ALGUNS ASPECTOS QUE DIFERENCIAM A UNIÃO ESTÁVEL DO CASAMENTO
José Ricardo Afonso Mota: Titular do Ofício do Registro Civil e Tabelionato de Notas
da cidade de Bom Jesus do Amparo (MG)
A união estável, popularmente conhecida como “amigar”, “juntar os
panos”, ou “amasiar”, foi reconhecida pela Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 no artigo 226, em seu §3º que assim apregoa: “Para efeito da
proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento”, dispositivo
este que foi regulamentado pela lei 9.278/96.
O Direito enquanto ciência possui algumas fontes, dentre elas o costume.
A União Estável é um bom exemplo do costume sendo aplicado como fonte de
Direito, através da prática reiterada da sociedade em simplesmente “ir morar juntos”
ao invés de formalizar a união através do casamento, fez com que o legislador
através desta prática habitual transformasse a União Estável em lei.
Na letra fria do dispositivo constitucional, percebe-se claramente que a
União Estável e o Casamento são entidades diferentes, senão não haveria a
necessidade de o legislador viabilizar a conversão de uma em outra.
O texto constitucional também deixa a impressão de que o instituto do
casamento se encontra numa posição bem mais privilegiada, ao mesmo argumento
de que o legislador viabilizou a conversão.
No princípio havia muita discussão sobre quais requisitos seriam
necessários estar presentes para se identificar uma união estável: convivência
pública de no mínimo 05 anos, coabitação, prole comum, dentre outros. Com o
passar do tempo e com a promulgação de leis que foram sendo necessárias devido
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às mudanças de costumes da sociedade, a união estável passou a ser caracterizada
simplesmente como o desejo mútuo entre um homem e uma mulher em constituir
família.
As diferenças entre União Estável e Casamento se iniciam no campo das
formalidades para sua constituição.
Quando um casal decide se casar, tem ele que se dirigir a um Cartório de
Registro Civil das Pessoas Naturais, acompanhado de no mínimo duas testemunhas
e munido da documentação exigida pelo artigo 1.525 da lei 10.406/2002 - Código
Civil (CC) - dar entrada ao processo de habilitação de casamento. O Oficial do
Registro Civil montará uma pasta (processo), que deverá ainda ser remetida ao
Judiciário para após parecer do Ministério Público, ter o MM. Juiz Competente
condições de prolatar sentença homologatória declarando que os contraentes estão
ou não estão aptos para o casamento. Só depois de enfrentada esta formalidade
legal é que poderá o casal retornar ao Cartório de Registro Civil para o ato solene,
no caso o casamento propriamente dito, ocasião em que passam os nubentes a ser
cônjuge um do outro, surtindo assim seus jurídicos e legais efeitos.
Para instituir uma União Estável não será necessário qualquer
procedimento formal, basta o desejo do casal de constituir família o que se inicia no
momento em que passarem a ocupar o mesmo teto, havendo também a exigência
de que tal união seja entre homem e mulher e que não estejam presentes entre eles
os impedimentos para o casamento que está elencado nos incisos I a VII do artigo
1521 do CC.
Instituída a união estável o casal passa a ser companheiro um do outro.
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Se existem formalidades para o casamento, evidentes que elas também
serão necessárias para a sua dissolução. Na hipótese de desentendimento entre o
casal, que torne a vida em comum insustentável, terá ele de passar por um
procedimento ainda mais complexo, pois mesmo sendo uma dissolução amigável
será necessário bater na porta do Judiciário, ou na porta de um tabelionato de notas,
se for o caso, não sendo em nenhum dos casos indispensável a assistência de um
advogado, profissional este que é indispensável à administração da justiça.
Já quando ocorre do desejo pelo casal em colocar fim na união entre eles
instituída, sendo amigável tal dissolução, basta apenas que eles próprios
transacionem acerca dos seus direitos e deveres e até mesmo acerca da guarda dos
filhos e pensão alimentícia, bem como a partilha dos bens quando existentes,
seguindo cada um sua nova vida.
Agora vejamos algumas particularidades de cada entidade em certas
situações da vida cotidiana. Iniciamos pelo ato do registro de nascimento de
eventuais filhos.
a) O filho nascido durante a constância do casamento tem a paternidade
presumida. Sendo assim, a genitora, munida da certidão de casamento poderá se
dirigir ao Cartório Competente para registrar o filho que terá o nome do seu marido
lançado como pai daquela criança.
Já o filho do casal que vive em união estável não goza deste privilégio,
sendo necessária a presença do pai para o registro de nascimento e caso isto não
seja possível o oficial não poderá fazer constar o nome do “suposto genitor”
informado no registro daquela criança, o que poderá acarretar transtornos já que a
lei 6.015/73 em seu artigo 109 veda qualquer retificação futura sem ordem judicial.
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b) Na esfera previdenciária também existem particularidades.
Quando ocorre o falecimento de um dos cônjuges e sendo este falecido
segurado de algum instituto de previdência, basta que o cônjuge sobrevivente
diligencie junto à agência seguradora, munido das certidões de casamento e de
óbito, alem de outros documentos pessoais para que seja concedida, por exemplo, o
benefício de pensão por morte.
Em se tratando do falecimento de um dos companheiros que também seja
segurado, aquele que sobreviveu sofrerá resistência da seguradora que certamente
lhe exigirá a prova da união estável como, por exemplo, a existência de conta
conjunta com o falecido, a existência de prole comum ou até mesmo a exigência de
que a união estável seja reconhecida judicialmente, para posterior concessão do
benefício.
c) Diferença também pode ser apontada na esfera sucessória.
Pelo código civil de 2002, o cônjuge é herdeiro necessário (artigo 1.845
CC), situação que não abarca o companheiro. Com a abertura da sucessão de um
dos cônjuges que não tenha deixado descendente e nem ascendente, caberá ao
cônjuge sobrevivente a integralidade dos bens da herança. No caso de o cônjuge
sobrevivente concorrer com outros herdeiros na sucessão do cônjuge falecido terá,
sem prejuízo do quinhão que lhe caiba na herança, direito de habitação sobre o bem
residencial da família, caso seja o único desta natureza (artigo 1.831 CC). Será
ainda assegurado ao cônjuge sobrevivente, independentemente do regime de bens
e caso seja ascendente dos herdeiros com quem concorre, quinhão nunca inferior à
quarta parte da herança, sem que haja também dependência com o número de
herdeiros que com ele concorram (artigo 1.832 CC).
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O companheiro sobrevivente não tem o mesmo privilégio na sucessão do
companheiro falecido. Aqui já não se fala em direito do companheiro de habitação
sobre o bem residencial. No caso de morte de um dos companheiros, ao
companheiro sobrevivente será atribuído o mesmo quinhão que for atribuído aos
herdeiros, e isto, na hipótese de ser também ascendente destes herdeiros. Caso os
herdeiros sejam descendentes apenas do falecido, ao companheiro sobrevivente
será atribuída apenas metade do que couber a cada um dos herdeiros (todas estas
hipóteses foram tratadas pelo legislador no artigo 1.790 do CC).
Aqui estão elencadas apenas algumas diferenças que certamente não
são únicas. Existem outras que ficarão a depender de cada caso em particular.
Em suma, a fuga pelo casal de uma mera formalidade para o Casamento,
levando-o à opção pela União Estável, poderá acarretar na necessidade de uma
enorme formalidade para o companheiro sobrevivente na tomada de certas
providências quando lhe faltar o outro companheiro.
Assim, diante de tudo que foi exposto, vimos uma enorme contrariedade
em se tratando de Direitos relativos ao famoso ditado popular que diz: “Amigado com
fé casado é”.
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JOSÉ RICARDO AFONSO MOTA