Anais do VIII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216
A RECEPÇÃO CRÍTICA DO ROMANCE O PRIMO BASÍLIO: A POLÊMICA
ENTRE MACHADO DE ASSIS E EÇA DE QUEIRÓS
Marcos Antonio Rodrigues
(G – UNESP/Assis – Bolsista/FAPESP)
Márcio Roberto Pereira
(Orientador – UNESP/Assis)
Introdução
O romance O Primo Basílio, de Eça de Queirós (1845-1900), foi publicado
em 1878, sendo uma das grandes novidades do meio literário da época. Eça de Queirós foi um
dos maiores nomes do Realismo/Naturalismo e um dos maiores prosadores em língua
portuguesa.
O Realismo surge primeiramente na França, tendo como marco o ano de
1857, com a publicação de Madame Bovary, de Gustave Flaubert, seguido pelo Naturalismo e
pelo Parnasianismo, que juntos integraram as chamadas: “Escolas Realistas”. Isso se deu em
meio às conturbadas revoluções político-sociais europeias, inseridas em um espírito
racionalista que teve como suporte o grande desenvolvimento cientifico e o significativo
crescimento econômico-industrial.
Essa grande onda de mudanças atinge todos os campos do conhecimento,
dando origem à chamada “Geração Materialista” da segunda metade do século XIX. O
período tem como base intelectual: o positivismo de Comte, o determinismo de Taine, o
socialismo utópico de Proudhon e o socialismo científico de Marx e Engels, o evolucionismo
de Darwin, a negação do cristianismo de Renan, entre outras correntes, que serviram de
suporte às transformações da época.
Nesse meio, nascem novos estilos literários com
propósitos realistas que, embora possuam características distíntas, todos se posicionam contra
o Romantismo e suas convenções com o objetivo de superá-lo. Assim, o Realismo acaba que
deplorando o subjetivismo e o idealismo romântico, procurando retratar criticamente os temas
do quotidiano por meio de uma observação e descrição detalhista da realidade.
O principal alvo dessa crítica era a decadente sociedade da época, fruto da
educação e do tradicionalismo romântico que, para os realistas, era vazio e não condizia com
a realidade. Em suma, a sociedade como um todo se tornou objeto dessa análise crítica: clero,
burguesia e monarquia.
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Em Portugal, o Realismo teve origem com a polêmica estabelecida entre os
românticos e os jovens estudantes de Coimbra, mais conhecida por “Questão Coimbrã”
(1865). Esses jovens escritores de Coimbra compunham a chamada “Geração de 70”,
composta por Antero de Quental, Teófilo Braga, Guerra Junqueiro, o ficcionista Eça de
Queirós, entre outros.
Eça de Queirós publica o primeiro romance realista-naturalista português,
O Crime do Padre Amaro, em 1874, inaugurando uma intensa crítica ao clero católico e sua
relação com a classe burguesa. Desse modo, não era de se esperar por menos em O Primo
Basílio, publicado logo em seguida, romance que gera grandes escândalos por denunciar a
promíscua sociedade lisboeta. A obra desenvolve a tematização do adultério feminino cujo
assunto era bastante comum na época.
Assim, o romance logo chega às livrarias brasileiras, gerando uma calorosa
polêmica, permeada de intensos debates entre os defensores e os opositores da obra. A
imprensa brasileira torna-se o palco dessa crítica, que contou com muitos nomes importantes.
Dentre esses, não poderíamos deixar de citar o de Machado de Assis, grande crítico literário e
escritor brasileiro, que publica um artigo sobre o romance e a nova estética no jornal O
Cruzeiro, em abril de 1878. Daí em diante, o assunto fornece pano para a manga,
desencadeando debates e discussões. Desta forma, esse trabalho tem por intuito verificar os
argumentos que Machado levanta contra o romance queirosiano e a estética realistanaturalista, assim como a resposta que Eça dirige ao crítico brasileiro por meio de uma carta.
Nestas condições, o intuito aqui presente é o de exaltar o diálogo entre ambos os escritores, a
fim de relevar a qualidade do debate intelectual ocorrido entre eles.
O Primo Basílio e a temática do adultério:
O Primo Basílio é um romance que tem como tema o casamento e o
adultério, destacando os vícios e hipocrisias da sociedade da época, do mesmo modo que o
romance de Gustave Flaubert, Madame Bovary, obra que também causou grandes escândalos
na época e que mais tarde serviu de inspiração ao romance queirosiano.
Em O Primo Basílio, o enredo gira em torno de Luísa, uma moça
sonhadora e romântica que, juntamente com seu marido Jorge, representa o típico casal
burguês de classe média da sociedade lisboeta do século XIX. Ela passa a sentir-se entediada
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com seu cotidiano enfadonho, devido à ausência do marido que, tendo de viajar para o
Alentejo a trabalho, deixa a esposa sozinha em Lisboa.
O tédio e a melancolia que Luísa passa a sentir perduram até a chegada de
seu primo Basílio, que também fora seu namorado durante a juventude. Basílio vinha do
Brasil, lugar onde fizera fortuna, e suas visitas à prima torna-se constantes. Luísa intensifica o
convívio com sua amiga de colégio, Leopoldina, também conhecida como “Pão-de-Queijo”,
por ela levar uma vida promíscua, permeada de traições e adultérios.
Basílio, um conquistador experiente, logo começa a rodear Luísa com o
intuito de seduzi-la; por sua vez, Luísa entrega-se facilmente às tentações. Eles passam a ter
freqüentes encontros amorosos em um lugar arranjado por Basílio a que chamam de
"Paraíso". A partir daí, ela vive em torno dessa aventura romântica, igual as dos romances que
lia.
A felicidade de Luísa perdura até o momento em que sua criada, Juliana,
apodera-se de algumas cartas comprometedoras que os amantes trocavam. Assim, com o
intuito de vingar-se da patroa e arrancar-lhe dinheiro, Juliana passa a fazer chantagens
constantes.
A vida de Luísa torna-se um pesadelo a partir de então, de modo que ela se
encontra completamente desorientada, ainda mais após ser abandona por Basílio, que
prometera levá-la para Paris. Com o retorno de Jorge e a intensidade das ameaças da criada,
Luísa quase enlouquece; por não possuir a quantia desejada por Juliana, esta exige também
que ela passe a fazer as obrigações domésticas.
Após tentar todas as soluções possíveis, Luísa percebe que a situação está
fora de suas mãos e resolve se abrir com Sebastião, um amigo íntimo da família. Ele pressiona
Juliana a devolver o que roubara da patroa, intimidando-a com a presença de um policial,
amigo seu. Com essa falsa armação, Juliana termina tendo um colapso nervoso e morre
instantaneamente. Apesar de tudo, o desfecho da obra não deixa de fluir tragicamente, pois
Jorge descobre tudo, após ler uma carta que Basílio envia para Luísa, esta que, por sua vez,
morre após uma longa agonia intermediada de receios e delírios.
O Folhetim assinado por Eleazar no jornal O Cruzeiro em abril de 1878:
Publicado em 1878, o romance queirosiano chega nesse mesmo ano à
imprensa brasileira, sendo anunciado no jornal Gazeta de Notícias, em 25 de março, por
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Ramalho Ortigão, quem já havia publicado uma crítica sobre o livro na imprensa portuguesa
daquele mesmo ano, em 22 de fevereiro.
Em 16 de abril, terça-feira, Machado usando o pseudônimo “Eleazar”,
publica seu primeiro manifesto contra o romance eciano no jornal O Cruzeiro (ano I, n. 106) e
revela sua tendência antinaturalista. Primeiramente, Machado toca em uma questão relevante
sobre O crime do Padre Amaro, pois, segundo ele, o livro seria uma imitação do romance
francês de Émile Zola:
“O próprio Crime do padre Amaro é imitação do romance de Zola, La faute de l’
abbé Mouret. Situação análoga, iguais tendências; diferença no meio; diferença no
desenlace; idêntico estilo; algumas reminiscências, como no capítulo da missa, e
outras; enfim, o mesmo título” (NASCIMENTO, 2008, p. 187).
Assim, questiona a originalidade da obra que, em sua concepção, só
obtivera sucesso devido à escola a qual se filiara, inaugurando o Realismo/Naturalismo em
Portugal. Machado se coloca contra a estética realista, defendendo que não basta “fotografar a
realidade”, mas que esta deve ser transfigurada pelo trabalho do artista. Dessa forma, em sua
visão, faltara “verossimilhança” tanto em O Crime do Padre Amaro quanto em O Primo
Basílio, pois reconhece que a “reprodução fotográfica”, à qual a nova escola se limitava era
servil, concluindo seu raciocínio dizendo que “nem tudo o que se [passava] no mundo” seria
útil à Arte:
“Não se reconhecia no nosso idioma aquela reprodução fotográfica e servil das
coisas mínimas e ignóbeis. Pela primeira vez, aparecia um livro em que o escuso e o
– digamos o próprio termo, pois tratamos de repelir a doutrina, não o talento, e
menos o homem - em que o escuso e o torpe eram tratados com um carinho
minucioso e relacionados com uma exação de inventário” (NASCIMENTO, 2008, p.
188).
Machado-Eleazar reconhecia o grande talento de Eça de Queirós, que, em
sua concepção, não deveria ter se prendido tanto às preocupações de escola, rompendo quase
que de um modo absoluto com a “pretensão mimética” por tentar captar a realidade com
exagerada precisão.
Machado argumenta que O Primo Basílio não trouxera nada de inovador
em relação a O Crime do Padre Amaro, destacando o “calculado cinismo” em que ambos os
heróis concluem os romances. Pois, enquanto em O Crime do Padre Amaro, tal fato é inédito,
em O Primo Basílio, isso se torna enfadonho e rebuscado.
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E, novamente, o crítico compara o romance eciano a um romance francês.
Dessa vez, leva a questão ao nível das personagens, referindo-se ao fato de Eça ter sido mal
sucedido caso tenha tentado plagiar as personagens de Balzac. Machado, assim, parte desse
pressuposto devido à semelhança em um fragmento do enredo de O Primo Basílio e de
Eugênia Grandet; e, por fim, faz a seguinte declaração a respeito da heroína zolaliana em
relação à heroína queirosiana:
“A Eugênia deste [Balzac], a provinciana singela e boa, cujo corpo, aliás robusto,
encerra uma alma apaixonada e sublime, nada tem com a Luísa do Sr. Eça de
Queirós. Na Eugênia há uma personalidade acentuada, uma figura moral, e que por
isso mesmo nos interessa e prende; a Luísa – força é dizê-lo – a Luísa é um caráter
negativo, e no meio da ação ideada pelo autor, é antes um títere do que uma pessoa
moral” (NASCIMENTO, 2008, p. 189).
E, enfatiza tal conclusão sobre a sua definição da personagem eciana:
“Repito, é um títere; não quero dizer que não tenha nervos e músculos; não tem
mesmo outra coisa; não lhe peçam paixões ou remorsos; menos ainda consciência”
(Idem).
Machado compreende que o romance ocorrido entre Luísa e Basílio não
passou de um “incidente erótico”, que nada acrescenta de relevante ao leitor. Relacionamento
adúltero fútil e repugnante que resulta em uma “luta intestina” entre ama versus criada. E,
enfim, toca no ponto que, conforme ele é o mais grave do romance:
“Parece que o Sr. Eça de Queirós quis dar-nos na heroína um produto de educação
frívola e da vida ociosa; não obstante, há aí traços que fazem supor, à primeira vista,
uma evocação sensual. A razão disso é a fatalidade das obras do Sr. Eça de Queirós
– ou, noutros termos, do seu realismo sem condescendência: é a sensação física. Os
exemplos acumulam-se de página a página; apontá-los, seria reuni-los e agravar o
que há neles desvendado e cru. Os que de boa fé supõem defender o livro, dizendo
que podia ser expurgado de algumas cenas, para só ficar o pensamento moral ou
social que o engendrou, esquecem ou não reparam que isso é justamente a medula
da composição. Há episódios mais crus do que outros. Que importa eliminá-los?
Não poderíamos eliminar o tom do livro. Ora, o tom é o espetáculo dos ardores,
exigências e perversões físicas. Quando o fato lhe não parece bastante caracterizado
com o termo próprio, o autor acrescenta-lhe outro impróprio. De uma carvoeira, à
porta da loja, diz ele que apresentava a “gravidez bestial”. Bestial por quê?
Naturalmente, porque o adjetivo avoluma o substantivo e o autor não vê ali o sinal
da maternidade humana; vê um fenômeno animal, nada mais” (NASCIMENTO,
2008, p. 192-193).
Machado julga necessários tais reparos na obra do ficcionista português
para o próprio bem de um tesouro comum a todos: a língua portuguesa. Na visão do crítico
brasileiro, Eça de Queirós constrói “um tom carregado das tintas” e, tentando ser “intenso e
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completo”, acaba se perdendo nos vícios da estética realista, de modo que não deixa
sobressair seu grande talento.
O segundo folhetim assinado por Eleazar nas páginas de O Cruzeiro:
Quinze dias após a publicação do primeiro folhetim, Machado-Eleazar
publica o segundo, no dia 30 do mesmo mês. Tendo em vista a grande repercusão que tivera
seu artigo no meio cultural brasileiro, ele resolve responder aos que tomaram partido em
defesa do romance queirosiano e se desagradaram da crítica que fora realizada.
Machado defende-se de seus contendores que o acusam de “nada achar de
bom” no livro de Eça, relembrando ter admitido o talento do autor português:
“Disse comigo: - Este homem tem faculdades de artísta, dispõe de um estilo de boa
têmpera, tem observação; mas o seu livro traz defeitos que me parecem graves, uns
de concepção, outros da escola em que o autor é aluno, e onde aspira a tornar-se
mestre; digamos-lhe isto mesmo, com a clareza e franqueza a que têm jus os
espíritos de certa esfera. (...) Censurei e louvei, crendo haver assim provado duas
coisas: a lealdade da minha crítica e a sinceridade da minha admiração”
(NASCIMENTO, 2008, p. 234-235).
Em seguida, vem à tona a questão em que Machado supõe em como teria
sido o romance se “não houvesse o extravio das cartas, ou se Juliana fosse mulher de outra
índole”. Segundo ele, o romance acabaria aí, no meio, pois tudo voltaria ao normal na vida
das personagens, já que nem Luísa, nem Basílio possuiam “remorços”. Mas, o extravio das
cartas, em sua análise, foi apenas um acessório, e, assim sendo, não dominaria o “absoluto”.
Portanto, um episódio não poderia responder por todo o “interesse moral” que a obra não
adquiriu:
“Que o Sr. Eça de Queirós podia lançar mão do extravio das cartas, não serei eu que
o conteste; era seu direito. (...) O drama existe, porque está nos caracteres, nas
paixões, na situação moral dos personagens: o acessório não domina o absoluto; é
como a rima de Boileau: "il ne doit qu' obéir". Extraviem-se as cartas, faça uso delas
Juliana; é um episódio como qualquer outro. Mas o que, a meu ver, constitui o
defeito da concepção do Sr. Eça de Queirós é que a ação, já despida de todo o
interesse moral, adquire um interesse anedótico, um interesse de curiosidade”
(NASCIMENTO, 2008, p. 236).
Luísa, em sua visão, possui apenas medo, e sua vida gira apenas em torno
de um único objetivo: preservar a “paz doméstica” que vinha sendo ameaçada. Assim, manter
a dignidade conjugal era mais um de seus caprichos, como fora sua aventura com Basílio. E,
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novamente, tocando na questão de escola, Machado não diz que o Realismo não serve para
nada; contudo, defende que deve haver algo de bom nele que possa ser aproveitado:
“Não peço, decerto, os estafados retratos do romantismo decadente; pelo contrário,
alguma coisa há no realismo que pode ser colhido em proveito da imaginação e da
arte. Mas sair de um excesso para cair em outro não é renegar nada: é trocar o agente
da corrupção” (NASCIMENTO, 2008, p. 240).
Machado conclui o artigo afirmando ser “um admirador” dos talentos de
Eça de Queirós, todavia persiste em se assumir “adversário de suas doutrinas”. Por fim,
finaliza seu discurso ao asseverar que o modo de dizer com franqueza corresponde ao papel
da crítica.
A carta de Eça de Queirós em resposta a Machado de Assis:
Eça de Queirós escreve uma carta a Machado de Assis, datada de 29 de
junho daquele mesmo ano, de Newcastle-upon-Tyne. Na correspondência, Eça diz conhecer
apenas o folhetim do dia 16 de abril e confirma que se sente honrado pela crítica à sua obra. O
escritor português admite que o artigo de Machado é “excelente” em sua concepção:
“Apesar de me ser adverso, quase revesso, e de ser inspirado por uma hostilidade
quase partidária à Escola Realista – esse artigo, pela sua elevação e pelo talento com
que está feito, honra o meu livro, quase lhe aumenta a autoridade. Quando conhecer
os outros artigos de V. S.a poderei permitir-me discutir as suas opiniões sobre este –
não em minha defesa pessoal (eu nada valho), não em defesa dos graves defeitos dos
meus romances, mas em defesa da Escola que eles representam e que eu considero
como um elevado fator do progresso moral na sociedade moderna”
(NASCIMENTO, 2008, p. 261).
Eça agradece aos colegas pela aceitação d’O Primo Basílio:
“Um total acolhimento por parte de uma literatura tão original e tão progressiva
como a do Brasil – é para mim uma honra inestimável – e para o Realismo, no fim
de tudo, uma confirmação esplêndida de influência e vitalidade” (Idem).
E, por fim, assume que pretende se encontrar com Machado de Assis, para
discutirem “questões de Arte”, já que, a seu ver, o crítico brasileiro possui talento:
“Espero ter em breve oportunidade de conversar com V. S.a – através do oceano –
sobre essas elevadas quetões de Arte, rogo-lhe queira aceitar a expressão do meu
grande respeito pelo seu belo talento” (Idem).
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Assim, Eça de Queirós encerra suas palavras ao crítico brasileiro, que, por
sua vez, não responde ao escritor português. Contudo, Machado de Assis não deixa de fazer
uma homenagem, assinando a primeira página em dedicação a Eça em virtude de seu
falecimento, no jornal Gazeta de Notícias, de 24 de agosto de 1900. Deste modo, encerra-se a
polêmica entre os dois grandes escritores de língua portuguesa, levantada dentre os dois lados
do Atlântico.
Considerações Finais:
A polêmica que fora estabelecida em torno do romance O Primo Basílio e
da nova estética tumultuaram os jornais do Rio de Janeiro, de modo que as análises que
surgiram a respeito desse assunto foram inúmeras. Diversas opiniões forma manifestadas
pelas páginas dos principais jornais da época: Jornal do Comércio, Gazeta de Notícias, O
Cruzeiro, A Província de São Paulo, Revista Ilustrada, dentre outros.
A polêmica ressalvou argumentos de toda uma concepção de Arte, tocando
na questão de mimeses; pois, sendo a arte uma imitação do real, ela recria a própria vida.
Contudo, Machado discorda do modo artístico de Eça retratar a realidade (concepções de
verossimilhança e imitação do real). Na concepção machadiana, a vida deve ser recriada com
graça, não se restringindo a uma cópia fiel do real, pois nem tudo o que existe é propício ao
fazer artístico. Nesse debate também se torna explícito um assentimento entre Eça e Machado,
que até então era implícito. Por fim, podemos concluir que a crítica de Machado de Assis foi
tão bem elaborada quanto à resposta de Eça de Queirós, resultando em um diálogo de alto
nível que marcou definitivamente o cenário cultural brasileiro do final do século XIX.
Referências:
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MAIA NETO, José Raimundo. O ceticismo na obra de Machado de Assis. São Paulo:
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MURICY, Kátia. A razão cética: Machado de Assis e as questões de seu tempo. São
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NASCIMENTO, José Leonardo do. O Primo Basílio na Imprensa Brasileira do Século XIX.
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PEREIRA, Lúcia Miguel. Machado de Assis: estudo crítico e biográfico. 5ª.ed. Rio de
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REIS, Carlos. (Direção). História da literatura portuguesa. O Realismo e o Naturalismo.
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SARAIVA, José Hermano. História Concisa de Portugal. 20ª.ed. Mem-Martins: EuropaAmérica, 1999. (Saber, 123).
Para citar este artigo:
RODRIGUES. Marcos Antonio Rodrigues. Recepção crítica do romance o Primo Basílio: a
polêmica entre Machado de Assis e Eça de Queirós. In: VIII SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO
CIENTÍFICA SÓLETRAS - Estudos Linguísticos e Literários. 2011. Anais... UENP –
Universidade Estadual do Norte do Paraná – Centro de Letras, Comunicação e Artes.
Jacarezinho, 2011. ISSN – 18089216. p. 115 – 123.
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