ARTIGOS
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O Brasil, o pai e a castração (1)
Luciano Elia∗
Resumo
Neste artigo, retomam-se linhas de pensamento já desenvolvidas em trabalhos anteriores a respeito
dos modos de exercício da sexualidade na contemporaneidade, segundo uma leitura lacaniana. O
desejo do analista é o operador conceitual de demarcação da posição da Psicanálise em relação à
ciência e à religião quanto a essas questões. Critica-se a tese, insustentável e falaciosa, de que a
contemporaneidade teria uma tendência à perversão. Desenvolve-se ao final um debate crítico de
posições adotadas por psicanalistas franceses que, na atualidade, insistem em empreender análises
da Nação Brasileira, tomada como destituída de referências paterna, simbólica e histórica, sem “um
significante nacional”, apontando-se sua impropriedade e inconsistência. Recorre-se a uma breve
história do surgimento da Nação Portuguesa, marcada por conflitos rupturais em relação à dinastia
francesa dos Bourgogne, cujo recalque parece estar na base dessas análises, conferindo-lhes forte
matiz sintomático e fantasístico.
Palavras-chave: Sexualidade; contemporaneidade; “obsessivação” falsa perversão; incidência da
Lei no Brasil.
Abstract
In this article, we revisit thought already elaborated in previous presentations, about the particular
form adopted by the practice of sexuality in the contemporary world, from a Lacanian point of view.
We refer to the “desire of the analyst” and relate it with scientific and religious demarches
concerning sexual questions. We discuss the idea that the contemporary world may have a tendency
towards perversion, considered unsustainable and fallacious. Finally we criticize some positions
adopted by certain psychoanalysts, demonstrating how their analysis of the Brazilian Nation may be
inappropriate, particularly when related to the supposed absence of fatherhood references in a
symbolic and/or historical approach. We present an analysis of the origin of Portugal as a conflict
with French nobility, in a repressive and symptomatic and fantastical way, that could be the reason
of certain ways of explaining Brazilian culture as “lawless”, “fatherless”, “hopeless”.
Key-words: Sexuality, contemporariness, obsession, false perversion, incidence of Law in Brazil.
∗
Psicanalista, Membro do Laço Analítico Escola de Psicanálise, Professor Titular de Psicanálise e Docente do
Programa de Pós-Graduação em Psicanálise do Instituto de Psicologia da UERJ. [email protected]
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I
O psicanalista deve estar muito ligado a seu tempo, talvez mais ainda que outros operadores,
na medida em que trabalha com o inconsciente, que, como sabemos por sermos lacanianos, mantém
as mais estreitas relações com o Outro cultural, sem reduzir-se a ele. Mas estar antenado com seu
tempo não significa moldar as questões do discurso analítico segundo leituras culturalistas,
sociológicas ou simplesmente moralistas, como se vê frequentemente na comunidade psicanalítica
lacaniana, quando se proclama o declínio do Pai como uma degradação da contemporaneidade, por
exemplo, ou quando se reproduz a ideologia maniqueísta do desejo como bom X gozo como mau,
maléfico, nocivo.
Parece-me que precisamos hoje, mais do que nunca, reafirmar as linhas axiais, estruturais, da
experiência humana, a experiência do ser falante, tal como a revela e concebe a experiência
psicanalítica. A sexualidade é, assim, hoje, o que sempre foi: o campo que se inaugura para aquele
que fala como subtraído do seu gozo próprio, o gozo sexual. O campo do gozo do qual o gozo
propriamente sexual (não qualquer um, mas este gozo em particular, como diz Lacan na primeira
aula do Seminário XVII) é subtraído, operação a que Freud deu o nome de castração (LACAN,
1969-70/1991).
O que pode particularizar esta sexualidade assim estruturalmente delineada hoje é, portanto,
o modo particular com que, hoje, lidamos com esse impossível que a castração significa – o acesso
ao gozo como sexual – ao gozo sexual como tal. O que temos feito com isso? O que podemos dizer
com certeza sobre isso é que a contemporaneidade não tem feito histeria com isso, nem tampouco
perversão, como querem os moralistas-culturalistas ao afirmarem que, sem o tal do Pai em alta, o
mundo de hoje é predominante perverso. Mentira e má-fé de quem sabe que um laço social amplo
não seria possível pela via da perversão. O que temos hoje é a “obsessivação” do mundo e dos laços
sociais (o que deve ser radicalmente distinto da neurose obsessiva clínica, “indubitavelmente, o tema
mais interessante e compensador da pesquisa psicanalítica”, nas palavras de Freud em “Inibição,
sintoma e angústia” (FREUD, 1976/1926, p. 136). Quem irá negar que um obsessivo atormentado,
em trabalho de análise é quase sempre um caso interessantíssimo para se tratar? O problema,
portanto, não diz respeito à neurose obsessiva clínica, em análise, mas ao caráter obsessivo do
mundo contemporâneo, não sintomático, mas endêmico.
O que me proponho a fazer neste artigo é seguir os passos de Lacan para pensar, com ele, a
sexualidade hoje.
II
Será que podemos dizer que, com Lacan, a Psicanálise trata da Sexualidade, opera sobre ela?
Responder afirmativamente a esta pergunta, como parece plausível, não é algo assim tão sustentável.
Tratar da sexualidade, operar sobre ela, implica em constituir a sexualidade como objeto,
como “substância” (como se exprime Lacan) sobre o qual a Psicanálise teria um saber, uma técnica
e uma operatória. E é isso justamente que não há.
No início da última lição do Seminário XI (Os quatro conceitos fundamentais da
Psicanálise), que se intitula “Em ti mais que tu”, seminário que é, em si mesmo, uma abertura e uma
conclusão, Lacan aborda as relações da Psicanálise com a ciência e com a religião (LACAN, 197273/1979).
A ciência elide o momento da alienação, e se funda na separação. Por isso ela produz um
corpo, o corpo da ciência, o objeto do saber científico, que se estrutura em torno do objeto a.
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A Psicanálise implica um além da ciência, que estamos no direito, pelo encaminhamento do
pensamento de Lacan, de dizer que é da ordem da alienação elidida pela ciência. É neste ponto que
incide o risco da Psicanálise ser colocada no plano da religião.
A religião, diz Lacan, é marcada por um esquecimento, que se chama de sacramento.
Embora a Psicanálise, “por relação ao fundamento de seu estatuto, seja marcada por um
esquecimento semelhante” (LACAN, 1972-73/1979, p.251), ela não é uma religião, mas procede do
mesmo estatuto da ciência. “Ela nada tem a esquecer, pois ela não implica nenhum reconhecimento
de alguma substância sobre a qual ela pretenda operar, nem mesmo a da sexualidade. A sexualidade
não é o terreno da Psicanálise?”, diz Lacan textualmente (LACAN, 1972-73/1979, p.251-52). Pois
bem, é este o ponto de que quero partir aqui. A Psicanálise não opera sobre a substância da
sexualidade, e sobre a sexualidade, “ela opera muito pouco”, nada nos tendo ensinado “de novo
sobre a operatória sexual” (LACAN, 1972-73/1979, p.252). A Psicanálise só diz respeito à
sexualidade pelo fato de que, sob a forma da pulsão, a sexualidade só se manifesta mediante a
estrutura do significante, e é isso que articula sexualidade e inconsciente.
A castração, que, como disse no início, é a subtração imposta ao falante do gozo
propriamente sexual, é o que desfaz a sexualidade como substância sobre a qual operar, é o que
destitui a sexualidade da condição de objeto da Psicanálise. O objeto da Psicanálise, que não é o
objeto a, o que seria simplificar demasiado a resposta sobre qual é o estatuto deste objeto, é, no
entanto, a condição do sujeito da experiência por ser dividido pelo objeto a. “O sujeito está, se assim
se pode dizer, em exclusão interna em relação a seu objeto” (LACAN, 1963-64/1979, p. 875).
Na última seção e última lição desse Seminário XI, Lacan aborda, para concluir, os traços
que aparecem em sua época. Trata ele nesse momento dos efeitos da ciência na época. Era o dia 21
de junho de 1964, 46 anos atrás. Em seguida, dizendo que deixará “eludidos” (que significa fora do
jogo, como se sabe) esses traços, ele afirma que colocará seu foco em outra coisa, que lhe aprece
completamente essencial. Refere-se, então, ao nazismo, monstruosidade da qual diz que nenhum
sentido da história, baseado em premissas hegeliano-marxistas, é capaz de dar conta.
A que Outro, Deus obscuro, e de cuja presença buscamos o testemunho em nosso objeto de
desejo, é ofertado este objeto em sacrifício?
Lacan diz, então, que, quanto a essa questão, Kant é mais verdadeiro que Spinoza, na medida
em que este propõe, como fé capaz de resistir ao sacrifício, um amor transcendente – amor
intelectual a Deus – no qual o desejo, essência do homem, está em dependência estrita dos atributos
divinos. Kant, ao fundar a lei moral como o equivalente do desejo em estado puro – o desejo de
Sade, por exemplo, que leva justamente ao sacrifício de tudo o que é da ordem do amor, rejeita o
objeto (pathos) – o sacrifica e o assassina. Se Spinoza dá uma saída pela vertente do amor
transcendente, Kant elimina o amor como pathos, patologia que deve ser superada na realização da
lei.
E o psicanalista? E Lacan? Entre a afirmação de um amor transcendente que faz barreira ao
sacrifício (Spinoza) – posição insustentável para o psicanalista – e o extermínio sacrificial do objeto
pelo desejo em estado puro (Kant e Sade), Lacan propõe uma outra via, a do desejo do analista. E é
por isso que este desejo não é um desejo puro (que extermina o objeto).
O homem precisa submeter-se ao limite, à lei, onde, como desejo, ele se encontra
acorrentado. Mas, uma vez atingido este ponto, abre-se a dimensão do seu mais-além, e é neste
campo que o amor pode vir a se situar para o homem.
O desejo do analista, dissera Lacan duas lições antes, é o que liga um desejo ao desejo do
Outro. Todo desejo, qualquer um, sem nenhuma qualidade que o torne especial ou específico, é
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desejo do Outro, mas não sabe como tal. O desejo do analista liga esse desejo cego, ignorante de si
mesmo como desejo do Outro, ao desejo do Outro.
O desejo se constitui e se inscreve nos limites da lei, que o situa em sua relação com o objeto
que o causa, de um lado, e ao que ele se dirige, falicizado, portanto, por outro. E o amor?
Se o amor não permanecer no nível do engodo, nível narcísico em que o sujeito se oferece
como objeto que exige ser amado (e aqui temos, como se sabe, todos os movimentos da
transferência em sua face de amor e enganação), ele só poderá se situar para além do próprio desejo,
para além do objeto a. E é neste ponto que novamente intervém o desejo do analista, no ponto de
conclusão da análise em que o sujeito já fez a travessia de seu fantasma, e no qual ele pode atingir
uma nova posição no amor.
O desejo do analista é fazer com que o sujeito desfaça o suborno que seu desejo faz com seu
fantasma, como se exprime Lacan em “Posição do inconsciente” (LACAN, 1960-64/1998, p.850),
para que ele cesse de se saber efeito da palavra. O sujeito precisa, depois da separação que o
constitui como desejo, voltar ao significante primordial ao qual seu desejo está assujeitado como
desejo do Outro.
É só neste ponto, neste retorno, em outro ponto, sobre a alienação, que desfaz o suborno
promovido pela separação e que pode, assim, desfazer os efeitos afanísicos que nela se reeditam e se
fixam, que se abre ao sujeito a “significação de um amor sem limites, porque fora dos limites da lei,
só onde ele pode viver” (LACAN, 1963-64/1979, p.260).
III
A metáfora paterna, que Lacan havia trabalhado detidamente seis anos antes, no Seminário
V, é aqui evocada como médium capaz de fornecer o abrigo no qual poderá se instituir uma relação
sustentável (como se diz do desenvolvimento econômico hoje, que ele deve ser sustentável) entre os
sexos.
Ora, a metáfora paterna, reafirmada no final do Seminário XI (LACAN, 1963-64/1979), quer
dizer que os sexos só podem estabelecer entre si uma relação (que, como se sabe, nunca poderá ser
uma relação sexual) na medida em que renunciem ao objeto (dito sexual) como tal. Considero
interessante que Lacan, neste final de seminário, em que o objeto a – que já vinha sendo trabalhado
por ele desde o Seminário IX, e que teve, no X, ampla elaboração, reafirme a metáfora paterna da
forma que faz, sobretudo se consideramos que os avanços posteriores do ensino de Lacan vieram a
deslocá-la de um lugar tão central quanto o que neste momento ainda se verifica.
O falo, como significação, é o que resulta da metáfora paterna, e esta significação marca, no
imaginário, o objeto do desejo, conferindo ao objeto a a marca que o torna desejável.
Embora o falo sempre tenha sido conceituado por Lacan como um significante, como se lê
em “A significação do falo”, (LACAN, 1958/1998), ele só aparecia na escrita da álgebra lacaniana,
nas suas operações matêmicas, senão em seu estatuto imaginário (φ). Como falo simbólico (Φ), ele,
na mesma época, só aparece na psicose, como falo zerado, na escrita gráfica da metáfora delirante
de Schreber, que ele desenvolve no escrito intitulado “De uma questão preliminar a todo tratamento
possível da psicose “(LACAN, 1957-58/1998).
Com o avanço do ensino de Lacan, sobretudo após o Seminário XV (LACAN, 1968-69/
inétido), o falo começa a aparecer em sua escrita de forma diferente, como o significante da
castração e do gozo. Podemos dizer que a este deslocamento da escrita do falo corresponde o
deslocamento da primazia conceitual do desejo para o gozo.
É isso que permitirá que, no Seminário XX, o falo seja apresentado como “a objeção de
consciência feita por um dos seres sexuados ao serviço que tem a prestar ao outro” (LACAN, 1972-
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73/1982, p.15). É também o que faz a escrita da tábua da sexuação, em que o falo, inscrição
significante do lado Homem, é o que nele situa uma das duas vertentes do gozo da Mulher. Mas o
que é mais interessante é que, dois anos antes, no Seminário XVIII (LACAN, 1970-71/2009, p. 63),
Lacan tenha dito que o gozo feminino é o falo, em sua condição de verdade, que é a castração.
Como se apresenta isso hoje na clínica? Penso que o modo particular pelo qual se procura,
hoje, elidir o feminino (pois é sempre disso, de certo modo, que se trata na clínica das neuroses) não
é o modo predominantemente histérico. Não estamos tão frequentemente quanto em outros
momentos da história da clínica psicanalítica diante do desgosto histérico de que a mulher seja não
toda, o anseio de que fosse toda. Esta questão vem se apresentando de modo cada vez mais
“obsessivado”. O que se tende a apresentar como tendência perversa a um gozo imediato,
necessário, compulsório e compulsivo, parece-me antes indicar um deslocamento obsessivo de
objeto em objeto, o que trai e traduz antes a evitação sistemática do encontro com o objeto que
pudesse dar notícia de sua falta, da castração.
O sexo é o encontro com isso. Talvez nossa época seja farta em práticas sexuais variadas,
não tenho certeza disso, mas certamente ela é pouco sexualizada. O discurso ideológico dominante
procura regular, codificar, esquadrinhar o sexo, seja promovendo a epidemia do abuso sexual, que
nos lança para mais de cem anos atrás, antes de Freud. Essa observação me faz lembrar da frase de
Lacan ao iniciar seu escrito “De uma questão preliminar”, dizendo que os “50 anos de freudismo
aplicado à psicose deixa intacto seu problema, in statu quo ante” (LACAN, 1957-58/1998, p. 537),
seja regulando os modos aceitáveis de abordagem sexual, seja proliferando o sexo virtual, telefônico
ou digital, via webcam e microfone. Há uma aversão ao sexual, que, há 40 anos, estava no ar com o
lema hippie “sexo e amor”, e que derivou em “sexo, drogas & rock and roll”. Hoje, temos muita
droga, pouco sexo e quase nenhum rock’n roll.
Mais do que nunca é preciso que a Psicanálise reafirme, de forma audível, que a relação
sexual não existe, que não podemos ter acesso ao gozo sexual, nem ao saber sobre o sexo. Mais do
que nunca é preciso reafirmar a castração. E, com isso, “ressexualizar” a posição subjetiva dos
nossos contemporâneos, “re-erotizar” suas relações não apenas entre si, mas com todos os seus
objetos de desejo.
Mas não devemos confundir a reafirmação, pelo discurso e na experiência psicanalítica, da
castração, com a reabilitação do pai. É preciso não confundir duas coisas muito distintas: os modos
próprios como a contemporaneidade – como aliás ocorre em todas as “temporaneidades”, em todos
os tempos da História, cada um a seu modo – recusa a castração, algo a que o psicanalista, como
comecei dizendo, deve estar sempre muito atento. É preciso distinguir isso das vicissitudes e
avanços internos ao próprio discurso analítico.
O declínio do Pai e do Édipo como estrutura central da constituição do sujeito desejante, por
exemplo, é uma vicissitude discursiva que se verifica a partir do Seminário XVII (LACAN, 197071/2009), momento em que, como penso, Lacan concluiu um ciclo da elaboração da sua própria
análise, aquela que ele dizia fazer incessantemente em seu seminário – o que lhe permitiu dizer, no
início do ano seguinte (Seminário XVIII), que a audiência do seu seminário era o seu “mais-degozar espremido” (plus-de-jouir pressé) (LACAN, 1970-71/2009, p. 13), e a introduzir a ruptura
produzida no semblante pela ocupação deste lugar pelo objeto a.
Reafirmar a castração não é a mesma coisa que reabilitar o Pai. A primeira operação é
analítica, e responde ao modo como a sexualidade é, hoje, pensada, concebida, praticada. A segunda
é neurótica. O pai, tomado em suas diferentes versões, pluralizado como nomes-do-pai, abre novas
possibilidades clínicas (com a psicose isso é inequívoco) e novas possibilidades discursivas para a
Psicanálise responder às questões da sexualidade hoje. Trata-se, portanto, de algo que, oriundo dos
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avanços discursivos da Psicanálise, tem a possibilidade de afetar de modo mais eficaz o sujeito e a
cultura. É, portanto, o contrário do que muitas vezes se diz, ou seja, o suposto efeito de uma cultura
“sem pai” sobre uma Psicanálise que, frágil, submeter-se-ia a esses efeitos culturais.
IV
Poderíamos, a propósito, examinar a tese segundo a qual o Brasil seria um país “sem pai”.
Essa tese está colocada na cultura psicanalítica contemporânea, os que a sustentam não são
anônimos, nem procuram sê-lo, e consideram que empreendem uma “aplicação cultural da
Psicanálise” ao sustentá-la. Um de seus defensores é Contardo Calligaris, entre cujos livros
publicados que se referem a isso temos o mais notável, “Hello Brasil! – Notas de um psicanalista
europeu viajando pelo Brasil” (CALLIGARIS, 1996).
Nesse livro, Calligaris defende a ideia de que a falta de um “significante nacional”, um
“Nome-do-pai”, que pudesse servir de baliza simbólica para a identidade do brasileiro e do Brasil.
Calligaris destitui o próprio “nome próprio” do Brasil:
Impressiona-me mais ainda o próprio significante “Brasil”. Que extraordinária herança do
colonizador para o colono este significante nacional, que eu saiba o único que não designa
nem uma longínqua origem étnica, nem um lugar, mas um produto de exploração, o
primeiro e completamente esgotado. É como se o colonizador entregasse para o colono o
manequim deslocado por um gozo sem freio, e ironicamente o convidasse a fazer disso o
UM da nação da qual ele quer ser o sujeito. (CALLIGARIS, 2000, p. 23).
O autor se diz impressionado, como o leitor pôde ler na nota acima. E eu me declaro muito
impressionado com a desenvoltura com que alguém se autoriza a “analisar” um nome próprio. Será
que, como psicanalista, ele não se dá conta de que sua análise é contratransferencial, e que, na falta
de um cuidado ético-metodológico mais rigoroso, próprio ao dispositivo, ao discurso e ao método
psicanalítico, tudo o que ele diz só pode revelar aspectos de sua própria atividade fantasmática?
Tudo isso teria levado ao “antropofagismo”, referindo-se à Semana de 22 e à obra de Oswald
de Andrade, como forma de suprir esta falta simbólica pela ingestão canibalística de elementos
culturais estrangeiros.
“Antropofagia”
Tarcila do Amaral
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Caetano Veloso, em “Verdade Tropical” (VELOSO, 1997, p.248-51), comenta longamente a
empreitada literário-psicanalítica de Calligaris, e o faz com respeito e até admiração, não se
furtando, contudo, à crítica de que Calligaris “forçava a mão para, numa sanha diagnosticadora,
meter no mesmo saco a mediocridade dos misturadores de informações mal assimiladas e o gesto
audaz de um grande poeta” (VELOSO, 1997, p. 248). Além disso, Calligaris faz uma leitura de
colonizador do que considera um “país sem projeto”. “Parece que vivemos no Brasil os efeitos de
uma fundação fracassada” (CALLIGARIS, 1996, p.101). Como observa Caetano Veloso: “E,
psicanalista, observa que a melhor maneira de ajudar esse país amado a superar sua falência como
projeto era jogar-lhe na cara sua desesperança fatal” (VELOSO, 1997, p. 249). Esta é a posição do
analista? O analista “joga na cara” o que, nele, aparece como “desesperança fatal” (expressão que
evoca a enunciação mesma de uma fantasia desesperançada), que supostamente seria do sujeito que
ele “ouve”, aqui equivalente ao Brasil? E o analista ama o sujeito que tem como analista? Ou esse
amor trai exatamente o fato de que aquele que está em posição de franca transferência é o “analistaautor”?
Seja no plano de uma análise histórico-antropológica “informada” por uma determinada
leitura da Psicanálise lacaniana [mas que na verdade se confunde com a posição religiosa segundo a
qual “o Pai é, antes de tudo, merecedor do amor” (LACAN, 1969-70/1991, p. 94)], seja no plano
estrito do que se passa nas operações de uma análise em intensão (2), a questão é: o que a
Psicanálise formula em relação ao Pai e que destino dá a ele? O que autoriza um autor (psicanalista
ou não, mas, se psicanalista, a pergunta se desdobra e especifica: o que autoriza um psicanalista) a
fazer a análise de um país na qual este se lhe afigura “sem pai” na cultura, na história, na sua
herança simbólica? O que permite ler no movimento da Antropofagia Cultural, cujas bases foram
lançadas na Semana de Arte Moderna de 1922 mas que, como observa de forma psicanaliticamente
acurada Caetano Veloso, permaneceram recalcadas por 40 anos, até os anos 60, quando retornaram
sob a forma do Tropicalismo (VELOSO, 1997, p.252) (o que atesta, incidentalmente, que a própria
cultura brasileira, supostamente ávida de ingerir “fragmentos de pai”, rechaçou essa proposta por
longo tempo), um sintoma de orfandade paterna produtora dos mais nefastos efeitos culturais
(desordem, traço cultural de burlar a lei, desrespeito a pactos sociais, tendência à delinquência, à
perversão sexual)?
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Quanto a este último aspecto, é comum ouvir-se de psicanalistas de outras nacionalidades,
em geral franceses, não por qualquer particularidade que estaríamos atribuindo a esses colegas, que
em nosso campo – o da Psicanálise Lacaniana – nos são tão caros, mas por força da orientação que
alguns dentre eles adotam no interior do movimento psicanalítico contemporâneo, em que se situam
como partícipes da herança lacaniana, afirmações tais como: “O Brasil é um país sem Pai, sem
História, sem referências simbólicas”, entre outras baboseiras. Certa ocasião, em uma palestra
proferida por um deles a convite de seguidores brasileiros que lhe haviam pago as passagens, estadia
e honorários, o palestrante, ao referir-se à perversão, fez o seguinte comentário: “Bem, eu não
preciso explicar a perversão a brasileiros, preciso?” (3). Seríamos nós, então, os brasileiros,
perversos ou afeitos à perversão? Interpelado, o palestrante tentou justificar-se, mas a emenda foi
pior do que o soneto: “Mas vocês não elegeram uma Miss Brasil travesti?” – porquanto revelou,
agora, além da profunda grosseria e desrespeito com o país que o recebe, também uma profunda
ignorância da história contemporânea do país (pois jamais existiu uma Miss Brasil travesti). Outros
comentam o elevado número de homossexuais e travestis brasileiros como indicador dessa mesma
devastação cultural decorrente da “falta de um pai simbólico”.
A alusão a esses ocorridos reais tem aqui valor antes heurístico que denuncista: sua função
aqui não é de denúncia, mas de demonstração da insustentabilidade de determinadas teses que se
fazem acompanhar desses ditos injuriosos, e constitui, também, o exercício necessário da crítica a
essas teses, de modo a lastrear a sua recusa como falsas, avessas a uma leitura histórica efetivamente
capaz de identificar os elementos constitutivos da cultura e da civilização brasileiras.
Mas sobretudo visamos demonstrar que a tese de fundo, pretensamente psicanalítica e
lacaniana, que subjaz a essas teses, é fruto de um grande equívoco teórico e ético quanto ao ensino
de Lacan, e alimentada por um intensa atividade fantasística de seus autores.
A tese de sustentação do pai na análise é religiosa, Lacan sempre o demonstrou, de todas as
formas. O pai na experiência analítica declina. Não temos que nos haver apenas com o declínio do
Édipo com a correlata ereção do Pai, sob a forma do Ideal e do supereu. É preciso fazer declinarem
os próprios ideais e o supereu, na conclusão de uma análise, da qual resulta um analista.
Cada país “re-inventa”seus pais, tendo-os recebido pelas transmissões históricas, pelos
respectivos processos de colonização e tendo, ao mesmo tempo, que recriá-los sob a forma de suas
figuras ideais. Cada país deve se situar em relação à Lei e às leis, e o Brasil não foge à regra nem à
luta.
Cada sujeito tem que se haver com os pais que teve, presentes ou ausentes, amorosos ou
destrutivos, e atravessar, na análise, quando isso lhe é possível, a enxurrada de marcas, cenas e
formas de desejar, repetir e gozar que essas marcas parentais lhe imprimem, para emergir dela como
homem ou mulher, isto é, já tendo deixado cair o pai e a mãe.
Sujeitos assim são cidadãos mais ativos, mais capazes de construir, nos pactos sociais e
coletivos que a democracia os convoca a produzir incessantemente, um país digno desse nome.
Curiosamente, e contra as previsões nefandas daqueles “analistas” do Brasil, que o declaravam sem
projeto e esperanças, o que assistimos hoje é a entrada cada vez mais efetiva no Brasil no seio do
mundo dos países grandes, que se respeitam, que cultuam sua história, sua civilização, suas
referências simbólicas.
Confrontando o pensamento de Calligaris com o de um autor português atual, um legítimo
representante dos nossos “pais” (que Calligaris insiste em dizer que ridicularizamos, que não
reconhecemos nem reverenciamos, como se deve fazer com toda referência paterna histórica ou
simbólica que se respeita), vemos que essa sua tese de que o Brasil repudia o seu “pai histórico” não
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corresponde exatamente ao que, em Portugal, se pensa. Diz António Gomes da Costa que “Portugal
só é grande no Brasil” (GOMES DA COSTA, 1988), referindo-se ao lugar que a civilização
portuguesa ocupa não entre seus herdeiros por colonização, os brasileiros, mas entre os seus
companheiros países europeus.
Talvez por ter tido um pai linguista e filólogo, cuja maior paixão intelectual era o objeto que
podemos denominar de língua portuguesa, e que ele soube estender ao país Portugal, que amava
como poucos, apesar de ser um filho de calabrês, meu avô paterno de quem herdei o prenome,
sempre estranhei quando alguém – quase sempre estrangeiro – me diz que Portugal é pouco
respeitado no Brasil. Meu pai me contou muitas histórias, e me deixou muitos livros, entre eles o
que menciono abaixo, além do depoimento belíssimo a que fiz alusão acima, desculpando-me por
essa pequena incursão em minha própria história pessoal no âmbito deste artigo, mas justificando-a
pelo que esta incursão constitui-me como recurso para debater com a tese de Calligaris e de uma
leitura que determinada orientação da Psicanálise contemporânea que se situa na direção lacaniana
pretende fazer do Brasil e dos brasileiros.
Não nos seria possível abordar, no escopo do presente artigo, uma obra como aquela à qual,
no entanto, remeto o leitor. Trata-se do livro de Damião Peres intitulado “Como nasceu Portugal”
(PERES, 1959). A importância desse livro está menos em seu valor de referência histórica do que na
peculiaridade de apresentar fatos pouco considerados na “Grande História” das nações modernas, e
de trazer elementos no mínimo curiosos que nos instrumentalizam no debate com as teses
sociológico-psicanalíticas de Calligaris.
Nesse livro, acompanhamos, por exemplo, o autor desfiar, criteriosamente, as diferentes
teses históricas que se sucederam quanto à constituição da Nação Portuguesa, iniciando esta série de
teses, é claro, pelo pioneiro Alexandre Herculano, que publicou, em 1846, o primeiro volume de
“História de Portugal” (HERCULANO, 1846, citado por PERES, 1959). Em 1894, Teófilo Braga
(“A Pátria Portuguesa”) (BRAGA, 1894, citado por PERES, 1959) critica na análise histórica de
Herculano: “o erro intencional de decepar a solidariedade do passado com as épocas sucessivas da
vida histórica do povo português” (BRAGA, 1894, citado por PERES, p. 10). Seguem-se as teses de
Oliveira Martins, Leite de Vasconcellos, Amorim Girão, Alfredo Pimenta, apresentadas em clara
exposição de suas discordâncias e confluências, em um movimento textual de alto valor dialético.
Do livro de Damião Peres, que, portanto, estende-se por diversas vertentes de análise
histórica do surgimento da Nação Portuguesa, interessa-nos particularmente destacar um fragmento
que denominaremos político-familiar da história da fundação da Nação Portuguesa. Como se sabe, o
Rei Afonso VI de Leão e Castellateve muitos matrimônios e veio a ser pai de D. Urraca, Rainha de
Leão e Castella, e, por uma união ilegítima com Ximena Nunes, veio também a ser pai de Teresa de
Leão. Com as inseguranças dos reinos que se distribuíam pela Península Ibérica, sobretudo em sua
parte oriental, ocupada pelos Almorávidas, seita político-religiosa oriunda do Rio Niger, na África,
(vejam que a incidência dos negros já se fazia presente nas origens do que veio a ser a nação
portuguesa), Afonso VI de Leão e Castella pede ajuda a Henri de Bourgogne, filho homônimo de
Henri de Bourgogne, ligado à Abadia de Cluny e descendente direto do Rei Robert II de França. Em
troca de seu bravo auxílio na luta contra os mouros e no que se denominou de Reconquista, Afonso
VI dá a Henri de Bourgogne (filho) a mão de sua filha ilegítima, Teresa de Leão: (a filha legítima,
Urraca, já se havia casado com Raymond de Bourgogne, primo de Henri, e viria a se tornar Rainha
de Leão e Castella). Desta união de Henry de Bourgone com Teresa de Leão, nasce Affonso
Henriques (nome cuja terminação em “es” significa “filho de Henrique, nome aportuguesado de
Henri, que é conhecido, aliás, como Conde Henrique de Portucale, condado que recebera do Rei
Afonso VI por suas conquistas). Affonso Henriques vem a rebelar-se contra sua mãe, que desejava
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manter a união com o marido francês e a dependência do Condado ao Reino de Leão e Castella, e,
por tabela, à influência dos Bourgogne na França.
Affonso Henriques rebela-se, abre guerra contra seu pai francês e sua mãe e proclama a
independência do Reino de Portugal, tornando-se o primeiro Rei de Portugal, daí seu título Afonso I
de Portugal. Expulsou o pai de seu ex-condado, agora reino do Filho-Rei, e o impediu de voltar a
entrar em seu território.
Há uma questão histórico-político-familiar, portanto, que envolve ibéricos (Reino de Leão e
Castella, Galiza, Sevilla, Toledo e outros) e portucalenses, por um lado, inicialmente igualmente
constitutivos do conjunto de reinos ibéricos, e franceses, nomeadamente de Bourgogne, por outro. O
destacamento de Portugal se dá por um rompimento produzido por um filho que expele
precisamente a influência francesa dos Bourgogne, representada por seu pai, que havia sido
convocado pelo avô materno de Affonso Henriques (seu filho caçula, porém, o único que se tornou
adulto), que doou a mão de sua mãe (filha ilegítima do Rei-avô) ao bravo guerreiro Henri (Conde de
Bourgogne), por sua inestimável ajuda na reconquista dos reinos rebeldes e na expulsão dos mouros
e dos almorávidas da região do Condado Portucalense.
História política que não deixa de conter uma dimensão edipiana, do maior interesse, creio
eu, na origem de Portugal.
A pergunta com que concluímos essa breve referência às origens de Portugal, mas tomando-a
em sua relação com a posição de determinadas correntes teóricas da Psicanálise que reclama uma
orientação lacaniana, mas que insiste em, “analisando o Brasil”, colocando-o no divã impregnado de
sua contratransferência, acusar os brasileiros de recusarem seu “Pai” histórico português, é a
seguinte: que espécie de recalque operam os franceses em relação à sua própria presença na origem
de Portugal, reconhecidamente pouco respeitado no continente europeu, país visto como “quaseafricano” e de onde os franceses importam seus e suas “concierges”? Por que atribuir a nós,
brasileiros, o movimento de rechaço que perpetram em relação aos portugueses, na própria Europa?
E por que não ver que é com os portugueses assim destituídos de valor pelos “altos-europeus” que o
Brasil se construiu, que o Rio de Janeiro fez Lisboa ser aqui, criando uma Alfama carioca
encrustrada nos seus morros mais belos e centrais, chamada Santa Teresa? Diz-se, com indifarçável
admiração, que Buenos Aires é como Paris na América do Sul (felizmente, para os argentinos, a
despeito do que eles pensam, Buenos Aires é mesmo a cara de Madrid). Respeitam-se mais as
imigrações espanhola, italiana, alemã e japonesa de São Paulo e do sul do Brasil do que a maciça
imigração portuguesa do Rio de Janeiro (e de Santa Catarina, através dos oriundos de Açores), como
se as outras imigrações produzissem mais desenvolvimento, cultura, riqueza e trabalho. Mas o que
não se pode negar é que o Rio de Janeiro – que na verdade é a cidade mais cosmopolita do Brasil – é
também a mais portuguesa, e ostenta um altivo orgulho quanto a isso (em que pese toda a influência
francesa em sua arquitetura art déco e no inconfundível sotaque dos cariocas).
É, parece que o equívoco nessas pretensas análises “sociológico-histórico-psicanalíticas” é
de grandes proporções, o que indica sua natureza sintomática, haja vista ao fato de que essas
análises não são feitas, em geral, por mentes incultas ou ignaras. Ao contrário do que pretendem
afirmar, o reconhecimento do Pai Simbólico, das origens históricas, da filiação, parece ser bastante
notável, significativo e indiscutível por essas terras brasileiras.
NOTAS
1.Este trabalho é fruto de uma série de elaborações escritas e apresentações orais sobre o tema da sexualidade
hoje. Para dar-lhe a forma atual, a escrita dos trabalhos que o precederam nesta série, digamos, temática,
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sofreu considerável reformulação, e também o acréscimo de uma parte inteiramente nova, a parte IV, que
trata da questão da relação entre a Nação Brasileira e a incidência da Lei Simbólica e da instância paterna,
questão que, como se sabe, é bastante polêmica no meio psicanalítico contemporâneo. A série de
intervenções que precedem e, de certo modo, preparam o presente artigo pareceu-me dever ser mencionada,
ainda que fora do corpo do texto. Uma dessas intervenções, a mais recente, teve como título “A sexualidade
hoje com Lacan”, comunicação apresentada na mesa-redonda de mesmo nome, integrante do III Seminário
Internacional do Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade da UVA – Universidade Veiga de
Almeida, realizado no Campus Tijuca desta Universidade, em 5 de dezembro de 2007. Essa comunicação,
por sua vez, mantém uma certa continuidade com uma outra, feita pouco tempo antes, intitulada “Sexo e
Contemporaneidade”, que apresentei na mesa-redonda de mesmo nome no Simpósio Sujeito e sexualidade na
aurora do século XXI, organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Psicanálise do Instituto de Psicologia
da UERJ, realizado de 27 a 31 de agosto de 2007. Nesse sentido algumas de minhas colocações aqui
retomarão a linha de pensamento que apresentei naquelas ocasiões. A seção IV, que não tem a mesma relação
de continuidade mencionada com esses trabalhos anteriores, mantém, no entanto, um claro ponto de
articulação com elas, razão pela qual decidi fazê-la integrar esta série, reformulando o conjunto, ao qual o
título corresponde com bastante fidelidade.
2. Referimo-nos aqui à dualidade introduzida por Lacan psicanálise em intensão/psicanálise em extensão,
que substitui o tripé freudiano análise pessoal/supervisão/estudo teórico, demonstrando que a mesma lógica
que rege a experiência psicanalítica (análise, entre analisante e analista, no dispositivo analítico freudiano)
deve reger a formação do psicanalista e a presença da Psicanálise no mundo, por meio da Escola de
Psicanálise. O declínio do pai, tal como o concebemos e propomos aqui, é uma operação da análise em
intensão, da experiência psicanalítica, e portanto deve também ser retomado no plano do laço entre analistas,
não cabendo, por exemplo, que uma instituição ou escola de Psicanálise se sustente no amor ao pai (líder,
chefe ou o que o valha).
3. Preferimos omitir aqui o autor desta requintada observação, para não caracterizar a intenção personalística
de denúncia. O fato ocorreu em um seminário no ano de 1996, no Rio de Janeiro, em que um grupo de
psicanalistas convidou o conferencista para uma comunicação em caráter privado.
REFERÊNCIAS
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Paulo: Editora Escuta, 1996.
FREUD, S. (1926/1976) Inibição sintoma e angústia Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, Vol. XX.
GOMES DA COSTA, A. (1988) Portugal só é grande no Brasil. Texto de Conferência pronunciada
no Liceu Literário Português, trabalho não publicado.
LACAN, J. (1963-64/1979). O Seminário, livro XI – Os quatro conceitos fundamentais da
Psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
______ (1968-69). Le Séminaire, livre XV – Lacte psychanalytique. Inédito.
______ (1969-70/1991). O Seminário, livro XVII – O avesso da Psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar.
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______ (1970-71/2009). O Seminário, livro XVIII – De um discurso que não seria semblante. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar.
______ (1972-73/1982). O Seminário, livro XX – Mais ainda. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
______ (1957-58/1998). “De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose”. In
Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
_____ (1958). “A Significação do Falo”. In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
_____ (1960-1964/1998) “Posição do inconsciente”. In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
PERES, D. Como nasceu Portugal?. Porto: Portucalense Editora, 1959.
VELOSO, C. Verdade Tropical. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
Recebido em: 28 de abril de 2010.
Aprovado em: 05 de maio de 2010.
http://www.uva.br/trivium/edicao2/artigos/9-o-brasil-o-pai-a-castracao-e-a-lei.pdf
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