas garantias conferidas à magistratura. Sendo elas: a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de subsídios9. 4.1 Vitaliciedade Consiste tal garantia no fato de que, após dois anos de exercício do cargo dentro da instituição do Ministério Público, tal membro não pode perdê-lo, senão em face de sentença judicial transitada em julgado. Conforme o artigo 38 parágrafo 1º da Lei n.º 8625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) tem-se o seguinte: “O membro vitalício do Ministério Público somente perderá o cargo por sentença judicial transitada em julgado, proferida em ação civil própria, nos seguintes casos: 4 I — prática de crime incompatível com o exercício do cargo, após decisão judicial transitada em julgado; II — exercício da advocacia; III — abandono do cargo por prazo superior a trinta dias corridos”. 4.2 Inamovibilidade O membro do Ministério Público não pode ser removido ou até mesmo promovido senão por iniciativa própria, “salvo por motivo de interesse público e diante de decisão de ordem de colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços dos seus membros, assegurada ampla defesa”10. Caso se trate do Ministério Público da União, o órgão competente para tal deliberação é o “Conselho Superior no Respectivo Ramo”11. A inamovibilidade é importantíssima para assegurar o princípio da autonomia funcional, ficando o membro do Ministério Público livre para exercer suas funções sem temer ser removido contra a sua vontade. 4.3 Irredutibilidade de subsídios Sendo pressuposto da independência dos membros do Ministério Público, a irredutibilidade de subsídios representa a impossibilidade do mesmo haver seus vencimentos diminuídos, por constituir direito adquirido. Porém vale lembrar que tais subsídios estão sujeitos a impostos, inclusive ao Imposto de Renda. 5. Vedações A própria Constituição Federal, ao dispor acerca do Ministério Público, além de garantias e princípios institucionais arrola também vedações aos membros do Ministério Público, sendo elas: (i) receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais; (ii) exercer a advocacia; (iii) participar de sociedade comercial, na forma da lei; (iv) exercer, ainda que em indisponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; (v) exercer atividade político-partidária; (vi) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; (vii) exercer a 5 advocacia ou juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração”12. 6. Organização A instituição do Ministério Público é composta pelo Ministério Público da União e Ministério Público dos Estados13. 6.1 Ministério Público da União Tal vertente do Ministério Público abrange: I — o Ministério Público federal; II — o Ministério Público do Trabalho; III — o Ministério Público militar; IV — o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Seguindo o pensamento de Pinto Ferreira, “o Ministério Público da União tem por chefe o procurador-geral da República, nomeado pelo presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução”14. Vale ressaltar que a destituição o procurador-geral da República também será indicada pelo Presidente da república e deverá possuir votos da maioria absoluta do Senado. Já no Distrito Federal e nos territórios, é eleito um procuradorgeral de Justiça, que será a chefia do Ministério Público dos mesmos. Sua eleição será feita mediante escolha em lista tríplice enviada pelo colégio de procuradores e promotores de Justiça enviada ao presidente da República. O mandato também será de dois anos, permitida a recondução. A sua destituição será feita nos mesmos moldes da do procurador-geral da República. 6.2 Ministério Público dos Estados A chefia dos Ministérios Públicos Estaduais é realizada, em consonância com Nelson Godoy Bassil Dower, pelo “procurador-geral de Justiça, no âmbito de cada entidade federativa (estadual)”15. Sendo que 6 cada estado possui a faculdade de organizar seu Ministério Público, mediante lei complementar de iniciativa dos procuradores-gerais. 6.3 A carreira no Ministério Público A Lei 8.625/1993, disciplina a carreira dentro do Ministério Público. Dentre seus comandos, destacam-se os seguintes: Artigo 59. O ingresso nos cargos iniciais da carreira dependerá da aprovação prévia em concurso público de provas e títulos, organizado e realizado pela Procuradoria-Geral de Justiça, com participação da Ordem dos Advogados do Brasil. Parágrafo 1º É obrigatória a abertura do concurso de ingresso quando o número de vagas atingir um quinto dos cargos iniciais da carreira. Parágrafo 2º Assegurar-se-ão ao candidato aprovado a nomeação e a escolha do cargo, de acordo com a ordem de classificação no concurso. Parágrafo 3º São requisitos para o ingresso na carreira, dentre outros estabelecidos pela Lei Orgânica: I — ser brasileiro; II — ter concluído o curso de bacharelado em Direito, em escola oficial ou reconhecida; III — estar quite com o serviço militar; IV — estar em gozo dos direitos políticos. Parágrafo 4º O candidato nomeado deverá apresentar, no ato de sua posse, declaração de seus bens e prestar compromisso de desempenhar, com retidão, as funções do cargo e de cumprir a Constituição e as leis. Artigo 61. A Lei Orgânica (estadual) regulamentará o regime de remoção e promoção dos membros do Ministério Público, observados os seguintes princípios: I — promoção voluntária, por antigüidade e merecimento, alternadamente, de uma para outra entrância ou categoria e da entrância 7 ou categoria mais elevada para o cargo de Procurador de Justiça, aplicando-se, por assemelhação, o disposto no artigo 93, incisos III e VI, da Constituição Federal; II — apurar-se-á a antigüidade na entrância e o merecimento pela atuação do membro do Ministério Público em toda a carreira, com prevalência de critérios de ordem objetiva levando-se inclusive em conta sua conduta, operosidade e dedicação no exercício do cargo, presteza e segurança nas suas manifestações processuais, o número de vezes que já tenha participado de listas, bem como a freqüência e o aproveitamento em cursos oficiais, ou reconhecidos, de aperfeiçoamento; III — obrigatoriedade de promoção do promotor de Justiça que figure por três vezes consecutivas ou cinco alternadas em lista de merecimento; IV — a promoção por merecimento pressupõe dois anos de exercício na respectiva entrância ou categoria e integrar o promotor de Justiça a primeira quinta parte da lista de antigüidade, salvo se não houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago, ou quando o número limitado de membros do Ministério Público inviabilizar a formação de lista tríplice; V — a lista de merecimento resultará dos três nomes mais votados, desde que obtida maioria de votos, procedendo-se, para alcançála, a tantas votações quantas necessárias, examinados em primeiro lugar os nomes dos remanescentes de lista anterior; VI — não sendo caso de promoção obrigatória, a escolha recairá no membro do Ministério Público mais votado, observada a ordem dos escrutínios, prevalecendo, em caso de empate, a antigüidade na entrância ou categoria, salvo se preferir o Conselho Superior delegar a competência ao procurador-geral de Justiça. Artigo 62. Verificada a vaga para remoção ou promoção, o Conselho Superior do Ministério Público expedirá, no prazo máximo de sessenta dias, edital para preenchimento do cargo, salvo se ainda não instalado. 8 Artigo 63. Para cada vaga destinada ao preenchimento por remoção ou promoção, expedir-se-á edital distinto, sucessivamente, com a indicação do cargo correspondente à vaga a ser preenchida. 7. Funções As funções do Ministério Público estão dispostas no artigo 129 da Constituição Federal e também na Lei de Organização Nacional do Ministério Público (Lei 8.625/1993). Tais funções serão pormenorizadas a seguir. 7.1 Ação penal pública A promoção de tal ação penal é privativa do Ministério Público e está prevista no artigo 129, I da Constituição Federal da seguinte forma: “São funções institucionais do Ministério Público: I — promover privativamente, a ação penal pública, na forma da lei.” Cabe única exceção a tal regra, também prevista na Constituição Federal em seu artigo 5º, LIX, tratando-se da legitimidade subsidiária do particular, ou seja, no caso de inércia do Ministério Público, ele pode entrar com a ação penal sem que haja nenhuma irregularidade. Caso o Ministério Público tenha requerido o arquivamento do inquérito policial, não é facultado a parte o direito de pleitear em juízo seu interesse, uma vez não configurando a inércia do Ministério Público, não há que se falar em ação penal subsidiária da pública. Vale lembrar que, segundo Hugo Nigro Mazzilli, “a Constituição mitigou o princípio da obrigatoriedade nas infrações de menor potencial ofensivo. Tanto para a conciliação como para a transação, é imprescindível a deliberação do Ministério Público sobre se aceita a conciliação ou transação, pois é o titular privativo da pretensão punitiva”16. Finalizando, tem-se que acrescentar que a propositura de uma ação penal não está vinculada ao inquérito policial, podendo este, somente servir como fundamentação da mesma. 9 7.2 O zelo pelos poderes públicos Deve o Ministério Público “zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”17. Mediante o artigo 27 da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, em seu artigo 27, dispõe o seguinte: “Cabe ao Ministério Público exercer a defesa dos direitos assegurados nas Constituição Federal e estadual, sempre que se cuidar de garantir-lhe o respeito: I — pelos poderes estaduais ou municipais; II — pelos órgãos da administração pública estadual ou municipal, direta ou indireta; III — pelos concessionários e permissionários de serviço público estadual ou municipal; IV — por entidades que exerçam outra função delegada do Estado ou do município ou executem serviço de relevância pública. Parágrafo único. No exercício das atribuições a que se refere este artigo, cabe ao Ministério Público, entre outras providências: I — receber notícias de irregularidades, petições ou reclamações de qualquer natureza, promover as apurações cabíveis que lhes sejam próprias e dar-lhes as soluções adequadas; II — zelar pela celeridade e racionalização dos procedimentos administrativos; III — dar andamento, no prazo de trinta dias, às notícias de irregularidades, petições ou reclamações referidas no inciso I; IV — promover audiências públicas e emitir relatórios, anual ou especiais, e recomendações dirigidas aos órgãos e entidades mencionadas no caput deste artigo, requisitando ao destinatário sua divulgação adequada e imediata, assim como resposta por escrito. 7.3 Ação civil pública “A ação civil pública corresponde ao meio processual adequado para a defesa de interesses transindividuais, assim entendidos os interesses ou direitos difusos e coletivos”18. 10 Tem-se como direito difuso aquele que tem como seu titular toda a sociedade, sem que entre os indivíduos haja uma vinculação jurídica. Um exemplo é o controle da publicidade abusiva. Já os interesses coletivos, são aqueles que possuem como titulares um grupo determinado de pessoas, existindo uma relação jurídica que os une; exemplificando, o condomínio. Além da tutela de tais interesses, cabe ao Ministério Público também promover tal ação para a defesa do patrimônio público e social, além de promover a ação de responsabilidade civil decorrente de infrações apuradas por comissões parlamentares de inquérito. 7.4 Ação de controle concentrado de constitucionalidade Dentre as atribuições do Ministério Público, é importante ressaltar a participação do procurador-geral da República nas ações originárias do Supremo Tribunal Federal, dentro do controle concentrado de constitucionalidade de leis e atos normativos, também chamado de controle abstrato, quer como legitimado ativo universal para a propositura de tais ações, quer como “custos legis”. 7.5 Defesa dos interesses da população indígena Tal atribuição está prevista na Constituição Federal no seu artigo 129, V. Porém vale lembrar que “os próprios índios, suas comunidades e organização são partes legítimas para ingressar em juízo na defesa se seus interesses. Se não for autor, será o Ministério Público interveniente”19. Finalizando, tal procedimento é de competência da Justiça Federal e não depende de prévia autorização da Funai. 7.6 Notificações e requisições O órgão do Ministério Público possui a faculdade de realizar investigações diretas, uma vez que é o titular da ação penal pública. Para que possa realizar tal ato, necessita de expedir requisições e notificações. 11 As notificações e requisições são utilizadas quando necessita de documentos ou informações pertencentes a processos administrativos ou quando requer diligências ou até mesmo a instauração de inquérito policial. 7.7 O Ministério Público e o inquérito policial Tal tema é objeto de grande controvérsia uma vez que no artigo 129, III, está estabelecida a possibilidade do membro do Ministério Público realizar o inquérito civil e não o policial. Porém foi concedida ao mesmo a possibilidade de solicitar diligências ao delegado, requerer a instauração do inquérito policial e até mesmo realizar seu controle externo. Tal controle não delega ao Ministério Público a possibilidade de presidir um inquérito, ou seja, substituir o delegado de polícia. Tem-se um posicionamento do Supremo Tribunal Federal colocando o seguinte “A requisição de diligências investigatórias de que cuida o artigo 129, VIII, Constituição Federal, deve dirigir-se à autoridade policial, não se comprometendo o poder da investigação do Ministério Público fora da excepcional previsão da ação civil pública (artigo 129, III, Constituição Federal). De outro modo, haveria uma Polícia Judiciária paralela, o que não combina com a regra no artigo 129, VIII, Constituição Federal, segundo o qual o MP deve exercer, conforme lei complementar, o controle externo da atividade policial” (RE 205.473-AL, 2ª T., relator Carlos Velloso, 15.2.1998, v.u., RTJ173/640).20 “Nada a objetar quando o representante do Ministério Público acompanha o desenrolar das investigações policiais e isto porque ‘é o Ministério Público o titular da ação pública, e ninguém melhor que ele para acompanhar aquelas diligências policiais’. Mas entre acompanhar diligências policiais e assumir, praticamente, a direção do inquérito policial a distancia é grande. O inquérito é instrumento da denúncia, fato por demais sabido, se disso e constantemente proclamado. Mas, sua direção, é necessário que se insista, é da polícia judiciária. (...) Em decorrência, não cabe ao representante do Ministério Público, sem que haja oficialização da prova, colher pareceres ou obter informes destinados a instruir o inquérito policial. Se o inquérito não se anula por essa circunstância, perde, contudo, sua validade como instrumento apto a instruir a propositura da ação penal. (...) 12 Não se pode deixar, repita-se, de levar em conta que todas as provas nele produzidas só podem sê-lo através da policia judiciária ou, excepcionalmente, do magistrado. Não se discute caber ao Ministério Público a faculdade e o poder de requisitar diligência diretamente aos órgãos da polícia judiciária. Mas estas atribuições não podem e não se sobrepõe e nem hão de contrariar as normas processuais vigentes e bem assim os preceitos constitucionais que garantem o contraditório”. (TJ-SP, HC 99.018-3, São Paulo, 2.ª C., rel. Weiss de Andrade, 25.02.1991, v.u.)21 7.8 Conflito de compêtencia Seguindo os ensinamentos de Marcellus Polastri Lima, “o Ministério Público, que tem destinação própria, pairando sobre os três poderes estatais, exerce, indubitavelmente, função administrativa através de seus órgãos de execução, e como tal, consoante ensinamento já de uma década do professor Sérgio Demoro Hamilton:...os órgãos do Ministério Público dispõem de atribuição, e, de conseqüência, o conflito que entre eles ocorrer será sempre de atribuições”.22 Dar-se-á o conflito de atribuições negativo quando o Ministério Público, apesar de não ser competente para praticar tal ato, o pratica. Neste caso deve declinar a competência à autoridade competente, como ocorre na presidência do inquérito policial. Já o conflito positivo se encontra quando mais de um órgão do Ministério Público se posiciona como competente para a realização do ato. Podendo esta ocorrer dentro do mesmo Estado, entre Estados diversos e até mesmo entre o Ministério Público Federal e o Estadual. De acordo com o pensamento de Mirabete, “reconhecendo sua incompetência, o juiz não deve receber a denúncia ou queixa, mas, se o fizer, poderá, a qualquer momento, declinar dela, remetendo os autos ao juiz competente”.23 Para a solução de tal conflito, se for entre membros do Ministério Público de um mesmo Estado, deve-se encaminhar o fato à autoridade superior competente, no caso, o procurador-geral de Justiça, para que ele o solucione. O mesmo ocorre entre promotores do Ministério Público 13 Federal, porém deve-se cientificar o procurador-geral da República para haja a solução. Finalmente, caso o conflito envolva Ministérios Públicos diversos, não há autoridade competente para dirimir-lo, cabendo assim, ao Superior Tribunal de Justiça decidi-lo. 8. O Conselho Nacional do Ministério Público Criado pela EC. Nº. 45 possui a finalidade de assegurar a correta realização não só das atividades fim do Ministério Público, mas também de suas atividades meio. Apesar de se parecer inadequada a criação do CNJ e á sua semelhança o CNMP pelo Poder Constituinte derivado e não pelo Poder Constituinte Originário, o STF admitiu sua constitucionalidade através da Adin 3.367. 8.1 Composição De acordo com José Afonso da Silva, “o conselho compõe-se de quatorze membros nomeados pelo presidente da República, depois aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: I- o procuradorgeral da República, que o preside; II- quatro membros do Ministério Público da União, assegurada a representação de cada uma de suas carreiras; III- três membros do Ministério Público dos Estados; IV- dois juízes, indicados pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justiça; V- dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VI- dois cidadãos de notável parecer jurídico e reputação ilibada, indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal. Os membros do conselho oriundos do Ministério Público serão indicados pelos respectivos Ministérios Públicos, na forma da lei”.24 8.2 Competência Dentre as competências atribuídas ao Conselho Nacional do Ministério Público, podemos salientar as seguintes: (i) zelar pela autonomia financeira e administrativa do Ministério Público; (ii) receber reclamações de órgãos do Ministério Público; (iii) rever os processos disciplinares dos membros do Ministério Público e, finalmente, (iv) elaborar um relatório anual acerca das providências que precisam ser tomadas sobre a situação do Ministério Público. 14 Vale lembrar que qualquer cidadão ou entidade pode acionar o Conselho Nacional acerca de reclamações de membros da Instituição do Ministério Público e também de seus serviços auxiliares. Como exemplo da atuação do Conselho nacional de Justiça temse a seguinte resolução: RESOLUÇÃO 8, de 8 de maio de 2006 Dispõe sobre impedimentos e vedações ao exercício de advocacia por membros do Ministério Público com respaldo no parágrafo 3º do artigo 29 do ADCT da Constituição Federal de 1988. O Conselho Nacional do Ministério Público, considerando o que consta no Processo n.º 0.00.000.000071/2005-25, Resolve: Artigo 1º. Somente poderão exercer a advocacia com respaldo no parágrafo 3º do artigo 29 do ADCT da Constituição de 1988, os membros do Ministério Público que integravam a carreira na data da sua promulgação e que, desde então, permanecem regularmente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil Artigo 2º. Além dos impedimentos e vedações previstos na legislação que regula o exercício da advocacia pelos membros do Ministério Público, estes não poderão fazê-lo nas causas em que, por força de lei ou em face do interesse público, esteja prevista a atuação do Ministério Público, por qualquer dos seus órgãos e ramos (Ministérios Públicos dos Estados e da União). Artigo 3º. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 8 de maio de 2006. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza Presidente 15 CONCLUSÃO O Ministério Público talvez seja a instituição pública brasileira que mais evoluiu nos últimos tempos. Há menos de 50 anos, a figura do promotor público era restrita à de acusador na ação penal, com mais algumas pouquíssimas incumbências, motivo pelo qual podia se dar ao luxo de advogar e ter outras atividades profissionais. A Constituição de 1988 ampliou extraordinariamente as suas funções, particularmente quanto à defesa de interesses difusos, permitindo, ainda, que legislação infraconstitucional pudesse também darlhe outras atribuições. Na esfera da Justiça Federal, a atuação do Ministério Público no combate aos crimes mais graves repercute socialmente cada vez mais, dando munição a polêmicas sobre os limites de sua atuação, cabendo à jurisprudência interpretar e delimitar tais limites. Mas, sem dúvida nenhuma, o Ministério Público vai, com o tempo, ganhando ares de um novo “poder”, ao lado dos tradicionais de Montesquieu, pela importância e pela abrangência de sua atuação na sociedade moderna. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2001. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 10 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. Direito Constitucional Didático. 4ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1997. CHEMENTI, R. Cunha; CAPEZ, Fernando; ROSA, M. F. Elias. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2004. DOWER, Nelson Godoy Bassil. Instituições de Direito Público e Privado. 10 ed. São Paulo, Nelpa, 2003. FERRAZ, Antonio Augusto Mello de (org.). Ministério Público: Instituição e processo. São Paulo, Atlas, 1997. GAMA, Ricardo Rodrigues. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Editora de Direito, 1996. 16 GARCIA, Emerson. Ministério Público: organização, atribuições e regime jurídico. Rio de Janeiro: úris úris, 2003. LIMA, Marcellus Polastri. Ministério Público e Persecução Criminal. Rio de Janeiro: 1997 úris úris, MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 1997. MIRABETE, Julio Frabrini. Código de Processo Penal Interpretado. São Paulo, Atlas, 1997. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 10 ed. São Paulo: Ed. Atlas, 2005. MOTA, L. Pereira; SPTIZCOVSKY, Celso. Curso de Direito Constitucional. 6º ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006 PESQUISA científica. Resoluções do Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: http://www.cnmp.gov.br/documentos-e-publicacoes/resolucoes/resolucoes-index. Acesso em: 31.out.2006. PINTO FERREIRA. Curso de Direito Constitucional. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998. RUSSOMANO, Rosah. Curso de Direito Constitucional. 5 ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1997. SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2005. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. -x-x-x-x-x- 17