JOSÉ RICARDO FERREIRA RAMALHO PLANO DE ARTICULAÇÃO E EQUIPAMENTO DE DEFESA: o desafio orçamentário Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: CMG (RM1) Caetano Tepedino Martins. Rio de Janeiro 2013 C2013 ESG Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitido a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG _________________________________ Assinatura do autor Biblioteca General Cordeiro de Farias Ramalho, José Ricardo Ferreira. Plano de articulação e equipamento de defesa: o desafio orçamentário / CMG (IM) José Ricardo Ferreira Ramalho. - Rio de Janeiro: RJ, 2013. 66 f.: il. Orientador: CMG (RM1) Caetano Tepedino Martins. Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2013. 1. Orçamento público. 2. Planejamento governamental. 3. Estratégia Nacional de Defesa. 4. Política Nacional de Defesa. 5. Plano de articulação e equipamento de defesa. I.Título. A minha esposa Márcia e ao meu filho Lucas, a minha gratidão pelo apoio incondicional, compreensão constante pelos incentivo períodos e de ausência ao longo da minha carreira, em particular neste ano que se finda. Sem vocês eu não teria cumprido a minha missão na Marinha. AGRADECIMENTOS Inicialmente a Deus, por tudo. Ao meu orientador, Capitão-de-Mar-e-Guerra Tepedino, amigo de outras jornadas na nossa Marinha, o apoio, o incentivo e os valiosos ensinamentos. Ao dileto amigo, Desembargador José Geraldo, pela inestimável ajuda na revisão textual deste trabalho. Ao Comando da ESG, Corpo Docente e Permanente pela oportunidade de refletir sobre o Brasil, capacitando-me a melhor serví-lo, e também por renovar a minha esperança no destino grandioso desta nação. Aos colegas do CAEPE 2013, Turma “Força, Brasil!”, pela qualidade de conteúdo e pela agradável convivência durante o curso. Agradeço a honra em poder estar ao lado de todos os senhores e senhoras, meus colegas de turma. Muito Obrigado! A verdadeira medida de um homem não se reconhece na forma como se comporta em momentos de conforto, mas como ele age e se mantém em tempos de desafio. Martin Luther King RESUMO Esta monografia aborda o Plano de Articulação e Equipamento de Defesa (PAED) e os recursos orçamentários necessários a sua implementação. O PAED, recentemente elaborado pelo Ministério da Defesa, em sintonia com a Estratégia Nacional de Defesa (END), constitui-se no principal plano norteador das ações do setor de defesa para transformar as Forças Armadas. Essa transformação é indispensável para que possam ser atingidos os objetivos previstos na Política Nacional de Defesa (PND), contribuindo para o país tornar-se, efetivamente, ator relevante no cenário internacional. O objetivo deste estudo é incentivar a discussão acerca do assunto, abordando o desafio orçamentário a ser suplantado. A metodologia adotada comportou pesquisa bibliográfica e documental. O campo de estudo delimitou-se ao período após o ano 2000, primeiro exercício financeiro com a existência do Ministério da Defesa e que também abrange as primeiras formulações da PND e da END. O trabalho discorre sobre a defesa nacional como um bem público, tendo o Estado a função de alocar recursos para prover esse serviço à sociedade por intermédio do orçamento federal, cuja elaboração depende da atuação dos poderes Executivo e Legislativo. Assim, analisa a evolução dos orçamentos anuais destinados ao setor de defesa como forma de identificar, de maneira indireta, como o Governo e a sociedade, por meio de seus representantes, consideram o tema no universo das demais políticas públicas, confrontando esse cenário com o custo estimado do PAED. Por fim, conclui relacionando possíveis ações para que os recursos orçamentários necessários à implantação do Plano seja alocado regular e continuadamente. Palavras chave: Orçamento público. Planejamento governamental. Política Nacional de Defesa. Estratégia Nacional de Defesa. Plano de articulação e equipamento de defesa. ABSTRACT This monograph discusses the Defense Articulation and Equipment Plan (DAEP) and the budgetary resources required for its implementation. This Plan, recently drawn up by the Ministry of Defense, in accordance with the National Defense Strategy (NDS), is the main guiding plan of actions of the defense sector to transform the Armed Forces. This transformation is essential so that they can be achieved the objectives set out in the National Defense Policy (NDP), contributing to the country to become, effectively, a relevant player in the international arena. The objective of this study is to encourage discussion about the subject, addressing the challenge budgeting to be supplanted. The methodology adopted has behaved bibliographic and documentary research. The field study was delimited to the period after the year 2000, the first fiscal year with the existence of the Defense Ministry and also covers the first formulations of NDS and NDP. The work discourses on national defense as a public good, with the State having the function to allocate resources to provide this service to society through the federal budget, whose development depends on the work of the Executive and Legislative branches. Thus, analyzes the evolution of annual budgets for the defense sector in order to identify, in an indirect way, such as the Government and society, through their representatives, consider the theme in other public policies, confronting this scenario with the estimated cost of the ADEP. Finally, it concludes by relating possible actions to ensure that the budgetary resources necessary to the implementation of the Plan be allocated regularly and continuously. Keywords: Public budget. Governmental planning. National Defense Policy. National Defense Strategy. Defense Articulation and Equipment Plan. LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURA 1 Ciclo orçamentário resumido.............................................................. 25 GRÁFICO 1 Participação da despesa primária do MD na despesa primária da........ União entre 2000 e 2012 .................................................................... 46 GRÁFICO 2 Participação da despesa de pessoal do MD na despesa.................. primária da União entre 2000 e 2012 ................................................. 46 GRÁFICO 3 Participação das despesas de custeio e de Investimentos do MD......... na despesa primária da União entre 2000 e 2012 ............................. 47 GRÁFICO 4 Participação da Despesa Primária da União no PIB entre 2000........... e 2012 ................................................................................................ 48 GRÁFICO 5 Participação da Despesa Primária do MD no PIB entre 2000........... e 2012 ................................................................................................ 48 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Participação dos países do BRICS nos gastos com defesa em 2012 ...... 40 Tabela 2 Gastos militares dos países da América do Sul em 2012 ........................ 41 Tabela 3 Participação do setor de defesa na despesa total da União,....................... por décadas, no período de 1950 a 1990, em % ...................................... 42 Tabela 4 Participação do setor de defesa na despesa total da União....................... 2000 a 2012, em % .................................................................................. 42 Tabela 5 Participação das despesas com pessoal no orçamento de defesa,........... período 2000 a 2012, em % ..................................................................... 43 Tabela 6 Despesas empenhadas no total da União, por funções................ selecionadas, no período de 2000 a 2012, em %..................................... 44 Tabela 7 Série comparativa do desempenho orçamentário do Ministério................. da Defesa, período 2000 a 2012, em R$ bilhões ..................................... 45 Tabela 8 Projetos prioritários da Marinha do Brasil no PAED, em R$ milhões ....... 50 Tabela 9 Projetos prioritários do Exército Brasileiro no PAED, em R$ milhões ...... 51 Tabela 10 Projetos prioritários da Força Aérea Brasileira no PAED,.......................... em R$ milhões.......................................................................................... 51 Tabela 11 Contingenciamento do Ministério da Defesa no período.......................... 2010 a 2013, em R$ ................................................................................. 56 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul CSD Curso Superior de Defesa CT&I Ciência, Tecnologia e Inovação DAEP Defense Articulation and Equipment Plan DASP Departamento Administrativo do Serviço Público END Estratégia Nacional de Defesa EUA Estados Unidos da América FFE Força de Fuzileiros da Esquadra GND Grupo de Natureza de Despesa IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada LBDN Livro Branco de Defesa Nacional LC Lei Complementar LDO Lei de Diretrizes Orçamentárias LME Limite de Movimentação e Empenho LOA Lei Orçamentária Anual MD Ministério da Defesa NDP National Defense Policy NDS National Defense Strategy OCDE Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico OPI Orçamento Plurianual de Investimentos PAC Programa de Aceleração do Crescimento PAED Plano de Articulação e Equipamento de Defesa PAEG Programa de Ação Econômica do Governo PDE Plano de Desenvolvimento da Educação PDN Política de Defesa Nacional PEC Proposta de Emenda Constitucional PED Programa Estratégico de Desenvolvimento PIB Produto Interno Bruto PND Plano Nacional de Desenvolvimento PND Política Nacional de Defesa PNM Programa Nuclear da Marinha PPA Plano Plurianual PROTEGER Sistema Integrado de Proteção de Estruturas Estratégicas Terrestres SIPRI Stockholm International Peace Research Institute SISFRON Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras SisGAAz Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul TCU Tribunal de Contas da União USD United States Dollar SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 12 2 ORÇAMENTO PÚBLICO E PLANEJAMENTO GOVERNAMENTAL ........... 15 2.1 SÍNTESE HISTÓRICA .................................................................................... 15 2.1.1 Evolução do orçamento público no Brasil ................................................. 17 2.1.2 Planejamento governamental no Brasil ...................................................... 20 2.1.3 A integração entre o orçamento e o planejamento no Brasil ................... 23 3 A DEFESA COMO POLÍTICA PÚBLICA ....................................................... 27 3.1 A POLÍTICA NACIONAL DE DEFESA............................................................ 30 3.2 A ESTRATÉGIA NACIONAL DE DEFESA ..................................................... 32 4 A DEFESA NO ORÇAMENTO DA UNIÃO .................................................... 33 4.1 O PPA E O ORÇAMENTO DE DEFESA ........................................................ 33 4.1.1 Plano Plurianual 2000-2003.......................................................................... 35 4.1.2 Plano Plurianual 2004-2007.......................................................................... 35 4.1.3 Plano Plurianual 2008-2011.......................................................................... 36 4.1.4 Plano Plurianual 2012-2015.......................................................................... 38 4.2 O ORÇAMENTO DE DEFESA ....................................................................... 39 5 O PAED E O DESAFIO ORÇAMENTÁRIO ................................................... 50 6 CONCLUSÃO ................................................................................................. 58 REFERÊNCIAS .............................................................................................. 62 12 1 INTRODUÇÃO Ao longo das duas últimas décadas, o Brasil tem vivenciado um período de relativa estabilidade, tanto política quanto econômica, o que o tem levado, gradativamente, a uma posição de destaque no cenário mundial. Dessa forma, o país tem se deparado com novas responsabilidades, desafios e ameaças frente a uma conjuntura internacional em constante mudança. Essa situação tem exigido outra postura do país e, consequentemente, da sociedade, fazendo com que o debate sobre a defesa e a necessidade de se investir nas Forças Armadas voltem a fazer parte da Agenda Nacional. Possuir Forças Armadas condizentes com a estatura político-estratégica que o Brasil almeja exige adequados recursos humanos, materiais e financeiros, devidamente suportados pelo erário, materializados no orçamento da União. Para melhor adequar-se a essa nova conjuntura, o Brasil elaborou a sua primeira Política de Defesa Nacional em 1996, que foi renovada em 2005. Como decorrência dessa Política, foi publicada, em 2008, a primeira Estratégia Nacional de Defesa. Esses dois documentos, condicionantes da Política de Defesa, foram recentemente revistos e submetidos, juntamente com o Livro Branco de Defesa Nacional, à apreciação do Congresso Nacional, em julho de 2012. A Estratégia Nacional de Defesa trata da reorganização e reorientação das Forças Armadas, da organização da Base Industrial de Defesa e da política de composição dos efetivos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. No tocante à restruturação, aquela Estratégia determina que cada Força Armada deve submeter ao Ministério da Defesa os seus Planos de Articulação e Equipamento, os quais contemplam uma proposta de distribuição espacial das instalações militares e de quantificação dos meios necessários ao atendimento eficaz das hipóteses de emprego. Os planos das Forças singulares são, então, consolidados no Ministério da Defesa (MD) e transformam-se no Plano de Articulação e Equipamento de Defesa, o qual possui metas de curto prazo (até 2014), de médio prazo (entre 2015 e 2022) e de longo prazo (entre 2023 e 2031). No Livro Branco de Defesa Nacional (LBDN), consta que o PAED poderá custar aos cofres públicos R$ 404,2 bilhões até 2031. Para a implementação do referido Plano, e, por conseguinte, contribuir para a consecução dos objetivos estratégicos estabelecidos para a Defesa, será 13 imperioso o incremento, significativo, dos patamares orçamentários destinados ao Ministério da Defesa, tendo em vista o elevado custo desse processo de reestruturação das Forças Armadas. No entanto, a alocação de recursos no orçamento da União para a Defesa não tem sido suficiente nem mesmo para atender aos objetivos mínimos de manutenção e operação das Forças Armadas. Como acreditar, então, que haverá um incremento nesse patamar? Nos últimos anos, o Governo tem canalizado o seu orçamento para as políticas públicas em curso no país, que buscam resgatar as nossas carências sociais, comprometendo a capacidade de investimentos em outras áreas. Dessa forma, a busca pelo desenvolvimento econômico e social, somada à continuidade da convivência pacífica do Brasil entre as nações, estabelecem, com clareza, as prioridades do Governo. No caso dos gastos com a Defesa, a situação é ainda mais delicada em face do contraste entre o elevado custo de manutenção e de investimentos demandados pelas Forças Armadas e a baixa probabilidade, na atual conjuntura, de que os meios combatentes sejam empregados a curto e médio prazos. Nesse contexto, podemos fazer o seguinte questionamento: os recursos orçamentários destinados ao Ministério da Defesa nos próximos anos serão suficientes para atender aos projetos previstos no Plano de Articulação e Equipamento de Defesa estabelecido pela Estratégia Nacional de Defesa? Dessa forma, esta pesquisa tem como objetivo verificar a viabilidade da implantação do Plano de Articulação e Equipamento de Defesa previsto na Estratégia Nacional de Defesa, bem como abordar possíveis ações para que o orçamento federal, como instrumento de planejamento, seja alocado regular e continuadamente, expressando as reais necessidades da Defesa e permitindo, assim, a execução daquele Plano, de modo a contribuir para o cumprimento da Política Nacional de Defesa. A metodologia a ser utilizada para atingir esses objetivos será o da investigação bibliográfica e documental, sendo o trabalho estruturado em quatro capítulos, além da introdução e da conclusão. Inicialmente, com o intuito de contextualizar o assunto, será descrita uma síntese histórica do orçamento público e do planejamento governamental. Da mesma forma, será demonstrada a relação entre o orçamento e o planejamento. 14 Em seguida, será examinada a importância da Política de Defesa como Política Pública e a sua inserção da Agenda Nacional. Posteriormente, será analisada a influência do planejamento governamental nos recursos destinados ao setor de defesa e demonstrado como foram alocados os recursos orçamentários disponibilizados ao MD desde a sua criação. Prosseguindo, serão estudados os futuros custos para a implantação dos projetos e subprojetos do Plano de Articulação e Equipamento de Defesa, destacando-se a necessidade desse Plano ser considerado política de Estado em face da sua relevância para a efetividade da Estratégia Nacional de Defesa e o considerável período necessário para a sua execução. Por fim, serão abordados os desafios orçamentários para a implantação do PAED e relacionadas possíveis ações a empreender para suplantá-los. A coleta de dados sobre a execução orçamentária da Defesa será limitada ao período após o ano 2000, primeiro exercício financeiro com a existência do Ministério da Defesa. Outra limitação será sobre a abordagem das demais consequências da implementação da Estratégia Nacional de Defesa no Orçamento da União, pois este trabalho terá como foco apenas os dispêndios necessários para a reestruturação das Forças Armadas, não sendo considerados os outros dois eixos estruturantes daquela Estratégia, quais sejam: a reorganização da Base Industrial de Defesa e a composição dos efetivos das Forças Armadas. Comecemos, então, por abordar o orçamento público e o planejamento governamental. 15 2 ORÇAMENTO PÚBLICO E PLANEJAMENTO GOVERNAMENTAL Uma das formas mais comuns de se estudar o orçamento público e o planejamento no Brasil é aquela que nos remete à análise do nosso arcabouço jurídico, tendo como destaque a norma constitucional em vigor. A Constituição Federal de 1988 vinculou o orçamento ao planejamento, estabelecendo as seguintes leis, de iniciativa do Executivo, que constituem os instrumentos do processo de planejamento orçamentário, para os três níveis de governo: o Plano Plurianual (PPA); a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO); e a Lei Orçamentária Anual (LOA). O planejamento e o orçamento moderno estão, de fato, estritamente relacionados. A elaboração da peça orçamentária parte da discussão, dentro da própria Administração Pública, acerca das necessidades da sociedade e a relação custo-benefício das possíveis ações governamentais para atendê-las vis-à-vis os recursos financeiros disponíveis. O planejamento também busca orientar as ações dos órgãos públicos para a consecução dos objetivos inicialmente formulados pelo Executivo. Em seu processo de elaboração, o governo submete o orçamento proposto à sociedade, representada pelo Legislativo, que detém a prerrogativa de apresentar emendas, podendo modificar as prioridades estabelecidas pela Administração Pública. Aprovado, o orçamento passa à fase de execução pelo Executivo, com fiscalização do Legislativo, por intermédio do Tribunal de Contas da União (TCU), órgão a este subordinado. Esta é uma síntese do processo de planejamento e elaboração do orçamento realizado no Brasil nos dias atuais. Entretanto, para chegar-se a esse estágio, um longo caminho foi percorrido. Assim, o propósito deste capítulo é mostrar, resumidamente, como ocorreu essa evolução. 2.1 SÍNTESE HISTÓRICA O orçamento representa um dos mais antigos instrumentos de planejamento e execução das finanças públicas. Apesar das ressalvas que uma abordagem mais aprofundada pode apontar, mediante o estudo de fatos históricos, que a noção de controle de recursos públicos estaria prevista na legislação sancionada por Moisés, mil e trezentos anos antes de Cristo, os estudiosos sobre o assunto convergem para 16 a assertiva de que o orçamento público teve origem na Inglaterra, no século XIII (MARTINS, 1996, p. 24 apud JUND, 2008, p. 66). Dessa forma, “o embrião da concepção de orçamento público teve origem na Magna Carta outorgada em 1217 pelo rei João Sem Terra” (PALUDO, 2012, p. 22). No mesmo pensamento, Viana (1950, p. 43 apud GIACOMONI, 2005, p. 46) afirma que “mesmo não envolvendo o lado da ‘despesa pública’, o artigo 12 da Magna Carta é geralmente considerado pelos tratadistas uma espécie de ‘embrião’ do orçamento público”. O citado artigo da Magna Carta, elaborado em consequência das pressões exercidas pelos barões feudais que integravam o Conselho dos Comuns − órgão de representação da época −, assim estava escrito: Nenhum tributo ou auxílio será instituído no Reino, senão pelo seu conselho comum, exceto com o fim de resgatar a pessoa do Rei, fazer seu primogênito cavaleiro e casar sua filha mais velha uma vez, e os auxílios para esse fim serão razoáveis em seu montante (BURKHEAD, 1971, p. 4 apud GIACOMONI, 2005, p. 45). Aos nobres interessava escapar do até então ilimitado poder do rei na criação de impostos. Com o passar do tempo, não bastava ao Parlamento autorizar a cobrança das rendas públicas. Começou a querer saber também se a aplicação dos recursos autorizados correspondia às finalidades para as quais haviam sido autorizadas. A “Revolução Gloriosa” de 1688, conflito ocorrido entre o rei Carlos II e o Parlamento inglês, provocou a aprovação do Bill of Rights1, em 1689. O Artigo 12 da Magna Carta foi, então, aperfeiçoado, estabelecendo-se a efetiva separação entre as finanças do reino (Estado) e as finanças da coroa. Da mesma forma, consolidouse a participação do Parlamento na aprovação e no controle do orçamento. Nas treze Colônias inglesas da América do Norte, o aumento de impostos e taxas determinado pelo governo inglês com o objetivo de custear despesas da metrópole gerou grande contrariedade por parte dos colonos, o que contribuiu para a eclosão da revolução pela independência americana de 1776. Assim, destaca-se que a busca pela legitimação popular na definição da obrigatoriedade e dos valores 1 A Declaração de Direitos (Bill of Rights) é um documento elaborado em 1689 na Inglaterra e que regulou o direito do cidadão comum, entre outras coisas, à liberdade, à vida e à propriedade privada, assegurando o poder do Parlamento sobre o monarca na elaboração de matérias legislativas dessa natureza. 17 dos tributos faz parte da história do nascimento da nação norte-americana. Nos primeiros anos de existência dos Estados Unidos da América (EUA), não havia a nítida definição das funções dos poderes Executivo e Legislativo na elaboração do orçamento anual. Em 1789, o Congresso passou a ter a responsabilidade oficial de preparar e relatar as estimativas das receitas e das despesas públicas, mas essa função, na prática, ficou a cargo do Executivo. Na França, a elaboração formal do orçamento decorreu da adoção do princípio do consentimento popular da cobrança de impostos, outorgado durante a Revolução de 1789, ao estabelecer que nenhum tributo deveria ser cobrado sem a anuência da nação. No período napoleônico, considerado autoritário, isso não foi respeitado. Com o advento da Restauração2, a Assembleia Nacional francesa passou a participar do processo orçamentário, inicialmente, em 1815, decretando a lei financeira anual, mas ainda sem controlar o detalhamento das dotações orçamentárias. Somente a partir de 1831 o controle parlamentar sobre o orçamento francês passou a ser completo (GIACOMONI, 2005, p. 45-52). Podemos verificar, portanto, que a evolução inicial do processo orçamentário nas nações mais desenvolvidas ocorreu no sentido de separar as finanças do reino e da coroa, assim como de estabelecer maior controle por parte da sociedade, através dos seus representantes, sobre as receitas e as despesas governamentais. E no Brasil, como evoluiu o orçamento público? 2.1.1 Evolução do orçamento público no Brasil A tentativa de se controlar as receitas e despesas orçamentárias pela sociedade brasileira teve seu primeiro impulso na Inconfidência Mineira, no século XVIII, quando os colonos se revoltaram contra os abusos na cobrança de tributos por parte de Portugal. Com a vinda da família real, em 1808, o Brasil iniciou um processo de organização de suas finanças, quando foram criados o Erário Público (Tesouro), o Conselho de Fazenda e o regime de contabilidade (JUND, 2008, p. 67). A evolução da questão orçamentária no Brasil costuma ser demonstrada tendo como pano de fundo as inclusões e mudanças realizadas nos textos 2 A Restauração é a designação dada ao período da história da França compreendido entre a queda do primeiro Império francês, em 1814, e a Revolução de 1830, consistindo no regresso da França à soberania monárquica. 18 constitucionais sobre o assunto, conforme mencionado anteriormente. De maneira crescente, foram sendo incorporados novos princípios e procedimentos orçamentários às várias cartas constitucionais do Estado brasileiro, os quais, resumidamente, passam a ser citados a seguir. A primeira Constituição brasileira, outorgada por D. Pedro I em 1824, estabeleceu as exigências iniciais para a elaboração de orçamentos formais por parte das instituições imperiais, com a obrigatoriedade da existência de um orçamento contendo o total da receita e da despesa do Tesouro Nacional. Também determinou que caberia ao Poder Executivo a elaboração da proposta orçamentária; que seria de responsabilidade da Assembleia Geral − que então compreendia a Câmara dos Deputados e o Senado − a sua aprovação; e, finalmente, que seria de responsabilidade da Câmara dos Deputados a iniciativa da elaboração de leis sobre a cobrança de impostos. Nos primeiros anos de vigência dessa pioneira Constituição, houve dificuldade para a implantação desses dispositivos constitucionais, considerados modernos para a época. Dessa forma, somente em dezembro de 1830 ocorreu, de fato, a aprovação da primeira lei orçamentária no Brasil, que fixava a despesa e orçava a receita para o período de julho de 1831 a junho de 1832 (GIACOMONI, 2005, p. 52-53). A constituição de 1891, a primeira elaborada após a proclamação da República, alterou a distribuição de responsabilidades em relação ao orçamento. O Congresso Nacional passou a ter competência privativa para estimar a receita e fixar a despesa, tendo sido atribuída à Câmara dos Deputados essa função, assim como a tomada de contas do Executivo. Entretanto, o Legislativo sempre se valeu da proposta orçamentária encaminhada reservada e extraoficialmente pelo Ministério da Fazenda, a qual orientava a comissão parlamentar de finanças na elaboração da lei de orçamento (VIANA, 1950, p. 76 apud GIACOMONI, 2005, p. 53). Três décadas mais tarde, em 1922, foi instituído, pelo Decreto 4.536, de 28 de janeiro de 1922, o Código de Contabilidade da União, que representou, junto com o seu regulamento, importante marco para as finanças públicas no Brasil, pois, nos dizeres de Giacomoni (2005, p. 54), “possibilitou ordenar toda a gama imensa de procedimentos orçamentários, financeiros, contábeis, patrimoniais etc, que já caracterizavam a gestão em âmbito federal”. O Código de 1922 acabou por formalizar a prática orçamentária vigente, determinando ao Poder Executivo enviar 19 anualmente à Câmara dos Deputados projeto de lei contendo a proposta que serviria de base para a elaboração da lei de orçamento (GIACOMONI, 2005, p. 54). Uma nova Constituição Federal é outorgada em 1934, onde o orçamento ganha destaque ao ser tratado em seção própria. Essa Lei Magna determinava que a iniciativa da elaboração da proposta orçamentária seria do presidente da República, cabendo ao Poder Legislativo a sua votação e, também, o julgamento das contas do presidente, com o auxílio do TCU. Desse modo, estabeleceu-se, pela primeira vez, a competência cumulativa dos poderes Executivo e Legislativo quanto à iniciativa orçamentária. A conturbada conjuntura política levou o país a um regime marcadamente autoritário − o Estado Novo −, em 1937. Nesse ano, foi promulgada a quarta Constituição brasileira, na qual se previa a existência do Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP), incumbido de organizar os órgãos do Estado visando ao aperfeiçoamento da máquina pública, além de ser responsável pela elaboração da proposta orçamentária do governo, de acordo com as instruções do chefe do Executivo. Segundo Giacomoni (2005, p. 55), como as duas casas legislativas nunca foram instaladas no Estado Novo, o orçamento federal sempre foi elaborado pelo Poder Executivo e decretado pelo presidente da República. Com a redemocratização do país, nova Constituição é promulgada em 1946, restaurando as atribuições do Legislativo no tocante ao orçamento público, que voltou a ser do tipo “misto”, isto é, elaborado pelos poderes Executivo e Legislativo, como era previsto na Constituição de 1934. Foi, também, ampliada a competência do Legislativo quanto à matéria orçamentária, ao se atribuir ao Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União, a função de fiscalização da administração financeira em geral, e da execução orçamentária em particular. Ao Legislativo também foi restabelecida a prerrogativa de apresentar emendas ao orçamento, o que permitiu a esse Poder voltar a participar da elaboração da lei orçamentária da União. A Revolução de 1964 teve como uma de suas consequências a implantação no país de um regime notadamente autoritário. Nessa conjuntura, foi outorgada a Constituição de 1967, onde a questão orçamentária foi tratada de forma relevante, tendo sido incorporadas novas regras e princípios aos processos de sua elaboração e fiscalização. A grande novidade, porém, ficou por conta da supressão das prerrogativas do Poder Legislativo quanto à iniciativa de proposição de leis ou 20 emendas que criassem ou aumentassem despesas, inclusive no que se referia ao projeto de lei do orçamento anual. O papel deste Poder passou, então, a ser o de apenas homologar o projeto de lei orçamentária conforme esse tenha sido elaborado pelo Poder Executivo, visto que não havia qualquer possibilidade fático-política de rejeitá-lo (GIACOMONI, 2005, p. 55-56). Em 1967, o Governo, com o intuito de efetuar uma reforma administrativa no Estado, publica o Decreto-Lei nº 200. Esse Decreto definiu o planejamento como um dos princípios fundamentais da administração federal, introduziu a expressão “orçamento-programa”, enfatizou a classificação orçamentária da despesa pública com base em programas e projetos e, ainda, instituiu o sistema de elaboração de planos plurianuais de investimentos, que compreendiam um período de três anos (BRASIL, 1967). A atual Constituição, promulgada em 1988, trouxe notáveis avanços acerca da matéria orçamentária, pois os constituintes deram grande importância ao tema, sobretudo por ter essa sido vista com uma das principais prerrogativas parlamentares perdidas ao longo do anterior regime militar. Nesse sentido, o Legislativo voltou a participar da elaboração de lei orçamentária, apreciando a proposta do Executivo e podendo alterá-la pela apresentação de emendas a seu texto original (BRASIL, 1988). 2.1.2 Planejamento governamental no Brasil A história do planejamento governamental no Brasil ganha destaque a partir do segundo quarto do século passado. Sob a influência da Revolução de 1930, o Brasil assistiu ao início da construção de um modelo de Estado interventor no plano econômico e social, centralizado em nível federal. Para alcançar os seus objetivos e fomentar o desenvolvimento do País, o governo escolheu o planejamento como ferramenta (REZENDE, 2011, p. 177). A partir dessa época, foram adotadas as primeiras experiências relevantes de planejamento governamental no Brasil. Não havia, contudo, uma vinculação obrigatória entre o planejamento e o orçamento. Os planos concebidos visavam ao atendimento de múltiplos propósitos, em especial o desenvolvimento econômico, mas sem que necessariamente fossem indicadas as fontes de recursos para a sua consecução. 21 No contexto do conflito militar da II Guerra Mundial, foi elaborado, em 1939, o Plano Quinquenal de Obras e Reaparelhamento da Defesa Nacional (BRASIL, 1939), tendo esta sido uma das primeiras experiências de planejamento governamental no Brasil. O Plano consistia numa lista de investimentos com vistas a preparar o País para uma possível participação na guerra (ALMEIDA, 2004, p. 6). Entre 1942 e 1943, foi realizada a missão Cooke3, fruto de uma cooperação internacional com os EUA. Pela primeira vez, a economia brasileira sofreu uma pesquisa detalhada visando à formulação de um programa de ação. Como forma estruturante, o país foi dividido em três regiões distintas (Nordeste/Leste, Norte/Centro e Sul), cujas características econômicas eram diferentes o bastante para justificar programas de desenvolvimento significativamente diversos. (BAER, 1996, p. 61). Em 1943, também foi elaborado o Plano de Obras e Equipamentos, este de periodicidade quinquenal, que priorizava os investimentos na indústria básica e em obras de infraestrutura. Esse Plano durou até a queda de Getúlio Vargas, em 1946. Em 1948, o governo cria, então, o primeiro ensaio de planejamento econômico no Brasil − o Plano SALTE4 −, cujo objetivo era alavancar o desenvolvimento dos setores da saúde, alimentação, transporte e energia. Esse plano adotou um rumo diferente na condução do planejamento, dando menor ênfase à intervenção direta do Estado na economia e buscando estimular maior envolvimento do setor privado na promoção do desenvolvimento. Coordenado pelo DASP e composto por sugestões encaminhadas pelos diversos ministérios sob a forma de programa de investimentos públicos para o período 1949-1953, o plano não chegou a ser executado na prática por ter sido instituído apenas em 1950, último ano do governo do presidente Dutra (REZENDE, 2011, p. 218). Em 1956, o Presidente Juscelino Kubitschek propôs, como programa de governo, cinquenta anos de progresso em cinco anos de realizações, com ênfase na industrialização do País. Nascia, então, o Plano de Metas, idealizado para ser executado entre 1956 e 1960, e que é considerado como o primeiro plano no país a prever metas para o setor privado e a motivar os estudos aprofundados sobre a 3 A Missão Cooke era misto de auxílio técnico e industrial entre o Brasil e os Estados Unidos que procurava diagnosticar as causas do baixo nível de progresso da economia brasileira. 4 O plano econômico SALTE foi apresentado pelo presidente Dutra ao Congresso, em 1947, que pretendia estimular as áreas de Saúde, Alimentação, Transporte e Energia, que vem a ser o significado da sigla que dá nome ao plano. 22 economia brasileira. O Plano relacionava trinta metas para as áreas de alimentação, transporte, energia, educação e indústrias básicas. Alguns dos resultados mais importantes do Plano de Metas referem-se ao setor de energia, com a previsão de aumento da potência elétrica instalada e da produção de petróleo. A indústria de base e a automobilística também apresentariam um significativo crescimento. Há, também, nesse período, ampliação dos serviços de infraestrutura e avanço no processo de substituição de importações, com destaque para a elevação dos índices inflacionários (MATOS, 2002, p. 32). De acordo com Rezende (2011, p. 222), a história do planejamento econômico no Brasil ganha novos contornos com a chegada ao poder dos militares, em 1964. Os primeiros anos do regime buscaram conciliar a estabilização macroeconômica com a preservação do crescimento. O Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG), instituído naquele primeiro ano do governo militar, propunha-se a corrigir as distorções acumuladas no período anterior. Sua plataforma baseava-se na contenção da inflação sem comprometer o crescimento da economia, bem como na redução das disparidades regionais e sociais. Em 1965, foi proposto o Plano Decenal para o desenvolvimento econômico e social, que abrangeria o período de 1967 a 1976, resultado de discussões entre órgãos federais, estaduais e o setor privado. Esse Plano pode ser visto como a primeira experiência concreta de desenvolver uma visão estratégica dos interesses e das prioridades nacionais. Por abranger um período considerado muito longo para os padrões brasileiros, não foi implementado pelo governo que tomou posse em março de 1967. Importante passo para a criação de uma estrutura de planejamento do setor público foi a elaboração do Orçamento Plurianual de Investimentos (OPI), previsto na Constituição de 1967. Entre os anos de 1968 e 1970, foi concebido o Programa Estratégico de Desenvolvimento (PED), que pretendia acelerar o desenvolvimento econômico, atingir progresso social e aumentar a taxa de emprego até o ano de 1973. Em setembro de 1970, foi apresentado o Plano de Metas e Bases para a Ação do Governo, que constituía continuidade das ações dos governos anteriores e mencionava que seria complementado pelo primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento (I PND). Este foi apresentado em 1971, caracterizando-se como o 23 primeiro plano que levou em conta o modelo de planejamento idealizado de acordo com os moldes do orçamento-programa. Entre 1975 e 1979, foi instituído o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND). Abrangendo um período de quatro anos, estimou metas quantitativas para o investimento, Produto Interno Bruto (PIB), produção industrial e agrícola, criação de empregos e de exportações. A crise econômica mundial que atingiu o Brasil e o mundo nesse período contribuiu para a obtenção de resultados aquém dos que foram planejados pelo Plano. Entre 1980 e 1985, foi lançado o terceiro Plano Nacional de Desenvolvimento (III PND). A continuidade da crise econômica afastou a elaboração de uma programação de planejamento de longo prazo, tendo esse plano cumprido mais uma exigência legal do que servir de instrumento para as ações do governo. O primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento da Nova República foi concebido entre 1986 e 1989. Nova crise econômica e redução da capacidade de investimento do Estado transformaram-no apenas num programa de ajuste e reorientação das ações do setor público, com ênfase na área social (MATOS, 2002, p. 37-73). Em geral, desde seu início, até 1988, o planejamento governamental não alcançou os resultados esperados. Apesar de terem servido para a formação da cultura do assunto no país, os planos não lograram o êxito devido, principalmente em razão das instabilidades política e econômica vivenciadas em seus respectivos períodos de vigência. Fez falta, também, a vinculação obrigatória entre o orçamento e o planejamento. Esses fatores levaram à desvalorização da função do planejamento como instrumento de ação governamental, e que perdurou até a promulgação da Constituição de 1988. 2.1.3 A integração entre o orçamento e o planejamento no Brasil Após a verificação de como evoluíram o planejamento e o orçamento, podemos indagar se há, de fato, relação entre esses dois processos. Silva (Apud CORE, 2006, p. 219), sintetiza: “Há quem considere coisas distintas e separadas o orçamento e o planejamento. Erro de observação. O planejamento e o orçamento, como processos, são incoercivelmente complementares”. Os orçamentos representam mais que documentos que autorizam a 24 realização de despesas públicas. Expressam o planejamento dessas despesas, em obediência a um plano governamental concebido pelo Estado, para o Estado – de acordo com objetivos e prioridades previamente deliberados – e que deve ser seguido, qualquer que seja a plataforma de governo (PEDERIVA, 1998, p. 34). As necessidades da sociedade são praticamente infinitas, o que demanda cada vez mais por parte dos governos planejamento dos serviços necessários nas áreas de educação, saúde, transporte, segurança etc. Entretanto, os governos dispõem somente de recursos limitados para atendê-los. O orçamento público evidencia a escassez de recursos necessários para a realização integral dos planos e programas idealizados pelos governantes, pois estima as receitas e fixa as despesas. Da mesma forma, possibilita o cumprimento das funções econômicas que tem o Estado (alocativa, distributiva e estabilizadora), que representam, respectivamente, o fornecimento de bens e serviços, denominados “bens públicos” (a defesa nacional, por exemplo), os ajustes na distribuição da renda e riqueza e a estabilização da atividade econômica (GIACOMONI, 2005, p. 28). Voltando, então, ao ponto inicial deste capítulo, e considerando a opinião de Almeida (2004, p. 25), a nossa atual Constituição, buscando retomar a valorização do planejamento, instituiu o Plano Plurianual como o principal instrumento de planejamento de médio prazo do sistema de governo brasileiro. Conforme previsto no art. 165, § 1º, da Carta Magna, o PPA deverá estabelecer “de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras dela decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada” (BRASIL, 1988). A denominada “Constituição Cidadã”5 reforçou a concepção que associa planejamento e orçamento como elos de um mesmo sistema” (GIACOMONI, 2005, p. 53). Os OPI previstos na Constituição anterior (por período de três anos) foram substituídos pelos Planos Plurianuais, com vigência de quatro anos, os quais norteiam a elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei Orçamentária Anual. O PPA orienta a execução dos orçamentos anuais, com sua vigência iniciando-se no segundo ano do mandato presidencial e encerrando-se no primeiro 5 A Constituição Federal promulgada em 1988 recebeu essa denominação pelo Deputado Ulisses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte, em 27 de julho de 1988. 25 ano do mandato subsequente, o que permite a continuidade do planejamento governamental e das políticas públicas. Dessa forma, o PPA organiza a atuação governamental em programas6 e ações7, viabilizando a orientação estratégica dos gastos para a obtenção de resultados destinados à sociedade, em um período de quatro anos. Nesse sentido, o PPA estabelece os programas que constarão dos orçamentos da União para cada um dos exercícios compreendidos no período do plano. Cabe à LDO, anualmente: estabelecer as metas e prioridades para o exercício financeiro; orientar a elaboração do orçamento; e fazer alterações na legislação tributária. Ela faz a articulação e o ajuste conjuntural do plano plurianual com o orçamento, servindo de elo entre o PPA e a LOA. Esta, por sua vez, estima receitas e fixa despesas para um ano, de acordo com as prioridades contidas no PPA e LDO, detalhando quanto será gasto em cada programa e ação. É o instrumento que viabiliza a execução do plano de trabalho do exercício a que se refere. O “Ciclo Orçamentário”, também chamado por Giacomoni (2005, p. 195) de “Processo de Planejamento e Orçamento”, pode ser definido como um processo contínuo, dinâmico e flexível, no qual se elabora, aprova, executa, controla e avalia os programas do setor público nos aspectos físicos e financeiros. Corresponde ao período de tempo em que se processam as atividades típicas do orçamento público, desde a sua concepção até a apresentação final, conforme a figura a seguir: Elaboração e revisão do Plano Plurianual - PPA Elaboração e revisão de planos nacionais regionais e setoriais Execução orçamentária e financeira / controle e avaliação da execução Discussão, votação e aprovação da Lei Orçamentária Anual Elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO Elaboração da proposta Orçamentária Anual LOA Figura 1 – Ciclo Orçamentário resumido. Fonte: Giacomoni, 2005, p. 196. 6 Programa é o instrumento de organização da atuação governamental que articula um conjunto de ações que concorrem para um objetivo comum preestabelecido, mensurado por indicadores instituídos no PPA, visando à solução de um problema ou ao atendimento de determinada necessidade ou demanda da sociedade. 7 Ação é a operação da qual resulta um produto (bem ou serviço) ofertado à sociedade ou que contribui para atender ao objetivo do programa. 26 Um aspecto que merece ser mencionado é que o modelo orçamentário brasileiro não estabelece a obrigatoriedade de se executar tudo o que foi definido na LOA, o que o caracteriza como autorizativo e não impositivo. O Governo Federal, em função da expectativa de arrecadação de receitas e das despesas previstas, ajusta a execução orçamentária ao longo do ano, podendo promover contingenciamentos das dotações orçamentárias. O contingenciamento consiste no retardamento ou, ainda, na não execução de parte da programação de despesa prevista na Lei Orçamentária Anual relativa à despesas discricionárias (investimentos e custeio em geral). A Lei de Responsabilidade Fiscal (BRASIL, 2000), em seu artigo 8º, determina que em até trinta dias após a promulgação da LOA o Poder Executivo estabelecerá, por decreto, a programação financeira e o cronograma de execução mensal de desembolso. Caso seja necessário ajustar a política fiscal, é esse decreto que reduz o valor autorizado na LOA e define o Limite de Movimentação e Empenho (LME) de cada órgão do Poder Executivo. Ou seja, em benefício do equilíbrio fiscal, o orçamento apreciado e aprovado pelo Legislativo pode ser alterado pelo Executivo sem que seja necessária qualquer autorização ao Congresso Nacional. A cada bimestre, o Executivo reavalia a situação fiscal e mantém ou flexibiliza o contingenciamento inicial. Por outro lado, caso a arrecadação permita, é possível a abertura de créditos adicionais, que, dependendo do enquadramento nas regras estabelecidas pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, pode até não ser apreciada pelo Legislativo. O mesmo vale para os eventuais casos de remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, também observadas as limitações estabelecidas pela LDO. 27 3 A DEFESA COMO POLÍTICA PÚBLICA Como foi visto no capítulo anterior, o orçamento deixou de ser uma simples previsão de receita ou estimativa de despesa para transformar-se em um mecanismo de administração que visa a auxiliar o Poder Executivo nos processos de planejamento, execução e controle das ações do Estado. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) denota, assim, a importância do orçamento em um regime democrático: “O orçamento é destacadamente o mais importante documento de política dos governos, onde os objetivos das políticas públicas são harmonizados e sua implementação colocada de forma concreta” (CAVALCANTE, 2008, p. 30). Cavalcante (2008, p. 30) aponta, ainda, que o orçamento se constitui, de forma organizada, na autorização para o gasto público num certo período. Em regimes democráticos, essa autorização é delegada pelo povo, de quem emana o poder, aos seus representantes democráticos. Almeida (2001, p. 27) afirma que o orçamento é, por excelência, a concretização da vontade política de um país. Na prática, acrescenta o autor, as aspirações políticas não passam de meros discursos até o momento em que estejam incluídas na peça orçamentária. Quando o fornecimento de bens públicos pela iniciativa privada é insuficiente, ineficiente ou inviável, como é o caso das necessidades para a defesa nacional, cabe ao Estado, utilizando-se da função econômica alocativa, prover os recursos orçamentários que permitam a adequada oferta desses bens à sociedade. Um bem público caracteriza-se por não ser individualizado (não limitado a um consumidor), não existe rivalidade no consumo (o consumo de um bem não impede o de outro) e no caso de não-pagamento, o consumidor não é excluído (GIACOMONI, 2005, p. 37). Assim, a defesa nacional constitui-se em um bem público, não sendo possível limitar seus benefícios a uma pessoa determinada, nem esgotar a sua utilidade pelo uso simultâneo de todos os envolvidos (FRANKO apud PEDERIVA, 1998, p. 117). Dessa forma, a defesa nacional deve ser entendida como um bem público a ser provido à sociedade por meio de políticas públicas (ALMEIDA, 2010). Cabe ao Estado, portanto, utilizando o orçamento como instrumento, prover os recursos para a obtenção desse “bem”. 28 Mas o que viria a ser uma política pública? Existem várias interpretações, de diferentes vieses. Sem ter a pretensão de esgotar o assunto, pois não é o propósito deste trabalho, citaremos alguns conceitos. Para Parsons, citado por Salomão (2012, p. 3), política pública é “um plano ou curso de ação, um conjunto de propósitos políticos, um rationale, uma manifestação de juízo bem considerado, adotada pelo governo diante de um problema”. De acordo com Souza (2009, p. 13), “o processo de formulação de política pública é aquele através do qual os governos traduzem seus propósitos em programas e ações, que produzirão resultados ou as mudanças desejadas no mundo real”. No mesmo sentido, Salomão (2012, p. 3) assim define política pública: Um conjunto de ações definidas pelo Estado para equacionar e resolver um problema público, a serem executadas por entes estatais ou não [...] visando determinados objetivos e metas [...], segundo uma estratégia [...] clara, observando cronogramas de execução [...] e financiada [...] por recursos orçados previamente, com a especificação de suas fontes respectivas. Portanto, uma política pública envolve a política (objetivos e metas), a estratégia (ações a implementar) decorrente e o orçamento (recursos materiais e humanos para sua consecução) que a suporta. Assim, os seguintes elementos são fundamentais para a construção de uma efetiva defesa nacional: uma política e uma estratégia nacional de defesa e um adequado orçamento de defesa. A política estabelece os objetivos e especifica o que fazer; a estratégia define como fazer; e o orçamento contribui para transformar em realidade os conceitos firmados na política e na estratégia. A ausência ou deficiência de pelo menos um desses elementos pode comprometer o bom resultado da defesa como um todo (POMPEU, 2009, p. 2-3). Segundo Almeida (2010), a exemplo das demais políticas públicas, a de defesa também pode ser analisada sob os aspectos dos conceitos político, jurídico e econômico. O autor prossegue o seu raciocínio explicando que o conceito político de políticas públicas decorre da ideia de que determinados resultados almejados pela política somente têm chance de ocorrer quando contam com a força coercitiva do Estado, por envolver uma atividade indelegável ao setor privado, como visto anteriormente. 29 Assim, a defesa nacional deve constituir uma política de Estado e não uma política de governo. Deve haver um arranjo político que permita reunir militares e civis, partidos políticos e sociedade, visando à atuação sinérgica desses grupos na definição de prioridades, alocação de recursos e elaboração do orçamento. Pelo conceito jurídico, Almeida (2010) defende que uma política é pública quando está presente na estrutura constitucional-legal. A defesa nacional está presente na Lei Magna do Brasil como responsabilidade do Estado. As normas legais decorrentes regulamentam o alcance que devem ou podem ter as ações de defesa nacional para que o uso da força estatal não viole direitos e garantias. O conceito econômico de políticas públicas, finaliza o autor, deriva da noção de bem público prevista na moderna teoria econômica, que inclui as noções de nãorivalidade e não-exclusividade, também já abordadas neste trabalho. Portanto, ratifica-se o pensamento que caberá ao Estado, diante da natureza imprescindível da defesa e da sua baixa aderência ao modelo de mercado, encarregar-se de sua entrega à coletividade. Por fim, em relação ao conceito de política pública, não se pode deixar de citar a noção de trade-off, que permeia o seu processo de formulação. A escolha pela realização de determinada política pública implica, necessariamente, o sacrifício de outras opções, como decorrência da clássica oposição econômica entre necessidades infinitas e recursos limitados. Nesse sentido, o conceito de trade-off, associado à defesa nacional, é tradicionalmente conhecido como o dilema “manteiga versus canhões”, ou “arados versus espadas” (ALMEIDA, 2001, p. 23). As políticas públicas são, em geral, reivindicadas pela sociedade. Como exemplo, saúde, educação e transporte não podem deixar de ser oferecidas pelo Estado. No Brasil, em relação à política de defesa, essa demanda não é significativa e isso muito se deve à baixa percepção da importância do "bem” defesa. Essa situação possui diversas justificativas. Oliveira (2006) relaciona quatro fatores que explicam o desinteresse pela política de defesa no Brasil: (i) ao superar o passado autoritário, uma parte articulada da sociedade rejeitou as forças armadas; (ii) governantes e legisladores parecem acreditar que não temos problemas de defesa e segurança; (iii) as enormes carências sociais monopolizam as atenções dos políticos e da sociedade, não sobrando espaço para a defesa nacional; e (iv) a defesa nacional, ao contrário dos 30 temas prioritários, “não dá votos” aos políticos. Todo esse quadro tem se traduzido em orçamentos de defesa que estão longe de atender às necessidades do setor. A proposta orçamentária que o Governo Federal encaminha ao Congresso reserva recursos para a defesa nacional insuficientes para o cumprimento das obrigações constitucionais das Forças Armadas. É verdade que houve progressos nos últimos anos, mas ainda longe do ideal, como será visto no próximo capítulo. Com o objetivo de tentar reverter essa situação, as Forças Armadas têm feito um considerável esforço para criar uma mentalidade de defesa que possa ser captada pela sociedade. A criação do Ministério da Defesa contribuiu para que fosse dado mais um passo nesse sentido. Nesse processo, ainda em curso, destacam-se dois documentos que se revestem de importância capital: a Política Nacional de Defesa e a Estratégia Nacional de Defesa. 3.1 A POLÍTICA NACIONAL DE DEFESA A Política Nacional de Defesa é uma política de Estado que estabelece a postura nacional frente às ameaças preponderantemente externas, com ênfase nas ações de caráter militar. Trata-se do documento condicionante de mais alto nível de planejamento de ações destinadas à defesa nacional coordenadas pelo Ministério da Defesa. A PND pressupõe que a defesa do País é inseparável do desenvolvimento, fornecendo-lhe o indispensável escudo. Ao reconhecer que o longo período livre de conflitos afeta a percepção dos brasileiros sobre a defesa nacional, um dos propósitos da PND é conscientizar todos os segmentos da sociedade brasileira sobre a importância da defesa do País e de que esta é um dever de todos os brasileiros e não apenas dos militares (BRASIL, 2012c). A PND, dentre diversos objetivos e orientações, ressalta que é essencial estruturar a defesa nacional de modo compatível com a estatura político-estratégica do País, bem como para preservar a soberania e os interesses nacionais. Da mesma forma, destaca a importância de se assegurar a previsibilidade na alocação de recursos, suficientes e contínuos, para permitir o preparo e o emprego das Forças Armadas (BRASIL, 2012c). Segundo Proença Jr. e Diniz (1998, p. 37), uma política de defesa caracteriza-se por sua natureza política. Trata-se de um jogo de interesses de forças 31 políticas, possuindo, dessa forma, caráter provisório e objetivos mutáveis, que seguem a tendência predominante. A atual Política Nacional de Defesa, elaborada em 2012 e aprovada pelo Congresso Nacional mediante o Decreto Legislativo nº 373/2013 (BRASIL, 2012c), foi precedida por dois outros documentos que se denominavam de Política de Defesa Nacional, com o mesmo propósito, emitidas em 1996 e 2005. Mesmo podendo ser considerada uma política de Estado, a política de defesa pode sofrer mudanças, pois está condicionada, entre outros fatores, pelas estruturas sociais e políticas que se apresentam em determinado contexto histórico (SANTANA, 2007, p. 97). Assim, o teor da política de defesa brasileira vem evoluindo em função da conjuntura nacional e internacional e, principalmente, pela crescente participação da sociedade, em suas diferentes formas de representação. A PND de 2012 (bem como a atual Estratégia Nacional de Defesa e o Livro Branco de Defesa Nacional) foi elaborada mediante amplo debate em seminários públicos e submetida ao Congresso Nacional, conforme determina o § 3º do artigo 9º da Lei Complementar (LC) nº 97, alterada pela LC nº 136, de 25 de agosto de 20108. No que se refere aos recursos financeiros, escopo deste trabalho, as três políticas de defesa assim trataram do assunto: Na Política de Defesa Nacional (PDN) de 1996, na parte das diretrizes, alínea p, explicita: “garantir recursos suficientes e contínuos que proporcionem condições eficazes de preparo das Forças Armadas e demais órgãos envolvidos na defesa nacional”. Na PDN de 2005, na parte das orientações estratégicas, item VII, está escrito: “garantir recursos suficientes e contínuos que proporcionem condições efetivas de preparo e emprego das Forças Armadas e demais órgãos envolvidos na Defesa Nacional, em consonância com a estatura político-estratégica do País” E, finalmente, na PND de 2012, na parte das orientações, item 7.18, pode ser visto que: “É prioritário assegurar continuidade e previsibilidade na alocação de recursos para permitir o preparo e o equipamento adequado das Forças Armadas”. Percebe-se, portanto, que sempre houve preocupação com a disponibilidade 8 O Poder Executivo encaminhará à apreciação do Congresso Nacional, na primeira metade da sessão legislativa ordinária, de quatro em quatro anos, a partir do ano de 2012, com as devidas atualizações: a PND; a END; e o LBDN. 32 de recursos financeiros, “suficientes e contínuos”, de modo a possibilitar a consecução dos objetivos estabelecidos pela política de defesa. 3.2 A ESTRATÉGIA NACIONAL DE DEFESA A Estratégia Nacional de Defesa, cuja versão atual também foi aprovada pelo Decreto Legislativo nº 373/2013, estabelece as diretrizes estratégicas para que sejam alcançados os objetivos de defesa, definidos pela Política Nacional de Defesa, por meio de ações de médio e longo prazo. Ao lado dessas diretrizes, aborda o papel de três setores decisivos para a defesa nacional: o cibernético, o espacial e o nuclear (BRASIL, 2012a). A END está organizada em torno de três eixos estruturantes. O primeiro eixo trata da reorganização e reorientação das Forças Armadas, de forma a prepará-las para o desempenho da missão constitucional de defesa da pátria no contexto das incertas ameaças contemporâneas. Um ponto fundamental para a efetividade das ações de rearticulação e reorientação das Forças Armadas é a execução do Plano de Articulação e Equipamento de Defesa, que será analisado no quinto capítulo, o qual deverá contemplar a quantificação dos meios necessários ao atendimento eficaz das Hipóteses de Emprego9 das Forças até 2031 e uma proposta de distribuição espacial das instalações militares. O segundo eixo diz respeito à organização da indústria nacional de defesa, que se baseia no preceito de que a política de defesa é inseparável da política de desenvolvimento e tem como propósito assegurar que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas se apoie em tecnologias sob domínio nacional. Por fim, o terceiro eixo discute a composição dos efetivos militares, com sua consequência sobre o futuro do serviço militar obrigatório e orienta a relação da sociedade com suas Forças Armadas (BRASIL, 2012a). Como dito na introdução deste trabalho, esses dois últimos eixos da END, em que pese também serem dependentes de vultosos recursos orçamentários, não serão objetos de análise. Vistos, então, a política e a estratégia, passaremos a abordar o outro pilar de uma política pública: o orçamento. 9 Hipótese de Emprego é a antevisão de possível emprego das Forças Armadas em determinada situação ou área de interesse estratégico para a defesa nacional, conforme preceitua o MD. 33 4 A DEFESA NO ORÇAMENTO DA UNIÃO Os capítulos anteriores nos ajudaram a compreender que o planejamento e o orçamento governamentais evoluíram ao longo da história para a normatização constitucional de integração de seus processos, motivados pela necessidade do Estado em satisfazer as demandas da sociedade, identificadas por intermédio de políticas públicas. Da mesma forma, foi visto que a defesa nacional é um bem público e o Estado é responsável por alocar recursos para prover esse serviço à sociedade, devendo fazê-lo por intermédio do orçamento federal, cuja elaboração depende da atuação dos poderes Executivo e Legislativo. Assim, analisar a evolução dos orçamentos anuais destinados ao setor da defesa nos permite identificar, de forma indireta, como o Governo e a sociedade, por meio de seus representantes, priorizaram o tema no universo das demais políticas públicas, durante o período considerado. Para Almeida (2001, p.31), o relacionamento entre a defesa nacional e o orçamento pode ser resumido da seguinte forma: O orçamento como a economia, também empresta seus conceitos e princípios à análise do tema da defesa. Uma vez ser o orçamento, por excelência, o instrumento de concretização da atividade governamental, muito da adequada definição do perfil da defesa depende de sua apropriada inserção no contexto do orçamento nacional. Assim, a análise das questões de defesa segundo a ótica orçamentária tende a aproximar o assunto dos demais interesses nacionais. Portanto, é importante verificar como se comportou o orçamento destinado ao Ministério da Defesa desde a sua criação. Além disso, conforme também já visto, é nesse período que ocorre, de fato, o despertar do tema para o Estado e um maior envolvimento da sociedade, com a elaboração das primeiras políticas e estratégias de defesa, as quais, sem dúvida, contribuíram para tornar o assunto mais próximo da Agenda Nacional. Mas, apesar disso, o orçamento do MD tem acompanhado essa maior relevância? É o que passaremos a tratar a seguir. 4.1 O PPA E O ORÇAMENTO DE DEFESA Para se ter Forças Armadas compatíveis com a inserção do Brasil no 34 cenário mundial, como se almeja, faz-se necessária uma adequada e contínua alocação de recursos orçamentários. Dessa forma, a atuação dos atores políticos, tanto no Governo Federal quanto no Congresso Nacional, reveste-se de grande importância. O Poder Executivo inicia o processo orçamentário, estabelecendo as suas prioridades de políticas públicas. Já o Poder Legislativo pode prestar ajuda relevante por ocasião da aprovação da Lei Orçamentária Anual, ao apresentar emendas que garantam os recursos necessários ao cumprimento da política e da estratégia de defesa. Nas palavras de Oliveira (2005, p. 109): Ainda que ao Executivo esteja reservada a direção exclusiva das Forças Armadas, o Congresso poderá transformar-se em co-autor da orientação política. De fato, a direção política transcende a direção administrativa na medida em que aponta os objetivos futuros, o perfil estratégico desejável ao país e os meios eficazes a serem alocados. Contudo, não podemos nos esquecer que o orçamento no Brasil não é impositivo, ou seja, a sua execução não é obrigatória. Conforme afirma Oliveira (2005, p. 263), ele “não passa de uma declaração de intenções do governo federal sobre a aplicação de recursos em programas, com a atuação coadjuvante do Legislativo”. Por outro lado, o Poder Executivo dispõe de instrumentos de gestão, como o Plano Plurianual, para dar conformidade ao seu planejamento estratégico, ao estabelecer diretrizes, objetivos e metas a serem cumpridas em um período de quatro anos, bem como para orientar a execução dos orçamentos anuais. O PPA é o documento que traduz o planejamento para atendimento das políticas públicas. Praticamente todos os recursos do orçamento são alocados, na forma de ações orçamentárias, para a realização dos programas previstos no Plano Plurianual, à exceção das transferências constitucionais devidas aos Estados e municípios e do pagamento de dívidas do Governo Federal (GARCES; SILVEIRA, 2002, p. 58). A maior parte dos investimentos das Forças Armadas envolve projetos que demandam longo prazo para a sua efetivação, ultrapassando, com frequência, o exercício financeiro em que foram iniciados. Portanto, para a defesa nacional, a inclusão de seus projetos estratégicos no PPA é fundamental, tendo em vista a característica plurianual desses investimentos. 35 Vamos passar a verificar, então, como os Planos Plurianuais elaborados após a criação do MD consideraram a defesa nacional. 4.1.1 Plano Plurianual 2000-2003 O Ministério da Defesa foi criado em 1999, mas, antes disso, em 1996, como já citado, foi elaborada a primeira versão da Política de Defesa Nacional. O primeiro Plano Plurianual criado após esses dois relevantes acontecimentos foi o PPA 20002003. Por conseguinte, esperava-se encontrar maior participação do setor de defesa nesse Plano, o que acabou não acontecendo. Esse PPA, intitulado “Avança Brasil”, trouxe mudanças de impacto no sistema de planejamento e orçamento federais, assim como na gestão pública. A recuperação da estabilidade monetária e o processo de ajuste fiscal, iniciado em 1994 com o Plano Real, realçou a necessidade de um choque gerencial na administração pública brasileira. A decisão foi transformar o plano em instrumento de gestão, orientando a administração pública para resultados. (GARCES; SILVEIRA, 2002, p.53) O Plano possuía seis diretrizes estratégicas, a partir das quais foram listados vinte e oito macro-objetivos, os quais tinham como finalidade nortear a formulação das políticas públicas no âmbito de cada Ministério e elaborar os programas que integraram o Plano Plurianual. Em relação aos macro-objetivos, apenas um, intitulado “garantir a defesa nacional como fator de consolidação da democracia e do desenvolvimento”, dizia respeito à área de defesa. O PPA 2000-2003 aglutinou todas as atividades do Governo Federal em trezentos e sessenta e cinco programas. Destes, cinquenta e quatro foram considerados estratégicos, que passaram a ter prioridade de recursos e de acompanhamento. Entretanto, nenhum programa de defesa fazia parte dessa relação. 4.1.2 Plano Plurianual 2004-2007 O PPA 2004-2007, denominado Plano “Brasil de Todos”, com forte viés social, propôs-se a apresentar um novo modelo, privilegiando a visão estratégica de desenvolvimento de longo prazo, com base no planejamento participativo, no 36 fortalecimento do conceito de revisão periódica do Plano e na valorização da gestão. Para tal, foi estruturado em cinco dimensões, as quais se articularam em torno de três megaobjetivos, distribuídos em trinta desafios, enfrentados por meio de trezentos e setenta e quatro programas (BRASIL, 2003, p.28). Assim como no PPA anterior, a defesa nacional não fez parte das metas prioritárias, tendo sido definida apenas como um dos desafios10 do terceiro megaobjetivo, denominado “Promoção e expansão da cidadania e fortalecimento da democracia”. O PPA 2004-2007 tinha como característica o processo de monitoramento, avaliação e revisão. A Lei nº 10.933, de 11 de agosto de 2004, que instituiu o Plano, em seu artigo 5º, cuja redação foi alterada pela Lei nº 11.318, de 2006, previu a possibilidade de o Poder Executivo propor alteração ou exclusão de programas constantes do PPA, bem como inclusão de novos programas por meio de projeto de lei de revisão anual ou específico. Conforme já visto, a então Política de Defesa Nacional foi revista em 2005, o que, mesmo ainda sem existência de uma decorrente estratégia de defesa, deveria influenciar a revisão anual do PPA, a partir do exercício de 2006, fazendo-a refletir, seja em termos de novos programas, seja em incremento de recursos financeiros, as novas orientações estratégicas e as diretrizes incluídas naquela Política. Portanto, qualquer eventual necessidade de alteração significativa na programação constante do PPA, bem como a inclusão de novos programas, resultantes da nova PDN, poderia ter sido proposta pelo Poder Executivo. No entanto, o Relatório Anual de Avaliação do PPA 2004-2007, no caderno específico sobre os programas do MD (BRASIL, 2007b, p. 26), afirma que “ocorreram apenas pequenas alterações e ajustes em nomes de programas e ações. Para o PPA 2008-2011, a situação ainda é a mesma”. Dessa forma, pode-se inferir que a aprovação da PDN, em 2005, não influenciou os programas afetos à defesa nacional no Plano Plurianual “Brasil de Todos”. 4.1.3 Plano Plurianual 2008-2011 O PPA 2008-2011 foi denominado “Desenvolvimento com inclusão social e 10 O desafio em que a Defesa Nacional estava inserido foi denominado “Preservar a integridade e a soberania nacionais”. 37 educação de qualidade”. Possuia como base três eixos: o crescimento econômico, a educação de qualidade e a agenda social. O conteúdo desses eixos correspondia, respectivamente: (i) ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que orientou a política de infraestrutura do segundo mandato do governo Lula, com destaque para as obras relacionadas aos setores energético e de transportes; (ii) ao Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), que tinha o objetivo de melhorar a qualidade da educação brasileira; e (iii) à Agenda Social, cuja principal política foi a continuidade de programas focalizados de “transferência de renda”, como o Bolsafamília, e os investimentos na área de segurança pública (BRASIL, 2007a, p. 11-31). A Estratégia Nacional de Defesa foi publicada em dezembro de 2008 (BRASIL, 2008), o que, visto o seu caráter orientador do planejamento nos assuntos da defesa nacional, poderia ter influenciado, pelo menos nos dois últimos anos do Plano, uma revisão dos programas relacionados ao tema. Entretanto, isso não aconteceu. No lugar dos trinta desafios do PPA anterior, o novo plano apresentou, com outra denominação, dez objetivos de governo. Nenhum deles se referiu, nem indiretamente, ao setor de defesa. Esses objetivos foram compostos por trezentos e seis programas no total, sendo vinte e seis sob a responsabilidade do Ministério da Defesa e dos Comandos Militares. A concepção desse Plano Plurianual foi inspirada nas experiências obtidas com o lançamento do PAC, com uma extensa agenda de investimentos em infraestrutura. Assim, ao se construir o plano, boa parte dos recursos discricionários do governo já possuía uma destinação previamente programada (LESSA; COUTO; FARIAS, 2009, p. 102-103). Há que se destacar que o Programa de Aceleração do Crescimento reflete uma mudança de procedimento do governo federal, que passou a estabelecer as suas prioridades e metas, à parte do PPA. É verdade que o PAC e outras iniciativas semelhantes (PDE e Agenda Social) tiveram de ser incluídos no Plano Plurianual para serem validados, de acordo com a previsão constitucional, mas essa etapa foi cumprida como um procedimento burocrático, contribuindo, dessa forma, para reforçar o descrédito do PPA como instrumento de planejamento e gestão estratégica (PAULO, 2010, p. 180). 38 4.1.4 Plano Plurianual 2012-2015 O governo entendeu que os Planos Plurianuais anteriores não estavam conseguindo traduzir suas prioridades estratégicas e, também, que havia sobreposição do Plano ao Orçamento, que se complementam, mas que possuem diferenças essenciais. Assim, promoveu diversas alterações na estrutura do plano, continuando a utilizar o aprendizado da implementação de políticas consideradas exitosas como, sobretudo, o PAC. O PPA 2012-2015, chamado de “Mais Brasil”, foi construído a partir da dimensão estratégica definida pelo governo e organizado à luz dos cenários econômico, social, ambiental e regional. Dessa dimensão decorrem os Macrodesafios e, destes, os Programas, que respondem pela dimensão tática do Plano (BRASIL, 2011a, p. 114). O atual PPA relaciona 11 macrodesafios e 109 programas, que são de dois tipos, conforme a finalidade: sessenta e cinco Programas Temáticos, que retratam a agenda de governo organizada pelos temas das políticas públicas e orientam a ação governamental; e quarenta e quatro Programas de Gestão, Manutenção e Serviços ao Estado, que reúnem um conjunto de ações destinadas ao apoio, à gestão e à manutenção da atuação governamental (BRASIL, 2011b). Como pode ser visto, houve drástica redução no número de programas. No setor de defesa, os vinte e seis Programas Finalísticos do PPA anterior deram lugar a apenas um Programa Temático (nova denominação) intitulado “Política de Defesa Nacional”. O nome do Programa sugere, em tese, que os objetivos propostos nos dois principais documentos de defesa, a PND e a END, poderão integrar, finalmente, o universo de políticas públicas que fazem parte do planejamento de médio prazo do Governo Federal. Corroborando esse sentimento, a mensagem presidencial que encaminhou o Plano ao Congresso Nacional fez constar o seguinte trecho ao apresentar o macrodesafio “Integridade e Soberania Nacional”, do qual esse Programa Temático relacionado ao setor de defesa faz parte (BRASIL, 2011b, p. 272): A Estratégia Nacional de Defesa (END), publicada em dezembro de 2008, por sua vez, constituiu-se em marco histórico na evolução do pensamento de defesa em nosso país. Pela primeira vez, o poder político tomou a si a 39 responsabilidade de definir os parâmetros que balizarão a evolução do segmento militar no contexto da estrutura de defesa nacional [...]. No Plano, cada Programa Temático passou a ser constituído por Objetivos, Metas e Iniciativas. Os Objetivos constituem-se na principal inovação desse PPA, na medida em que orientam a ação governamental para a implementação de determinada política pública. A cada Objetivo estão associadas Metas, que são indicações que fornecem parâmetros simples e transparentes para a realização esperada durante o período do Plano, resgatando uma dimensão que, anteriormente, se confundia com o produto das ações orçamentárias (BRASIL, 2011b, p. 115). Outra inovação no PPA é a inexistência do detalhamento das Ações, que agora constam apenas dos orçamentos. Essa alteração pretende distinguir o Plano do Orçamento a fim de respeitar as diferenças estruturais entre eles. A sobreposição anterior confundia o PPA com o Orçamento, à medida em que mantinha níveis idênticos de agregação entre os instrumentos (BRASIL, 2011b, p. 115). Assim, a análise dos planos plurianuais elaborados a partir do ano de 2000 nos leva a inferir que o setor de defesa não tem conseguido influenciar, efetivamente, o planejamento estratégico do país. O atual PPA, 2012-2015, já esboça uma aproximação do Programa Temático do setor aos objetivos traçados pela END. No entanto, como forma de possibilitar a alocação dos correspondentes recursos orçamentários, ainda será preciso avançar mais no sentido de inserir, de forma concreta, os projetos estratégicos das Forças Armadas naquele que é, por imposição constitucional, o planejamento governamental de médio prazo, condicionante das demais leis orçamentárias. 4.2 O ORÇAMENTO DE DEFESA Conforme comentado no início deste capítulo, a análise do orçamento proporciona a base para estudar-se como se planeja e executa as políticas públicas, traduzindo, em termos financeiros, quais são as prioridades do país. Nas palavras de Almeida (2005, p. 44), “o orçamento é a materialização da ação governamental”. O ministro da Defesa, Celso Amorim, na Aula Magna proferida aos 40 estagiários de 2013 do Curso Superior de Defesa11 (CSD), da Escola Superior de Guerra, bem como na abertura do VI Simpósio Internacional de Logística Militar, reconheceu que, apesar de estar crescendo nos últimos anos, o orçamento do setor ainda é modesto, e apontou como meta para os próximos dez anos alcançar 2% do PIB com gastos em defesa, que hoje é de 1,5% (AMORIM, 2013, p. 5). Essa aspiração do ministro Celso Amorim, também exposta em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, em 9 de maio de 2013 (MINISTRO..., 2013), baseia-se na comparação dos gastos militares entre os países, em especial aqueles que se equiparam ao Brasil em termos geopolíticos. Dentre os países do BRICS, grupo político de cooperação formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, o nosso país foi o segundo que menos gastou com defesa, em relação ao PIB, em 2012, superando apenas o país africano. A tabela abaixo mostra-nos que o dispêndio brasileiro corresponde a um quinto do chinês e a um terço do russo. Entre os anos 2000 e 2012, ou seja, no período posterior à criação do Ministério da Defesa, o Brasil foi o que menos aumentou as despesas militares. País Posição (no mundo) Despesa (USD bilhões) China 2 166,11 % (no total mundial) 9,7 Rússia 3 90,75 Índia 8 Brasil 11 Despesa (% PIB) Variação 2000-2012* (%) 2,0 348,5 5,3 4,4 179,1 46,13 2,7 2,5 66,8 33,14 1,9 1,5 31,6 África do Sul 39 4,47 * A valores constantes de USD de 2011 0,3 1,1 31,7 Tabela 1: Participação dos países do BRICS nos gastos com defesa em 2012. Fonte: SIPRI, 2013. Quando o gasto brasileiro com defesa é comparado ao dos países vizinhos, ainda em relação ao PIB, o resultado também parece apresentar espaço para o crescimento, conforme demonstrado na tabela 2. Da mesma forma que na comparação com o BRICS, o Brasil investiu pouco em defesa no período de existência do MD, tendo sido o segundo que menos aumentou suas despesas 11 Criado em 2012, o CSD destina-se a preparar civis e militares para o exercício de funções de assessoramento de alto nível que envolvam assuntos de defesa, tanto no âmbito do Ministério da Defesa como nos demais órgãos governamentais de interesse da Defesa Nacional. 41 militares no continente sul-americano, em que pese responder, em termos absolutos, por praticamente a metade de todo o gasto da região. País Posição (no mundo) Despesa (USD bilhões) No total mundial (%) Despesa (% PIB) Variação 2000-2012* (%) Equador 57 2,38 0,1 3,4 291,3 Colômbia 18 12,15 0,7 3,3 99,9 Chile 33 5,48 0,3 2,1 64,7 Uruguai 69 0,97 0,1 1,9 10,8 Paraguai 84 0,42 0,02 1,8 94,0 Guiana 127 0,03 0,002 1,8 77,7 Brasil 11 33,14 1,9 1,5 31,7 Bolívia 88 0,40 0,02 1,5 46,1 Peru 55 2,56 0,1 1,3 62,0 Venezuela 49 4,01 0,2 1,0 48,2 Argentina 41 4,34 0,3 0,9 100,0 * A valores constantes de USD de 2011 para o período 2000 a 2011 Tabela 2: Gastos militares dos países da América do Sul em 2012. Fonte: SIPRI, 2013. Apesar das limitações e dificuldades, reconhecidas pelo próprio SIPRI12, na interpretação dos dados fornecidos pelos países pesquisados, em face de eventuais diferenças conceituais na prestação de informações sobre a defesa, os gastos militares representaram, em 2012, em média, 2,5% do PIB mundial (SWEDEN, 2013). O Brasil está abaixo dessa média, embora em termos absolutos seja, atualmente, o 11º país que mais despende recursos com defesa no mundo, sendo o maior na América do Sul, como já abordado. A comparação dos orçamentos de defesa entre os países demonstra que, em termos absolutos, os Estados Unidos da América respondem por 40% de todos os gastos militares do mundo, representando quatro vezes o dispêndio da China, a segunda colocada. Isso se deve à realidade do país que possui o maior economia do mundo e que estimula a sua estratégia de manutenção de supremacia entre as nações (SWEDEN, 2013). Ainda de acordo com os dados divulgados no relatório de 2013 do SIPRI, o 12 O Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI) é um instituto internacional independente, com sede em Estocolmo, dedicado à pesquisa sobre conflitos, armamentos, controle de armas e desarmamento. Fundado em 1966, fornece dados, análises e recomendações, com base em fontes abertas, para os governantes, políticos, investigadores, meios de comunicação e ao público interessado. 42 Brasil manteve o percentual de gastos militares em relação ao PIB praticamente constante desde a criação do Ministério da Defesa. O mesmo não pode ser dito quando se compara a participação das despesas do setor de defesa no Orçamento da União. Almeida (2005, p. 53), com base em informações obtidas nos relatórios e pareceres prévios sobre as contas anuais do Governo da República, emitidos pelo TCU, verificou o percentual das despesas militares nos gastos totais da União, ano a ano, desde 1950, e concluiu que ele vem decrescendo, o que evidencia a queda de importância, em termos orçamentários, do setor de defesa. A tabela a seguir apresenta como essa queda foi acentuada. Despesa Anos 50 Anos 60 Anos 70 Anos 80 Anos 90 Defesa / União 24,1 17,0 12,8 7,6 2,2 Tabela 3: Participação do setor de defesa na despesa total da União, por décadas, no período de 1950 a 1990, em %. Fonte: Almeida, 2005, p. 53-55. Dados do Ministério da Defesa indicam que, a partir do ano 2000 − período pesquisado neste trabalho −, a participação da defesa nacional no Orçamento da União continuou a sua trajetória de queda. A tabela abaixo nos mostra que apesar de vir ocorrendo uma leve recuperação desde 2008, ainda se observa um percentual inferior ao do início do período considerado. Despesa 2000 2000-2003* 2004-2007* 2008-2011* 2012 Variação 2000/2012 Defesa / União 2,31 1,97 1,64 1,93 2,13 -0,08 * média do período Tabela 4: Participação do setor de defesa na despesa total da União 2000 a 2012, em %. Fonte: Ministério da Defesa. Quando se compara o orçamento por ministérios, o da Defesa ocupa a quarta colocação em números absolutos, ficando atrás apenas da Previdência Social, da Saúde e da Educação13. Dizendo dessa forma, parece que, em termos nacionais, o orçamento de defesa é privilegiado. Entretanto, há que se considerar que os recursos orçamentários destinados ao pagamento do pessoal militar (ativo e 13 Anexo II da Lei nº 12.798 (LOA), de 4/4/2013 (BRASIL, 2013). 43 inativo) e os encargos sociais são computados no orçamento do MD, o que não acontece com os demais ministérios. A tabela a seguir mostra o percentual de despesas com pagamento de pessoal no orçamento de defesa ainda é elevado, mas vem regredindo. Despesa Pagamento de pessoal (%) * média do período 2000 2000-2003* 2004-2007* 2008-2011* 2012 Variação 2000-2012 72,9 75,9 77,8 74,2 71,2 -2,2 Tabela 5: Participação das despesas com pessoal no orçamento de defesa, período 2000 a 2012, em %. Fonte: Ministério da Defesa. Nas análises realizadas sobre o orçamento militar no Brasil encontram-se, com frequência, críticas a esse elevado custo com pagamento de pessoal, o que resultaria no baixo montante de recursos para o custeio e o investimento nas Forças Armadas. Alsina Jr. (2006, p. 169-170) assim sintetiza: A precariedade material hoje existente na Marinha, no Exército e na Aeronáutica (em níveis diferenciados) é um reflexo direto de distorções acumuladas ao longo de décadas. Essas, por sua vez, decorrem de forma importante do aumento paulatino das restrições orçamentárias acopladas ao peso ascendente das despesas com o pessoal inativo (fundamentalmente) e ativo (subsidiariamente). Esse tipo de comparação, que inclui os gastos com pagamento de pessoal, pode levar à conclusão equivocada de que se gasta muito com defesa nacional. E essa comparação produz argumentos frequentemente adotados por aqueles que são contrários ao incremento de recursos para as Forças Armadas. É fato que o dispêndio com o pagamento de pessoal sobrecarrega o orçamento público, mas isso é inexorável, principalmente em um país com as dimensões e a população do Brasil, onde ter um grande efetivo militar é compreensível e, até certo ponto, necessário. No entanto, as pesquisas mostram que o Brasil, em termos proporcionais da sua população, quando comparado com outros países, inclusive os da América do Sul, não possui um contingente tão grande assim. Além disso, os militares brasileiros são os que possuem a menor média salarial do setor público federal (CABRAL, 2007, p. 132-133). 44 Uma outra forma de comparar gastos, inclusive expurgando o peso do pagamento de pessoal, é mediante a análise de gastos por funções de governo14. Rosière (2005, p.129) afirma que os orçamentos públicos no Brasil são elaborados por funções, que representam o maior nível de agregação das ações de governo. Portanto, o orçamento do Ministério da Defesa não deve ser adotado como referencial para efeito de comparação, mas, sim, os recursos alocados à função defesa. Resumindo, o autor afirma: “uma comparação tecnicamente correta deve levar em consideração os orçamentos públicos consolidados por função de governo”. A tabela a seguir mostra os maiores gastos, em termos de volume financeiro, por funções de governo no período de 2000 a 2012. Função 2000 2000-2003* 2004-2007* 2008-2011* 2012 Variação 2000-2012 Prev. Social 15,2 17,2 18,1 21,1 21,7 26,0 Saúde 3,3 3,5 3,5 4,1 4,3 22,0 Educação 1,7 1,8 1,7 2,9 3,9 116,7 Assistência Social 0,8 0,9 1,7 2,5 3,1 235,1 Defesa Nacional 1,7 1,7 1,7 2,1 2,3 35,3 * média do período Tabela 6: Despesas empenhadas no total da União, por funções selecionadas, no período de 2000 a 2012, em %. Fonte: Tribunal de Contas da União - Relatórios e Pareceres Prévios sobre as Contas do Governo da República (2000 a 2012). A análise dos dados da tabela acima nos leva a concluir, portanto, que nos últimos anos o governo vem, de fato, priorizando a assistência social e a educação, cujas participações nas despesas da União aumentaram em 235,1% e 116,7%, respectivamente, enquanto a participação do setor de defesa, no mesmo período, evoluiu muito pouco, 35,3%. Visto, de forma sintética, como se situa o orçamento de defesa brasileiro, quando comparado a outros países e, também, a outros setores do governo, vamos passar a verificar mais detalhadamente como ele se compõe. Nas tabelas a seguir, faremos uma breve análise sobre a composição do 14 Portaria nº 42/1999 do então Ministério de Orçamento e Gestão, que define a despesa por 28 funções de governo (BRASIL, 1999). 45 orçamento do Ministério da Defesa por Grupo de Natureza de Despesa (GND), que representam uma forma de classificação da despesa, assim descrita: (1) Despesas com Pessoal e Encargos Sociais; (2) Juros Encargos da Dívida; (3) Outras Despesas Correntes; (4) Investimentos; (5) Inversões Financeiras; e (6) Amortização da Dívida. Para efeito de simplificação das comparações, consideraremos as inversões financeiras15 incluídas nos investimentos e apenas as despesas primárias, que são aquelas que não incluem o serviço da dívida. Os investimentos, por sua vez, são despesas de capital, execução de obras, aquisição de imóveis, bem como a aquisição de instalações, equipamentos e material permanente. O item custeio envolve todos os gastos para a manutenção da máquina pública que não estejam sendo tratados nos outros itens; e as despesas de pessoal são as relacionadas aos gastos da folha de pagamento dos servidores civis e militares, ativos, inativos e pensionistas. Podemos verificar na tabela a seguir como foi composto o orçamento do Ministério da Defesa e a sua comparação como o PIB e a despesa primária da União, no período de análise deste trabalho. Despesa \ GND 2000 2000-2003* 2004-2007* 2008-2011* 2012 PIB 1.179,48 1.414,85 2.279,89 3.491,47 4.402,54 Desp. Primária União 102,95 206,27 389,73 644,36 854,53 Desp. Primária MD 12,66 21,75 33,08 53,58 65,5 Pessoal 15,12 19,07 26,69 41,04 47,27 Custeio 2,54 2,78 4,24 6,91 8,2 Investimentos 1,73 1,58 2,16 5,63 10,03 * média do período Tabela 7: Série comparativa do desempenho orçamentário do Ministério da Defesa, período 2000 a 2012, em R$ bilhões. Fonte: Ministério da Defesa. 15 Inversões financeiras são os gastos relacionados à aquisição de imóveis ou de bens de capital já em utilização; aquisição de títulos do capital de empresas ou entidades, já constituídas, quando não importe aumento do capital; constituição ou aumento do capital de empresas ou entidades que visem a objetivos comerciais ou financeiros, inclusive operações bancárias ou de seguros, conforme previsto no Art. 12, § 5°, da Lei nº 4.320/64 (BRASIL, 1964). 46 Pode-se notar com mais detalhes no gráfico a seguir que o orçamento do MD vem perdendo importância quando comparado às despesas do governo, tendo reduzido em quase 37% a sua participação entre os anos 2000 (10,50%) e 2012 (7,67%). 11,5 11,12 DP-MD/DP-UNIÃO (%) 11 10,65 10,5 10 10,5 9,5 9 9,31 8,4 8,88 8,5 8,55 8 8,43 8,08 8,55 8,23 8,31 7,5 7,67 7 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Gráfico 1: Participação da despesa primária do MD na despesa primária da União entre 2000 e 2012. Fonte: Ministério da Defesa. A despesa com pagamento de pessoal, apesar de ainda representar mais de setenta por cento do orçamento do MD, como já foi visto, confirma a sua trajetória de queda, de acordo com os dados apresentados no gráfico a seguir. 9,5 8,77 Pessoal MD/DP-União (%) 9 8,83 8,5 8 8,19 7,91 7,5 7 7,23 6,5 6,85 6,95 6,79 6,52 6 6,48 6,20 6,14 2010 2011 5,5 5 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Gráfico 2: Participação da despesa de pessoal do MD na despesa primária da União entre 2000 e 2012. Fonte: Ministério da Defesa. 47 Por outro lado, as despesas com custeio e investimento sofreram pouca variação, como pode ser visto no gráfico 3. Os investimentos, ainda que lentamente, apresentam trajetória ascendente, principalmente a partir de 2008, o que reflete o início dos grandes projetos previstos na END, em especial o da construção de submarinos. O custeio, no entanto, apresenta uma tendência de queda, o que é preocupante pois pode comprometer ainda mais a manutenção dos meios militares existentes e dos que estão sendo incorporados. 3,00 2,50 2,31 2,35 1,82 % na Desp. da União 2,00 1,50 2,20 1,37 1,42 1,71 1,75 1,65 1,71 1,84 1,49 1,40 1,12 1,00 1,02 1,08 1,05 1,08 1,06 1,15 1,17 1,04 0,96 1,17 0,70 0,70 0,67 0,34 0,00 1,08 1,12 0,94 0,93 0,50 2,13 1,94 2000 2001 2002 Custeio e Investimentos 2,31 2,35 1,82 Custeio 1,37 1,42 1,12 Investimentos 0,94 0,93 0,70 2003 1,40 1,06 0,34 Custeio e Investimentos 0,50 0,53 0,44 2004 1,65 1,15 0,50 2006 1,49 1,04 0,44 2005 1,71 1,17 0,53 Custeio 2007 1,71 1,02 0,70 2008 1,75 1,08 0,67 0,86 0,79 2009 1,84 1,05 0,79 2010 2,20 1,08 1,12 2011 1,94 1,08 0,86 2012 2,13 0,96 1,17 Investimentos Gráfico 3: Participação das despesas de custeio e de Investimentos do MD na despesa primária da União entre 2000 e 2012. Fonte: Ministério da Defesa. Quando comparamos as despesas do governo em relação ao PIB, vemos que elas estão crescendo. Entretanto, essa maior disposição para gastar não está sendo direcionada para o setor de defesa, conforme podemos ver nos dois quadros a seguir: 48 20,8 19,43 DP-União / % PIB 19,8 19,41 18,72 18,8 17,74 17,8 18,27 17,34 16,91 16,8 15,8 17,35 16,39 16,35 15,65 16,12 15,71 14,8 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Gráfico 4: Participação da Despesa Primária da União no PIB entre 2000 e 2012. Fonte: Ministério da Defesa. 1,9 1,82 DP-MD / PIB % 1,8 1,74 1,7 1,62 1,6 1,57 1,64 1,5 1,43 1,4 1,45 1,46 1,46 1,48 1,48 1,49 1,46 1,3 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Gráfico 5: Participação da Despesa Primária do MD no PIB entre 2000 e 2012. Fonte: Ministério da Defesa. Vimos, então, que o orçamento de defesa, desde a criação do MD, vem crescendo em termos absolutos mas não em termos relativos. Outro problema que vem contribuir para a penúria orçamentária do setor diz respeito ao recorrente contingenciamento a que o MD é submetido anualmente. Como já mencionado no capítulo 2 deste trabalho, o contingenciamento consiste no retardamento ou na não execução de parte da programação de despesa prevista na LOA. Nos últimos anos, parte da dotação contingenciada tem sido liberada apenas 49 na proximidade do encerramento do exercício financeiro, o que acarreta, em geral, dificuldade em se planejar a despesa, reduzindo significativamente a qualidade do gasto. A própria Estratégia Nacional de Defesa reconhece que a histórica descontinuidade na alocação de recursos orçamentários ainda é uma vulnerabilidade da atual estrutura de defesa do País (BRASIL, 2012a, p. 26). Além de inconstante, o orçamento destinado às Forças Armadas nas últimas décadas não tem sido suficiente nem mesmo para a adequada manutenção de navios, carros de combate e aviões, quanto mais para a tão almejada modernização do inventário de equipamentos militares. Daí a insistência com que o Ministro da Defesa, em seus pronunciamentos, tem defendido aumento real para o orçamento de defesa e que ele seja acompanhado de uma maior previsibilidade, característica indispensável para um setor que demanda investimentos de caráter plurianual. 50 5 O PAED E O DESAFIO ORÇAMENTÁRIO Os recursos demandados pela defesa exigem uma transformação de consciências, para que se constitua uma estratégia de defesa para o Brasil. Estratégia Nacional de Defesa Como já foi dito na introdução deste trabalho, o PAED é o plano que consolida as propostas das três Forças Armadas para a distribuição espacial das instalações militares e de quantificação dos meios necessários ao atendimento eficaz das hipóteses de emprego, conforme previsto na Estratégia Nacional de Defesa. O Livro Branco de Defesa Nacional (BRASIL, 2012b, p. 192) assim o descreve: O PAED consubstancia, de forma coerente, os projetos estratégicos das Forças Armadas que visam a atender às demandas por novas capacidades da Defesa. Os projetos do PAED, tanto os de articulação no território nacional quanto os de aquisição de equipamentos, necessitam de recursos orçamentários específicos para serem viabilizados. Para tanto, os projetos deverão integrar a estrutura programática orçamentária dos sucessivos Planos Plurianuais da União no horizonte temporal de 20 anos (2012 a 2031). O próprio LBDN apresenta, de forma consolidada, os principais projetos que integram o PAED e respectivos custos estimados, conforme tabelas a seguir. Projetos Período Previsto Valor Global Estimado até 2031 1. Recuperação da Capacidade Operacional 2009 — 2025 5.372,30 2. Programa Nuclear da Marinha (PNM) 1979 — 2031 4.199,00 3. Construção do Núcleo do Poder Naval 2009 — 2047 175.225,50 4. Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz) 2013 — 2024 12.095,60 5. Complexo Naval da 2ª Esquadra e 2ª Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE) 2013 — 2031 9.141,50 6. Segurança da Navegação 2012 — 2031 632,80 7. Pessoal 2010 — 2031 5.015,60 Total MB Tabela 8: Projetos prioritários da Marinha do Brasil no PAED, em R$ milhões. Fonte: BRASIL, 2012b, p. 196. 211.682,30 51 Projetos Período Previsto Valor Global Estimado até 2031 1. Recuperação da Capacidade Operacional 2012 — 2022 11.426,80 2. Defesa cibernética 2011 — 2035 839,90 3. Guarani 2011 — 2034 20.855,70 4. Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON) 2011 — 2035 11.991,00 5. Sistema Integrado de Proteção de Estruturas Estratégicas Terrestres (PROTEGER) 2011 — 2035 13.230,60 6. Sistema de Defesa Antiaérea 2010 — 2023 859,40 7. Sistema de Mísseis e Foguetes ASTROS 2020 2012 — 2023 1.146,00 Total EB 60.349,40 Tabela 9: Projetos prioritários do Exército Brasileiro no PAED, em R$ milhões. Fonte: BRASIL, 2012b, p. 200. Projetos Período Previsto Valor Global Estimado até 2031 1. Gestão Organizacional e Operacional do Comando da Aeronáutica 2010 — 2030 5.689,00 2. Recuperação da Capacidade Operacional 2009 — 2019 5.546,70 3. Controle do Espaço Aéreo 2008 — 2030 938,30 4. Capacitação Operacional da FAB 2009 — 2033 55.121,00 5. Capacitação Científico-Tecnológica da Aeronáutica 2008 — 2033 49.923,90 6. Fortalecimento da Indústria Aeroespacial e de Defesa Brasileira 2009 — 2030 11.370,20 7. Desenvolvimento e Construção de Engenhos Aeroespaciais 2015 — 2030 8. Apoio aos Militares e Civis do Comando da Aeronáutica 2010 — 2030 3.229,60 9. Modernização dos Sistemas de Formação e PósFormação de Recursos Humanos 2010 — 2028 352,00 A ser determinado pelo PNAE Total FAB Tabela 10: Projetos prioritários da Força Aérea Brasileira no PAED, em R$ milhões. Fonte: BRASIL, 2012b, p. 206. 132.170,70 52 O total do PAED, considerando as três Forças Armadas, alcança a quantia de R$ 404,2 bilhões. Voltando à proposta do Ministro da Defesa, citado no capítulo anterior, Celso Amorim justifica assim o seu pleito pelo incremento de 1,5 para 2% do PIB com os gastos em defesa (AMORIM, 2013, p. 5): Isso permitirá a implementação do PAED, hoje ainda um plano indicativo que, a despeito de não ter a força de um plano plurianual ou de uma lei orçamentária, é já uma referência fundamental para a recomposição da capacidade operacional das Forças Armadas. Nesse sentido, é fundamental transformar o PAED em política de Estado, que perpasse vários governos, de modo a garantir a sustentabilidade financeira no longo período de sua execução. Caso contrário, o plano sempre correrá o risco de ser interrompido ou adiado, o que poderá inviabilizá-lo, com o consequente desperdício dos recursos financeiros até então investidos, como frequentemente acontece com algumas políticas de governo. Os três eixos estruturantes da Estratégia Nacional de Defesa estão diretamente relacionados com a implantação do PAED. A END é um documento afirmativo e ambicioso, que traduz o projeto de construção de um país que pretende assumir um papel cada vez mais importante no mundo (BRASIL, 2012a, p. 1). Portanto, o êxito da estratégia de defesa depende, fundamentalmente, do sucesso do PAED, tendo em vista o papel primordial que exercerá na revitalização das Forças Armadas, bem como no futuro da indústria de defesa, das políticas industrial e de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) do Brasil. O PAED pode funcionar como espiral de investimentos e contribuir para o desenvolvimento nacional e o crescimento econômico. Ao conhecer as demandas das Forças Armadas, os fornecedores serão capazes de investir em produtos e serviços, inclusive os de emprego dual16, que gerem emprego e renda para os brasileiros. Como visto, o PAED necessitará de elevados recursos orçamentários, muito maiores que os destinados às Forças Armadas nos últimos anos e, além disso, envolverá projetos que demandarão contratos com duração prolongada, onde não poderá haver descontinuidade do fluxo orçamentário. O plano está estimado em 16 Produtos de emprego dual, são aqueles que podem ser utilizados tanto no meio militar quanto no âmbito civil. 53 aproximadamente R$ 400 bilhões em vinte anos. Isso representaria algo em torno de R$ 20 bilhões por ano. Portanto, para que o PAED seja efetivamente implantado e traga os benefícios que dele se espera, será necessário aumentar substancialmente o orçamento de defesa e garantir que os recursos financeiros sejam regulares. A seguir serão relacionadas algumas ações a empreender que poderão contribuir para tornar o orçamento de defesa capaz não apenas de absorver o custo da implantação do PAED, mas permitir a adequada manutenção dos novos meios e organizações previstos no plano. • Continuar a conscientizar a sociedade e os políticos Apesar dos esforços desenvolvidos nos últimos anos, ainda se configura vulnerabilidade da atual estrutura de defesa do País o envolvimento pouco significativo da sociedade brasileira nos assuntos de defesa (BRASIL, 2012b, p. 26). De fato, as atividades das Forças Armadas ainda precisam ser mais bem compreendidas. Os resultados de uma relevante pesquisa realizada em 2011 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostram que a sociedade não se preocupa com a defesa nacional. A maioria das pessoas até concorda com o aumento do montante de gastos governamentais para aquisição de equipamentos militares no Brasil, mas, por outro lado, a maior parte dos entrevistados opinou que as Forças Armadas devem ser utilizadas no combate ao crime organizado e não nas funções básicas e essenciais que dizem respeito à defesa do país (BRASIL, 2011c, p. 38). É indispensável que as Forças Armadas tenham a capacidade de sensibilizar a população para o tema da defesa nacional. O esforço que já vem sendo feito precisa ser intensificado para que essa questão esteja incorporada na pauta da sociedade brasileira. É isso que vai garantir o interesse do tema entre os políticos do Executivo, a quem cabe formular as políticas públicas demandadas pela sociedade, e os do Legislativo, que têm a capacidade de influenciar na elaboração do orçamento de defesa. • Revisar o PAED de forma realista Há que se admitir que, na atual conjuntura, é muito difícil imaginar que o 54 setor de defesa venha a ser contemplado com recursos tão vultosos, como o que foi estimado para o PAED. Dessa forma, o Ministério da Defesa precisa rever esse Plano, trazendo-o a valores mais palatáveis e condizentes com a situação econômica do país. É necessário ser criterioso na aceitação dos projetos propostos pelas Forças, priorizando os projetos que estejam de fato alinhados com a Política e a Estratégia Nacional de Defesa. Não adianta simplesmente consolidar os plano das Forças Singulares, conforme descrito na END (BRASIL, 2012a, p. 32), pois dificilmente haverá recursos financeiros para fazer tudo. Diante de tantas demandas, agravadas pelo longo período sem investimento no setor, o Ministério da Defesa deve ser capaz de responder quais, dentre os pertinentes projetos estratégicos vislumbrados pelo setor, serão atendidos prioritariamente. Nesse pensamento, Moura Neto afirmou: “os projetos de articulação e equipamento deverão ser relacionados separadamente, sendo destacados os projetos prioritários” (informação verbal).17 Ensina o dito popular que quando tudo é prioridade, nada é prioridade. Como todos os projetos incluídos no PAED são estratégicos e importantes, há que se definir o que é realmente prioritário. Essa definição depende de um árduo trabalho técnico para selecionar e ordenar os projetos em termos de prioridades absolutas, sem esquecer - e isso é fundamental - os correspondentes gastos incrementais de custeio. • Transformar o PAED numa Lei Apesar de constar no LBDN, há a intenção de que o PAED seja formalizado em um documento à parte, que será apresentado ao Congresso Nacional, em forma de projeto de lei, após aprovado pela presidência da República (BRASIL, 2009). Moura Neto ressaltou a importância desse trâmite: “com isso, buscar-se-á que fiquem assegurados os recursos necessários às metas físicas adotadas e o compromisso dos Poderes Executivo e Legislativo com esse planejamento de longo prazo e sua característica de Projeto de Estado” (informação verbal).18 No entanto, há que se reconhecer que não será uma tarefa fácil a 17 Palestra proferida pelo Almirante-de-Esquadra Júlio Soares de Moura Neto, Comandante da Marinha, aos estagiários do Curso Superior de Defesa, na Universidade da Força Aérea, Rio de Janeiro, 2013. 18 Palestra idem. 55 elaboração de uma lei para o PAED. O primeiro obstáculo será convencer o Executivo a apreciar um projeto de lei dessa natureza e enviá-lo ao Congresso, ou, até mesmo, editar uma Medida Provisória, para discussão nas comissões de defesa nacional e posterior votação em plenário. Entretanto, uma lei contendo o PAED, condizente com as possibilidades atuais do país e coerente com as prioridades da defesa nacional, poderá estabelecer as metas, situadas no tempo, ano a ano, que deverão servirão de subsídios para o Programa sobre a defesa nacional no PPA, orientar o capítulo correspondente da LDO e, finalmente, servir de base para a elaboração da LOA no que diz respeito à citada função (SALOMÃO, 2012). • Fazer constar o PAED no Plano Plurianual O Capítulo 2 deste trabalho procurou demonstrar a interação entre o planejamento e o orçamento, destacando que a nossa atual Constituição instituiu o Plano Plurianual como o principal instrumento de planejamento orçamentário do governo brasileiro. Assim, foi atribuído ao PPA um papel fundamental de organização da ação do Estado, tendo em vista que a elaboração dos demais documentos de planejamento e orçamento deve ser submetida às suas disposições. A Carta Magna é clara em estabelecer que os planos e programas nacionais devem ser compatíveis com o PPA (art. 165, § 4º) e, da mesma forma, que a LDO e a LOA não contenham dispositivos incompatíveis com o Plano Plurianual (art. 166). Vimos, também, que a Estratégia Nacional de Defesa ainda não tem conseguido influenciar, como deveria, a elaboração do PPA. Já houve um avanço, apesar de tímido, no PPA 2012-2015, mas, de modo geral, ainda há uma reduzida aderência entre os objetivos, metas e iniciativas do Plano Plurianual aos objetivos estratégicos previstos na END. Dessa forma, para que o orçamento de defesa venha a ser contemplado com o volume de recursos necessários para a implantação do PAED, é indispensável que ele passe, de fato, a constar do PPA. Por mais que existam diversas críticas entre os estudiosos acerca da eficácia do PPA como um plano estratégico de governo, é certo que a nossa atual Constituição determina que a realização da despesa pública será precedida pela apreciação de três leis orçamentárias, da qual o PPA é a mais estratégica. 56 Ao incluir o PAED no PPA, reforça-se a apreciação do Plano pelo Congresso Nacional, construindo, ao menos em tese, um compromisso político entre os Poderes Executivo e Legislativo, orientando a formulação das leis orçamentárias durante a vigência do PPA. • Buscar medidas que impeçam o contingenciamento dos recursos de defesa Como também visto no segundo capítulo deste trabalho, mesmo que uma política pública esteja prevista no orçamento, não há garantia de que ela será realizada, pois pode ser contingenciada. Um dos ministérios que mais tem sido atingido com o contingenciamento é justamente o MD, o que dificulta significativamente o planejamento e a execução orçamentária das Forças Armadas, tendo em vista que a maior parte dos recursos contingenciados permanece nessa situação até o encerramento do exercício financeiro. Na tabela a seguir podemos verificar o contingenciamento aplicado aos recursos do Ministério da Defesa nos últimos quatro anos. Montantes 2010 2011 2012 2013 LOA + Créditos (a) 15.924.954.000 15.275.079.000 16.525.046.742 18.967.458.409 LME19 inicial 10.020.545.000 10.891.927.000 13.206.000.000 15.134.636.306 Contingenciamento (b) 5.904.409.000 4.383.152.000 3.319.046.742 3.832.822.103 b / a (%) 37,08 28,69 20,08 20,21 Tabela 11: Contingenciamento do Ministério da Defesa no período 2010 a 2013, em R$. Fonte: Ministério do Planejamento. Recentemente, o Governo Federal, a pretexto de equilibrar as contas públicas, anunciou novo contingenciamento em 2013, o que foi formalizado pelo Decreto nº. 8.062, de 29 de julho de 2013. Foram subtraídos mais R$ 919 milhões do LME do Ministério da Defesa, o que agrava ainda mais a restrição orçamentária vivida pelo setor. No total, foram contingenciados R$ 4.7 bilhões, ou 25% da dotação inicial. 19 Limite de Movimentação e Empenho, ou seja, aquilo que pode ser utilizado do orçamento aprovado. 57 Com base nesse contexto, é importante que se busquem medidas para reduzir o montante contingenciado no orçamento do Ministério da Defesa. Existe uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Senador Marcelo Crivella, já aprovada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, mas com tramitação paralisada, que veda limitações ao orçamento das Forças Armadas. É importante que medidas como essa, ou, talvez, outras ainda mais expeditas, sejam prestigiadas pelo MD, trazendo o assunto ao debate. Em 2013, o MD conseguiu incluir quatro projetos estratégicos de defesa no PAC20. O principal benefício vislumbrado pelos defensores dessa inclusão é o fato de que esses projetos estarão livres de contingenciamento, tendo em vista que as despesas daquele Programa vêm sendo isentas desse risco anualmente na LDO. É claro que essa medida traz consequências positivas para a administração desses importantes projetos, que poderão se beneficiar com a tão almejada regularidade de recursos. Entretanto, o que não se pode esquecer é que ter apenas uma parte da programação orçamentária não passível de contingenciamentos ou cortes, tal como acontece com as despesas obrigatórias, reduz o poder discricionário do MD de decidir aonde aplicar os eventuais contingenciamentos, que, infelizmente, são determinados Governo Federal todos os anos. O resultado é que os recursos para o custeio e manutenção dos meios militares acabam sendo os mais atingidos por esses contingenciamentos, contribuindo para o sucateamento das Forças. Incluir alguns projetos estratégicos no PAC foi uma medida positiva para o setor de defesa, mas temos de avançar mais na blindagem do orçamento da setor, sendo o ideal, portanto, que nenhum recurso aprovado na Lei Orçamentária seja contingenciado. 20 Os seguintes projetos da defesa foram incluídos no PAC pela Portaria nº 29, de 15/04/2013, da Secretaria do Orçamento Federal: Programa de Construção de Submarinos (PROSUB), Programa Nuclear da Marinha (PNM), Aquisição de Helicópteros (Projeto H-X BR) e Aeronave KC-390. 58 6 CONCLUSÃO A elaboração de um Plano de Articulação e Equipamento de Defesa, inserida no contexto da estruturação das Forças Armadas, conforme preconizado pela Estratégia Nacional de Defesa, configura, sem dúvida, um avanço no sentido de harmonizar as principais ações do Ministério da Defesa para transformar a defesa nacional, de modo a torná-la condizente com a importância cada vez maior do Brasil no cenário internacional. No entanto, a implementação desse Plano implicará elevado dispêndio de recursos financeiros, o que contrasta com o insuficiente patamar orçamentário atualmente destinado às Forças Armadas. Nosso objetivo com este trabalho foi o de ampliar essa discussão ao tratar de questões do orçamento público, procurando mostrar o imenso desafio orçamentário que o PAED terá de superar para se materializar. Assim, verificamos como surgiu o orçamento público, destacando o seu caráter inicial de controle sobre as finanças públicas com a previsão da receita e estimativa da despesa, e sua evolução no sentido de se tornar, também, um instrumento de administração que auxilia o Poder Executivo nos processos de planejamento e realização das ações do Estado. No Brasil, a integração entre o orçamento público e o planejamento governamental foi sendo consolidada ao longo da história do país, desde os tempos do Império até a sua normatização pela Constituição de 1988, quando surgiram os três elementos fundamentais do processo orçamentário atual: PPA, LDO e LOA. É por intermédio desse processo que o Estado busca satisfazer às necessidades da sociedade, identificadas e formalizadas por intermédio de políticas públicas, sendo uma delas a defesa nacional. No Brasil, em relação à política de defesa, essa necessidade não é significativa e isso muito se deve a ainda baixa percepção da importância do “bem” defesa para a sociedade. Nos últimos anos tem havido grande esforço do estamento militar para tornar o tema defesa presente na Agenda Nacional. São exemplos: a elaboração da Política e da Estratégia Nacional de Defesa; e a criação do Ministério da Defesa. Verificamos que, além da política e da estratégia, um adequado orçamento também constitui elemento indispensável à construção de uma efetiva defesa nacional. A política estabelece os objetivos e especifica o que fazer, a estratégia 59 define como fazer e o orçamento contribui para transformar em realidade os conceitos firmados na política e consubstanciados na estratégia. No entanto, a análise dos planos plurianuais elaborados desde o ano 2000 e, em consequência, os respectivos orçamentos destinados às Forças Armadas nesse período, nos revelou que o setor de defesa não tem conseguido influenciar, efetivamente, o planejamento estratégico do país. Quando comparado a outros países, seja entre aqueles que possuem características geopolíticas semelhantes, seja entre os nossos vizinhos sul-americanos, o Brasil é o que tem vivenciado o menor crescimento nas despesas militares. Internamente, o orçamento de defesa, apesar de esboçar um crescimento em termos absolutos, vem tendo sua participação reduzida no orçamento da União, o que demonstra a baixa prioridade atribuída ao setor pelos últimos governos. Por outro lado, podemos verificar um crescimento, ainda que discreto, na rubrica de investimentos, principalmente a partir de 2008, o que reflete o início dos grandes projetos previstos na END, em especial o da construção de submarinos. O gasto com o custeio, no entanto, apresenta uma tendência de queda, o que é preocupante, pois pode comprometer, ainda mais, a manutenção dos meios militares existentes, bem como daqueles que estão sendo incorporados. Outro problema a agravar a situação orçamentária do setor de defesa diz respeito aos contingenciamentos impostos pelo Poder Executivo. Nos últimos anos, o MD tem sido um dos ministérios mais afetados por essa prática, implicando maior dificuldade para o planejamento das despesas e reduzindo significativamente a qualidade do gasto. Além de inconstante, o orçamento destinado às Forças Armadas nas últimas décadas não tem sido suficiente nem mesmo para a adequada manutenção de navios, carros de combate e aviões, quanto mais para a tão almejada modernização do inventário de equipamentos militares. Nesse cenário, não se imagina ser possível implementar os projetos estratégicos da forma como estão previstos no PAED, cujo montante financeiro alcança mais de quatrocentos bilhões de reais, o que, numa divisão aritmética simples, representaria um incremento em torno de vinte bilhões de reais por ano no orçamento das Forças Armadas durante o período do Plano, até 2031. O êxito da estratégia de defesa formulada para o Brasil depende, fundamentalmente, do sucesso do PAED, tendo em vista o papel primordial que exercerá na revitalização das Forças Armadas, bem como no futuro de nossa 60 indústria de defesa. Esse Plano poderá funcionar como indutor de investimentos e contribuir para o desenvolvimento nacional e o crescimento econômico. Ao conhecer as demandas das Forças Armadas, os fornecedores serão capazes de investir em produtos e serviços, inclusive os de emprego dual, que gerarão emprego e renda para os brasileiros. Esse cenário somente se materializará com planejamento eficiente e fluxos contínuos de recursos orçamentários. Urge, pois, a adoção, por parte do Poder Executivo, de ações que tornem o orçamento de defesa capaz de não apenas absorver o custo da implantação do PAED, mas também permitir a adequada manutenção dos novos meios e organizações militares previstos no Plano. Nesse sentido, é fundamental convencer as elites políticas de que é indispensável transformar o PAED em uma política de Estado, que perpasse vários governos, de modo a garantir a sustentabilidade financeira no longo período de sua execução. Caso contrário, o plano sempre correrá o risco de ser interrompido ou adiado, o que poderá inviabilizá-lo, com o consequente desperdício dos recursos financeiros até então investidos. É indispensável, também, que as Forças Armadas sejam capazes de sensibilizar a população para o tema da defesa nacional. O esforço que já vem sendo feito precisa ser intensificado para que essa questão seja definitivamente incorporada à pauta da sociedade brasileira. É isso que irá despertar o interesse dos políticos do Executivo, a quem cabe formular as políticas públicas demandadas pela sociedade, e os do Legislativo, que têm a capacidade de influenciar na elaboração do orçamento de defesa. Deve ser construído um arranjo político que permita reunir militares e civis, partidos políticos e sociedade, com a finalidade de proporcionar a atuação sinérgica desses grupos na definição de prioridades estratégicas, na alocação de recursos e na elaboração do orçamento. Todos os projetos incluídos no PAED são estratégicos e importantes, mas devemos revisá-los, redefinindo prioridades que devem ser escalonadas ao longo do tempo, de modo a tornar o Plano adequado à conjuntura orçamentária do país. Essa revisão demandará árduo trabalho técnico para selecionar e ordenar os projetos em termos de prioridades absolutas, sem esquecer − e isso é fundamental − os correspondentes gastos incrementais de custeio. Por mais que existam críticas entre os estudiosos acerca da eficácia do PPA 61 como um plano estratégico de governo, o certo é que a nossa atual Constituição determina que a realização da despesa pública será precedida da avaliação das três leis orçamentárias, da qual o PPA é a mais estratégica. Ao incluir o PAED no PPA, reforça-se a apreciação desse Plano pelo Congresso Nacional, construindo, ao menos em tese, o compromisso político entre os Poderes Executivo e Legislativo, orientando a formulação das leis orçamentárias durante a vigência do PPA. Nesse mesmo contexto, para fortalecer a sua execução, seria interessante o PAED ser sustentado por uma lei, coerente com as prioridades da defesa nacional, que possa estabelecer o cronograma das metas que servirão de subsídios para a elaboração das leis orçamentárias. A maior parte dos investimentos realizados pelas Forças Armadas envolve projetos que demandam longo prazo para a sua efetivação, ultrapassando, com frequência, o exercício financeiro em que foram iniciados. Portanto, para a defesa nacional, a inclusão de seus projetos estratégicos no planejamento governamental é fundamental, tendo em vista a sua característica plurianual. Apesar do avanço obtido recentemente com a inclusão de alguns projetos estratégicos no PAC, temos de continuar a busca de apoio político para progredir ainda mais na blindagem do orçamento de defesa, sendo ideal que todos os recursos aprovados na Lei Orçamentária do setor sejam imunes ao contingenciamento. O PAED, dada a sua importância estratégica, não pode correr o risco de se transformar apenas em uma “lista de desejos” elaborada pelas Forças Armadas ou em um plano que exista apenas no papel. Precisamos torná-lo viável. Portanto, para que o PAED seja efetivamente implantado e traga os benefícios que dele se esperam, será necessário aumentar substancialmente o orçamento de defesa e garantir que os recursos financeiros sejam regulares e contínuos. Conseguir isso não será tarefa fácil. Será um enorme desafio. Vale ressaltar, no entanto, que as primeiras ações já estão sendo adotadas no sentido de conquistar “corações e mentes” para a luta pela transformação das Forças Armadas. São exemplos os recentes debates sobre o tema com políticos, com a sociedade e com o meio acadêmico. Cabe, agora, ao setor de defesa, manter o impulso e estar preparado para aproveitar o êxito dessas iniciativas, planejando de forma adequada o seu futuro, condizente com as riquezas e a grandiosidade do nosso país. 62 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Carlos Wellington Leite de. Economia e orçamento para a defesa nacional. Revista do Tribunal de Contas da União. Brasília, v. 32, n. 90, p. 22-32, out./dez. 2001. ______. 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