1
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ABUSO SEXUAL NA INFÂNCIA, FAMÍLIA E ATUAÇÃO DOS
PROFISSIONAIS ENVOLVIDOS NO ATENDIMENTO
INTERDISCIPLINAR
Por: Mariana Faria Moura
Orientadora
Profª. Naura Americano
Niterói
2011
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
ABUSO SEXUAL NA INFÂNCIA, FAMÍLIA E ATUAÇÃO DOS
PROFISSIONAIS ENVOLVIDOS NO ATENDIMENTO
INTERDISCIPLINAR
Apresentação
Candido
de
Mendes
monografia
como
à
requisito
Universidade
parcial
para
obtenção do grau de especialista em Terapia de
Família.
Por: Mariana Faria Moura
3
AGRADECIMENTOS
Reservo este espaço para agradecer todas as pessoas que direta ou
indiretamente contribuíram neste meu processo de aprendizagem.
Agradeço imensamente a minha mãe Heliane e ao meu pai
Eduardo, não só por terem me dado, junto a Deus, o maior presente que é a
vida, mas também por sempre acreditarem e investirem em meu potencial.
Amo vocês eternamente!
Agradeço a você Anderson (Amor) que mesmo que indiretamente
tem me acompanhado nestes quase cinco anos em que estamos juntos em
todo meu processo de aprendizagem, tanto os quatros anos da Graduação e
mais este um ano de Pós-Graduação. Amo-te, amor da minha vida.
Agradeço a minha avó Hélia, que cuidou tanto de mim na minha
infância para que meus pais pudessem trabalhar e pagar a minha Escolinha.
Amor eterno a senhora e saudades do avô Adenil que durante a sua
passagem por esta terra, foi o melhor avô que pude ter, sempre me levando
para passear e me alegrando. Assim como agradeço ao meu avô paterno
Augusto, que enquanto esteve consciente teve orgulho de ser meu avô e
também me alegrava.
Muito obrigada as minhas tias Adriana, Andréa, Denise e Patrícia,
, cada uma contribuiu para cada parte do que sou agora!
Meu principal agradecimento vai para o meu Triuno Deus!
Agradeço-te, Senhor, pela sua infinita misericórdia na minha vida, eu sei que
não sou merecedora de todo esse amor. Eu te amo tanto, Jesus, que não
tenho palavras para descrever.
Falando em “irmãs”, de maneira alguma poderia deixar de falar da
minha prima-irmã Flávia. Sei que você fica muito feliz por esta minha
conquista, assim como fico pelas suas.
E vocês, irmãs (Bruna, Clara, Kamila, Letícia e Sheila) de
faculdade, dedico o meu “muito obrigada”.
Por fim, agradeço a minha orientadora Naura.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a
meu pai Eduardo, minha mãe Heliane,
minhas tias Adriana, Andréa, Denise e Patrícia
e a meu noivo Anderson.
5
RESUMO
O
presente
trabalho
procura
mostrar
os
preceitos,
fundamentos
e
características essenciais do Abuso Sexual Infantil Incestuoso, um tema
centrado na criança e na família e que merece um atendimento especializado
por uma equipe interdisciplinar capacitada, pois, este fenômeno constitui-se
numa forma de violência dos direitos, torna-se uma questão social especial,
pois é provocado pelas pessoas que deveriam proteger a criança. Define-se
Abuso Sexual Infantil Incestuoso como qualquer conduta sexual com uma
criança praticada por um parente adulto, muitas vezes o padrasto, o pai, o
irmão ou por outro parente que seja mais velho que a criança. Tal fenômeno
traz para a criança abusada e para família incestuosa conseqüências que
afirmam que se trata de uma violência que se estende para além dos aspectos
emocionais e físicos, mas que com acompanhamento terapêutico e
atendimento realizado por equipe de profissionais especializados, é possível
uma superação da problemática.
Palavras-Chave: Abuso Sexual; Incesto; Criança; Interdisciplinariedade.
6
METODOLOGIA
Pesquisa Bibliográfica e documental através da análise e leitura de
livros, artigos e leis relacionados ao Abuso Sexual Infantil Incestuoso e suas
implicações psicossociais.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 7
CAPÍTULO I - ABUSO SEXUAL INFANTIL..... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
CAPÍTULO II - CONCEITUANDO VIOLÊNCIA INFANTIL ....................................... 21
CAPÍTULO III - O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL JUNTO A EQUIPE
INTERDISCIPLINAR NO ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES
RELACIONADAS AO ABUSO E VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL
INTRAFAMILIAR ....................................................................................................... 33
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 33
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ................................................................................ 33
ÍNDICE ...................................................................................................................... 50
8
INTRODUÇÃO
Partindo da concepção histórica de evoluções e conquistas, a
questão norteadora deste trabalho estará voltada para o estudo e compreensão
do abuso sexual infantil incestuoso como fenômeno e questão social que deve
ser trabalhada por uma equipe interdisciplinar especializada, atendimento este
também com continuação terapêutica.
O interesse por esta questão surgiu através da percussão do tema
apontado pela mídia, não só em noticiários, mas em séries e filmes. A
importância do tema foi notada à partir da concepção de que a sociedade tem
uma visão ainda muito conturbada e enxerga a problemática como raridade, o
que aumenta mais o tabu ao redor do tema, fazendo com que ele permaneça
“escondido”. É preciso trazê-lo à tona, para que as autoridades reconheçam a
notoriedade de sua relevância e importância.
É importante salientar que o período histórico discutido neste
trabalho foi feito após análise prévia de material, que gerou condições de ter
uma base histórica. Esta leitura possibilitou perceber que a questão do abuso
sexual infantil existe no quadro do mundo há séculos, porém os estudos sobre
este fenômeno são recentes.
Os estudos e pesquisas trouxeram uma enorme contribuição ao
debate sobre este tema, bem como têm importante contribuição para a
concepção atual da legislação brasileira, que considera o abuso sexual infantil
como crime.
Escolheu-se este tema acreditando que será possível contribuir para
o enriquecimento da continuação de formação profissional, assim como se
considera importante dar visibilidade às conquistas históricas pelos direitos da
criança e a permanente luta para sua efetividade, fomentando, portanto, um
debate imprescindível para os atores sociais envolvidos na temática.
Para isso, realizou-se uma pesquisa bibliográfica sobre o contexto
histórico e atual do processo do enfrentamento da violência sexual infantil,
especialmente a incestuosa. Tomou-se como base, a análise referencial de
9
artigos e livros publicados referentes ao contexto geral deste tipo de violência
que se revela como questão central desse trabalho.
Sendo assim, esse estudo será apresentado através de informações
seqüenciais organizadas por capítulos. No primeiro capítulo será focada a
trajetória histórica do abuso sexual infantil, em especial o incestuoso, bem
como o processo de reconhecimento da infância.
O
segundo
capítulo
abordará
as
questões
relacionadas
à
conceituação da violência sexual infantil e as semelhanças e diferenças entre
abuso e exploração sexual infantil, bem como os mitos existentes e a realidade
destes. Esta discussão é notoriamente importante uma vez que procura
desmistificar algumas posturas e crenças mais defendidas pelo senso comum.
No terceiro capítulo, aponta-se a relação entre o Serviço Social e a
Equipe Interdisciplinar no processo de Enfrentamento à Violência Sexual
Infantil. Destacam-se o processo importantíssimo do trabalho interdisciplinar e
a importância da Terapia de Família no processo de atendimento continuado à
criança vítima de abuso sexual infantil e a sua família.
A Conclusão trará no sentido de contribuir para uma reflexão sobre o
tema, as aprendizagens adquiridas ao longo deste estudo, bem como para
fomentar a análise da relação entre uma Equipe Interdisciplinar e o processo
de enfrentamento da Violência Sexual Infantil Incestuosa, salientando a
necessidade de novas discussões e debates sobre esta relação no âmbito das
diversas profissões que lidam com este tipo de violência.
10
CAPÍTULO I
ABUSO SEXUAL INFANTIL
O exame sobre o abuso sexual infantil que estará presente neste
capítulo teve como base os livros Abuso Sexual Incestuoso de Ana Paula
Magalhães (2005) e Abuso Sexual em Crianças de Christiane Sanderson
(2005), escritoras estas, que proporcionam uma pesquisa com base histórica e
de entendimento de diferentes aspectos do tema e suas individualidades,
assim como aclaram a visão de vários autores que examinam o assunto.
O mistério do abuso sexual infantil existe no quadro histórico do
mundo há séculos. Entretanto, os estudos sobre este assunto são recentes.
Uma maneira de entender o abuso sexual infantil é buscar
conceituá-lo, ou seja, buscar sua definição e particularidades. Muitos fatos
devem e podem ser apontados para o entendimento deste conceito. Este
estudo terá como foco o abuso sexual infantil incestuoso, ou seja, aquele que
acontece no ambiente intrafamiliar. Sendo assim, indica-se o contexto
intrafamiliar do abuso sexual infantil apontado por Magalhães (2005, p.45).
Deve-se pensar o incesto (pai-filha) numa situação
triangular, estando a mãe presente ou ausente. Ela participa da
criação de um ambiente incestuoso. O pai confunde a tentativa
de agradar da filha, lendo esta tentativa através de um viés
sexual e/ou pela cumplicidade de uma hostilidade comum em
relação
à
mãe.
A
mãe
favorece
–
consciente
ou
inconscientemente – a filha a se enquadrar no papel de esposa
e amante, libertando-se dessas funções. E mais do que isso,
este tipo de relação não faz face à diferenciação e
individuação, uma situação de extrema negação do processo
de separação.
Observar os aspectos relacionados ao abuso sexual infantil
requer uma base de contexto histórico já existente. Desta maneira, são
ponderadas seis épocas diferentes: a Grécia Antiga, os Séculos I e II de nossa
11
era, os Primórdios do Cristianismo, a Modernidade, a Sociedade Moderna
Individualista e o Século XX.
1.1 História do Abuso Sexual Infantil
O abuso sexual alia-se à trajetória da humanidade, essa atitude
assumia ou não um caráter de violência, de acordo com as várias
características socioculturais das diferentes épocas. Desta maneira, buscou-se
analisar se esta preocupação contemporânea com a criança sexualmente
abusada existe ao longo da trajetória histórica mundial ou não. Portanto, há
importância
em
ostentar
o
processo
histórico
do
entendimento
e
reconhecimento da infância.
Desta maneira, compreende-se como necessário e apropriado
discorrer sobre o contexto mundial do processo histórico do abuso sexual
infantil.
Não obstante de serem recentes as pesquisas sobre o fenômeno da
violência sexual, tem sido consentido saber sobre as conseqüências em
relação ao desenvolvimento físico, social, moral e mental da criança, bem
como seus efeitos na vida adulta. Existem pesquisas na perspectiva histórica
apresentada por alguns autores, a fim de compreender as estruturas
socioculturais da sociedade contemporânea em relação ao abuso sexual
infantil. Os escritores escolhidos que desenvolveram pesquisas nesse tema
foram: Ana Paula Magalhães, Christiane Sanderson, Lloyd DeMause, Maria
Amélia Azevedo, Maria Regina Fay de Azambuja, Michel Foucault e Viviane
Guerra.
Foucault (apud Magalhães, 2005, p.26-27), exemplificando, efetuou
um estudo acerca do processo que ocorreu ao longo da história para que o
indivíduo se constituísse como sujeito sexual. Este estudo trabalhado por
Foucault apresenta a evidência de que o sexo tornou-se simplesmente algo
12
com fins reprodutivos, por isso, o sexo foi prezado como segredo, como
abominável, de natureza pecaminosa. Em relação à criança com o sexo,
Foucault afirma: “As crianças, por exemplo, sabe-se muito bem que não têm sexo.”.
Desde o século XVIII, o sexo das crianças transformou-se em centro
de atenção para estratégias discursivas e dispositivos constitucionais, tendo
como estrutura as bases de poder. Segundo Magalhães, “a partir do século XVIII,
a família se torna o lugar por excelência e obrigatório de afetos, de amor. Por esta
razão a família nasce “incestuosa”, o incesto se apresentando como interdito de
acordo com o dispositivo de aliança.” (ibid., ibid.).
A escritora comenta ainda, que para Foucault (idem, idem) “o estudo
e a criação de novos discursos sobre o sexo, assim como a invenção da sexualidade,
fazem parte de vários processos de formação das instituições modernas.[...]” Foucault
ainda indica para o fato de que as organizações e estados modernos
necessitam de um domínio cuidadoso das populações através do espaço e
tempo.
Outra autora que vale a pena ser citada é Christiane Sanderson.
De acordo com Sanderson (2005), as grandes dificuldades em se definir o
abuso sexual infantil se dão ao fato de que ele é de natureza social e reproduz
significados e contextos culturais, raça, relatividade cultural, consciência étnica
e tempo histórico em que ocorre.
Sanderson indica o autor Lloyd DeMause como um dos grandes
pesquisadores do tema. Ela assegura que o diferencial do trabalho DeMause é
sua maneira extensa de escrever sobre os fatos históricos do abuso infantil. Os
dados indicam que as crenças, posturas relacionadas a crianças e os padrões
de tomar conta dos filhos transformaram-se de maneira relevante através do
tempo. Nas sugestões de Sanderson, DeMause apresenta que:
[...]
os
padrões
de
cuidado
dos
filhos
da
Antiguidade ao século IV, que ele chama de modo de
infanticídio, tinham como base a idéia de que as crianças
existiam para atender às necessidades e à comodidade dos
adultos e que crianças defeituosas eram responsáveis por suas
desgraças. (DEMAUSE apud SANDERSON, 2005).
13
É nesse sentido que Sanderson considera que era comum
abandonar crianças indesejadas.
Com apoio nas concepções de DeMause, Sanderson indica mais
cinco tipos de modos, que seriam: modo de abandono, modo de ambivalência,
modo de intrusão, modo de socialização e modo de ajuda. De acordo com
Sanderson (2005), o modo de abandono estaria relacionado ao século IV ao
XIII em que as crianças eram vistas como seres malignos, por esta causa eram
vendidas como escravas, apanhavam, eram abandonadas e sustentadas
emocionalmente distantes dos pais. O modo de ambivalência é relacionado ao
século XIV ao XVII em que os pais tinham o dever de moldar a criança,
agredindo fisicamente e reprimindo-a, entretanto nesta época os pais já
estavam mais ligados emocionalmente aos filhos, porém ainda temiam as
crianças como se fossem seres absolutamente malignos. Já o modo de
intrusão condiz ao que acontecia no século XVIII, época em que as crianças
deixam de ser vistas como ameaçadoras, portanto, o jeito que os pais
encontravam de controlar as crianças era através de punições, ameaças e
culpas. A partir disto segue-se o modo de socialização, que aconteceu durante
o século XIX à metade do século XX, neste tempo os pais tentavam fazer com
que as crianças correspondessem às expectativas dos demais, corrigindo-as
publicamente, instruindo e treinando boas maneiras e bons hábitos. E o modo
de ajuda condiz desde a metade do século XX até os dias de hoje, em que se
considera que as crianças sabem mais do que devem. Neste momento, a
punição não é mais o foco, já que se acredita que se o potencial da criança for
cumprido em cada estágio, esta se tornará uma pessoa sem medo da
autoridade, autêntico, criativo, gentil, talentoso e alegre.
Esta divisão de modos mencionada acima, indica o fato de que
essas formas de tomar conta das crianças induziram a um impacto tanto nos
pais, quanto nas próprias crianças, e algumas destas últimas reproduzem
inconscientemente os próprios padrões e experiências do jeito como foram
criadas.
Assim
como
demonstradas
as
influências
culturais
de
compreensão dos padrões com a questão do abuso infantil em geral,
importante se torna esclarecer que também há influências culturais no abuso
14
sexual infantil, por isso, culturas diferentes possuem distintos costumes de
educação infantil, que podem ou não serem aprovados totalmente como
costumes normais. Portanto, em algumas circunstâncias, o abuso sexual
infantil não é julgado abusivo pela sociedade em questão.
Outras escritoras citadas nas produções teóricas acerca da violência
sexual infantil são Maria Amélia Azevedo e Viviane Guerra que propagam a
maneira como o envolvimento de adultos em experiências sexuais com
crianças tem admitido interpretações diversas da sociedade, segundo o
período histórico e o lugar em que acontecem. (MAGALHÃES, 2005)
Segundo Azevedo e Guerra (apud Magalhães, 2005, ibid.), “a idéia
de normalidade das relações sexuais adulto-criança está presente em pelo menos três
grandes vertentes históricas: na tradição grega, na tradição judaica e na tradição
sumeriana.”.
Azevedo e Guerra declaram que se atribui à Bíblia e ao Talmud1 a
tradição que motiva o sexo, através da servidão, casamento ou concubinagem,
entre meninas muito pequenas e homens adultos. No Talmud, o noivado, com
a permissão do pai, poderia acontecer quando a menina completasse três anos
de idade.
Magalhães (2005, p. 29) procura, também, revelar a contribuição
da tradição judaica e o machismo bíblico no processo histórico sociocultural do
abuso sexual. Suas indicações têm como base referencial as autoras citadas
acima. Em sua análise, ela explica que:
Vê-se que a tradição judaica era dotada de uma
certa ambigüidade em relação às práticas sexuais adultocriança. Por um lado, aceitava o casamento e o concubinato
entre homens e meninas, e ao mesmo tempo proibia a sodomia
e algumas formas de incesto (entre irmãos e/ou primos), ainda
que silenciasse a respeito do incesto pai-filha. (...) encontra-se
subjacente a estas práticas a idéia de que a mulher era um
objeto ou propriedade do homem e não um ser humano dotado
de vontades e direitos. O mesmo que passava com o menino
1
O Talmud é uma literatura em hebraico e aramaico, que cobre os significados e as
interpretações das porções legais do Velho Testamento, assim como dizeres sábios de fontes
rabínicas. Ele se estende sobre um período de tempo de um pouco depois de Esdras, por volta
de 400 a.C. até aproximadamente 500 a.C.
(RODRIGUES, 2009)
15
grego e com as parábolas da Bíblia, que incluíam atitudes
violentas contra crianças.
Entendendo-se, assim, que essa ligação cultural se expressa de
diferentes formas nas organizações da sociedade, pode-se comprovar que o
incesto era glorificado e justificado, com base em sentenças de pureza
sanguínea e em termos divinos, em algumas sociedades, mesmo sendo
condenado há muito tempo.
Compreende-se, portanto com base nas evidências mencionadas
acima, a idéia de que o incesto foi transgredido por algumas sociedades,
mesmo sendo condenado desde o tempo neolítico. Desta forma, pode-se trazer
a importância, fatos culturais como na era pré-colombiana em que o casamento
entre irmãos era imposto aos reis peruanos, como uma maneira de prestar
homenagem à Lua e ao Sol, bem como, no Antigo Egito os faraós tinham que
se casar com suas irmãs, como uma maneira de prestar homenagem aos
deuses Osíris e Íris. Há em outros locais relatos de casos incestuosos,
portanto, em sua análise Magalhães (2005), diz que “podemos encontrar também
relatos de casos incestuosos na China, no Japão, na Birmânia e na Tailândia”.
Indica-se aqui a indicação dada por Azambuja (2005, p. 20-21)
que afirma a relevância em se compreender o processo histórico do
reconhecimento da criança como sujeito de direitos:
O reconhecimento da criança como sujeito de
direitos decorre de um processo histórico. Em vista disso,
convém situar a infância no contexto social, histórico e jurídico
através dos tempos, observando-a desde a Antiguidade até os
nossos dias, para então abordar o caminho traçado pela
normativa internacional, a partir do século XX [...].
Ao ramificar o processo histórico do abuso sexual contra crianças
em seis diferentes épocas, Ana Paula Magalhães (2005) o estabelece da
seguinte maneira: Grécia Antiga, Séculos I e II de nossa era, Primórdios do
cristianismo, A modernidade, a Sociedade moderna individualista e o Século
XX.
16
A Grécia Antiga é atentada como um período em que não existia
repressão sexual e o que conduzia a prática sexual era condição do sujeito
perante a sociedade. Portanto, era completamente aceitável um homem adulto
manter relações sexuais com um púbere (adolescente), pois este último ainda
não era considerado cidadão.
A moralidade sexual grega foi dirigida e pensada aos homens.
Portanto, a mulher aparece apenas como um objeto de procriação, ou na
melhor das teorias, uma companheira a quem se deveria educar e vigiar.
Sendo assim, esta moralidade estava relacionada a comportamentos ligados a
autoridade dos homens e ao exercício do poder da virilidade. (MAGALHÃES,
2005, p. 31)
A ligação sexual entre homens e mulheres era somente
considerada necessária, porque a procriação necessitava dela. A cobiça sexual
não carregava nenhum valor negativo porque era considerada uma resposta
esperada à aparência física. Portanto, os pensamentos que existiam
relacionados às práticas sexuais não eram voltados a fim de normatizar esse
querer sexual e sim para a pressão em que os homens eram levados por este
último.
Havia também uma diferenciação entre os papéis dos homens e
das mulheres, esses papéis eram chamados de ativos e passivos, cabia aos
escravos, mulheres e rapazes o papel passivo e aos homens o ativo
(MAGALHÃES, 2005, p. 31 – 32). Vale ressaltar que, nesta cultura, os homens
que agiam forma passiva, eram julgados fracos, sendo assim, indignos, além
de que, diferentemente da moral cristã, na moral grega não se diferenciava
uma relação sexual entre os pólos masculino e feminino e sim nos pólos ativo e
passivo, isto é, um indivíduo e um objeto.
A temperança e essa função ativa eram ligadas ao status que o
sujeito exercia naquele povo, isto é, quanto mais poder e autoridade um
homem possuir, mais ele tem que dar continuidade à conduta mantida pelas
premissas rígidas de conduta sexual. Portanto, havia uma necessidade de se
conhecer a maneira correta de reunir bem os entusiasmos sexuais ao longo da
existência vital, concordando com a premissa da temperança.
17
Sobre o incesto, pode-se falar que era proibido, entre mãe e filho
por causa da diferença de idade entre estes, isto é, seus filhos não seriam
saudáveis o bastante. Desta maneira, o incesto era relacionado ao comando da
interdição. Pode-se falar que a moral sexual era regida por um uso dos
prazeres, por uma maneira de utilização.
Objetivando realizar esta moral dos prazeres, havia o ímpeto de
possuir uma postura adequada descrita pela continência, isto é, lutar ou
mesmo suportar com o objetivo de assegurar a dominação sobre os
entusiasmos e as vontades (MAGALHÃES, ibid., p. 33). Esta moral era
manifestada pela boa utilização que se faz dos prazeres.
Desta maneira, apontado anteriormente e baseado nos estudos
de Magalhães, alguns aspectos podem ser indicados, bem como: as
discussões não geravam em torno do mal psicológico e físico, ou mesmo da
maturidade ou escolha dos jovens; as preocupações focalizam as fronteiras
para manter a dignidade dos adolescentes, a fim de que estes passassem à
atividade, tornando-se cidadãos dignos; o adolescente que não adquirisse a
posição ativa na hora correta, não atendia os princípios morais e tornava-se,
perante a sociedade, uma figura feminina; a feminilidade estava explicitamente
relacionada à passividade, manifestando não possuir autoridade sobre si. Estes
são alguns fatores que retratam a cultura da Grécia Antiga.
Nós séculos I e II de nossa era, vale ressaltar, as práticas, as
necessidades e mesmo o crescimento da cultura tinham como base o contexto
do princípio de existência em que era necessário possuir cuidados consigo
próprio. Desta maneira, era necessário cuidar da alma e do corpo e refletir
sobre si próprio. Como observa Magalhães (idem, p.34): “Imerso no ideário da
época estavam a valorização do casamento e das obrigações conjugais, a virgindade
e o desinteresse em relação ao amor por rapazes.”
Nesta hora, acontece uma mudança, isto é, o indivíduo tem que
se constituir como sujeito moral, levando em conta a questão de um dado
sobre si mesmo, a racionalidade.
Desta forma, tem começo uma consideração na ligação entre o
homem e a mulher, uma abstinência das satisfações sexuais. Com essa base
de comportamento, a castidade torna-se o foco no estilo de vida e a atividade
18
sexual é restrita ao matrimônio, sendo este visto como laço conjugal. Portanto,
neste instante, há uma modificação na maneira como os homens refletiam os
problemas relacionados ao sexo.
No século V, a Igreja cristã sustentava fervorosamente a noção da
abstinência que se encontrava relacionada à aptidão de profetizar e a da
virgindade. Essa renúncia sexual acontecia para alcançar o ideal de
transparência frente a Deus. Atravessar a puberdade, para os adolescentes,
sem fazer sexo significava superar as tentações que Adão e Eva não
conseguiram.
Outra evidência que merece destaque é que os atos sexuais
começaram a ser julgados pelo clero, como ato pecaminoso, chegou ao ponto
de Agostinho permitir que o Governo romano aplicasse suas leis para
interceder nas brigas das congregações, inserindo o espírito católico na
sociedade.
Agostinho pregava que após a vinda dos filhos no casamento, o
certo era abster-se do sexo, pois no matrimônio o mais importante é a amizade.
O espaço privado é definido entre a Renascença e o século XVIII.
Somente nos séculos XVIII e XIX que surge o conhecido sentimento da infância
e neste momento também, o indivíduo passa a ser definido como sujeito da
sexualidade. A partir disso, a burguesia se interessa mais no lucro econômico
da vigilância sexual do que na repressão sexual.
Segundo Ana Paula Magalhães (2005), a partir do momento em
que começamos a contextualizar a violência sexual infantil não quer dizer que
estejamos deixando de descrever a violência da ação e sim que estamos
revelando o fato de que ele é considerado violento em nossa sociedade a partir
de certa época da história.
Deve-se iniciar, portanto, a partir do século XX, um movimento de
garantia à infância. Em 1959, a Declaração dos direitos da Criança foi
aprovada e proclamada pela Assembléia Geral da Organização das Nações
Unidas. Atualmente, há uma relevante mobilização de algumas organizações
e/ou grupos da sociedade em relação à proteção da criança, em conseqüência
disto, foi estabelecido no dia 18 de maio como dia nacional de combate ao
abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes, criando, assim,
19
espaços para discussão desta temática. Sendo assim, a criança se constitui
como sujeito de direitos que são defendidos por lei.
Azambuja (2004) sustenta que a Declaração dos direitos da
Criança chegou com a finalidade de tornar evidente a enorme diferença que
existe entre as condições subumanas de vida da maioria das crianças
brasileiras e o conteúdo do documento. Isto se deve ao fato de que de acordo
com a Declaração, toda criança teria direito à proteção especial para o seu
desenvolvimento mental, social e físico, teria direito, à igualdade, independente
de nacionalidade, raça ou religião, entre outros direitos.
A autora supracitada elucida que somente após a publicação da
obra Síndrome da Criança Espancada, em 1962, por Kempe e colaboradores,
em Chicago, que o maltrato a criança passou a chamar a atenção do público
em geral e dos profissionais da saúde para a proteção à criança como algo
urgente e necessário, assim, o tema também passou a ser admitido como
objeto de investigação.
Atualmente, é importantíssimo reconhecer que apesar dos
avanços registrados na história, bem como no aspecto jurídico, bem como no
social, no Brasil, o número de crianças vítimas de todo tipo de violência,
especialmente a violência sexual intrafamiliar, é alarmante. Azevedo e Guerra
(apud Azambuja, 2004, p.43) classificam as crianças encontradas vítimas de
violência, basicamente, como: “Infância pobre, vítima de violência social mais
ampla; a infância explorada, vítima de violência no trabalho; a infância torturada, vítima
de violência institucional; a infância fracassada, vítima de violência escolar; a infância
vitimizada, vítima de violência doméstica.”.
Segundo Rouyer (1997) a criança sobrevivente vítima de abuso
sexual sofre profundas marcas no seu desenvolvimento físico e emocional.
Essas profundas marcas são caracterizadas pelo trauma que torna a criança
abusada incapaz de construir relações de familiaridade e confiança, relações
essas que são fundamentais para seu desenvolvimento pleno.
As crianças vítimas de violência sexual intrafamiliar carregam em
suas vidas sinais de distúrbios causados por estresse pós-traumático.
A Constituição Federal, o Código Penal e o Estatuto da Criança e
do Adolescente (Lei 8069, de 13 de Julho de 1990) dispõem sobre a proteção
20
da criança contra qualquer forma de abuso sexual, aqueles que se omitem e
aqueles que praticam o ato são penalizados por estas leis. Corroborando esta
idéia, indicam-se aqui preâmbulos da Política de Proteção Integral a Criança:
O diagnóstico geral da atuação dos principais
atores de garantia de direitos aponta, ao mesmo tempo, para
celebração e preocupação. Como motivo de celebração, o
balanço dos 18 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA) indicou um avanço extraordinário na institucionalização
e aprimoramento dos mecanismos de exigibilidade de direitos
das crianças e dos adolescentes compondo um amplo e
complexo sistema.
Os Conselhos de Direito e Tutelares foram os dois
mecanismos de exigibilidade dos direitos da criança e do
adolescente incorporados aos estados brasileiros pelo Estatuto
da Criança e do Adolescente. Juntos, eles compõem uma rede
de mais de 70 mil pessoas que cotidianamente trabalham na
construção da cidadania de crianças e adolescentes. Essa rede
atua hoje como um dinamizador do Sistema de Garantia de
Direitos. (CONFERÊNCIA NACIONAL DOS DIREITOS DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 2009).
No nascimento do século XXI, o abuso sexual infantil deve ser
encarado como uma violação aos direitos humanos da criança. Assim, o
conjunto de leis de proteção integral à criança deve ser visto como provocador
de aceleramento da transformação social, ou seja, a criança é considerada
pessoa em desenvolvimento, tendo, assim, a garantia de seus direitos
humanos fundamentais assegurados.
21
CAPÍTULO II
CONCEITUANDO VIOLÊNCIA INFANTIL
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), violência é “uso
intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra
outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha grande
possibilidade de
resultar
a lesão,
morte, dano psicológico,
deficiência de
desenvolvimento ou privação.” (OLIVEIRA DA SILVA; SOUZA E SILVA, 2005, p.
15).
Nota-se uma atenção especial no que tange ao aspecto relacionado
à violência contra a criança. Isto é evidenciado na criação do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) aprovado pela Lei 8069/1990, de 13 de julho
de 1990. Contém 267 artigos que contemplam todos os requisitos que levam a
criança ao amparo total. Nota-se a proteção, em um sentido ampliado, tendo
esta concepção destacada no artigo 5º, em que dispõe que “nenhuma criança ou
adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação
ou omissão, aos seus direitos fundamentais.” (BRASIL, 1990).
Examinando as concepções supracitadas, deve-se entender a
violência como algo amplo, que sujeita todo ser humano, inclusive a criança.
Há dois processos que compõem a questão da violência infantil (vitimação e
vitimização).
O sistema de vitimação relaciona-se a uma violência estrutural,
característica das sociedades representadas pela desigualdade da distribuição
de renda e pela dominação de classe. A menina e o menino vitimados têm
seus direitos básicos violados todos os dias, como o próprio direito à vida,
saúde, escola e alimentação. A vitimização relaciona-se a uma violência nas
relações inter-pessoais adulto-criança, relações caracterizadas por hierarquia,
22
fundamentando-se na presunção da autoridade adulta sobre a criança e
implicando um abuso desta autoridade, ou seja, a vitimização diz respeito à
submissão do desejo da criança ao do adulto, coisificando a criança, tornando
esta em objeto e não em sujeito.
De acordo com Safiotti (apud Magalhães, 2005), o abuso sexual,
diferentemente da violência física, que normalmente envolve os dois tipos de
sexo, tem a maior parte de agressores homens e a maior parte de vítimas
meninas. Isto mostra, historicamente, a maneira de como a mulher é submetida
ao homem. Com base nesta afirmação, Magalhães (2005) destaca que a
violência contra a criança não caracteriza somente a submissão da mesma
contra o poder adulto, mas ao poder do adulto homem. Há uma tendência
muito forte em conceber a submissão da criança ao adulto não como uma
construção social, mas como natural. Desta maneira, os pais são vistos, não só
como responsáveis pelos filhos, mas também como donos destes, podendo,
assim, fazer com eles o que quiserem. É necessário que se desconstrua esta
maneira de se pensar que tem sido base para práticas nocivas contra crianças.
Magalhães destaca ainda as diferentes formas de maus-tratos, tais
como: maus-tratos físicos, abuso sexual, maus-tratos psicológicos, negligência
e Síndrome de Munchausen.
Maus-tratos físicos estão relacionados ao uso da força física nãoacidental, ou seja, de forma intencional. Esse exemplo de violência também
pode ser conceituado por atos de omissão intencionais, ou seja, não
acidentais. Essas práticas seriam feitas por parte de responsáveis pela criança
ou pelos próprios pais. Magalhães (2005, p. 22) adiciona que esses atos têm “o
objetivo de ferir, danificar ou destruir esta criança ou adolescente, deixando ou não
marcas evidentes.”.
O abuso sexual está relacionado à situação em que uma criança é
utilizada a fim de gratificar sexualmente um adolescente mais velho ou um
adulto, fundamentado em uma relação de poder. Magalhães indica que, o
abuso sexual inclui o ato sexual com ou sem penetração, com violência ou não,
a manipulação da genitália, ânus ou mama, exibicionismo, exploração sexual,
pornografia e “voyeurismo”.
23
Indicando os maus-tratos psicológicos, Magalhães ressalta que este
tipo de violência é marcado pelo uso da criança como objeto para gratificar as
necessidades psicológicas dos adultos, pela rejeição, pelo desrespeito, pela
depreciação e pela discriminação. Este tipo de violência é um dos mais difíceis
de caracterizar e conceituar devido à falta de evidências imediatas e pela
sutileza do ato, porém é um dos tipos de violência mais freqüente. Cobranças e
punições exageradas são formas de maus-tratos psicológicos, que podem
causar danos graves ao desenvolvimento social, psicológico, físico e sexual da
criança.
A negligência é caracterizada pelo ato de omissão por parte dos
responsáveis pela criança em fornecer as necessidades básicas para o seu
desenvolvimento. A negligência dos responsáveis pode ser maneira acidental
ou não-acidental, ou seja, intencional. A situação sócio-econômica também
deve ser levada em conta. (Magalhães, 2005)
A Síndrome de Munchausen caracteriza-se por uma situação em
que os responsáveis ou os pais da criança, burlam, a partir de uma simulação
de uma sintomatologia, que estas sejam impostas a realizar várias
investigações médicas. Além de simular doenças em suas crianças, há duas
outras formas de Munchausen, estas se caracterizam pelas formas
toxicológicas ou por asfixia, ou seja, a criança é asfixiada e intoxicada por
alguma substância, sejam plantas, sejam medicamentos, muitas vezes, a
criança é asfixiada quase até a morte.
Ressalta-se aqui que o abuso sexual pode ser subdivido em abuso
sexual sem contato físico e abuso sexual com contato físico. Fazem parte do
primeiro conjunto o voyeurismo, o abuso sexual verbal, o exibicionismo, o
assédio sexual e telefonemas obscenos. O segundo conjunto é composto pelos
atos físico-genitais (sedução, estupro, atentado violento ao pudor e incesto),
pela prostituição e pornografia e pelo sadismo.
Vale esclarecer que o voyeurismo caracteriza-se por um voyeur que
obtém gratificação sexual observando os órgãos ou atos sexuais de crianças.
Essas últimas podem estar com roupas íntimas, envolvidas em atos sexuais,
24
nuas ou com qualquer outro tipo de vestimenta que seja apelativa para o
voyeur.
Magalhães (2005) esclarece o abuso sexual verbal como: “conversas
abertas sobre atividades sexuais destinadas a despertar o interesse da criança ou do
adolescente ou chocá-los”.
O exibicionismo tem como foco chocar a vítima. O exibicionista
mostra partes do corpo ou faz gestos obscenos. É um desvio sexual que se
demonstra através da necessidade incontrolável de se obter satisfação sexual
simplesmente exibindo seus órgãos genitais às vítimas.
Magalhães (2005) atribui-se ao assédio sexual como sendo:
“propostas de contato sexual; na maioria das vezes, a vítima é chantageada em
decorrência da posição de poder do agressor”. Já o telefone obsceno atribui-se ao
uso que o agressor faz do telefone para conversas obscenas, muitas vezes, no
anonimato.
O abuso sexual com atos físico-genitais é aquele que inclui relações
sexuais com penetração vaginal, penetração anal, sexo oral, tentativas de
relações sexuais, masturbação e carícia nos órgãos genitais. A sedução é
quando ocorre relação sexual com adolescentes virgens de 14 a 18 anos, sem
uso de violência e há penetração vaginal e/ou anal, o estupro é a situação em
que ocorre penetração com grave ameaça ou com uso de violência, em
crianças e adolescentes de até 14 anos, o atentado violento ao pudor se
caracteriza pelo ato de constranger maiores de 14 anos a praticar atos
libidinosos, utilizando grave ameaça ou violência, sem penetração, o incesto é
qualquer relação de caráter sexual em que existe um laço familiar, direto ou
não, ou até mesmo uma simples relação de responsabilidade.
A prostituição é relacionada à participação de crianças em atos
sexuais com outros menores ou adultos, em que há presença do uso da força
da coação, já a pornografia diz respeito ao uso de crianças como modelos ou
atores em vídeos e fotografias obscenas, assim como na prostituição,
geralmente com fins econômicos. O sadismo condiz com o abuso sexual que
envolve surras, flagelação e torturas.
25
2.1 Semelhanças e Diferenças entre Abuso Sexual e
Exploração Sexual
Diante do exposto sobre o processo da violência infantil, é
interessante indicar as diferenças conceituais entre abuso sexual e exploração
sexual. Com base nas análises de Sanderson (2005), o abuso sexual infantil é
definido pelo envolvimento de crianças subordinadas a atividades sexuais com
pessoas um pouco maiores ou mais velhas ou com adultos, em que exista uma
diferença de poder, tamanho ou idade, em que a criança é usada como objeto
sexual para satisfação dos desejos ou necessidades, para a qual ela não tem
capacidade de dar uma permissão consciente devido ao desequilíbrio no
poder, ou de qualquer incapacidade física ou mental. Esta autora indica que
essa definição inclui quaisquer adultos e crianças em quem elas depositem
confiança e que exerçam algum tipo de poder sobre elas.
O abuso sexual infantil incestuoso é julgado por alguns autores
qualquer contato sexual entre uma criança e um adulto que tenham grau de
parentesco ou acreditem tê-lo. Nos abusadores incestuosos, também estão
incluídos os meio-irmãos, madrasta, padrasto, amantes que morem junto com
os pais quando assumem papéis de pais e avôs por afinidade. Se a relação
que há entre a criança e um parente for violada por qualquer ato sexual, é
considerado abuso sexual infantil incestuoso. Quando se fala em Abuso Sexual
Incestuoso, entende-se que é aquele praticado dentro do âmbito intrafamiliar,
ou seja, quando é perpetrado por pessoa que tenha com a criança uma relação
de afetividade, responsabilidade ou consangüinidade. Abuso sexual é qualquer
tipo de contato sexualizado e como corrobora Unicef – Crami (2009, p. 18): “[...]
desde falas eróticas ou sensuais e exposição da criança a material pornográfico até o
estupro seguido de morte. Dentro deste vasto espectro incluem-se as carícias íntimas,
relações orais, anais, vaginais com penetração ou não, além do voyeurismo e
exibicionismo, entre outros.”.
O abuso sexual também se caracteriza por uma situação em que
a criança é submetida por um adulto a jogos ou atos sexuais com o propósito
26
de satisfazer-se ou estimular-se, impondo pela sedução (com oferta de
presentes ou palavras), pela força física ou por ameaça. Geralmente, falandose de casos extrafamiliares, acontece em instituições de prestação de serviços
e de atendimento e na vizinhança.
A questão da exploração sexual está intrinsecamente conectada a
conotação comercial, refere-se ao uso de crianças para satisfação e
estimulação sexual de adultos em que existem ganhos financeiros. Além de
que, “geralmente, estas pessoas que exploram e as que usam estas crianças (...) não
têm com eles uma relação de afinidade, como na Violência Sexual Doméstica”
(UNICEF-CRAMI, 2009, p.18). A exploração sexual é caracterizada também
por: “ato ou jogo sexual em que a criança ou adolescente é utilizado para fins
comerciais por meio de relação sexual, indução à participação em shows eróticos,
fotografias, filmes pornográficos e prostituição” (ANDI, 2003, p.27).
2.2 Os Mitos e a Realidade do Abuso Sexual Infantil
É importante estudar algumas crenças e posturas mais defendidas
comumente sobre o abuso sexual infantil, as quais se tornaram mitos e
concepções profundamente errôneas. Nas indicações de ABRAPIA (2005) e
Sanderson (2002), segue-se uma seção com as concepções errôneas mais
comuns e a substituição destas por dados e fatos atualizados.
MITO: O abuso sexual de crianças não é tão comum quanto às
pessoas imaginam.
Com certeza, o abuso sexual infantil está mais disseminado do
que a maioria das pessoas pensa. Calcula-se que o abuso sexual em crianças
acontece em geral com uma entre quatro garotas e um entre seis garotos, por
mais que as estimativas possam variar de acordo com o tipo de pesquisa que
está sendo realizada. Vários pesquisadores calculam que esses números não
significam nem a metade da realidade já que algumas crianças jamais
27
confessam o abuso ou este nunca atinge o conhecimento do sistema judiciário,
dos serviços sociais ou da polícia. O fato de várias denúncias de crianças
sobre abusos serem interpretadas como fantasia ou ignoradas se dá devido à
crença de que o abuso sexual infantil é infreqüente. Ressalta-se aqui, que na
maioria dos casos, o abuso sexual não é um acontecimento singular na vida da
criança, mas algo que pode durar por muitos anos, principalmente no caso de
abuso sexual intrafamiliar ou incestuoso. Desta maneira, acredita-se que o
abuso sexual é muito comum em todo mundo. O governo deve ter prioridade
em sua prevenção até mesmo por questões financeiras. Exemplo disto é uma
pesquisa feita nos EUA em que foi revelado que o gasto a atendimentos de
dois milhões de vítimas de abuso sexual infantil, alcançou 12.400 milhões de
dólares por ano.
MITO: O abusador sexual é um psicopata, um tarado que qualquer
um reconhece na rua.
Na maioria das vezes, são indivíduos que são queridos por
crianças e tem aparência normal. Foi-se a época em que o abusador de
criança poderia ser notado como um velho que anda com roupas sujas ao
redor dos portões de parques infantis ou escolas. Abusadores sexuais podem
ser de todas as faixas etárias, grupos étnicos e classes sociais. Eles não só
aparentam ser normais, como necessitam dessa aparência para evitar serem
exibidos. Pertencem à comunidade local e fazem parte de todo tipos de
profissão, inclusive àquelas que trabalham com crianças, como outras, tais
como motoristas de caminhão, juízes, encanadores, advogados, homens de
negócio, médicos, professores, membros do clero e até policiais. Usualmente,
são considerados exemplos na comunidade e fazem sua rotina cotidiana sem
serem notados. É completamente improvável que se consiga apontar um
abusador sexual de crianças em meio a uma multidão.
MITO: As garotas correm mais risco de abuso sexual do que os
garotos.
Apesar de os dados atuais apontarem que há mais garotas
abusadas sexualmente do que garotos, isso pode também não significar nem a
28
metade da realidade. Existe a crença de ser mais difícil para meninos
denunciar o abuso sexual porque se sentem mais constrangidos em revelá-lo
por causa da sociedade machista em que vivem. Desta maneira, por existir o
estereótipo do homem ser o iniciador sexual, aos meninos é difícil comentar
sua experiência como vítimas de abuso sexual. Além do machismo, a cultura
homofóbica faz os meninos se sentirem confusos quanto à sua sexualidade, o
que dificulta a revelação do abuso sexual. Acredita-se que os meninos correm
mais risco de sofrer abuso sexual na comunidade, enquanto as meninas
correm mais risco de sofrer em casa.
MITO: O estranho retrata maior risco às crianças.
Estranhos abusarem de crianças acontece na minoria dos casos
registrados. Na grande parte das vezes, a criança é abusada por alguém
conhecido como o médico, pai/mãe, professor, madrasta/padrasto, babá,
namorado da mãe, colegas de escola, parentes, amigos da família e vizinhos.
Não há possibilidade de proteger integralmente uma criança apenas mandando
que fique afastada de estranhos. Na realidade, a probabilidade é maior que
uma criança seja abusada por algum conhecido dela na comunidade em que
vive e na vizinhança do que por um estranho.
MITO: O abuso sexual infantil acontece somente em certas
classes/comunidades/culturas.
O abuso sexual infantil ocorre em todas as classes, culturas e
comunidades. O abuso sexual pode ocorrer com qualquer criança, ou seja,
todas as crianças estão sujeitas ao abuso sexual. É necessário que a
sociedade tenha em mente o fato de que o abuso sexual infantil não acontece
só em outras culturas, com os outros ou em outras comunidades, ou seja, ele
pode acontecer em qualquer lugar com qualquer criança. Para que aconteça
uma efetiva proteção, é preciso que se reconheça a realidade do abuso sexual
infantil para que assim a sociedade não seja atraída pela falsa idéia de
segurança de que suas crianças estão fora de risco.
MITO: O abuso sexual está fundido a lesões corporais.
29
Na realidade, o mais comum é a criança ser conquistada ou
ameaçada afetivamente e não a violência física. Na grande parte das vezes, as
crianças são mais prejudicadas psicologicamente pelo abuso sexual.
MITO: A Bíblia desculpa o abuso sexual em crianças.
Considerando que a Bíblia está sujeita a todos os tipos de
interpretações, os abusadores podem achar uma justificativa, através dessas
interpretações, para cometer o abuso sexual em crianças. Mas, a Bíblia exige o
banimento de atos sexuais imorais e prega a proteção das crianças.
MITO: A criança inventa e mente que é abusada sexualmente.
As crianças têm sim imaginação fértil, mas isso não significa que
inventem sobre estarem sendo abusadas sexualmente. A grande parte das
crianças não tem percepção sobre assuntos sexuais para ter fantasias sexuais
adultas. O fato dos adultos não acreditarem nas crianças traz a conseqüência
da realidade do abuso sexual ser ignorada. Além disso, essa concepção
errada, muitas vezes, desloca a responsabilidade do abusador para a criança.
Desta, é relevante exaltar o fato de que a criança não tem
conhecimento sexual o bastante para mentir sobre o abuso sexual. Além do
mais, não existem motivos para a criança pequena mentir e/ou inventar sobre
abuso sexual. Ainda que a criança já tenha assistido pornografia adulta, é
improvável que invente histórias sobre abuso sexual, já que elas não podem
obter ao simplesmente assistir uma atividade sexual adulta, informações sobre
o cheiro do sêmen, a textura e o sabor sem nunca ter tido uma experiência a
respeito. Uma conseqüência fatal deste mito é não perceber a própria denúncia
que a criança faz ao não acreditar na mesma.
MITO: O abuso sexual infantil ocorre somente em famílias
desestruturadas.
É importante ressaltar que níveis de educação e renda familiar
não são indicadores de abuso sexual. Inclusive, as famílias das classes alta e
média têm meios melhores para acobertar o abuso e conservar o “muro do
silêncio”.
30
O abuso sexual pode ocorrer em qualquer família, até mesmo nas
consideradas
“estruturadas”.
Bem
como,
abusadores
intrafamiliares
e
extrafamiliares podem ser e conquistar os pais de todo tipo de família, não só
as desestruturadas. Levando em conta que os abusadores são manipuladores
e bastantes espertos, é preciso ressaltar que têm capacidade de enganar todos
os tipos de família.
MITO: É fácil identificar o abuso sexual em motivo das evidências
físicas achadas nas crianças.
Somente em 30% dos casos, existe evidência física. Levando em
conta este fato, é necessário que as autoridades sejam treinadas para as
diversas técnicas de percepção de abuso sexual.
MITO: O abuso sexual infantil está crescendo.
O abuso sexual infantil existe há séculos. O que acontece é que,
atualmente, as taxas de detecção e denúncia aumentaram, apesar do abuso
sexual infantil ainda permanecer oculto, acredita-se que seja menos oculto no
presente do que no passado.
MITO: A grande parte dos professores e pais está informada sobre
abuso sexual infantil, como lidar com ele e sua freqüência.
No Brasil, a grande parte das pessoas desconhece a realidade do
abuso sexual infantil. Professores e pais desinformados ficam impossibilitados
de auxiliar uma criança.
MITO: Todo abusador sexual de crianças e “pedófilo” foi abusado
sexualmente quando criança.
Realmente há pedófilos que foram abusados sexualmente na
infância, mas a maioria não foi. É necessário ter cuidado ao aceitar totalmente
essa crença, pois pedófilos adultos podem usar o fato de terem sofrido abuso
como desculpa e/ou justificativa para seu comportamento com crianças, para
obter simpatia.
31
A grande conseqüência errônea deste mito é acreditar que
apenas adultos que foram abusados quando crianças têm capacidade de
abusar de crianças. Ressalta-se aqui que a maioria das mulheres e homens
sobreviventes do abuso sexual quando crianças não se tornaram adultos
abusadores sexuais.
MITO: A divulgação de textos sobre pedofilia e fotos de crianças
praticando sexo com adultos, animais, ou até outras crianças ou em posições
sedutoras, não causam malefícios, já que tudo ocorre virtualmente na tela do
computador e não há contato.
O malefício é altíssimo para as crianças fotografadas e filmadas.
O uso dessas imagens e textos estimula a aceitação do sexo de crianças com
adultos, situação inaceitável e criminosa. Sabe-se que o primeiro contato do
pedófilo acontece de forma virtual através da internet, podendo, depois se
tornar conquista física, chegando inclusive ao assassinato de crianças.
MITO: Apenas homens gays abusam de meninos.
Tanto homens heterossexuais como bissexuais ou homossexuais
abusam de crianças, porém, a maioria dos abusadores sexuais de crianças é
composta por heterossexuais.
MITO: Na grande parte das vezes, o abuso sexual acontece longe
da casa da criança.
Frequentemente, o abuso acontece perto ou dentro da residência
da criança. Na grande parte dos casos, o abusador e a vítima pertencem ao
mesmo grupo étnico e têm nível socioeconômico igual.
MITO: Mulheres não cometem abuso sexual contra crianças.
Existe a crença que de 20% a 25% dos casos de abuso sexual
infantil são perpetrados por mulheres. Pelo fato das mulheres serem vistas
como protetoras e guardiãs, as pessoas têm mais dificuldade em acreditar que
possam ser abusadoras. As crianças com menos de cinco anos de idade são
as que mais correm perigo de serem abusadas por uma mulher. Isso acontece,
32
frequentemente, em creches ou por uma babá. O fato deste tipo de abuso ser
pouco detectado se dá devido a pouca idade da criança e pelas atividades
sexuais não deixarem evidências, já que ocorre, usualmente, em meio a
práticas comuns de higiene. As mulheres abusam de seu poder de maneira
sexual com crianças sim.
MITO: O abuso sexual se limita ao ato de estuprar.
Não só o ato sexual com penetração, seja ela anal ou vaginal, é
considerado
abuso
sexual,
práticas
como
exibicionismo,
pornografia,
“voyeurismo” e a manipulação dos órgãos sexuais também são considerados
abuso sexual.
MITO: Crianças em idade pré-escolar e bebês não correm riscos de
sofrer abuso sexual.
Existem adultos que abusam até mesmo de bebês. Pornografias
infantis já confiscadas mostraram crianças pequenas e bebês sendo abusadas
por adultos. A evidência mais importante deste fato vem de exames médicos
de bebês com doenças sexualmente transmissíveis. O fato das crianças
menores não conseguirem se expressar bem é usado como artifício por alguns
pedófilos, considerando que estas não poderão revelar o abuso.
Entende-se que é preciso compreender primeiramente as definições
incorporadas ao Abuso Sexual Infantil e posteriormente analisar seus
desdobramentos em forma de atendimento adequado a esta demanda. Desta
forma, buscar-se-á no próximo capítulo apresentar o papel do Serviço Social
junto à equipe interdisciplinar, inclusive, será inserida no próximo capítulo a
importância da Terapia de Família em face de uma família incestuosa.
33
CAPÍTULO III
O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL JUNTO A EQUIPE
INTERDISCIPLINAR NO ENFRENTAMENTO DAS
QUESTÕES RELACIONADAS AO ABUSO E A
VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL INTRAFAMILIAR
Este capítulo tem por objetivo demonstrar de que maneira o Serviço
Social e a Equipe Interdisciplinar se posiciona frente à questão do Abuso
Sexual Infantil Incestuoso.
Será tratado neste capítulo, o papel dos profissionais envolvidos
neste contexto. Para isso, é necessário afirmar a necessidade de um
atendimento especializado e interdisciplinar, pois, é um tema e uma questão
social especial, portanto deve ser tratado como tal.
3.1 Papel do Serviço Social
Terá como base neste capítulo, o trabalho feito pelo CRAMI – SP,
apesar disso, faz-se necessário esclarecer aqui que o papel do Serviço Social
que será apresentado neste tópico é o mesmo processado em todo país. Esta
ação encontra-se na Rede de Serviços proposta através dos órgãos de
enfrentamento a violência sexual infantil.
Esta pesquisa apresentará concepções desenvolvidas por algumas
assistentes sociais que atuam no CRAMI, a fim de se demonstrar uma base
concreta para este estudo. Portanto, as assistentes sociais que produziram o
artigo reforçando a importância e o papel do Serviço Social no enfrentamento
da violência sexual doméstica, foram: Fabiana Brenelli Vidotti, Maria Salete
Lopes de Araújo e Mariana Claudia Puente.
Para as autoras citadas acima é necessário que seja feito um
trabalho junto à família na qual ocorre a Violência Sexual Infantil Doméstica. O
34
assistente social contata todos os meios sociais em que a vítima e a família
estão inseridas. Brenelli Vidotti et. al (2009, p.47) traz a relevância que:
Levando em consideração que o Complô do
Silêncio se faz presente nos casos de Violência Sexual
Doméstica contra Crianças e Adolescentes, e, portanto a vítima
pode apresentar características deste fenômeno em um espaço
e com pessoas com as quais ela mantém uma convivência
diária.
Nas indicações de Brenelli Vidotti et. al (2009), Azevedo e Guerra
caracterizam o Complô do Silêncio como uma situação em que “a criança vítima
se cala enquanto os demais membros se negam a enxergar a realidade”. Ressalta-se
aqui que as famílias incestogênicas mantêm uma relação de poder em que as
mudanças são encaradas com uma grande resistência.
Segundo Brenelli Vidotti et. al (2009), as crianças vítimas de abuso
sexual incestuoso não são capazes de protegerem-se sozinhas, pelo fato de
não entenderem a situação a qual estão sendo submetidas. Desta maneira,
não conseguem se expressar, além do fato de serem muito pequenas o que
acarreta todos os fatores anteriormente indicados. Sendo assim, as autoras
sintetizam que: “[...] por estar dentro de uma família, na qual o silêncio faz parte [...],
podem estar sendo ameaçadas [...] para reforçar o Complô do Silêncio [...] as vítimas
sentem-se inseguras em revelar de fato o que ocorre com elas.”.
O assistente social que desenvolve um trabalho com famílias
incestogênicas, necessita ter uma qualificação profissional especializada e
precisa ser um profissional compromissado em garantir um atendimento efetivo
da família. Segundo Brenelli Vidotti et. al (2009, p. 47), exemplos de recursos
sociais em que o assistente social entra em contato são Educação, Saúde e
Assistência Social, sendo, a partir destes feitos os encaminhamentos
necessários. A grande parte dos contatos é feita com instituições como núcleos
comunitários, escolas e creches, lugares estes em que as crianças vítimas
convivem diariamente. Este contato se faz preciso, pois, a partir dele são
coletadas informações que ajudam a desvendar características que revelem a
35
problemática vivida pela criança vitimizada. Nos órgãos educativos, busca-se
fazer contato com a professora da criança, assim como com a direção e com a
orientadora pedagógica.
O assistente social também possui como papel importantíssimo levar
a reflexão a outros profissionais que convivem com as crianças vitimizadas,
bem como com outros líderes de diversos segmentos sociais que mantenham
contato direto com a mesma.
Nas indicações de Brenelli Vidotti et. al (2009), segue-se uma lista
contendo sinais indicativos que a criança vítima de abuso sexual incestuoso
pode apresentar.
• Comportamento agressivo, mudanças no apetite, mau
desempenho escolar, poucas relações com colegas ou amigos, raiva,
medo de escuro, fuga de escola, perturbações no sono, vergonha
exagerada.
• Comportamento sexual inadequado para sua idade, ou
seja, quando a criança apresenta comportamento ou conhecimento
sexual, não compatível ao desenvolvimento de sua idade.
• Dor ou inchaço, dores de cabeça e vômitos sem nenhuma
explicação médica, sangramento ou lesão nas áreas anais ou genitais,
erupções na pele, infecções urinárias, baixo controle dos esfíncteres,
secreções
penianas
ou
vaginais.
Apresentação
de
Doenças
Sexualmente Transmissíveis, sêmen na roupa, boca e genitais.
• Medo de uma pessoa em especial, de ficar sozinha com
alguém ou em algum lugar específico.
• Não querer mudar de roupa na frente de outrem.
• Práticas delituosas, gravidez precoce, tendências suicidas,
prostituição infantil, depressões, alcoolismo, toxicomania.
• Regressão ao estágio de desenvolvimento anterior.
As assistentes sociais, autoras do artigo estudado, exaltam a
relevância que o Serviço Social tem de manter contato freqüente com os
36
recursos sociais os quais a vítima participa com o propósito de obter
informações sobre como a família procede nestes espaços sociais, bem como
observar como a vítima se relaciona com seus amigos, como está sua
assiduidade na Escola ou Creche, conforme o caso, como é o relacionamento
da criança com o professor e como está seu desenvolvimento nas práticas
educacionais.
Brenelli Vidotti et. al (2009) procura sintetizar que quando ocorre um
trabalho em conjunto, há um considerável ganho para todos os lados, sendo
assim é um ganho favorável tanto para o Serviço Social quanto para os demais
profissionais. Ressalta-se aqui a importância do “Sigilo Profissional” dos
assistentes sociais envolvidos, pois, é de extrema importância que haja uma
postura profissional dos referidos técnicos para que exista uma garantia na
privacidade da família envolvida. As autoras elucidam uma análise, procurando
trazer a relevância de que:
Acredita-se que quando os profissionais estão
envolvidos e comprometidos, pode-se obter uma compreensão
e
entendimento
mais
abrangentes
a
respeito
do
comportamento da criança e do adolescente, fazendo com que
a sua aproximação seja não apenas por curiosidade e sim no
sentido
de
ajudá-los,
pois,
em
todo
o
processo
de
intervenção/avaliação da família no CRAMI, a criança e o
adolescente estarão emitindo sinais indicativos, através do seu
comportamento, sejam eles físicos ou emocionais.
Tem-se, portanto nas concepções citadas acima o conceito de que o
Serviço Social tem o papel de envolver os recursos que existem na
comunidade, contextualizando a criança vítima no seu meio, através de ações
articuladas. Portanto, o assistente social que trabalha com a questão do Abuso
Sexual Infantil deve estar preparado, pois se trata de um tema muito complexo,
por isso grande parte dos profissionais não qualificados apresenta dificuldades
em articular as ações que devem ser desenvolvidas dentro deste contexto.
Sendo assim, é importante destacar aqui que cabe aos assistentes sociais
entrar em contato com os recursos da Rede de Serviços, buscando mobilizar e
37
sensibilizá-los, cabe principalmente ao assistente social, na análise de Brenelli
Vidotti et al (2009, p. 51), “estar ‘atento e preparado’, para saber ouvir, respeitar e,
principalmente, ‘acreditar’ na vítima”.
Enfim, nota-se que se todos os órgãos e profissionais envolvidos
manterem uma postura atenta e compromissada na questão do Abuso Sexual
Infantil Incestuoso, há uma efetiva garantia da proteção integral da vítima.
Compreende-se que é preciso que haja uma atuação composta por diferentes
olhares e formações para o atendimento à vítima. Desta maneira, buscar-se-á
no próximo tópico apresentar a importância de uma equipe interdisciplinar e
como este trabalho em conjunto é feito no atendimento a uma vítima de abuso
sexual infantil incestuoso.
3.2 Interdisciplinariedade
Ao se colocar em pauta à complexidade e dificuldades existentes no
processo do Abuso Sexual Infantil Incestuoso, Maria Regina de Azambuja
(2004), refere à necessidade de um trabalho interdisciplinar com objetivo de
que as conseqüências da intervenção do atendimento sejam menos danosas o
possível tanto ao grupo familiar que a vítima está inserida, quanto a ela
mesma. A autora aponta interdisciplinariedade como uma busca constante de
novas realidades e novos caminhos a serem tomados.
Ressalta-se aqui que o Abuso abala toda a família, assim torna-se
necessário que seja realizado um trabalho conjunto de juízes, assistentes
sociais, advogados, médicos, inspetores, psicólogos, variados profissionais das
instâncias jurídica e policial e enfermeiros.
O processo interdisciplinar de um caso de abuso sexual infantil
incestuoso tem seu início através de denúncias e notificações que
normalmente são enviadas a partir dos recursos sociais da rede como
promoção social, saúde e educação, muitas vezes também chegam através do
Conselho Tutelar ou até mesmo de anônimos. Estas denúncias passam por
38
uma triagem e depois são levadas a um processo de atendimento. Desta
forma, segundo Pereira (2009, p.22), as denúncias entram em contato
primeiramente com o setor administrativo dos órgãos que a Rede de Serviços
oferece no que tange ao enfrentamento da violência sexual infantil incestuosa:
As notificações são recebidas por funcionárias do
setor administrativo; são elas as primeiras pessoas a terem
contato com o caso e também as responsáveis pelas
orientações concernentes ao registro do ocorrido. Caso seja
necessário
aprofundar
as
orientações,
as
funcionárias
encaminharão o notificante à equipe técnica.
Segundo o artigo 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA, 1990) a notificação de casos de maus-tratos é obrigatória, se não feita, é
passível
de
pena.
Portanto,
torna-se
preconizado
um
atendimento
interdisciplinar a criança vítima de abuso sexual incestuoso.
É preciso que cada profissional envolvido tenha clareza do seu papel
no processo complexo que envolve o abuso sexual infantil incestuoso,
Magalhães (2005, p.66) aponta que: “Os profissionais das equipes que atuam em
casos de violência sexual são peças importantes na fabricação dos discursos dos pais
das crianças vitimizadas, portanto, cada profissional deve ter clareza dos possíveis
efeitos de sua atuação.”.
É importantíssimo ressaltar que é necessário ter um acolhimento
integral à família, pois esta, a partir da revelação, surge aos profissionais da
equipe interdisciplinar com muitas dúvidas.
A Rede de Serviços aqui descrita constitui-se em uma atuação
articulada de vários profissionais de variados equipamentos sociais que tem o
objetivo de enfrentar qualquer tipo de violência contra a criança, neste caso a
sexual. Portanto, os que compõem esta importante rede devem ter em mente
certas concepções, por exemplo, de que é necessário negociar e discutir sobre
como o trabalho será conduzido, definir de maneira grupal os objetivos, saber
que o crédito deve ser de todos, pois, o mérito é de toda equipe, definir fluxos
39
em concordância com cada tipo de gravidade e necessidade do caso e abdicar
de créditos individuais.
A triagem do caso é realizada da seguinte maneira: consideram-se
os equipamentos de apoio qual a família está integrada, a data da
notificação/denúncia, a gravidade da notificação e a idade da vítima. Desta
forma, é importante ressaltar que o aspecto da idade da vítima é primordial,
pois quanto mais nova for a criança, mais riscos ela corre e no caso da
violência sexual intrafamiliar, os instrumentos de defesas são quase nulos
devido ao Complô do Silencio estabelecido em uma família incestogênica.
Junto à questão da idade da vítima, também é importantíssimo
considerar a gravidade da notificação/denúncia. (PEREIRA, 2009, p.23)
Destaca-se aqui que todo caso de violência sexual é grave, porém há de se
fazer uma priorização, pois, ao contrário, seria impossível atender com
qualidade. Considera-se aqui importante destacar o que vem a ser uma rede
de apoio a família, estas redes podem ser exemplificadas por serviços de apoio
familiar ou serviços de saúde, inúmeras vezes, estas redes de apoio são os
próprios notificantes.
Além disso, baseado nas análises de AZAMBUJA (2004), as
primeiras percepções do que as conseqüências do abuso sexual infantil
incestuoso poderiam acarretar vieram de diversas áreas do conhecimento.
Portanto, estudiosos de várias áreas apontam que devido à complexidade do
fenômeno, surge uma necessidade de uma intervenção interdisciplinar, equipe
esta formada por vários profissionais da área das Ciências Sociais e da Saúde.
Ressalta-se aqui que cinco princípios devem estar presentes em
uma equipe interdisciplinar/multidisciplinar, estes são: desapego, humildade,
respeito, coerência e espera.
É preciso que haja cada vez mais, mais
qualificação dos profissionais envolvidos com a temática, pois, os desafios são
grandes e é preciso que as respostas esperadas pela sociedade sejam dadas à
altura deles.
Dentre tantos fatores citados acima, é importante salientar que o
caráter da Terapia de Família merece ser destacado e será abordado a seguir.
40
3.3 A Importância da Terapia de Família em Face de uma
Família Incestuosa
Sabe-se que o abuso sexual é uma experiência traumatizante para
qualquer criança que tenha passado por esta situação, principalmente quando
a violência ocorre dentro do ambiente intrafamiliar. Para tratar casos como
esse, é importante que haja um acompanhamento terapêutico com a família.
Quando o incesto se torna atuante na vida de pais e filhos, revela-se
uma situação muito difícil de tratar, pois, há uma resistência muito grande entre
os profissionais que lidam com os abusos sexuais, inclusive entre os que estão
relacionados a proteção à infância e os profissionais de saúde mental.
Importante se faz buscar entender o que leva um pai a se tornar abusador de
sua própria prole, pode-se compreender a partir da observação do discurso do
pai sedutor que sempre se arrasta para uma negação completa da realidade,
alimenta-se de todas as justificativas possíveis, ele inclusive, acha que tem o
direito de iniciação da sexualidade de sua filha, o que leva a denegação do
sofrimento da criança. Desta maneira, indicam-se as considerações apontadas
por Sabourin in (GABEL, 1997, p. 165).
Primeira evidência, o incesto ativo entre pais e
filhos muito jovens nada tem a ver com o sonho ou o fantasma
incestuoso da criança nem com seu delírio incestuoso, com o
seu desejo ou pulsão, nem com qualquer literatura; mais
frequentemente, está ligado a maus-tratos parentais, a uma
carência afetiva materna e a intimidações sedutoras do adulto.
O incesto ativo ou atuante revela-se quando uma menina de
quatro anos ou um menino de seis anos decide em seu entendimento de
criança revelar o sofrimento sofrido, com frases como: “Ele mexeu na minha
pepeca de novo...”. Ou “Papai me machuca quando coloca o dedo no meu
bumbum...”.
41
Segundo Brenelli Vidotti et. al (2009, p. 47), “... nestas famílias as
relações são limitadas, rígidas e resistentes a mudanças.” Nestas famílias o que é
proibido não é o incesto em si, o que é proibido é revelar o segredo a outrem,
ou seja, “isto não deve sair da família”. Família esta em que comumente a mãe
sabe, tolera e protege o abusador de todas as acusações.
Nas indicações de Sabourin in (GABEL, 1997, p. 166), Ferenczi
precisa que: “O pior realmente é o desmetido, a afirmação de que nada aconteceu”.
A criança que revela de alguma maneira o abuso é desacreditada pela própria
mãe, ninguém na família pode acreditar nela, no presente, ela será insultada,
punida e rejeitada, no futuro, será expulsa ou afastada de sua própria casa.
As crianças abusadas em meio ao ambiente intrafamiliar são
violentadas duas vezes de maneiras distintas, ou seja, primeiro o pai que ela
amava e respeitava a estupra, depois a sua própria mãe que deveria protegê-la
não acredita nela.
Sabourin in (GABEL, 1997, p. 167) mostra que:
A guarda terapêutica assumida só será útil se o
contato entre esse pai e a criança for inicialmente interrompido.
É necessário que ela esteja protegida das pulsões parciais de
seu ambiente – sadismo intimidante do pai e cegueira materna.
Fica bem entendido que o que se designa como “pai” é aquele
que assume a autoridade paterna (pai biológico, legítimo ou
adotivo, padrasto, avô, tio, irmão mais velho, etc.). Cuidar da
criança sem protegê-la seria um contra-senso absoluto. Em
caso algum a perspectiva de uma terapia deve ser considerada
se
as
práticas
transgressoras
prosseguirem,
quer
a
sexualidade seja genital, anal ou oral, quer os maus-tratos
físicos estejam associados ou não. Em todos os casos, essa
criança está submetida a um campo pulsional exterior,
implicando um considerável transtorno em seu equilíbrio afetivo
e narcísico.
42
Não é considerada uma perspectiva satisfatória realizar uma
terapia individual com a criança abusada de início, ou seja, toda a família
merece uma atenção especial, esta sendo enxergada como uma única célula.
Daí observa-se que a perspectiva sistêmica é necessária para uma evolução
coerente.
Sabourin
aponta
três
protagonistas
incestuosa, que seriam: a criança, o pai e a mãe.
dessa
célula
familiar
Segundo Sabourin in
(GABEL, 1997), a primeira relaciona-se àquela que sofreu o abuso sexual
incestuoso, depois da puberdade, se ainda manter relações sexuais com o seu
pai, acontecendo de ficar grávida, gerará um fruto que será uma criança
incestuosa. O pai, devido as suas pulsões violentas e sádicas, pode ser
considerado em grande parte do tempo, devido às relações sexuais confusas
existentes entre um adulto e uma criança, um pedófilo ou um pai incestuoso. Já
a mãe, normalmente omissa ao abuso sexual incestuoso que acontece em sua
casa, terá a designação de incestigadora, há de se ressaltar aqui que em
alguns casos, a mãe pode imediatamente defender os seus filhos, denunciando
o agressor e se separando deste.
Ressalta-se aqui mais uma vez a importância da intervenção de
uma equipe interdisciplinar e multidisciplinar, pois, para que se aconteça uma
terapia, antes de tudo, a criança deve ser protegida, ou seja, antes da iniciação
de um processo terapêutico, o Conselho Tutelar deve ser acionado, devem
acontecer tais intervenções: a policial, a social e a jurídica. Ou seja, não cabe
aos profissionais de saúde mental fazer o papel da polícia e do juiz. Para que
haja uma intervenção satisfatória, o papel de cada profissional envolvido deve
ficar claro. Antes de tudo, a criança deve ser protegida.
Por todos estes fatos supracitados, é que se deixa claro que é
mais satisfatória a realização de uma terapia familiar e não individual, porém,
ressalta-se aqui que nem sempre na terapia familiar todas as pessoas da
família devem estar presentes nas sessões, no caso do incesto, é muito
importante a cadeira vazia do pai abusador, enfocando mais na relação entre a
mãe e a criança. SABOURIN in (GABEL, 1997).
43
Nos
casos
de
abuso
sexual
incestuoso,
não
se
exclui
completamente a terapia individual, ela é muito importante, principalmente, nas
sessões desenvolvidas com o pai “sedutor”.
De acordo com Sabourin in (GABEL, 1997, ibid), “nesse tipo de
família, a lei da linguagem, supostamente universal, é encoberta, graças à intimidação
e à ditadura intrafamiliar, pela lei do silêncio reforçada por todas as ameaças...”.
Aqui vemos uma criança prisioneira em seu próprio lar. Quando a
criança é violentada, se constitui em estupro, independentemente se houve
penetração anal, vaginal ou oral (Lei 12.015 de agosto de 2009), portanto,
constitui-se em crime. Sabemos que o advogado de defesa, tentará
desacreditar a criança de todas as maneiras possíveis. O juiz, de acordo com
sua formação, terá dificuldade em acreditar na criança, principalmente se esta
estiver sem apoio advocatício, destaca-se aqui, desta maneira, a noção dos
direitos da criança face aos direitos do adulto. Ou seja, para proteção efetiva da
criança, é necessário que neste momento, esta possua um advogado em sua
defesa e esteja, ao mesmo, tempo sendo assistida e acolhida por uma
assistência educativa e pela família ampliada.
Sabourin in (GABEL, 1997, p. 172) busca, ainda, mostrar a
contribuição do esclarecimento dos laços familiares nas três gerações. Em sua
análise, ele esclarece que:
[...] permitirá uma transformação da mãe em
relação à lei, à medida que será possível, fazer-lhe a seguinte
sugestão paradoxal: continuar a se submeter à lei, mas
mudando de legislador, e passar da lei tirânica de seu marido,
totalitário e ditador, à lei republicana e democrática, - que se
impõe a ela e a nós – com relação ao que é autorizado ou
proibido. É aí que a mãe será levada a fazer todo um trabalho
em sua memória, em sua própria infância de criança maltratada
e não raro vítima, também ela, de abuso sexual... onde
elaboração e tomada de consciência de suas coações infantis
vão substituir as repetições mortíferas.
44
Nesta hora que a terapia familiar irá proporcionar uma mudança
de conceitos na família incestuosa, ou seja, a criança que antes era
considerada depravada, mentirosa, acusada de desestruturar o equilíbrio da
família, de arruinar a educação de seus irmãos e mandar o seu pai para a
prisão, passa a ser considerada, através da terapia familiar, uma vítima.
Ela não é mais prisioneira de seu pai agressor, mas agora ela faz
parte de uma rede de proteção ocupada por diversos segmentos profissionais
(os terapeutas, o advogado, os assistentes sociais, entre outros) que tem o
mesmo objetivo, ou seja, garantir a proteção e saúde psicossocial desta
criança. Desta maneira, a criança se descobre como pessoa humana e sujeito
de direitos porque acreditaram nela. Sendo assim, torna-se comum, bem como
analisa Sabourin in (GABEL, 1997) “ouvir as crianças contarem espontaneamente
que a primeira pessoa que teve o efeito salutar sobre o seu infortúnio foi o policial a
quem elas puderam falar (...) sem duvidar de suas palavras”.
Finalizamos este tópico, trazendo a relevância de que a terapia de
família é uma das melhores maneiras de se abordar uma família incestuosa.
Assim, as equipes interdisciplinares, junto à rede de proteção
integral a criança, permitem uma garantia de seus direitos, ressaltando um
acompanhamento terapêutico que é essencial para a superação da criança e
sua família face ao incesto.
45
CONCLUSÃO
Esta pesquisa sobre a realidade do fenômeno do abuso sexual
infantil incestuoso tornou possível um amadurecimento e crescimento
profissional enquanto Assistente Social e futura especialista em Terapia de
Família. Acredita-se que os profissionais das equipes interdisciplinares
precisam estar engajados em promover ações articuladas para que possam
intervir efetivamente na questão de viabilizar os direitos e garanti-los a
população infantil abusada sexualmente, bem como a sua família.
A aproximação ainda maior com a realidade vivenciada por equipes
interdisciplinares que trabalham no enfrentamento da violência sexual infantil
incestuosa, foi possível através do estudo do artigo publicado por esses
profissionais. Desta forma, no decorrer deste trabalho, procurou-se observar,
estudar e analisar a experiência realizada por equipes interdisciplinares que
atuam com essa problemática. Assim, pode-se reconhecer a importância do
trabalho junto às ações articuladas com as Redes de Serviço e a importância
do Sigilo Profissional.
Entende-se que para dominar e trabalhar a problemática referente
ao abuso sexual infantil incestuoso é preciso que haja uma qualificação
profissional com reconhecida competência dos profissionais proponentes. A
abordagem é desafiadora, fatos este que muitos profissionais não se sentem à
vontade para lidar com a temática e por isso, acabam não produzindo um
trabalho efetivo junto à criança vitimizada e a família incestogênica.
Desta forma, considera-se importante o questionamento sobre a
atuação dos referidos profissionais no que tange a demanda de casos de
abuso sexual infantil incestuoso. Se muitos profissionais não se sentem à
vontade para lidar com esses casos, de que maneira irão fornecer um trabalho
de melhoria dos serviços prestados?
É válido ressaltar ainda a escassez dos estudos referentes à relação
entre a Terapia de Família e o enfrentamento da Violência Sexual Infantil
Incestuosa. Considera-se, portanto, que este estudo pretende ser um
46
desencadeador para um futuro aprofundamento e discussões sobre esta
questão.
47
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ABRAPIA. Abuso Sexual: Mitos e Realidade, 2002.
ANDI; INSTITUTO WCF – BRASIL; UNICEF. O Grito dos Inocentes: os meios
de comunicação e a violência sexual contra crianças e adolescentes. São
Paulo: Cortez, 2003.
AZAMBUJA, Maria Regina Fay de. Violência Sexual Intrafamiliar: é possível
proteger a criança? Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2004.
BRASIL. Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, 2009.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de
outubro de 1988. 27 ed., atual. e ampl. Coleção Saraiva de legislação. São
Paulo: Saraiva, 2001.
BRASIL. Guia de Orientação do Centro de Referência Especializado de
Assistência Social.
BRASIL. Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil,
2002.
BRASIL. Sistema Único de Assistência Social, 2005.
CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL, 7ª R. Código de Ética
Profissional. In Coletânea de Leis e Resoluções: Assistente Social: ética e
direitos. 4 ed. Rio de Janeiro, 2005.
CORDEIRO, Flávia de Araújo. Aprendendo a Prevenir: orientações para o
combate ao abuso sexual contra Crianças e Adolescentes – Brasília:
Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude, 2006.
GABEL, Marceline (Org.). Crianças vítimas de abuso sexual. 2.ed. São Paulo:
Summus, 1997.
MAGALHÃES, Ana Paula. Abuso Sexual Incestuoso: um tema centrado na
criança e na família. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2005.
SANDERSON, Christiane. Abuso Sexual em Crianças: fortalecendo pais e
professores para proteger crianças de abusos sexuais. São Paulo: M. Books,
2005.
48
SILVA, Helena Oliveira; SILVA, Jailson de Souza. Análise da Violência Contra
a Criança e o Adolescente segundo o Ciclo de Vida no Brasil. São Paulo:
Global, 2005.
UNICEF. Abuso Sexual Doméstico: atendimento às vítimas e responsabilização
do agressor. 3.ed. São Paulo, 2009.
WEBGRAFIA CONSULTADA
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei Federal n. 8069 de
13/07/1990.
Disponível
em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm> Acesso em 05 de maio
de 2011.
BRASIL. Lei Orgânica da Assistência Social: Lei Federal n. 9742 de
07/12/1993.
Disponível
em
<
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8742.htm> Acesso em 05 de maio de
2011.
BRASIL, Lei de Regulamentação da Profissão: Lei n.8.662 de 07/06/1993.
Disponível
em
<http://www.cfess.org.br/arquivos/legislacao_lei_8662.pdf>
Acesso em 05 de maio de 2011.
Declaração Universal dos Direitos Humanos: promulgada em 10 de Dezembro
de 1948. Disponível em
<
http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>
Acesso em 25 de junho de 2011.
DROPA, Romualdo. Direitos Humanos no Brasil. Disponível em
<http://www.advogado.adv.br/artigos/2003/romualdoflaviodropa/direitoshumano
sbrasil.htm#_Toc7158423> Acesso em 28 de junho de 2011.
HERKENHOFF, João. História dos Direitos Humanos no Mundo. Disponível em
<
http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/herkenhoff/livro1/dhmundo/index.html
> Acesso em 28 de junho de 2011.
LORENZI, Gisella. Uma Breve História dos Direitos da Criança e do
Adolescente no Brasil. Disponível em
<
http://www.promenino.org.br/Ferramentas/Conteudo/tabid/77/ConteudoId/70d9f
a8f-1d6c-4d8d-bb69-37d17278024b/Default.aspx> Acesso em 05 de julho de
2011.
49
OLIVEIRA, Reynaldo. A Síndrome. Disponível em
<http://www.munchausen.com.br/asindrome.html> . Acesso em 05 de julho de
2011.
PRADO, Anna. Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes: uma
responsabilidade de todos. Disponível em < http://jusvi.com/artigos/28034>
Acesso em 11 de julho de 2011.
TELLES, Tiago. A Importância da Ação Técnico-Administrativas dos
Conselheiros
Tutelares.
Disponível
em
<http://www.ead.fea.usp.br/semead/7semead/paginas/artigos%20recebidos/Ad
m%20Geral/ADM60__A_import%E2ncia_da_a%E7%E3o_tecnico_administ.PDF> Acesso em 11 de
julho de 2011.
VELASQUEZ, Miguel. Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes.
Disponível em < http://www.mp.rs.gov.br/infancia/doutrina/id455.htm> . Acesso
em 11 de julho de 2011.
WIKIPÉDIA. Declaração Universal dos Direitos da Criança. Disponível em
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Declara%C3%A7%C3%A3o_Universal_dos_Direito
s_da_Crian%C3%A7a> Acesso em 11 de julho de 2011.
WIKIPÉDIA. Exibicionismo. Disponível em
< http://pt.wikipedia.org/wiki/Exibicionismo> Acesso em 11 de julho de 2011.
WIKIPÉDIA.
Voyeurismo.
Disponível
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Voyeurismo> Acesso em 11 de julho de 2011.
em
50
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO .................................................................................................... 2
AGRADECIMENTOS .................................................................................................. 3
DEDICATÓRIA............................................................................................................ 4
RESUMO .................................................................................................................... 5
METODOLOGIA ......................................................................................................... 6
SUMÁRIO ................................................................................................................... 7
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 8
CAPÍTULO I - ABUSO SEXUAL INFANTIL.............................................................. 10
1. 1 HISTÓRIA DO ABUSO SEXUAL INFANTIL. ..................................................... 11
CAPÍTULO II - CONCEITUANDO VIOLÊNCIA INFANTIL. ...................................... 21
2. 1 SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ENTRE ABUSO SEXUAL E
EXPLORAÇÃO SEXUAL .......................................................................................... 25
2. 2 OS MITOS E A REALIDADE DO ABUSO SEXUAL INFANTIL .......................... 26
CAPÍTULO III - O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL JUNTO A EQUIPE
INTERDISCIPLINAR NO ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES
RELACIONADAS AO ABUSO E VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL
INTRAFAMILIAR ....................................................................................................... 33
3. 1 PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL .......................................................................... 33
3. 2 INTERDISCIPLINARIEDADE............................................................................. 37
3. 3 A IMPORTÂNCIA DA TERAPIA DE FAMÍLIA EM FACE DE UMA FAMÍLIA
INCESTUOSA ........................................................................................................... 40
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 44
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ..................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.7
ÍNDICE .................................................................................................................................... 50
51
Download

universidade candido mendes pós-graduação “lato sensu” avm