EDIÇÃO INFORMATIVA DO SEST/SENAT CNT ANO XI NÚMERO 126 T R A N S P O R T E AT UA L TAXISTAS NA PONTE DA AMIZADE CONFLITO NA FRONTEIRA LEIA ENTREVISTA COM PRESIDENTE DA SP TURISMO CAIO CARVALHO CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 3 “É possível dar incrementos maiores, desde que se estabeleça uma política cambial positiva sob a ótica dos exportadores” EDITORIAL CLÉSIO ANDRADE Comércio internacional: fator de crescimento É surpreendente o crescimento das exportações brasileiras nos últimos anos. Este desempenho derivado não só do aumento da quantidade de produtos exportados, como também da ampliação da base de países importadores de produtos brasileiros, garantindo, além da geração de divisas, o equilíbrio de nossa balança comercial e a efetiva inserção do país no mercado internacional. Estes resultados são provenientes de uma sistemática política de abertura e de consolidação de mercados no exterior, de uma gestão severa da política cambial, do aumento da qualidade dos produtos brasileiros, da determinação do empresariado nacional em lançar-se em busca de novos consumidores, e da colocação de novos produtos no mercado internacional. Um dos exemplos mais marcantes é a exportação da moda brasileira, produto que até então sequer era incluído em nossa pauta de exportação. O sucesso das exportações tem permitido que o país honre seus compromissos no exterior, realize, com regularidade, o pagamento da dívida externa, mantenha em equilíbrio as reservas cambiais e reduza os picos de instabilidade comercial, proporcionando a prospecção do empresário nacional no mercado internacional com melhora considerável da imagem do país perante os investidores internacionais. Mantendo-se neste caminho o país terá resultados crescentes e promissores, de modo que o resto do mundo perceba o Brasil como um lugar de grandes oportunidades, com enorme mercado consumidor, detentor de uma política econômica estável, gastos internos sob controle, relações comerciais internacionais crescentes. O Brasil será visto, então, como um país que detém reservas cambiais que suportam eventuais crises no mercado mundial, que possui taxas crescentes de crescimento econômico, políticas internacional e comercial estáveis e com regras claras e bem definidas. No entanto, é sempre possível dar incrementos maiores, desde que se estabeleça uma política cambial positiva sob a ótica dos exportadores. Para tanto, é preciso intensificar o controle de custos administrativos das operações cambiais, oferecer mais facilidades aos exportadores, implantar mais portos secos alfandegados no interior do país, e incentivar operações logísticas e de transporte, através da intensificação do uso da multimodalidade. Certamente seremos a nação do futuro se obtivermos a credibilidade dos capitais transnacionais, com mão-de-obra bem preparada tecnicamente, gerando mais empregos e renda para a população brasileira. Claro que muito mais poderá ser realizado para que o país seja a potência do futuro. Mas mais importante será não perder de vista a perspectiva de crescimento auto-sustentado, com valorização do meio ambiente, aumento do PIB e, conseqüentemente, melhoria da qualidade de vida de nossa gente. Afinal, somos a nação da esperança. CNT CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO TRANSPORTE PRESIDENTE DA CNT Clésio Andrade PRESIDENTE DE HONRA DA CNT Thiers Fattori Costa VICE-PRESIDENTES DA CNT Jésu Ignácio de Araújo Jorge Marques Trilha Oswaldo Dias de Castro Romeu Natal Pazan Romeu Nerci Luft Tânia Drumond Augusto Dalçóquio Neto Valmor Weiss Paulo Vicente Caleffi José Hélio Fernandes TRANSPORTE DE CARGAS Newton Jerônimo Gibson Duarte Rodrigues TRANSPORTE AQUAVIÁRIO, FERROVIÁRIO E AÉREO Meton Soares Júnior TRANSPORTE DE PASSAGEIROS Benedicto Dario Ferraz TRANSPORTADORES AUTÔNOMOS, DE PESSOAS E DE BENS José Fioravanti PRESIDENTES DE SEÇÃO E VICE-PRESIDENTES DE SEÇÃO TRANSPORTE DE PASSAGEIROS Otávio Vieira da Cunha Filho Ilso Pedro Menta TRANSPORTE DE CARGAS Flávio Benatti Antônio Pereira de Siqueira TRANSPORTADORES AUTÔNOMOS, DE PESSOAS E DE BENS José da Fonseca Lopes Mariano Costa TRANSPORTE AQUAVIÁRIO Glen Gordon Findlay Claudio Roberto Fernandes Decourt TRANSPORTE FERROVIÁRIO Bernardo José Gonçalves de Figueiredo Clóvis Muniz TRANSPORTE AÉREO Wolner José Pereira de Aguiar (vice no exercício da presidência) CONSELHO FISCAL (TITULARES) Waldemar Araújo David Lopes de Oliveira Luiz Maldonado Marthos Éder Dal’lago CONSELHO FISCAL (SUPLENTES) René Adão Alves Pinto Getúlio Vargas de Moura Braatz Robert Cyrill Higgins DIRETORIA TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS Denisar de Almeida Arneiro Eduardo Ferreira Rebuzzi Francisco Pelúcio Irani Bertolini TRANSPORTE DE PASSAGEIROS Luiz Wagner Chieppe Alfredo José Bezerra Leite Narciso Gonçalves dos Santos José Augusto Pinheiro Marcus Vinícius Gravina Oscar Conte Tarcísio Schettino Ribeiro Marco Antônio Gulin Eudo Laranjeiras Costa Antônio Carlos Melgaço Knitell Abrão Abdo Izacc João de Campos Palma Francisco Saldanha Bezerra Jerson Antonio Picoli TRANSPORTADORES AUTÔNOMOS, DE PESSOAS E DE BENS Edgar Ferreira de Sousa José Alexandrino Ferreira Neto José Percides Rodrigues Luiz Maldonado Marthos Sandoval Geraldino dos Santos José Veronez Waldemar Stimamilio André Luiz Costa Armando Brocco Heraldo Gomes Andrade Claudinei Natal Pelegrini Getúlio Vargas de Moura Braatz Celso Fernandes Neto Neirman Moreira da Silva TRANSPORTE AQUAVIÁRIO, FERROVIÁRIO E AÉREO Glen Gordon Findlay Luiz Rebelo Neto Moacyr Bonelli Alcy Hagge Cavalcante Carlos Affonso Cerveira Marcelino José Lobato Nascimento Maurício Möckel Paschoal Milton Ferreira Tito Silvio Vasco Campos Jorge Cláudio Martins Marote Jorge Leônidas Melo Pinho Ronaldo Mattos de Oliveira Lima Bruno Bastos Lima Rocha CONSELHO EDITORIAL Almerindo Camilo Aristides França Neto Bernardino Rios Pim Etevaldo Dias Hélcio Zolini Jorge Canela Maria Tereza Pantoja FALE COM A REDAÇÃO (31) 3291-1288 • [email protected] Rua Martim de Carvalho, 661 • Santo Agostinho CEP 30190-090 • Belo Horizonte (MG) ASSINATURAS 0800-782891 ATUALIZAÇÃO DE ENDEREÇO [email protected] REDAÇÃO AC&S Mídia REPRESENTANTES PUBLICIDADE Remar (11) 3086-3828 EDITOR RESPONSÁVEL Celso Marino (11) 9141-2938 Fabio Dantas (11) 9222-9247 Almerindo Camilo [[email protected]] EDITOR-EXECUTIVO Antonio Seara [[email protected]] Publicação do Sest/Senat, registrada no Cartório do 1º Ofício de Registro Civil das Pessoas Jurídicas do Distrito Federal sob o número 053. Editada sob responsabilidade da AC&S Assessoria em Comunicação e Serviços Ltda. Tiragem 40 mil exemplares Os conceitos emitidos nos artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da CNT Transporte Atual SEGURANÇA RODOVIA INTELIGENTE Empresas investem em equipamentos para proteção contra assaltos Trechos concessionados no país utilizam tecnologia de última geração PÁGINA 40 PERIGO NO AR Empresas aéreas sofrem prejuízos com a presença de aves em lixões nas proximidades dos aeroportos PÁGINA 52 PÁGINA 58 CNT TRANSPORTE ATUAL ANO XI | NÚMERO 126 ENTREVISTA MEMÓRIA FERROVIÁRIA Projeto busca catalogar 500 locomotivas espalhadas pelo Brasil e transformar pesquisa em livro para consulta de historiadores e estudantes REPORTAGEM DE CAPA Taxistas brasileiros que trabalham na fronteira com o Paraguai questionam lei que os responsabiliza pelo transporte de passageiros com mercadoria irregular PÁGINA 24 E MAIS Editorial Cartas Alexandre Garcia Debate Mais Transporte Água de lastro Gestão de cargas Sest/Senat Idet Humor CAPA INTERVENÇÃO DE RICARDO SÁ SOBRE FOTOS DE ADRIANA CARDOSO 3 6 11 12 14 46 56 62 64 66 Caio Carvalho fala sobre o potencial turístico brasileiro e os desafios para o setor PÁGINA 8 MERCOSUL PÁGINA 18 Subgrupo de Transportes quer acabar com entraves comeciais e operacionais ao setor transportador PÁGINA 32 6 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 Escreva para CNT TRANSPORTE ATUAL As cartas devem conter nome completo, endereço e telefone dos remetentes DOS LEITORES [email protected] MAGAZINE LUIZA Objetiva, prática e oportuna a entrevista com Luiza Helena Trajano, publicada na edição 125 desta Revista CNT - Transporte Atual. O "case" Magazine Luiza, já internacional, continua despertando interesse. A meu juízo, o sucesso de Luiza Helena e sua empresa – ciências administrativas à parte –, baseia-se unicamente na simplicidade e humildade desta senhora. Observem atentamente o olhar (expressão) de Dona Luiza na foto estampada na revista... e pronto!! “O SUCESSO DE LUIZA HELENA E SUA EMPRESA BASEIA-SE UNICAMENTE NA SIMPLICIDADE E HUMILDADE DESTA SENHORA” Idacy Nascimento São Paulo-SP governo federal, no sentido de recuperar parte da malha viária do país, alcance essa sofrida parcela da população que mora e trabalha no Norte. Certos de que a reportagem em muito contribuirá para isso, somos gratos. ESTRADAS AMAZÔNICAS A reportagem “Em Estado Terminal”, do jornalista Wagner Seixas, publicada na edição 125 desta Revista CNT - Transporte Atual, retrata muito bem a situação de calamidade em que se encontram as estradas da Amazônia, em especial as BRs 163 e 319. Nós, que dependemos destas rodovias para o desenvolvimento de nossas empresas e da nossa gente, ficamos realmente agradecidos por uma publicação séria como essa abrir espaço tão generoso para retratar as dificuldades que enfrentamos. Esperamos que as recentes medidas tomadas pelo absoluta realidade o que é a estrada, com certeza uma das piores do país. O desabafo de quem precisa desta estrada para sobreviver é algo emocionante, já que, nas vezes em que lá passei, tive vontade de largar o frete. Mas a esperança é a última que morre. Por isso, espero mesmo que alguém venha ainda fazer alguma coisa pelo sofrido povo do Norte, já que somos trabalhadores e pagadores de impostos como qualquer outra parcela da população. Ananias Oliveira Manaus (AM) Ademar Francisco da Silva Santarém (PA) ESTRADAS AMAZÔNICAS 2 Na nossa vida de caminhoneiro, aprendemos a conviver com as precárias estradas de nosso país, o que não quer dizer que tenhamos que aceitar isso sem reclamar. Como já passei pela BR-163 por três vezes, posso testemunhar: a matéria veiculada trata com FAIXA DE SEGURANÇA Quero primeiramente parabenizar esta revista pelas reportagens publicadas, bem como cumprimentar em especial o jornalista Alexandre Garcia, pois acompanho todos os seus artigos. Mas escrevo para sugerir uma matéria que diga respeito à observação (ou a falta dela) dos motoristas em relação às faixas de segurança de pedestres, principalmente as desprovidas de faróis. Acredito que pelo menos no quesito educação em geral poderíamos “copiar” alguma coisa do Primeiro Mundo. Lembro que, no caso do cinto de segurança, foram desenvolvidas grandes campanhas e até multas quando o seu uso não era observado. Orides Sanches São Paulo (SP) Resposta do Editor: A sugestão será levada para apreciação do Conselho Editorial desta publicação. AGRADECIMENTOS A Revista CNT - Transporte Atual agradece as mensagens enviadas com cumprimentos por nosso trabalho: Andréa Maria Lidington Lins – Biblioteca Central da Universidade Católica de Pernambuco (Recife, PE); Aurélio Nomura – Vereador (São Paulo, SP); Ivone Brigatti – Sistema de Bibliotecas eInformação (Campinas, SP); José Delgado - Ministro do Superior Tribunal de Justiça (Brasília, DF); José Megale - Deputado estadual (PA); Universidade Estadual Vale do Acaraú (CE); Vereadora Bispa Lenice Lemos (São Paulo, SP); e Mauro Benevides - Deputado federal (CE). CARTAS PARA ESTA SEÇÃO Rua Martim de Carvalho, 661 30190-090 - Belo Horizonte (MG) Fax (31) 3291-1288 E-mail: [email protected] Por motivo de espaço, as mensagens serão selecionadas e poderão sofrer cortes 8 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 “ESTIMA-SE QUE A CAPITAL PAULISTA MOVIMENTE COM O TURISMO EM GE QUE GERAM MAIS DE 500 MIL EMPREGOS DIRETOS. SOMENTE AS FEIRAS M ENTREVISTA CAIO LUIZ DE CARVALHO “FALTA VALORIZAR TURI POR serviços e equipamentos turísticos no país estão melhorando desde 1992, fruto da profissionalização e da adoção de estratégias de comercialização e divulgação realizadas pelos agentes públicos e privados. Mas ainda falta muito para que possamos nos incluir entre os mais profissionais destinos. A opinião é de Caio Luiz de Carvalho, que preside a São Paulo Turismo, órgão da prefeitura que administra o maior centro de eventos da América Latina, o Parque Anhembi, e cuja cidade fica com cerca de 36% do total de recursos que essa atividade gera no país. Advogado, com dedicação ao desenvolvimento do turismo nacional desde 1983, esteve à frente da Embratur e do Ministério do Turismo entre 1994 e 2002. Nessa entrevista, ele aponta caminhos para o segmento no Brasil, fala sobre o crescimento do Nordeste como O AMERICO VENTURA pólo atrativo de estrangeiros e garante que o terrorismo é hoje o maior inibidor da atividade. CNT Transporte Atual - A violência e os escândalos políticos têm maculado a imagem do Brasil e prejudicado a vinda de turistas ao país? Caio Luiz de Carvalho Não se pode dizer que esses itens colaboram para o nosso desenvolvimento turístico... Mas há muitos outros fatores que se somam para que o Brasil esteja ainda aquém de sua capacidade nesse setor, entre eles, por exemplo, a inobservância de algumas verdades sobre as quais não cabem controvérsias. Uma delas é a necessidade de estudar fluxos. Outra, de valorizar o turista local e intra-regional - especificamente do Brasil e da América do Sul. Segundo a Organização Mundial do Turismo, 76% das viagens em 2020 serão de curta distância. E o Brasil, em função de suas características continentais e localização, não se beneficia diretamente dos principais destinos emissores do mundo. Isso não é novidade, embora muitos insistam em desconsiderar esse panorama ao pensar a evolução do destino. Porém, hoje, o que realmente impacta um destino internacional quando se pensa na violência é o terrorismo. E nesse quesito o Brasil acaba sendo favorecido. Mas é preciso deixar claro que, nesse campo, competimos com outros destinos que, além de não serem associados ao terrorismo, já fizeram a lição de casa há tempos, como o Caribe, por exemplo. Não basta a um destino ser bonito por natureza e ter uma população naturalmente com vocação para bem receber. Se isso fosse suficiente para um país ser objeto maior do desejo da indústria mundial do turismo, o Brasil seria, há décadas, o destino mais procurado do mundo. O Rio ainda é o destino preferido dos estrangeiros? O Rio de Janeiro é uma cidade belíssima e a principal referência do Brasil no exterior. Peça a um estrangeiro para falar do Brasil e, certamente, algo da capital fluminense será citado. Isso mostra a força do destino, apesar de não ter recebido os investimentos que merece para o seu desenvolvimento turístico. No entanto, é preciso considerar que outros destinos brasileiros vêm trabalhando muito bem, não somente seus atrativos, como sua capacitação. Isso implica na diminuição, a cada ano, da fatia que o Rio representa no total de visitas estrangeiras no país. A Cidade Maravilhosa já foi destino de 70% dos turistas internacio- CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 9 SP TURISMO/DIVULGAÇÃO ERAL CERCA DE R$ 8 BILHÕES, MOBILIZAM R$ 2,4 BILHÕES” STA LOCAL” nais que vinham ao Brasil. Hoje, tem pouco mais de 35% de market-share. Também acho importante ressaltar que, a meu ver, a questão da violência prejudica mais o fluxo de turistas nacionais, mais impactados pelas notícias sobre violência, do que o de estrangeiros, que hoje sabe que a violência, infelizmente, está no mundo. Mas a cidade precisa estar sempre atenta e mudar percepções. Hoje, o turismo relaciona-se, cada vez mais, de maneira extremamente íntima, com a experiência emocional, com a materialização de sonhos e promessas de transformações que possam melhorar a chamada FIB, a Felicidade Interior Bruta do cliente. Isso implica na oferta de produtos não comoditizados, que fujam da tradicional receita de “sol e praia” ou “serviços de qualidade” sem que diferenciais sejam agregados. Os aeroportos, hotéis e pessoal especializado estão preparados para receber o turista estrangeiro? Os serviços e equipamentos turísticos no país estão melhorando sensivelmente, conseqüência da profissionalização do produto turístico brasileiro a partir de estratégias de comercialização e de divulgação de seus grandes destinos, realizadas pelos agentes públicos e privados da cadeia produtiva do setor e implementadas, de forma efetiva, desde 1992. Mas ainda falta muito para que possamos nos incluir entre os mais profissionais destinos do planeta. A sinalização turística, por exemplo, ainda não é uma realidade efetiva, mesmo nos grandes centros turísticos do país. Para se ter uma idéia de como a situação é grave, somente em meados de 2005 as Centrais de Atendimento ao Turista (CIT) de São Paulo tiveram seus funcionários avaliados, treinados e as estruturas físicas moderniza- das e padronizadas. Até então, somente 20% do quadro de atendentes de nossas 11 CITs falavam outro idioma além do português. O próximo passo nessa linha de capacitação e investimento em públicos que se inter-relacionam diretamente com o turista, é um programa dirigido aos taxistas que ganharão, em breve, um CD de boas-vindas para que, ao receber o turista nos táxis ele possa oferecer, no idioma do passageiro, informações sobre a cidade. Outro ponto que vem sendo trabalhado é a qualidade do serviço receptivo da cidade. Afinal, uma cidade com uma cultura eminentemente exportadora de turistas, precisa ter, no receptivo, a mesma qualidade (ou ainda melhor) que há no exportativo. O Nordeste tem sido o alvo principal dos vôos fretados da Europa. Como analisa o fato e de que forma isso pode contribuir para melhorar a situação social na região? Já está contribuindo. Quando estive à frente da Embratur e do Ministério do Turismo, entre 1994 e 2002, uma de nossas grandes bandeiras foi, justamente, o desenvolvimento do turismo no Nordeste, como forma de aplacar as mazelas sociais distribuindo renda e gerando oportunidades para inclusão social. Programas como o Prodetur, o Instituto de Hospitalidade (que surgiu em função da demanda de produtos como a Costa do Sauípe), os investi- 10 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 “O turismo tem contribuído para a melhoria da qualidade de vida e como estímulo à permanência do povo no Nordeste” ENTREVISTA mentos aeroportuários - foram nove aeroportos nesse período -, o estímulo à chegada de grandes redes hoteleiras e aos investimentos de renomados grupos internacionais, entre outros, são bons exemplos. E os resultados efetivos podem ser vistos em locais como a Bahia, Ceará ou Rio Grande do Norte. Certamente, o turismo - e suas oportunidades - tem contribuído para a melhoria da qualidade de vida e para o próprio estímulo à permanência da população na região, diminuindo, por exemplo, os índices do êxodo urbano e rural. Quais as dificuldades para o crescimento do turismo interno? O que falta para o brasileiro poder viajar mais pelo país? Uma cidade só será prazerosamente consumível para o turista brasileiro e estrangeiro à medida que as suas múltiplas virtudes forem percebidas como qualidades para os seus cidadãos. Análises consistentes das cidades que ascenderam à condição de globais - à medida que dispõem, entre outros objetos de comercialização, de eficiente sistema de transporte público, escolas de qualidade, hospitais e postos de saúde suficientes para atender toda a população, áreas de lazer, saneamento básico, baixos índices de violência, sistema de transporte integrado de qualidade e ampla oferta de museus, teatros e cinema - ainda não foram, de fato, devidamente consideradas pela cadeia produtiva da indústria brasileira do turismo. As estradas ruins são empecilho para o desenvolvimento do turismo no Brasil? Certamente. Um bom exemplo pode ser visto ao comparar roteiros de ônibus e roteiros de avião entre os mesmos destinos e origens. As viagens por terra, muitas vezes, têm preços muito próximos aos dos pacotes aéreos, sem a contrapartida da agilidade e comodidade representadas pelo avião. Isso faz com que, com algumas exceções, as viagens de ônibus não sejam tão procuradas e não possam se tornar um estímulo ao desenvolvimento do turismo interno no país, favorecida ainda pelos preços mais em conta. E esse custo alto tem tudo a ver com as condições das estradas. Fatores como segurança e manutenção dos veículos ganham adicionais sensíveis na composição de preços dos roteiros turísticos em função das condições das estradas brasileiras. O senhor administra o maior centro de eventos da América Latina. Quais são os maiores desafios na SP Turismo? O Parque Anhembi é apenas um dos braços da São Paulo Turismo que, além de ser o órgão oficial de eventos e turismo da cidade de São Paulo, administra o Autódromo de Interlagos. Nosso grande desafio é fazer de São Paulo o maior destino de entretenimento da América Latina. Tornar a capital não somente um produto turístico conhecido, mas desejado e consumido pelo viajante brasileiro e estrangeiro. Não somente a negócios, mas também a lazer ou para nichos específicos, seja para cuidar da saúde, fazer um curso etc. São Paulo concentra o turismo de negócios do país. O que isso representa em recursos e empregos? São Paulo sedia nada menos que 75% das feiras de negócios no Brasil, que recebem 4 milhões de visitantes, sendo 45 mil estrangeiros, somente para o segmento de feiras. Com isso, R$ 2,4 bilhões são movimentados por ano por esse setor, que gera 120 mil postos de trabalho anualmente na cidade com a realização de feiras. Estima-se que a capital movimente com o turismo em geral cerca de R$ 8 bilhões, que geram mais de 500 mil empregos diretos. Há uma especialização no setor com programas para públicos diferenciados ou ainda é um segmento incipiente? Sem dúvida. A especialização e a segmentação têm tudo a ver com a busca por uma experiência “única” do viajante. E isso é estimulado, sensivelmente, por fatores que já abordei aqui, entre eles o fato de que o turismo relaciona-se íntima e diretamente com a experiência emocional, com a realização de sonhos e de transformações que possam melhorar a vida do cliente, através de vivências e histórias memoráveis. Como incrementar o turismo na baixa temporada? Eu não tenho dúvidas de que, em São Paulo e em muitos destinos brasileiros, o caminho são os grandes eventos. A capital paulista, por exemplo, tem eventos que são referências mundiais. Entre eles, a Parada do Orgulho GLBT, considerada a maior do mundo; as duas edições do São Paulo Fashion Week; o GP Brasil de Fórmula 1; a Virada Cultural - 24 Horas de Cultura; entre outros. Se conseguíssemos consolidar mais 15 grandes eventos, mudaríamos a história do turismo em São Paulo. No Carnaval deste ano, por exemplo, acontece um fato especial para a cidade. Na semana anterior e posterior à maior festa brasileira, a capital paulista sediava, além de um dos grandes Carnavais do país, show da banda irlandesa U2, o Congresso Mundial de Oftalmologia e a maior Bienal do Livro do Brasil. Uma oportunidade e tanto para os turistas. E para a cidade. t CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 “A impressão que se tem é que o Brasil a cada ano precisa ser reconstruído, como se não existíssemos há 500 anos” 0PINIÃO ALEXANDRE GARCIA Como Platão ensinou B rasília (Alô) - Os partidos estão semeando seus candidatos; logo será a época da colheita, nas convenções. Depois, a da nossa escolha, nas eleições. Difíceis escolhas, neste ano tão especial, em que nenhum dos partidos importantes é virgem de poder. Todos já foram testados e já têm mais experiência que os que chamamos de “tradicionais”: PTB, PSD e UDN duraram de 1946 a 1966. Apenas 20 anos. Os de hoje já duram 25. Na maioridade, assim como o eleitor deveria estar maduro, depois de tantas experiências, tantos escândalos, tantas mudanças, tantas surpresas e desencantos, tantas frustrações e tantos recomeços. A impressão que se tem é que o Brasil a cada ano precisa ser reconstruído, como se não existíssemos há 500 anos. Lembro-me das eleições de quando eu era menino, em que os eleitores vestiam terno e gravata para votar e as senhoras iam com o vestido da missa. Tinha-se o cerimonial do voto, depositado no sacrário da urna. Hoje, urnas são mais fiéis, mais realistas e mais imunes à fraude. Mas serão os candidatos, eles próprios, isentos de fraudes? Como não se deixar enganar? Graças à bandeira desfraldada pelo vitorioso da última eleição, elegemos a ética, que vitimou primeiro os que a hastearam. Mas seria a ética uma exigência nova, na escolha dos governantes? Leia o que Platão escreveu há 2.400 anos, em “República”: “(...) os homens de bem não querem governar nem pelas riquezas nem pela honra; porque não querem ser considerados mercenários, exigindo abertamente o salário correspondente à sua função, nem ladrões, tirando dessa função lucros secretos; também não trabalham pela honra porque não são ambiciosos. Portanto é preciso que haja obrigação e castigo para que aceitem governar – é por isso que tomar o poder de livre vontade sem que a necessi- dade a isso obrigue, pode ser considerado vergonha – e o maior castigo consiste em ser governado por alguém ainda pior que nós, quando não queremos ser nós a governar. É com este receio que me parecem agir quando governam, as pessoas honradas, e então assumem o poder não como um bem a ser usufruído, mas como uma tarefa necessária, (...). Se surgisse uma cidade de homens bons, é provável que nela se lutasse para fugir do poder, como agora se luta por obtê-lo, e tornar-se-ia evidente que, na verdade, o governante autêntico não deve visar ao seu próprio interesse, mas ao do governado. De modo que todo homem sensato preferiria ser obrigado por outro do que preocupar-se em obrigar outros.” Como é velho o mundo, e como se repete! Platão poderia ter escrito isso hoje, para este ano eleitoral brasileiro, para esta República. E como o pensamento de Platão se faz necessário aqui, 2.400 depois, é bom que cada vez mais pensemos nisso. Na hora de votar, mesmo de tênis e jeans, temos que vestir nosso espírito cívico de terno e gravata, ou de salto e tailleur, porque o momento é solene e decisivo. Depois da posse dos que saírem da urna, não há um Procon que obrigue o mandatário a devolver o mandato, porque não cumpriu as cláusulas combinadas com o mandante na campanha eleitoral. Na hipótese mais remota, uma CPI pode provocar a cassação de mandatos ou um impedimento de chefe de executivo, mas isso é raro. A hora da decisão está começando. Já não podemos nos envergonhar tardiamente daqueles que elegemos. Por isso, vai ser preciso pensar e pensar e pensar. Ainda assim, há o risco de sermos enganados. Na campanha, eles vão se expor. E antes das convenções, é o tempo de encontrar como candidatos pessoas honradas, que assumam o poder não como um bem a ser usufruído, mas como uma tarefa necessária – como Platão ensinou. 11 12 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 “OBRAS PÚBLICAS E MEDIDAS EXPANSIONISTAS SÓ CONVENCEM A TORCIDA SE FOREM PARTE DE UM PROGRAMA CONSISTENTE” DEBATE O QUE ESPERAR DA ECONOMIA EM ANO ELEITORAL E D Copa atuará como dinamizador de importantes segmentos LUIZ GUILHERME PIVA á foi maior, mas ainda é freqüente a associação entre Copa do Mundo e resultados eleitorais. Herança do regime militar, quando o general Garrastazu Médici buscou se identificar com a seleção tricampeã em 1970. Normalmente se diz que a vitória da seleção amealha votos para o governo, e a derrota, para a oposição. Bem que os governos tentam – de forma mais sutil do que Médici –, mas essa associação não é verificável. Fernando Henrique Cardoso venceu no primeiro turno em 1994, no tetracampeonato trazido por Romário, mas também em 1998, quando o Brasil perdeu da França na final. E seu candidato, José Serra, perdeu para Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, quando Ronaldo nos deu o pentacampeonato. A principal relação tem sido observada entre economia e resultados eleitorais. Em 1994, na estréia do Plano J LUIZ GUILHERME PIVA Economista-chefe e diretor de finanças da BDO Trevisan e professor da Trevisan Escola de Negócios. É doutor em Ciência Política pela USP Real, a vitória governista foi avassaladora. E de virada: poucos meses antes da eleição Lula liderava as pesquisas, e Fernando Henrique acabou consagrado ainda no primeiro turno. Em 1998, ainda se viviam algumas glórias do Real, embora àquela altura artificiais, e Fernando Henrique Cardoso saiu-se de novo vencedor. Mas em 2002, depois de quatro anos em que crises sérias (câmbio, apagão, estagnação econômica) desmontaram o time governista, Lula é quem deu a volta olímpica. Se for mantida este ano, essa relação indica um quadro potencialmente favorável a Lula. A queda gradual da taxa de juros, a inflação baixa e a liquidez externa podem assegurar um crescimento visível neste ano, sobretudo se os efeitos no mercado de trabalho repercutirem como uma “ola” nas arquibancadas. Se, ao contrário, os juros permanecerem elevados a ponto de travarem o crescimento, a oposição pode crescer no jogo. A Copa do Mundo deste ano, na Alemanha, atuará como dinamizador de importantes segmentos da economia. Publicidade, material esportivo, eletroeletrônicos e viagens são alguns dos principais. Nesse sentido, também a eleição tem seus impactos: material gráfico, camisetas, cabos eleitorais, viagens, anúncios e shows (a depender da legislação) costumam ser os negócios mais ativados. Obras públicas e medidas expansionistas também costumam ser mais assíduas em anos de eleição. Isso anima a atividade econômica. Mas só convencem a torcida se forem parte de um programa consistente e sustentado. Porque, neste terreno, ao contrário da Copa do Mundo, não vale ganhar com gol de mão, impedido, no último minuto da partida. Tem que jogar bonito. CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 13 "OS ÚLTIMOS ANOS PARA O NOSSO PAÍS FORAM DESASTROSOS, COM O MESMO RITMO DE CRESCIMENTO MEDÍOCRE DA ECONOMIA" DE COPA DO MUNDO? Juros e câmbio inibem o crescimento do Brasil FLÁVIO ANTÔNIO REIS DO VALLE ste ano de 2006 promete, com toda certeza, muito samba com o Carnaval e muito choro com a Copa do Mundo: seja na comemoração do hexa, seja na frustração da perda. Mas o ritmo e o tom da música só serão mesmo conhecidos nas eleições de outubro. Posteriormente, só esperamos que não tenhamos de levar a situação de teimoso e de pirraça fazendo piruetas e caretas pra cavar o ganha-pão, engolindo sapos pelo caminho... Mas, e a economia? Como ficará neste e no próximo ano? Se vivemos, nesse início de milênio, o paradoxo da indefinição de modelos de desenvolvimento sustentável, defrontamo-nos, por razões as mais esdrúxulas, com políticas econômicas importadas e infelizes, que privilegiam o nãooperacional, ou que propõem o desaquecimento da economia como arma contra os processos inflacionários. São políticas oriundas de um modelo neoliberal sabidamente esgotado. Devemos ter em mente que os últimos anos para o nosso país E foram desastrosos em termos econômicos. Constata-se que o país esteja mantendo, infelizmente, o mesmo ritmo de crescimento medíocre dos últimos 20 anos. Foi uma grande oportunidade desperdiçada em 2005, fundamentalmente se considerarmos que este tem sido o melhor momento da economia internacional nas últimas décadas. Infelizmente, de acordo com análise do The Economist Intelligence Unit, do Reino Unido, o ritmo de crescimento da economia mundial deve se desacelerar em 2006, estabilizando-se nos dois anos seguintes. Na análise, após ter registrado crescimento de 5% em 2004, a economia mundial avançou em média 4,4% no ano passado. Para 2006, prevêem 4%, caindo para 3,9% no ano seguinte, retornando aos 4% em 2008. Os cálculos consideram o sistema de paridade do poder de compra, que seria traduzido pelo valor de aquisição, em cada país, de uma determinada cesta de produtos e serviços. Para os países emergentes, a OCDE pontua, em seus relatórios, para os riscos devidos à incerteza sobre o crescimento da demanda. Para os técnicos, o principal risco é até que ponto a oferta crescerá para enfrentar o fortalecimento da demanda doméstica, pondo fim às preocupações com a inflação. O nível dos preços do petróleo e uma mudança nas atuais condições do mercado financeiro internacional, como altas das taxas de juros nos Estados Unidos, e possivelmente na União Européia, acabarão atraindo investimentos para essas praças, reorientando os fluxos financeiros em detrimento dos países em desenvolvimento. Sabemos que a ocorrência, num mesmo ano, de eleições para a Presidência, Congresso, governadores e assembléias estaduais, juntamente com a Copa do Mundo, representam fatores positivos, vez que ajudam a dinamizar a economia. Mudanças nesses aspectos, somente a partir de políticas macroeconômicas envolvendo, dentre outras coisas, as relacionadas aos juros e câmbio, hoje calcanhar-de-aquiles para o crescimento do Brasil. FLÁVIO ANTÔNIO REIS DO VALLE Presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais 10ª Região 14 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 MAIS TRANSPORTE JOTA FREITAS/ONDINA/DIVULGAÇÃO DE OLHO NA ÁFRICA Em busca do mercado africano, a Induscar-Caio começa a montar suas carrocerias na África do Sul neste ano, em parceria com a Bussmark, empresa local. A intenção da internacionalização da linha de montagem é alcançar 10% das vendas no país, de um total de 1.500 carrocerias por ano. MARCO PICCHU O patrimônio cultural da humanidade Machu Picchu agora é visitado em microônibus da Marcopolo. A empresa entregou 22 veículos para o consórcio que realiza as viagens de turistas na região peruana. Os ônibus atenderão os 8 km de visitação nos santuários de Machu Picchu, que recebem mais de 1.200 viajantes por dia. COMO NOSSOS AVÓS Os turistas e a população de Salvador se sentirão mais confortáveis ao circular de ônibus pela orla da capital baiana. A transportadora Ondina adquiriu 10 carrocerias Svelto Jardineira, da encarroçadora Comil, que atenderão todo o roteiro dos hotéis turísticos da cidade. A versão Svelto Jardineira oferece robustez, beleza, acabamento e conforto ao usuário. A frota inicial, composta de seis veículos, está circulando na cidade desde novembro. CÂMARA ESPECIAL ADEUS AO VERMELHÃO A Tortuga colocou no mercado uma câmara de ar para pneus que não utilizam esse artefato. Com intuito de aumentar a vida útil dos compostos, principalmente entre caminhões e ônibus, a peça possui 20% a mais de borracha que as câmaras normais. Londres se despede dos ônibus vermelhos de dois andares, os "Routemasters", que percorrem as ruas da cidade desde 1954. Os antigos veículos foram substituídos recentemente porque não possuem elevadores para usuários de cadeiras de rodas. A nova frota em circulação na capital inglesa é composta por veículos vermelhos, também com dois andares, porém mais altos e mais largos que os antigos. Eles estão devidamente adaptados para os cadeirantes que utilizam o transporte coletivo. O prefeito de Londres, Ken Livingstone, diz que a cidade está cumprindo uma exigência da União Européia. Segundo o prefeito, a partir de agora, os "vermelhões" antigos irão circular apenas como atração turística, em rotas secundárias. CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 “A sociedade brasileira se ressente atualmente do peso de uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo” LUIZ ALFREDO BIANCONI ENTREVISTA LUIZ ALFREDO BIANCONI • ECOLOGIA NAS RUAS Os grandes centros urbanos são concentração de fatores para doenças respiratórias devido à alta emissão de poluentes. Para evitar males como irritação nos olhos, dores de garganta e cabeça, mal-estar e bronquite, uma boa revisão no veículo, seja automóvel, motocicleta ou ônibus, é a saída para quem vive e trabalha em uma metrópole. A seguir, uma lista de cinco itens de verificação preparada pela rede Midas para garantir o funcionamento ecologicamente correto do sistema de escapamento do veículo. O carro verde... ... evita corrosão com checagem periódica dos componentes ... passa por revisão após batidas na parte inferior do veículo, principalmente em lombadas ... usa catalisador, item obrigatório em veículos novos. Mas apenas 24,5% dos carros têm até 5 anos, segundo o Detran ... só é abastecido com combustível de origem comprovada. A adulteração provoca danos no motor e no sistema de escape, o que aumenta a emissão de poluentes ... passa por manutenção preventiva a cada três meses nos sistemas de alimentação, ignição e exaustão. PREMIAÇÕES CIDADANIA A Rápido 900 recebeu o prêmio Sistema de Qualidade no Transporte Amanco, concedido às empresas que obtiveram os melhores resultados no transporte dos produtos da firma de turbo-sistemas. As cargas da Amanco são fabricadas em Sumaré (SP) e Suape (PE) e levadas para o Nordeste e Sudeste. E empresa também recebeu o selo Sassmaq da Associação Brasileira da Indústria Química, certificação para o padrão de transporte de produtos químicos. O Rio Ônibus, empresa que administra o transporte coletivo no Rio de Janeiro, começou o projeto Motorista Cidadão, que pretende certificar todos os 18 mil motoristas da cidade. Parceria com a Fundação Getúlio Vargas, o programa tem como meta valorizar o papel do profissional diante da população e de seu papel social. O processo, que deve durar 30 meses, inclui treinamento, formação de instrutores e exames para obtenção do certificado. Postura rigorosa POR SANDRA CARVALHO As empresas de transporte rodoviário de carga têm arcado com um alto custo operacional, decorrente da má conservação das rodovias, da atuação das quadrilhas de furto e roubo de cargas e da elevada carga tributária. Mas o que muitos empresários não sabem é que transformar esses gastos em receita é possível. Uma das formas é a utilização de benefícios fiscais concedidos pela legislação brasileira, muitas vezes desconhecidos pelo transportador. É o que explica, na entrevista a seguir, Luiz Alfredo Bianconi, advogado especializado no assunto e sócio da Bianconi, Carvalhais e Loria Advogados Associados. Por que a tributação é tão elevada sobre o transportador? A sociedade brasileira se ressente atualmente do peso de uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo, motivada por uma política fiscal inadequada, pelo alto nível de corrupção na administração pública e a interpretação e aplicação da legislação tributária de forma inadequada pelos contribuintes. Isso acarreta sérios prejuízos, principalmente pela não utilização integral de benefícios legalmente concedidos. Quais gastos podem ser deduzidos das tributações de acordo com a lei? Há tributos que comportam deduções, mas sua aplicabilidade depende da correta interpretação da legislação vigente em cada caso. O que os autônomos ou empresas de transporte devem fazer para se beneficiar desses mecanismos legais? Devem adotar uma postura rigorosa em relação à realização de despesas com tributos, bem como buscar o assessoramento de profissionais qualificados e atualizados com a legislação tributária, aptos a orientá-los corretamente. 15 FOTOS SETCESP/DIVULGAÇÃO 16 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 MAIS TRANSPORTE ANIVERSÁRIO 70 ANOS DO SETCESP ma confraternização entre mais de 1.500 convidados – amigos, parceiros, associados e autoridades – comemorou, no dia 4 de fevereiro último, os 70 anos de fundação do Setcesp (Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região), completados no dia 26 de janeiro, no Clube Monte Líbano, em São Paulo. O presidente do Setcesp, Urubatan Helou, enalteceu, em seu discurso, os ex-presidentes que contribuíram para a história da entidade. Personalidades que prestam serviços ao setor de transportes foram homenageadas durante a solenidade. O presidente da CNT, Clésio Andrade, recebeu uma distinção especial, um troféu com a marca dos 70 anos do Setcesp em nome de todos os presidentes de entidades representativas do setor no Brasil. Depois das homenagens, um bolo especial no formato do prédio-sede do Set- U cesp foi levado ao palco. Os presentes cantaram parabéns à entidade, com uma chuva de papel picado, efeitos de laser e clima de muita descontração. Os convidados assistiram ao show do humorista Sérgio Rabelo e, após o jantar, foram agraciados com o show 40 Anos da Jovem Guarda, que resgatou as músicas que marcaram gerações. Wanderléa, Erasmo Carlos, Vips, Golden Boys, Fevers, Ary Sanches, Martinha e Lílian apresentaram inesquecíveis sucessos. As festividades de comemoração dos 70 anos do Setcesp foram parar no Sambódromo paulista, com a participação da entidade no Carnaval de São Paulo, através de uma homenagem da Escola de Samba Unidos de Vila Maria à entidade e ao setor de transportes rodoviário de cargas. A escola levará ao Sambódromo o enredo: “Em Minhas Costas o Brasil Carreguei, Nas Minhas Rodas o País Levantei... Com o Futuro Eu Sonhei”. TROFÉU Presidente da CNT, Clésio Andrade, agradece premiação FESTA Urubatan Helou, presidente do Setcesp, discursa na solenidade CNT TRANSPORTE ATUAL 17 EDIÇÃO 126 ESTANTE O NOVO MODELO TREM RÁPIDO A viagem entre Rio de Janeiro e São Paulo poderá ser feita em trens de alta velocidade. O edital de licitação para a construção e operação do trecho será lançado no primeiro semestre deste ano, de acordo com o Ministério dos Transportes. Com custo estimado de US$ 8 bilhões (R$ 18,4 milhões), a linha ligará a Luz à Estação Central, no Rio, em um trecho de cerca de 400 km. O trajeto via ferrovia era percorrido até 1998 pelo Trem da Prata, desativado por problemas econômicos. MAIS TREM RÁPIDO O Departamento de Relações Institucionais do Ministério dos Transportes deve receber o projeto de construção da linha ferroviária entre Brasília e Goiânia, conhecida como Expresso Pequi. O governo de Goiás irá levar o documento para iniciar o processo de licitações. O trem de média velocidade, que percorrerá um trecho de 200 km, será movido a diesel. No embalo da minissérie global, o livro reconstitui a vida de Juscelino Kubitschek, através de depoimentos de pessoas que conviveram com ele e de imagens de época. A obra traz entrevista com Oscar Niemeyer e prefácio de Maria Adelaide Amaral. Das passagens pela Prefeitura de Belo Horizonte até a presidência, toda a carreira de JK está documentada no livro. O que a CIT propõe • Uniformização das normas para se obter a habilitação • Dos órgãos emissores • Dos conhecimentos necessários para tirar a licença Formato proposto Órgão Emissor FOTO De Marleine Cohen Ed. Globo, 312 págs., R$ 42 Identidade País Direção do motorista Licença para conduzir Chip Número da licença Validade Observações Nome do Condutor Tipo Data da emissão Categoria Frente Certificação Assinatura do Condutor Verso UNIDADE VIA HABILITAÇÃO Versão impressa do documentário que faz sucesso em todo o mundo, o livro mostra em 200 fotos a migração dos pingüins, que fogem do inverno rigoroso da Antártica. O tema do filme já foi usado como referências para discussões religiosas e de negócios, criando uma analogia com a forma como os animais se organizam e buscam refúgio. De Luc Jacquet Ed. Prestígio, 136 págs., R$ 39,90 "COMO FAZER UMA EMPRESA DAR CERTO EM UM PAÍS INCERTO" DO Instituto Empreender Endeavor Reunião de histórias de empreendedores, de diversos graus de sucesso, o livro é um retrato do caminho tortuoso que abrir e consolidar uma empresa significa no Brasil. Detalhes das dificuldades, de sucesso e fracasso reforçam o caráter didático da obra, que funciona como um guia para quem pretende se aventurar no negócio próprio. Ed. Campus, 432 págs., R$ 69 Um modelo de carteira de habilitação comum para todos os países da América. Essa é a mais nova proposta da CIT (Câmara Interamericana do Transporte) em discussão desde dezembro. Segundo Fernando Carlos Santos da Silva, consultor jurídico da entidade e autor do estudo, um modelo único facilitaria o transporte, a circulação de bens e pessoas, o turismo e o comércio entre os países. “O transportador que vai para outro país a trabalho tem um elevado custo para tirar uma nova carteira e rodar legalmente, conforme as leis locais. Isso onera e burocratiza a atividade. O objetivo é acabar também com esse tipo de problema”, diz Santos da Silva. O pontapé para o debate sobre o assunto foi dado. Os governos dos 19 países que compõem a entidade já receberam o texto com as alterações propostas para iniciar as discussões. Além de tornar único o modelo da carteira, a CIT também sugere a uniformização das normas para se obter a licença dos órgãos emissores e dos conhecimentos necessários para isso. A carteira de habilitação brasileira, por exemplo, sofreria algumas mudanças diante da proposta. Uma delas no formato, que passaria do papel ao cartão eletrônico, com chip – modelo já utilizado em alguns países. O intuito da entidade é que, inicialmente, a habilitação se torne comum nos 19 países que a compõem. Depois disso, a CIT pretende batalhar para que o modelo único seja adotado por todo o continente americano. “É uma discussão que se estenderá por muitos anos, se tomarmos o exemplo da União Européia, onde o tema é debatido há mais de 40 anos”, diz Santos da Silva. (SC) CNT TRANSPORTE ATUAL FOTOS AMÉRICO VERMELHO/MEMÓRIA FERROVIÁRIA/DVULGAÇÃO 18 EDIÇÃO 126 MEMÓRIA PRESERVADA DE OLHO NO FUTURO PESQUISADORES PERCORREM O PAÍS FOTOGRAFANDO E CATALOGANDO LOCOMOTIVAS EM PROJETO QUE VAI SE TRANSFORMAR EM LIVRO POR longo e sonoro apito do chefe da estação ordenava a partida dos trens, maquinistas e fogueiros, apressados e ansiosos, apertavam válvulas e alavancas. As locomotivas deixavam as estações esguichando vapor para todos os lados. A cena era comum até o fim dos anos 1950 na maioria das estações brasileiras, mas o aparecimento da eletrônica e as transformações que o mundo sofreu depois da Segunda Guerra Mundial tiraram dos O EDSON CRUZ trilhos e aposentaram as locomotivas a vapor. Com o objetivo de resgatar essa história, o projeto Memória Ferroviária está percorrendo 172 cidades de todas as regiões do país. “Já fotografamos e fichamos 350 locomotivas no Sul e Sudeste. Faltam cerca de 150, que se encontram no Nordeste, Norte e CentroOeste”, diz o consultor-técnico do projeto, Gérson Toller. Além dele, integram o projeto desenvolvido pela “Revista Ferroviária” mais cinco profissionais, um deles especialista em tração a vapor. As máquinas a vapor eram de propriedade de ferrovias, portos, fazendas, armazéns e usinas e são parte de ciclos econômicos da história do Brasil. O projeto pretende associar cada locomotiva ao ciclo a que pertenceu. Algumas máquinas fizeram parte do ciclo cafeeiro e transportaram imigrantes do porto de Santos para a região do Planalto Paulista, outras movimentaram cana-de-açúcar nas usinas do Nor- “O livro vai servir como um inventário para os organizadores de futuros museus” GÉRSON TOLLER CONSULTOR-TÉCNICO deste e no norte do Rio de Janeiro e outras ainda viabilizaram a exploração de jazidas de minério de ferro em Minas Gerais. O trabalho tem grande rigor técnico, e a equipe (formada por um fotógrafo e um especialista no assunto) se desloca para os lugares em que estão hoje as locomotivas. Além de fotografá-las, os dois profissionais de campo preenchem ficha que contém dados como fabricante, configuração de rodas, data de fabricação, origem, empresa onde operava, localização atual, dimensões, responsável e estado atual. Os pesquisadores estimam em 500 o número de locomotivas a vapor existentes no Brasil. O resultado final do projeto será um livro que divulgará o primeiro levantamento completo do acervo constituído por locomotivas a vapor utili- “Num país onde a memória é posta de lado, o livro vai valer muito” zadas nas ferrovias brasileiras em cem anos, que vão da metade do século 19 até meados do século 20. “Num país onde a memória é posta de lado, o livro vai valer muito. Infelizmente, os brasileiros sabem mais da Guerra de Secessão americana, devido principalmente ao filme ‘... E o Vento Levou’ do que da Guerra do Contestado, que até hoje não mereceu nenhum filme digno de registro”, diz Toller, referindo-se ao violento conflito no oeste e norte de Santa Catarina entre 1912 e 1916. A miséria de caboclos e o messianismo do monge José Maria foram os estopins da Guerra do Contestado. O conflito começou porque dezenas de famílias de desempregados de uma ferrovia (ligando São Paulo ao Rio Grande do Sul) foram expulsas das terras à beira da linha férrea e se rebelaram com auxílio do monge José Maria – os terrenos foram concedidos pelo governo a companhias colonizadoras e madeireiras. Numa batalha em 1912, o monge foi morto, o que prolongou o conflito, envolvendo mais de 20 mil pessoas. O Exército brasileiro interveio e a batalha terminou com o saldo de 3.000 mortos. A Guerra de Contestado não é um dos capítulos nem é citada no livro, mas, segundo Toller, serve de inspiração para que as locomotivas a vapor não se tornem também um episódio apagado da história do Brasil. “Vai ser um bonito livro com fotos de locomotivas antigas, mas também vai servir como inventário para os organizadores de futuros museus. Infelizmente, ainda não existe um museu ferroviário nacional. Queremos que o livro seja a fonte de dados primários para trabalhos de estudantes e pesquisadores”, diz o consultor, que pretende ainda despertar o espírito preservacionista em dirigentes de em- BOM ESTADO Locomotiva encontrada na Estrada de Ferro das Oficinas de Divinópolis (MG) RARIDADE presas que possuem máquinas a vapor em seu patrimônio. A maioria das locomotivas pesquisadas foi importada da Inglaterra, França, Alemanha e dos Estados Unidos, ou, excepcionalmente, montadas em oficinas de ferrovias brasileiras. As locomotivas a vapor genuinamente brasileiras foram fabricadas durante a crise no abastecimento de produtos industriais provocada pela Segunda Guerra Mundial. Duas das três locomotivas construídas no Brasil foram encontrados pelos pesquisadores em Divinópolis (MG). A terceira foi localizada em Ponta Grossa (PR). Uma das que se encontra hoje em Divinópolis é a locomotiva a vapor 339, batizada de Carmem Miranda, construída a partir de peças feitas CNT TRANSPORTE ATUAL Locomotiva do Exército Imperial Alemão, usada da Primeira Guerra Mundial A PESQUISA ESTIMA EM 500 O NÚMERO DE LOCOMOTIVAS A VAPOR NO BRASIL de material usado, recolhidas em sucatas e utilizando medidas conseguidas através de sarrafos de madeira. O protótipo, construído nas oficinas da antiga Rede Mineira de Viação e idealizado pelo técnico ferroviário João Morato, possuía capacidade de tração de sete vagões com 180 toneladas cada um e percorria o trajeto entre Divinópolis e Belo Horizonte. Depois da Carmem Miranda, o técnico João Morato fabricou em Divinópolis a locomotiva Dircinha Batista. Os nomes foram dados em homenagem às duas famosas cantoras da era do rádio. As locomotivas foram aposentadas em 1965. O levantamento realizado não considera o estado atual da máquina. “Se tiver caldeira e o langueirão (chassis), consideramos a locomo- EDIÇÃO 126 21 ABANDONO Estrada de Ferro de Dourados, interior de São Paulo EM ATIVIDADE Trem da linha São João del-Rei e Tiradentes “Nosso objetivo é apenas revelar sua existência. Não nos propomos A TODO VAPOR Aquecendo o turismo A expedição encontrou algumas locomotivas nos trilhos de Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul em plena atividade e a todo vapor. “Elas só fazem trajetos turísticos. Foram testadas e se encontram adaptadas às normas de segurança vigentes”, diz Sérgio Martire. Normalmente, as caldeiras usam óleo em vez de lenha para produzir o vapor. Entre São João del-Rei e Tiradentes, seis locomotivas se revezam para percorrer diariamente um trajeto de 12 km. Em feriados e nos finais de semana, o movimento aumenta e os seis trens se desdobram para realizar as viagens. As locomotivas pertencem ao complexo ferroviário de São João del-Rei, que é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). “O complexo reúne o maior acervo de locomotivas a vapor preservado, de um mesmo fabricante”, diz Martire, referindo-se às quinze locomotivas da fábrica norte-americana Baldwin. Apenas seis estão em atividade (duas funcionam a lenha e quatro a óleo), enquanto outras oito estão completas, mas paradas, e apenas uma está sucateada. O passeio é uma das maiores atrações das duas maiores cidades históricas de Minas Gerais. Ainda em Minas, outras locomotivas a vapor fazem o trajeto entre São Lourenço e Soledade de Minas e em Passa Quatro. Os “caça-locomotivas” também encontraram locomotivas em atividade em São Paulo, que fazem o trajeto entre as estações de Anhumas e Jaguariúna, entre Pindamonhangaba e Piraquara, no parque municipal da cidade de Taubaté, e no Memorial do Imigrante, na capital paulista. Em Santa Catarina, uma locomotiva a vapor faz o trajeto entre as cidades de Tubarão, Imbituba e Urussunga. Um passeio que percorre parte de uma serra e da encosta do mar. Nas Serras Gaúchas, uma locomotiva a vapor, do chamado Trem do Vinho, percorre o trajeto entre Bento Gonçalves e Carlos Barbosa. “Todas as máquinas foram fotografadas no ambiente de trabalho e vão aparecer em destaque no livro”, diz Sérgio Martire. ENTRE O VERDE Locomotiva na Estrada de Ferro Perus-Pirapora (SP) tiva existente, mas nosso objetivo é apenas registrar, não nos propomos a restaurar locomotivas”, diz Gerson Toller. Algumas locomotivas estão em estado lastimável de conservação ou em lugares de difícil acesso, o que chega a impedir até mesmo a visitação. Os pesquisadores encontraram quatro máquinas a vapor em lugares surpreendentes, nas cidades de Bragança Paulista, Iperó (SP), Varginha e Teófilo Otoni (MG). “Uma locomotiva a vapor em Iperó está coberta por matos e árvores na Floresta Nacional de Ipanema. Tivemos que percorrer uma trilha para chegar ao local e até abrimos uma clareira na mata”, diz Sérgio Martire, um dos maiores especialistas em locomotivas a vapor do Brasil, que faz o trabalho de campo do projeto Memória Ferroviária, ao lado do fotógrafo Américo Vermelho. A Maria Castro, modelo AAR-40, construída em 1894, encontra-se no zoológico de Varginha. Nesse caso, o especialista elogiou o bom estado de conservação da máquina, mas criticou a forma de exposição. “Ela está num local isolado e que impede a visitação pública”, diz Martire. Outra locomotiva que está em lugar inadequado é a Luiz Leme, em Bragança Paulista, da antiga Estrada de Ferro Bragantina. “A locomotiva está enjaulada em uma praça pública próxima a um ponto de ônibus. Para evitar vandalismos e roubos, a máquina está cercada por grades, tornando impossível a visitação”, diz o pesquisador, que foi informado pela a restaurar locomotivas” RARIDADES DA HISTÓRIA LOCOMOTIVA BARONEZA Primeira em operação no Brasil, inaugurou também a primeira ferrovia, a Estrada de Ferro Mauá. Construída em 1852 por Willian Fair Bairns & Sons, em Manchester, Inglaterra, a Baroneza foi retirada de circulação 30 anos depois. Foi transformada em monumento cultural pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e hoje faz parte do acervo do Centro de Preservação da História Ferroviária, no Rio de Janeiro LOCOMOTIVA PEDRO 2º Está no Museu Ferroviário, em Indaiatuba (SP). Foi doada pelo imperador dom Pedro 2º na inauguração da Estrada de Ferro Ytuana. Considerada a mais antiga locomotiva fabricada nos EUA, a máquina foi fabricada pela empresa norte-americana Baldwin Locomotive Works e chegou ao Brasil em 1892 para fazer transporte de passageiros. Aposentou-se em 1967 HISTÓRICA Locomotiva Pedro 2º no Museu Ferroviário, em Indaiatuba (SP) LOCOMOTIVA BRIGADIER Máquina militar alemã que, durante a 1ª Guerra Mundial, transportou diariamente 1.500 toneladas de suprimentos para soldados em conflito nas trincheiras. Chegaram ao Brasil, como presas de guerra, em 1917, em navio apreendido pelo governo brasileiro. O projeto localizou seis locomotivas. Uma foi comprada pelo pesquisador Sérgio Martire num ferro-velho em Santos e se encontra em reparos em Sorocaba. Outra está no Parque Municipal de Cubatão, três estão em Minas Gerais (Ouro Preto, São João del-Rei e Sete Lagoas) e a única ainda pertencente ao Exército se encontra em Resende (RJ), na Academia Militar das Agulhas Negras LOCOMOTIVA ZEZÉ LEONI Foi doada pelo rei Alberto, da Bélgica, para operação na Estrada de Ferro Central do Brasil, em 1920. O nome é uma homenagem à miss Brasil de 1930 (e primeira brasileira miss Universo), Iolanda Pereira, também conhecida como Zezé Leoni. Era do tipo Pacifíc 370 e foi construída pela American Locomotive Company. Foi aposentada em 1960 e faz parte do patrimônio histórico de Santos Dumont (MG). FONTES: “REVISTA FERROVIÁRIA” E DNIT Prefeitura de Bragança Paulista que a locomotiva será recuperada para o transporte turístico de passageiros. Uma outra locomotiva, a Jovianna, construída pela empresa norte-americana Baldwin Locomotive Works em 1881, encontra-se gradeada na principal praça de Teófilo Otoni. Apesar das decepções passageiras encontradas no caminho, os pesquisadores, já chamados de “caça-locomotivas”, têm se surpreendido com a solidariedade de colaboradores anônimos no trabalho de levantamento de dados. “Através de e-mails de colaboradores conseguimos descobrir três locomotivas em São Paulo e no Mato Grosso do Sul”, diz Sérgio Martire. Durante o trabalho de campo, os pesquisadores foram informados sobre a existência de velhas locomotivas em Icém e Pontal (SP) e em Caarapó (MS). “Estávamos fotografando em Dumont (SP) quando um rapaz apareceu com informações sobre a locomotiva de Icém. A equipe retornou quase 500 km em seu itinerário original, mas fizemos o registro da locomotiva que se encontra ao lado de uma caldeira há seis anos, numa usina de açúcar”, diz Martire. Com o apoio do Ministério da Cultura, através da Lei Rouanet, que propõe incentivos fiscais para os patrocinadores, o projeto está sendo financiado pela CSN, Usiminas Mecânica, Amsted Maxion, MRS, GE, SKF, MWL Rodas e Eixos, Caramuru Alimentos e Freios Knoor. t 24 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 FOTOS ADRIANA CARDOSO CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 25 EMBATE JURÍDICO EM CHOQUE COM A LEI TAXISTAS DE FOZ DE IGUAÇU SÃO PUNIDOS POR LEVAREM PASSAGEIROS COM MERCADORIAS ILEGAIS POR SANDRA CARVALHO a tarde do dia 15 de dezembro do ano passado, o taxista Carlos Pressi Nicolau, de 26 anos, de Foz do Iguaçu (PR), foi chamado para mais uma corrida na cidade. Ele levaria um passageiro que estava em um hotel até Cordélia, um município vizinho. As bagagens e algumas compras feitas no Paraguai, divididas em três volumes, foram acomodadas no bagageiro do carro. Os dois seguiram viagem pela BR-277. Quando passaram pelo posto da Receita Federal, na rodovia, foram abordados. Os fiscais abriram o bagageiro olharam a mercadoria – vários pisca-piscas de Natal – e a N apreenderam. Segundo a Receita, os produtos configuravam contrabando, já que tinham valor estimado em US$ 600 (cerca de R$ 1.320), bem superior aos US$ 300 (R$ 660) permitidos para compras no país vizinho. O passageiro teve a mercadoria apreendida, assinou um papel, teve os dados anotados e logo foi liberado. O taxista, porém, que afirma que nada sabia sobre a mercadoria, teve seu carro apreendido. Os fiscais alegaram que o veículo tem relação com o crime de contrabando. Por causa dessa corrida, Nicolau está há dois meses sem o carro. Deixou de ser autônomo e está traba- 26 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 ENTENDA O CONFLITO Ponto de discussão A apreensão de veículos de motoristas de táxis que transportam passageiros com mercadorias ilegais oriundas do Paraguai lhando de empregado. Teve de contratar advogado, pois o processo corre normalmente na Justiça. A mulher, a filha e a mãe do taxista, que moram com ele, são afetadas diretamente pela situação, já que a renda da família caiu em 70%. O drama vivido por Nicolau é o mesmo de outros 11 taxistas em Foz do Iguaçu (dados atualizados até 30 de janeiro). Eles se dizem injustiçados por um conflito jurídico instalado na cidade que recebe turistas de diversas partes do país e do mundo, em função das Cataratas do Iguaçu e também pela sua proximidade com o Paraguai. “Não podemos dispensar passageiros porque há uma lei na cidade que proíbe isso. No entanto, temos de recusálos por causa da Receita. É uma situação muito complicada”, diz o taxista. Ele acrescenta que o público da categoria são os turistas e as pessoas que cruzam a Ponte da Amizade para fazer compras no Paraguai. “Não há como diferenciá-los. Não temos de ficar vistoriando bagagem de passageiro para saber o que levam. Não somos polícia e nem temos autoridade para isso.” O que alegam os taxistas Não podem recusar passageiros em função de proibição de uma lei municipal Não têm autoridade e nem preparo para fiscalizar as bagagens Não têm como adivinhar que o passageiro está carregando mercadoria ilegal Não devem ser responsabilizados pelo ato ilegal dos passageiros O que diz a Receita Os taxistas são coniventes. Eles transportam passageiros com mercadorias ilegais sabendo disso e, portanto, devem ter seu veículo apreendido RECLAMAÇÃO O taxista João Leocir reclama de estar tendo Nilton Noel da Rocha, presidente do Sinditaxi (Sindicato dos Taxistas de Foz do Iguaçu), conta que o drama começou com a fiscalização cerrada aos ônibus. “Por causa da fiscalização da Receita, os ônibus de ‘muambeiros’ e comerciantes não circulam mais em Foz do Iguaçu. Os ônibus e vans levam seus passageiros até as cidades vizinhas de Santa Terezinha, São Miguel do Iguaçu, Medianeira, Cascavel e Corvélia. Dessas cidades, eles tomam táxis ou carros particulares e vão até Ciudad Del Este, no Paraguai, para fazer compras. Quando vêm de lá, tomam táxis em Foz do Iguaçu e retor- "Não temos de ficar vistoriando bagagem de passageiro para saber o que levam" CARLOS PRESSI NICOLAU TAXISTA nam para a cidade onde está o ônibus”, diz. Por causa desse cerco da Receita Federal aos ônibus e vans, a procura pelos serviços de táxis pelos “muambeiros” (chamados também de compristas ou sacoleiros, pessoas que fazem compras no Paraguai para revender no Brasil), que se passam também por turistas, aumentou. Por isso, desde julho do ano passado, o órgão passou a fiscalizar táxis. Rocha frisa que a situação vivida pelos taxistas de Foz é “inaceitável” e diz que “trabalhadores honestos estão sendo taxados de bandidos”. “Na verdade, enquanto táxis CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 27 DÍVIDAS “Meu rendimento caiu 60%” “Trabalho próximo à ponte da Amizade com dois táxis. Em outubro do ano passado, peguei um passageiro que estava indo para São Miguel do Iguaçu. Pegamos a BR-277. Quando passamos por Santa Terezinha, fui abordado pela Polícia Rodoviária Federal. Eles abriram o bagageiro do veículo e vistoriaram a mercadoria. Apreenderam cerca de R$ 5.000 em equipamentos de informática. O passageiro, dono da mercadoria ilegal, foi liberado numa boa e eu tive meu primeiro carro apreendido. Em dezembro último, peguei uma passageira que não aparentava estar contrabandeando. Fomos abordados no pedágio de São Miguel do Iguaçu pela Receita Fede- ral. A mercadoria ficou classificada em uns R$ 1.000. A passageira foi liberada e eu tive meu segundo carro apreendido. Hoje, trabalho de empregado para os outros para ver se consigo sustentar minha mulher e meus dois filhos. Mas está complicado. O problema é que ainda devo prestações altíssimas de um dos carros. Já anunciei minha casa e pretendo vendê-la para pagar essa e outras dívidas, já que meus rendimentos caíram em torno de 60%. Nesses 15 anos como taxista na cidade, eu e minha família nunca vivemos uma situação tão difícil.” João Leocir Passola, 39 anos, taxista prejuízo de até 60% por causa das restrições impostas em Foz do Iguaçu estão sendo vistoriados, muitos caminhões e carros com contrabando devem passar pelos fiscais e eles não vêem. Em vez de ficar prejudicando quem é trabalhador, eles (Receita Federal) deveriam apreender os verdadeiros criminosos”, diz o sindicalista. Em uma reunião entre taxistas e o delegado da Receita Federal na cidade, ocorrida em dezembro, os profissionais buscavam resolver o impasse. Mas nada ficou definido. “Queremos apenas que os verdadeiros culpados, que são os passageiros, donos das compras, sejam responsabilizados pela mercadoria e que paguem a corrida. Isso que está acontecendo não é justo”, diz Rocha. De acordo com o Sinditaxi, dos 380 táxis em circulação em Foz do Iguaçu, cerca de cem trabalham nos arredores da Ponte da Amizade, onde o público é composto basicamente de compristas que voltam do Paraguai. RECUSA Yoshimitsu Oda, superintendente da FozTrans (Instituto de Transporte e Trânsito de Foz do Iguaçu), diz que o taxista experiente sabe “só de olhar” se o passageiro está ou não com mercadoria "Queremos que os verdadeiros culpados sejam responsáveis pela mercadoria" NILTON NOEL DA ROCHA PRESIDENTE DO SINDTAXI ilegal. O problema é que nem todos os taxistas são experientes a esse ponto. “Ao desconfiar da mercadoria, o taxista deve recusar a corrida”, afirma. Por outro lado, Oda explica a resolução do município que proíbe a recusa do passageiro.“O passageiro que passar por uma situação desse tipo pode formalizar uma reclamação à FozTrans. O taxista recebe advertência e, no caso de reincidência, pode ser multado ou até mesmo perder a licença”, afirma. No caso de recusa por desconfiança de mercadoria ilegal, o taxista deve expor “claramente seus argumentos à empresa de trânsito do muni- 28 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 O QUE DIZ A LEI O taxista não pode recusar passageiro, a não ser nos seguintes casos* • Quando constatar que o passageiro é foragido da Justiça • Quando o número de passageiros exceder aquele previsto na lei, conforme a capacidade do veículo • Quando perceber que a lei será violada (Neste caso, segundo a superintendência da FozTrans, é qualquer lei em vigor. No entanto, este artigo será revisado e melhor esclarecido, já que o taxista não é obrigado a conhecer de todas as leis) • Quando a bagagem a ser transportada não permita o tráfego do veículo com todas as portas e bagageiros fechados • Quando estiver se deslocando para refeições, repouso ou reparos no veículo * Artigo 66 do Decreto Municipal nº 1.764 de Foz do Iguaçu Respondem pela infração de transportar mercadorias ilegais* • Quem praticar ou se beneficiar conjunta ou isoladamente das mercadorias • O proprietário e/ou consignatário do táxi onde a mercadoria está sendo transportada, no exercício de atividade própria do veículo • O proprietário e/ou consignatário do táxi no caso de omissão de seus tripulantes • A pessoa física ou jurídica em razão do despacho que promova de qualquer mercadoria • O importador e/ou adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por conta e ordem deste, por intermédio de pessoa jurídica importadora * Artigo 603 do Decreto nº 4.543 (Regulamento Aduaneiro) e Decreto-lei nº 37 Punições* Para os taxistas • Apreensão do veículo (objeto que tem relação com o fato) Para os passageiros • Apreensão da mercadoria * Artigos 104 e 617 do Decreto-lei nº 37, artigo 24 do Decreto-lei nº 1.455 e artigo 6 do Código de Processo Penal FLAGRANTE Taxista e passageiros enchem o bagageiro cípio e, certamente, terá a advertência anulada”. Oda afirma que as reclamações de recusa de taxistas até ocorrem, mas são muito raras. “Acho que o passageiro que está com mercadoria irregular dificilmente vai querer formalizar reclamação. Ele quer mesmo é passar pela cidade despercebido”, diz. Para o superintendente da FozTrans, a Receita Federal está certa de cumprir seu papel fiscalizador. Porém, ele é contra a apreensão dos veículos. “O cerco deve ser fechado ao contrabando. Mas os taxistas devem ser liberados, assim como seus carros. Os passageiros, donos da CERCA DE 100 TÁXIS TRABALHAM NOS ARREDORES DA PONTE DA AMIZADE CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 DESILUSÃO “Vivo situação muito difícil” com mercadorias em Foz do Iguaçu, na fronteira brasileira com o Paraguai DESÂNIMO Sebastião Pedroso do Amaral teve o seu táxi detido “Não quero mais mexer com corrida nesses locais. A gente trabalha, trabalha e ainda fica no prejuízo. No dia 15 de novembro, em pleno feriado, eu estava trabalhando e fui levar uma passageira de Foz do Iguaçu para Corvélia. Passei pela BR-277 e fui abordado no posto de fiscalização da Receita em Medianeira. O bagageiro do carro estava cheio de brinquedos e enfeites natalinos comprados no Paraguai. Contabilizaram um valor acima do permitido para compras. Fotografaram toda a mercadoria no meu carro. A passageira parecia que não tinha nada a ver com aquela situação e foi rapidamente liberada. Ela simplesmente sumiu. Eu fui tratado como se fosse um criminoso e perdi meu instrumento de trabalho, com o qual sustento minha mulher e dois filhos. Meu carro foi detido. O pior de tudo é que, além de ter de trabalhar de empregado, estar cheio de dívidas e ter de gastar com advogado, acabei tendo um contratempo familiar. Minha sogra, dona do veículo, não entendia a situação direito e achava que eu tinha sumido com o carro. Foi muito complicado explicar para ela o que havia acontecido. Estou vivendo uma situação muito difícil. Nesses 16 anos que trabalho como taxista, estou me sentindo, pela primeira vez, desanimado com a profissão. O que estamos vendo é que a corda sempre arrebenta para o lado do mais fraco.” Sebastião Pedroso do Amaral 51 anos, taxista 29 30 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 "Ao desconfiar da mercadoria, YOSHIMITSU ODA superintendente da FozTrans SACOLEIROS Policias federais revistam passageiros em ônibus com mercadorias do Paraguai mercadoria, devem ser penalizados.” O delegado José Carlos Araújo, da Receita Federal em Foz do Iguaçu, afirma que os taxistas que tiveram carros apreendidos não são inocentes. “Se não soubessem do conteúdo das mercadorias, por que então que alguns dos que tiveram carros apreendidos pegaram estrada de terra para chegar às cidades vizinhas em vez de seguir pela rodovia de asfalto? Por que utilizaram estradas secundárias? Creio que para fugir da fiscalização. São na verdade coniventes”, afirma. Além disso, o delegado ressalta que, de acordo com a legislação aduaneira, é de responsabilidade do taxista, para efeito fiscal, a mercadoria que não estiver identificada no bagageiro do veículo com o nome do passageiro, ou seja, se o passageiro fugir e não se responsabilizar pelas bagagens, elas são consideradas do taxista. Por isso, o profissional deve identificar todas as bagagens antes de iniciar uma corrida. Sobre a alegação dos taxistas de que não podem recusar o passageiro, o delegado aconselha que eles verifiquem a mercadoria antes de iniciar a corrida e, em caso de “Por causa da fiscalização da Receita, os ônibus de ‘muambeiros’ não circulam mais em Foz” NILTON NOEL DA ROCHA PRESIDENTE DO SINDTAXI dúvida, levem o passageiro até a delegacia ou ao posto de fiscalização para que a procedência dos produtos seja identificada. “Estamos à disposição dos taxistas. Se fizerem isso, serão eximidos das responsabilidades. Mas eles dificilmente nos procuram”, diz Araújo. O delegado diz que o objetivo da Receita Federal com a fiscalização é combater o contrabando, que gera prejuízos à cadeia produtiva do país. “Para cada subemprego desse (de sacoleiro), são perdidos na cadeia seis empregos formais. Isso gera uma reação em cadeia que resulta em crime organizado, tráfico de drogas, pobreza, miséria, prostituição e analfabetismo”, diz. Segundo o delegado, em 2005 foram fiscalizados 1.466 veículos (táxis, ônibus, vans de turismo, carros de passeio), ações que resultaram na apreensão de US$ 62,3 milhões (R$ 137 milhões) em mercadorias ilegais. O advogado Valdemar Ernesto Feiertag Júnior, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em Foz do Iguaçu, diz que não cabe à entidade emitir opinião sobre CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 31 o taxista deve recusar a corrida" o assunto, mas ele explica que a ação da Receita Federal em deter os veículos dos taxistas está respaldada também pelo Código de Processo Penal. “Todo instrumento que tem relação com o crime tem que ser apreendido”, afirma. Sobre a alegação dos taxistas, de que em muitos casos não sabem o que estão levando, o advogado diz: “A lei prevê a regra geral e o juiz pondera. Por isso, a Receita cumpre a regra geral, ao apreender o táxi e as mercadorias, e joga a responsabilidade para o juiz decidir ou não pela inocência dos taxistas”. A DEFESA Washington Luiz Teixeira, advogado do Sinditaxi, diz que a Receita Federal está querendo tornar local uma fiscalização que deveria ter amplitude nacional. “O taxista de Foz trabalha e paga os mesmos impostos que um taxista de São Paulo, do Rio de Janeiro ou de qualquer outra parte do país. Ele deveria receber dos órgãos públicos o mesmo tratamento que é dado a todos. Além disso, nos grandes centros urbanos, podem ocorrer DEPOIS DA PONTE Taxista brasileiro atravessa a fronteira e pega passageiro em solo paraguaio situações piores no que se refere ao contrabando. Se for fechar o cerco ao trabalho dos taxistas, então que isso ocorra em todo o país. Que não haja discriminação”, diz. Teixeira também critica a forma como a Receita aborda o taxista. “A fiscalização já vai direto no taxista e não no passageiro, que é liberado imediatamente. Pressupõe-se desde o início que o taxista é culpado.” Para o advogado, a Receita está jogando para cima do taxista uma responsabilidade que é do Estado. “Ora, o taxista não tem que ficar fiscalizando a mercadoria do passageiro. Ele não tem autoridade e nem preparo para isso”, diz. Outro ponto destacado por Teixeira é a diferenciação entre turista e comprista. Segundo ele, ambos se comportam da mesma forma quando tomam um táxi com mercadorias. “Se for assim, o taxista tem de desconfiar de todo mundo e não pegar nenhum passageiro.” O advogado acrescenta que os critérios para identificação de mercadorias ilegais sugeridos pela Receita Federal também não são seguros. “Dizem que o taxista tem que saber pela aparência e pelo volume da mercadoria se ela é ilegal ou não. Ora, uma pessoa pode comprar quatro per- fumes no Paraguai, extrapolar o limite permitido para compra e colocar a mercadoria entre as roupas. O taxista vai pedir para ela abrir a mala de roupa e vistoriar suas cuecas? É uma situação constrangedora”, diz Teixeira. Segundo Nilton Rocha, presidente do Sinditaxi, enquanto o impasse não se resolve, os taxistas estão sendo aconselhados pelo sindicato a não pegarem passageiros que estejam com qualquer tipo de sacolas do Paraguai. “É injusto, mas temos de nos sujeitar a isso. Nossos rendimentos caem, nossas famílias sofrem as conseqüências”, diz. t 32 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 MERCOSUL EM BUSCA DE SINTONIA SUBGRUPO DE TRANSPORTES DO MERCOSUL QUER ACABAR COM ENTRAVES NO SETOR POR T rês luzes verdes instaladas no pára-sol dos caminhões, conhecidas como “três-marias”. Acessório totalmente dispensável no Brasil, é de uso obrigatório na Argentina. Sem as luzes, os caminhões não podem circular em território argentino. Para aparar essas e outras disparidades, os negociadores do subgrupo de Transporte do Mercosul têm feito longas e periódicas reuniões, que já se arrastam por mais de uma década e meia. A última e 30ª reunião do subgrupo aconteceu em outubro passado, em EDSON CRUZ Montevidéu. “Nosso objetivo é alcançar um denominador comum para conseguir maior crescimento do setor. Pretendemos eliminar os entraves comerciais e operacionais ainda existentes. Paralelamente, continuam ainda as negociações do acordo de transporte marítimo”, diz o coordenador brasileiro do subgrupo de transporte do Mercosul, Noboru Ofugi. As condições e regras para o transportador brasileiro de cargas trabalhar no Mercosul são reguladas pelo ATIT (Acordo de Transporte Internacional Terrestre) de 1990. “A legislação foi um grande avanço, mas pouco saiu do papel por entraves burocráticos e porque os acordos não foram internalizados pelos países do Mercosul”, diz a advogada e assessora técnica da NTC (Associação Nacional de Transporte de Cargas e Logística), Sônia Rotondo. Na reunião de Montevidéu, os debatedores constataram a total ausência de normas comuns entres os países do Mercosul. Um dos itens em discussão é o que trata do peso e dimensão (altura, largura e comprimento) dos veículos. Os negociadores CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 33 AUREA CUNHA/GAZETA DO POVO/FUTURA PRESS 34 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 PRINCIPAIS PONTOS EM DISCUSSÃO 1. Revisão e pesos e dimensões dos veículos • O que pretende o subgrupo Harmonização das normas • Como se encontram os trabalhos O subgrupo pretende concluir os trabalhos até dezembro deste ano 2. Transporte de produtos perigosos • O que pretende o subgrupo Atualização das normas técnicas • Como se encontram os trabalhos As discussões estão bastante lentas 3. Transporte de encomendas em ônibus Acordo já realizado, mas não entrou em vigência 4. Transporte marítimo • O que pretende o subgrupo Acordo multilateral • Como se encontram os trabalhos As discussões devem se arrastar por um bom tempo 5. Normas de trânsito • O que pretende o subgrupo Revisão da atual legislação • Como se encontram os trabalhos Término previsto para dezembro deste ano 6. Tanques adicionais de combustíveis • O que pretende o subgrupo Novas regras • Como se encontram os trabalhos Término previsto para dezembro deste ano 7. Responsabilidade civil no transporte de passageiros • O que pretende o subgrupo Fixação de limites de indenização • Como se encontram os trabalhos As discussões começam na próxima reunião do grupo 8. Requisitos de acesso para a profissão de transportador O negociador brasileiro Noboru Ofugi informa que o conceito de profissionalização varia de acordo com a situação de cada país. pretendem ainda unificar a documentação, os tipos de equipamentos de medição de pesos e os critérios de pesagem por tipo de veículos e eixos e padronizar as punições para os caminhoneiros que trafegarem com excesso de carga. Um dos pontos mais controvertidos da discussão refere-se às normas de trânsito. Com lugar de destaque entre as distorções, encontram-se os equipamentos de uso obrigatório. Para trafegar na Argentina, além das “trêsmarias”, os caminhões têm que ter pára-choques dianteiros na largura do veículo a 45 cm do solo (“mata-cachorro”), dois faróis auxiliares amarelos (antineblina), duas placas de licenciamento (uma dianteira e outra traseira), um kit de primeiros socorros, dois triângulos balizas, dois sinalizadores noturnos, lamparina a diesel ou a bateria, dois cones, bandeirolas adesivas dos países e pintura especial nas laterais do veículo. Sem esses itens obrigatórios, um caminhoneiro em trânsito na Argentina está sujeito a uma salgada multa. “Há alguns meses, um caminhoneiro da empresa teve que pagar R$ 35 por uma bandeira adesiva para um policial argentino. Maus policiais existem também em grande número na Argentina”, diz o coordenadorgeral de operações petroquímicas da empresa Ulracargo, We- PESADO Dados mostram ber Girardi. A Ultracargo tem rota fixa e faz transporte de produtos petroquímicos para os países do Mercosul em 32 caminhões. Além dos equipamentos, para transitar na Argentina, os caminhoneiros também são obrigados a sempre manter os faróis acessos. Outro item que tem gerado calorosas discussões é o da permissão para caminhões em trânsito através dos países do Mercosul. Um caminhoneiro brasileiro, por exemplo, está autorizado apenas a fazer a entrega em uma única cidade de destino. A seguir, tem que retornar ao Brasil. Não pode fazer fretes para outras cidades de países do bloco, a menos que consiga obter nova documentação através de um despachante CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 35 CHARLES SILVA DUARTE/O TEMPO/FUTURA PRESS que 4.000 caminhões brasileiros e chilenos transportaram 1,3 milhão de toneladas entre os dois países em 2005 “Caminhoneiro avulso pode usar a permissão da empresa idônea para transportar munições” WEBER GIRARDI COORDENADOR-GERAL DA ULTRACARGO local, operação que onera bastante os custos do transporte. Até pouco tempo, o governo argentino pretendia exigir compensação de veículos brasileiros e chilenos em trânsito por seu território. “Os argentinos definiram previamente certas rotas de transporte que deveriam obrigatoriamente ser utilizadas e chegaram a impedir a circulação de caminhões brasileiros e chilenos. As negociações vão permitir que esse problema seja resolvido em breve”, diz Ofugi, que também é diretor da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Para Sônia Rotondo, a preocupação excessiva com a proteção dos interesses nacionais é que vem levando à adoção de medidas restritivas. “Num mercado comum, os nacionais têm que agir em defesa do bloco e não dos interesses exclusivos de seu país”, diz a advogada. No ano passado, caminhoneiros da Ultracargo foram obrigados a fazer desvio de cerca de 200 km da rota traçada pela empresa, para atender a ordens de autoridades de trânsito, que limitavam o trânsito de veículos brasileiros e chilenos nas proximidades da cidade argentina de Rosário. Dados dos departamentos de trânsito argentinos indicam que 4.000 caminhões brasileiros e chilenos transportaram 1,3 milhão de toneladas de produtos no ano passado entre os dois países e, segundo autoridades argentinas, usufruíram “gratuita- mente” da infra-estrutura de transporte. “Os argentinos estão apenas se esquecendo de que os caminhoneiros pagam pedágios e consomem óleo diesel. Já existe a contraprestação”, diz Sônia Rotondo, que também integra a delegação brasileira do subgrupo de transportes do Mercosul. O projeto do subgrupo de transportes prevê que as atuais empresas permissionárias possam incluir número ilimitado de autônomos em seus quadros. “O mais preocupante é que não se tem muito controle sobre esses autônomos. Um caminhoneiro avulso de má índole pode usar a permissão da empresa idônea para transportar até munições durante o retorno ao Brasil. Por isso, a Ultracargo apenas faz transporte internacional com frota própria”, diz Weber Girardi. Essa parece ser mais uma questão controvertida nas negociações. “O problema é de interpretação. O texto em espanhol do acordo diz que o transporte internacional rodoviário de cargas no Mercosul só pode ser feito por empresas permissionárias, mas admite que as empresas tenham em sua frota veículos em sistema de leasing. O texto em português é mais abrangente e menciona ‘leasing e arrendamento’. Ou seja, incluiu o arrendamento. Isso tem gerado grande desinformação. Acordo é como um bom negócio: tem que ser bom para 36 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 DENIS FERREIRA NETTO/ FUTURA PRESS SOLICITAÇÃO Documento assinado por brasileiros pede o fim da reserva de mercado na cabotagem todas as partes”, afirma Sônia Rotondo. O tanque de combustível adicional (ou reserva) é outro quesito discutido no subgrupo de Transportes do Mercosul. Os pac-tuantes pretendem uniformizar o uso de tanques complementares, sem desrespeitar a estrutura e capacidade de volume trans-portador de cada veículo. A delegação brasileira propôs que a norma fosse semelhante à estipulada pelo Contran (Conselho Nacional de Trânsito). A lei brasileira, que passou a vigorar em setembro do ano passado, permite que cada caminhão possa ter quantos tanques complemen-tares desejar, desde que a capacidade de todos seja de no máximo 1.200 litros – o limite dos tanques instalados em reboques e semi-reboques é de 350 litros. Além disso, exige-se do interessado extensa documentação que comprove a segurança do veículo. “O problema é que o custo do diesel na Argentina é menor do que no Brasil. Como não existe norma no Mercosul para regulamentar o uso de tanques suplementares, as empresas argentinas conseguem cumprir dois ter-ços da viagem com o abastecimento em seu país, o que as torna mais competitivas”, diz Sônia Rotondo. CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 37 ATRASO Acordo sobre transporte de encomendas não está em vigor As regras para o transporte de encomendas em ônibus de linhas internacionais regulares são a prova cabal de que a internalização dos acordos do Mercosul é mesmo um obstáculo para a otimização do setor. “Após longos anos de negociação, foi realizado um acordo em outubro de 2005, que não está vigorando porque os países do bloco ainda estão estabelecendo os procedimentos operacionais”, diz Noboru Ofugi, o negociador brasileiro do subgrupo de transportes do Mercosul. Os termos do acordo parecem que vão demorar mesmo muito tempo para sair do papel. “Desconheço qualquer mudança no procedimento. Para nós, o que vale são as atuais regras e nela só existem bagagens. Cada passageiro pode portar até três volumes e, em caso de compra de produtos no Paraguai, no retorno, tem que respeitar O novo acordo estipula também novas regras para o transporte de produtos perigosos. Os transportadores vão ter que identificar os produtos através de um número fornecido pela ONU (Organização das Nações Unidas). A legislação de trânsito argentina é bastante flexível para o transporte de produtos perigosos. “Os caminhões da Ultracargo que transportam acrilato de butila (líquido inflamável usado na fabricação de tintas) são monitorados até pelo Exército em estradas brasileiras. Basta cruzar a fronteira da Argentina a cota de US$ 300. Desconhecemos o que são encomendas”, diz o supervisor-geral de operações da Delegacia da Receita Federal em Foz do Iguaçu, Gilberto Buss. O acordo prevê que as encomendas (tudo o que não for bagagem), como malotes de correios, pacotes e embalagens de empresas comerciais, sejam colocadas em contêineres padronizados, de fibra de vidro ou alumínio. O peso total da carga não pode ultrapassar 50 kg. “Os contêineres devem ser lacrados para evitar o descaminho. O lacre só pode ser retirado por agentes da Receita Federal de cada país”, diz Walter Cunha, consultor da empresa Pluma Conforto e Turismo, que tem linhas de passageiros para a Argentina, Uruguai e Paraguai. “As normas do acordo serão benéficas quando estiverem em prática. É o resultado de uma batalha de pelo menos dez anos. Ganha o O Brasil importou 4,7 mi de toneladas de trigo da Argentina em 2005 transportador e até mesmo a fiscalização será facilitada”, diz Cunha. Buss admite que a fiscalização atual é “complicada” e feita por amostragem. De cada 20 veículos que passam na fronteira, apenas um é fiscalizado. “Mesmo assim, conseguimos apreender 700 ônibus e evitar um rombo fiscal de US$ 62 milhões em produtos eletrônicos, de informática, brinquedos e cigarros não declarados”, diz o supervisor. Para Cunha, as encomendas representam uma porcentagem mínima nos lucros das empresas de ônibus. “Existe uma idéia disseminada no mercado de transportes de que as empresas de ônibus são concorrentes dos transportadores de cargas. Isso é um grande equívoco porque a limitação de peso e volume nos ônibus é muito grande. As bagagens dos passageiros são prioritárias. Não há como competir.” para que os caminhoneiros transitem sem nenhuma proteção até a cidade de Rafaela, na província de Santa Fé, a cerca de 500 km da divisa”, afirma Weber Girardi. MAR AGITADO As discussões também estão mais do que aquecidas quando se trata de transporte marítimo de cargas. Um documento assinado pela associação de usuários, importadores e exportadores brasileiros solicita o fim da reserva de mercado na cabotagem (navegação entre portos do mesmo país). Já os termos do acordo, aprovados por armadores brasileiros e pela Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), prevê a ampliação da reserva já existente. ”Os efeitos do aumento da reserva serão a redução da competitividade das exportações brasileiras de minério de ferro para a Argentina e o aumento do trigo consumido no Brasil, que no ano passado importou 4,7 milhões de toneladas de trigo da Argentina”, diz um documento, assinado por nove entidades reunidas pela CNI (Confedera- 38 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 A legislação de trânsito argentina é bas PESSIMISMO Bloco vive crise de identidade Na avaliação do professor, escritor e consultor do Grupo Aduaneiras para o comércio exterior, Samir Keedi, o Mercosul está passando por uma crise de identidade envolvendo principalmente a Argentina e o Uruguai. “A Argentina ainda não se livrou dos problemas da crise que assolou o país em 2002, e o Uruguai, recentemente, negociou um acordo comercial com os EUA”, diz o professor. Segundo ele, o Mercosul precisa ser refundado e os países devem se conscientizar da importância do bloco, o que não acontece desde a sua fundação, há 15 anos. Para o especialista, a aproximação da Venezuela, dos EUA e do Mercado Europeu, um outro assunto na pauta de discussão entre os países participantes do bloco, é positiva. “A melhor forma de desenvolvimento da economia de um país é a procura do relacionamento através de acordos comerciais de preferências tarifárias e de livre comércio”, diz Keedi, que propõe até a criação da ASALC (Associação Sul-Americana de Livre Comércio) e que também defende a criação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas). As novas inclusões de países ao bloco, entretanto, são vistas com ressalvas pela advogada da NTC, Sônia Rotondo. “Sob o aspecto exclusivo do transporte, não se deve nutrir muita expectativa com o acesso de Venezuela, Peru ou Bolívia ao Mercosul. Existe uma deficiência de infra-estrutura de transporte muito grande nesses países. Será muito difícil que cumpram as normas existentes em futuros acordos”, diz a advogada. De acordo com ela, nem mesmo as normas firmadas no ATIT de 1999 estão sendo cumpridas pela Venezuela. A crise cambial é outro entrave ao entendimento entre os integrantes do bloco. “Com o real supervalorizado, não há como equilibrar as contas recebendo em dólares e gastando em real. Os fretes são negociados em dólares e as despesas, pagas em reais. O peso está desvalorizado (cada dólar custa 3 pesos) e, com isso, a Argentina acaba conseguindo competitividade muito maior do que o Brasil”, diz Sônia Rotondo. FISCALIZAÇÃO Operação da Polícia Rodoviária Federal busca diminuir ção Nacional da Indústria). A reserva de mercado na cabotagem existe há mais de 30 anos. No Mercosul, a navegação de cabotagem somente pode ser realizada por embarcações construídas no próprio país. “Com isso, surgiram vários cartéis. As empresas que detêm a propriedade dos navios são protegidas da competição com os navios estrangeiros, maiores e mais eficientes, tornando os fretes bem mais caros”, diz o almirante José Ribamar Miranda Dias, vice-presidente executivo da Anut (Associação Nacional dos Usuários de Transporte de Cargas), que também endossou o documento remetido ao subgrupo de Transpor- CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 39 tante flexível para o transporte de produtos perigosos REGINALDO PEREIRA/AG. A TARDE/FUTURA PRES de carga, seria necessário o uso de 500 caminhões. CRONOLOGIA DOS ACORDOS TODOS DE ACORDO 1966 Assinado o Convênio de Transporte Internacional Terrestre 1980 Brasil e Argentina criam o Pice (Programa de Integração e Cooperação Econômica) e depois assinam o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento. São assinados 24 protocolos em diversas áreas como bens de capital, trigo, produtos alimentícios, indústria automotriz, cooperação nuclear e transporte terrestre 1989 Assinado o ATIT (Acordo sobre Transporte Internacional Terrestre), entre Brasil, Chile, Paraguai, Uruguai, Argentina, Bolívia e Peru, que substituiu o antigo Convênio de Transporte Internacional Terrestre 1990 o tráfego de cargas de produtos perigosos Os acordos estipulados no Pice foram absorvidos pelo Acordo de Cooperação Econômica Nº 14. Em março, nasceu o Mercosul. Também é internalizado o ATIT no Brasil 1991 tes do Mercosul pela CNI. De acordo com Miranda, a abertura do mercado aumentaria a competitividade porque um navio pequeno, de mil contêineres, pode transportar até 15 mil toneladas enquanto, na rodovia, um caminhão transporta uma carga máxima de 30 toneladas. Para se transportar a mesma quantidade As cotas de transporte entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai são eliminadas. Entrou em operação o Siscomex (Sistema Integrado de Comércio Exterior), que acelerou os trâmites burocráticos na adequação às normas aduaneiras 1991 É assinado um ATIT entre Brasil e Venezuela FONTE: NTC É ponto pacífico, e não causa polêmica nas reuniões, a importância estratégica do Mercosul para os países pactuantes. Segundo estatísticas da ANTT, o valor das trocas comerciais entre o Brasil e seus parceiros no Mercosul cresceu 198,4% entre 1992 e 2005 e passou de US$ 6,3 bilhões para US$ 18,8 bilhões, um salto de 3,6 milhões para 28,4 milhões de toneladas, com um crescimento de 116,8%. “Sem o Mercosul, provavelmente a corrente de comércio exterior brasileira seria menor que a atual já que, com o imposto de importação, o comércio não seria tão intenso. O saldo é positivo para o transportador. Quanto mais venda, mais transporte, já que não há como realizar venda de mercadorias sem um modal de transporte viável”, diz o professor, escritor e consultor para o comércio exterior do Grupo Aduaneiras, Samir Keedi. Os dados da NTC indicam que até 1990 existiam no Brasil 45 empresas habilitadas para operar no transporte internacional. Depois de 15 anos do Mercosul, já chegam a 570 as empresas habilitadas. t MACOR/DIVULGAÇÃO CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 SEGURANÇA ANJOS DA GUARDA SISTEMAS DE RASTREAMENTO MOVIMENTAM R$ 392 MILHÕES POR ANO PARA EVITAR ROUBOS POR EDSON CRUZ ara se defender da pirataria do asfalto, as transportadores têm se valido de um exército armado até os dentes nas rodovias. Modernos sistemas de segurança com monitoramento via satélite 24 horas, uso de escolta armada e investimento em seguros têm onerado os fretes em até 15%. “Quem não se previne fica órfão dos bandidos”, diz Paulo Rogério Rizo, gerente-geral de uma das maiores empresas de segurança do Brasil, a Macor Security. A oferta de rastreamento por satélite tem ajudado até caminhoneiros autônomos a conseguir um preço melhor pelos fretes. “Os bandidos estão evitando atacar quando vêem adesivos de ‘veículo rastreado por satélite´ espalhados em diversas partes da carroceria dos caminhões. O problema é que alguns caminhoneiros estão ten- P tando enganar o cliente ou despistar os assaltantes encomendando adesivos a confecções e os afixando nos caminhões, mas os ladrões sabem quando um caminhão está ou não realmente rastreado por satélite”, diz Rizo. Uma das maneiras utilizadas pelos bandidos é a sondagem nos próprios caminhões para ver se eles possuem antenas, transmissores ou teclados. Estima-se que apenas 5% dos cerca de 1,4 milhão de caminhões que trafegam pelas rodovias brasileiras são dotados dessa tecnologia. Mesmo com essas restrições, o mercado de seguros para o transporte de cargas cresceu tanto com a pirataria do asfalto que, entre janeiro e novembro de 2005, o setor movimentou cerca de R$ 392 milhões, segundo a gerência de estatísticas da Susep (Superintendência de Seguros Privados), autarquia vinculada ao Ministério da Fa- 41 42 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 FOTOS PAULO FONSECA RICARDO SÁ SAIBA MAIS SOBRE SEGURANÇA Como funciona o rastreamento 1 Satélites que estão em órbita da Terra, numa altitude de 21 mil km, transmitem continuamente informações de tempo e distância 3 2 Receptores de satélite usam as informações para calcular a localização, através de coordenadas geográficas, de um caminhão, por exemplo 4 POLÍCIA Essas informações têm que ser retransmitidas para uma central de gerenciamento para que o processo se concretize BLOQUEIO ALARMES Acionada, a central pode ligar alarmes, bloquear o veículo e acionar a polícia, municiada com as informações de localização Os sistemas GPS CELULAR TECNOLOGIA Motorista consulta informações através do sistema GPS zenda e responsável pelo controle e fiscalização do mercado de seguros. Ótimo para as seguradoras, mas prejuízo para os transportadores, que deveriam dividi-lo com o governo federal, em tese, maior responsável pela segurança nas rodovias brasileiras. O grande inibidor é o alto custo. Um rastreamento eficiente não sai por menos de R$ 400 mensais por veículo. O pacote inclui monitoramento 24h, bloqueio através do controle do sistema de injeção de combustível, botões de pânico e sensores que impedem, por exemplo, que a porta do caminhão fique aberta por mais de 80 segundos. Atualmente, são três os rastreadores mais utilizados no mercado (ver quadro). A Patrus Transportes Urgentes, uma das maiores empresas do país no ramo de transportes fracionados, cargas altamente visadas pelas quadrilhas especializadas, afirma não registrar nenhum sinistro há dois anos. “Apesar de os produtos transportados serem bastante cobiçados, a alta tecnologia empenhada no gerenciamento de risco no transporte de cargas nos dá segurança plena”, diz o gerente de operações da empresa, Evoir José Kohl. A Patrus, que possui uma frota de 160 caminhões próprios e 300 caminhoneiros agregados, transporta 14 mil toneladas mensais. “A maior vantagem do monitoramento via satélite é que o sistema diminuiu a responsabilidade do caminhoneiro sobre a carga. Ele sabe que há um anjo da guarda acompanhando todos os Sistema: É o genuíno sistema via satélite. O sistema obtém as informações de coordenadas geográficas e as transmite, a cada 1h, por satélite, para a central de gerenciamento Sistema: Baseia-se na estrutura existente das empresas de telefonia móvel, com antenas com rádio-transmissores. A transmissão de informações sobre a localização do veículo para a central de gerenciamento se dá a cada 5min Vantagem: Rapidez na transmissão Vantagem: Abrangência total Desvantagem: Alto custo Desvantagem: Só funciona na área de cobertura das antenas das operadoras Custo: R$ 400/mês por caminhão Custo: R$ 100/mês por caminhão HÍBRIDO (Celular + GPS) Sistema: É o mais utilizado no momento. Na área onde não há cobertura por operadoras de celular, é acionado o sistema GPS, o que garante um bom custo-benefício Fonte: CESVI Vantagens: Abrangência e rapidez Desvantagem: Custo do equipamento Custo: R$ 300/mês por caminhão CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 43 ESCOLTA ARMADA Modalidade está em expansão no mercado de segurança Quando o valor agregado da carga supera a cifra de R$ 100 mil há consenso sobre a necessidade de utilização de escolta armada. “Hoje, está havendo uma migração na criminalidade. Em vez de assalto a bancos, roubo de cargas. Para os criminosos, os riscos são menores e há cargas que superam R$ 1 milhão”, diz o gerente-geral da Macor, Paulo Rogério Rizo. Criada em 1995, é a maior empresa do país especializada em escolta de cargas. Para atender a uma carteira de clientes, que inclui as Casas Bahia, a Macor dispõe de uma milícia formada por 250 viaturas e 700 homens. “Quinzenalmente, nossos funcionários passam por cursos de reciclagem. A ban- didagem está cada vez mais preparada e a gente tem que estar um passo a frente dela”, diz. A escolta padrão realizada pela Macor para até dois caminhões inclui dois seguranças armados com coletes à prova de bala e um veículo identificado. Com o mercado em expansão, a empresa realiza 3.800 escoltas por mês – cerca de 130 por dia. A Macor tem crescido 30% ao ano e hoje fatura R$ 2,2 milhões por mês. A atenção dos vigilantes é redobrada em trechos distantes até 150 km das capitais. “Pelas estatísticas, é a faixa de maior risco de assaltos”, diz o gerente. A empresa mantém sigilo em relação a valores, revelados apenas mediante proposta escrita de contratação dos serviços. Um cliente revela que, em perímetro urbano, a Macor cobra cerca de R$ 230 por três horas de serviço. Em trajeto rodoviário acima de 300 km, o custo gira em torno de R$ 2 por km rodado. Rizo admite que a escolta armada é o grande “osso” do mercado de segurança porque poucas empresas conseguem prestar os serviços a preço competitivo. “O preço da Macor é baixo porque a empresa dispõe de posto de gasolina próprio, estacionamento e toda infra-estrutura”. Ele afirma ainda que os serviços fornecidos por uma escolta armada garante segurança de quase 100% aos contratantes. “Temos um cliente que arcava com UM BOM RASTREADOR CHEGA A CUSTAR ATÉ R$ 400 MENSAIS POR VEÍCULO SEGURANÇA Central de monitoramento da Cesa Logística R$ 700 mil mensais de prejuízo apenas com roubos de cargas. Há nove anos, por um custo bem baixo, ele acabou com a dor de cabeça.” Porém, a audácia das quadrilhas especializadas em roubo de cargas tem sido tão grande que até mesmo veículos com escoltas não estão totalmente isentos de problemas. Em 2005, a seguradora Porto Seguro fechou uma cobertura total para uma carga de R$ 1 milhão em eletroeletrônicos de um antigo cliente. A seguradora exigiu escolta armada, mas teve que enfrentar a ação de uma quadrilha especializada. Os criminosos conseguiram render a escolta e roubaram toda a carga. seus passos e, por isso, nem pensa em reagir a assalto”, diz Rizo. Outra transportadora que investe muito em segurança é a Cesa, uma das cinco maiores operadoras de logística do país. Os mais de mil caminhões da empresa são rastreados 24 horas por satélite. A Cesa possui estrutura própria de monitoramento com equipes em revezamento. Além disso, os motoristas têm recebido treinamento especial. “Eles são proibidos de parar em área de risco. Toda a viagem é planejada com pré-definição de locais de paradas e pernoites. Nos pontos mais críticos, limitamos inclusive o horário de circulação dos veículos”, diz Arthur Barbosa, gerente de risco da empresa. Coordenador técnico do Cesvi 44 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 "A tecnologia empenhada no gerenciamento de risco nos dá plena segurança" EVOIR JOSÉ KOHL VIA SATÉLITE Caminhão equipado com sistema GPS (Centro de Experimentação e Segurança Viária), Paulo Barrachina, diz que o mercado evoluiu bastante nos últimos cinco anos. “Surgiu até uma nova profissão, o gerenciador de riscos.” O profissional faz estudos amplos sobre o tipo de carga a ser transportada, o trajeto a ser percorrido pelo caminhão, pontos de paradas para descanso e pernoite, idoneidade e habilidade do condutor e o melhor tipo de rastreamento a ser utilizado. Apesar de toda a parafernália disponível no mercado, o monitoramento via satélite não é totalmente isento de riscos. Há pouco tempo, na rodovia Anhangüera, um caminhão que era monitorado por satélite foi assaltado e a empresa que fazia o gerenciamento não percebeu o sinistro. “Havia um sensor de abertura de portas no veículo, mas o ladrão entrou por uma janela”, diz a gerente de transporte da Porto Seguro, companhia de seguros que cobria a empresa, Rose Matos. Como diferencial para seus clientes, a partir dessa ocorrência, a seguradora criou uma empresa própria de gerenciamento de riscos que faz o monitoramento via satélite. “A carga dificilmente seria roubada GERENTE DE OPERAÇÕES DA PATRUS TRANSPORTES URGENTES se existisse um sensor no banco do carona”, diz Barrachina. Com o crescimento do mercado de equipamentos de segurança para cargas, surgiu o “vírus de carga”, desenvolvido pela empresa Easy Track, especializada em rastreamento portátil. Um rastreador de pequenas proporções é colocado em um ponto estratégico da carga. Se for roubada, o sistema, conhecido também como “vírus do bem”, permite a localização dos volumes transportados. De acordo com Barrachina, já há disponíveis no mercado outros rastreadores que funcionam através de etiquetas com sensores, como os existentes nas principais lojas de departamentos do país. “Todos os produtos transportados são etiquetados e, além de garantir a segurança, a empresa pode fazer o acompanhamento da logística de distribuição e conhecer o destino de seus produtos.” O professor Maurício Lima, coordenador de cursos do Centro de Estudos Logísticos do Coopead-UFRJ (escola de pós-graduação em negócios), afirma que o principal problema é a forma de escoamento dos produtos porque, no Brasil, transitam pelas rodovias mais de 70% de tudo do que se consome. “Se os transportes ferroviário, aéreo, hidroviário e de cabotagem fossem mais utilizados, a segurança poderia ser maior e haveria redução nos gastos com equipamentos eletrônicos e mãode-obra”, diz. Ele alerta, no entanto, que já existem quadrilhas especializadas em roubo de cargas atuando à beira de ferrovias. Uma das 15 principais do ranking de seguradoras com maior carteira de clientes no ramo de transporte de cargas, de acordo com a Susep, a Porto Seguro é muito exigente no fechamento dos contratos. “Há clientes que dizem que nem precisam de seguro com tantas opções de equipamentos, mas ressaltamos que o melhor mesmo é a confiabilidade do consumidor final. Garantimos que a carga vai chegar ao destino. Isso vale mais que qualquer indenização”, diz Rose Matos, gerente da companhia. Há determinados clientes que não conseguem ter sua carga segurada na Porto Seguro. “Não fazemos seguros para cigarros e há muitas restrições para eletroeletrônicos, pneus e medicamentos. Apenas algumas seguradoras continuam a correr determinados riscos”, diz Rose. Das 35 seguradoras que atuam no ramo, apenas seis aceitam fazer seguro para as cargas mais visadas pelas quadrilhas especializadas. t CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 IVONALDO ALEXANDRE/ GAZETA DO POVO/ FUTURA PRESS 46 TRANSPORTE MARÍTIMO ESTABILIDADE AMEAÇADA ÁGUA DE LASTRO VIRA PREOCUPAÇÃO MUNDIAL PELOS RISCOS AMBIENTAIS E ECONÔMICOS POR CERCA DE 7.000 ESPÉCIES CIRCULAM NA ÁGUA DE LASTRO PELA FROTA MUNDIAL Q FLÁVIO HENRIQUE SILVEIRA uem já ouviu falar em água de lastro? O termo certamente não é dos mais populares, principalmente para quem não vive em áreas litorâneas. Trata-se, porém, de um procedimento que, quando não é bem realizado, pode gerar transtornos ambientais, econômicos e até afetar a saúde. Todo navio de carga, quando desembarca seu produto em algum porto, precisa recolher água do oceano para manter a estabilidade durante a navegação no trajeto de volta. Se não fizer isso, a embarcação corre o risco de partir-se ao meio e naufragar. A água, recolhida ou despejada, precisa ser oceânica – nunca costeira – para transportar o mínimo possível de organismos, que, fora de seu ambiente natural e com condições favoráveis de desenvolvimento (clima propício e ausência de predadores), podem provocar estragos ao novo ecossistema em que chegam. A água de lastro é um componente indispensável à navegação internacional. Não há tecnologia que a substitua. Justamente por essa importância, a questão tem ganhado corpo nos últimos anos, e tem sido tema de estudos e discussões na IMO (Organização Marítima Internacional). De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA), o pro- SUSPEITA O Porto de Paranaguá, blema é um dos quatro maiores a afetar os oceanos do mundo. Especialistas consultados não chegam a um consenso quanto à solução para diminuir as conseqüências negativas da troca de lastro, tanto na esfera dos impactos ecológicos quanto nos socioeconômicos e de saúde. No entanto, não há dúvidas quanto à necessidade de conscientização dos agentes de navegação e portuários, aliada ao cumprimento de diretrizes e regulamentações na operação de troca. A IMO realizou no ano passado a Conferência Internacional de Controle e Gestão da Água de Lastro, que lançou diretrizes sobre o assunto. De acordo com o no Paraná. sofreu um surto de cólera em 1999, mas não possivel provar que o microorganismo causador da doença, era originário de água de lastro oceanógrafo Róbson José Calixto, assessor para questões de poluição marinha do MMA, baseada nas diretrizes do encontro, a Marinha Brasileira promulgou, em outubro de 2005, a Norma da Autoridade Marítima (Norman 20), uma série de regras e procedimentos para regulamentar a troca de lastro no país, visando impedir a proliferação de espécies exóticas e patogênicas nas costas brasileiras. A Norman 20 passou a exigir dos navios que aportam no Brasil o preenchimento de formulários com informações sobre o lastro. Além disso, a norma regulamenta três métodos para a troca em áreas oceânicas, além de procedimentos sobre a opera- ção e sobre a fiscalização. A Norman 20 prevê penalidades e multas que podem variar de R$ 1.000 até R$ 50 milhões. Rubens Lopes, biólogo da USP (Universidade de São Paulo), diz que cada país deve avaliar as normas da convenção internacional antes de adotá-la, de acordo com as especificidades de seu território. Segundo Lopes, a adoção de algumas normas podem não ser necessárias, já que nações com economias fragilizadas precisam afrouxar regras para não deixar de receber ou exportar cargas. Seria o caso da norma que determina a troca de lastro a 200 milhas da costa. Lopes afir- ma que ela “depende da geografia de cada local. Pode ser, por exemplo, necessária para a região Sudeste do Brasil, onde a costeira é mais larga. Uma quantidade de milhas menor poderia ser suficiente para as regiões Leste e Nordeste, com costeira estreita. Em distância menor já se chega a profundidades muito grandes, nas quais é adequado fazer o lastro”. Ele salienta, entretanto, que a troca de lastro tem de ser realizada longe da região costeira, que comporta mais microorganismos que o alto-mar. Para o biólogo da USP, que já coordenou o Informe Nacional sobre Espécies Exóticas Invasoras, não há estatísticas confiá- veis sobre água de lastro no Brasil. Lopes participou de uma pesquisa, em 2001, com formulários fornecidos por embarcações que atracavam no Brasil, contendo informações como tipos de tanque de lastro e histórico da água proveniente da troca. “Um dos problemas que encontramos nesses formulários é que muitos estavam praticamente ilegíveis, pois eram feitos à mão. Outros não estavam escritos em inglês, mas em línguas de difícil compreensão. Outro problema é o fornecimento de informações provavelmente inverídicas, quando comparadas com amostragens de água de lastro recolhidas dos navios. Havia, por exemplo, for- 48 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 A cada nove semanas uma espécie mari mulários afirmando que havia sido feito a troca oceânica, com amostras de água tipicamente costeira, com baixa salinidade. Esse é um dos principais problemas do gerenciamento: até que ponto as informações prestadas são confiáveis.” Alexandra Sofia, superintendente de qualidade, meio ambiente e normatização do porto de Santos, diz que, apesar de ser o maior da América Latina, ainda não dispõe de dados e estatísticas sobre quantas e quais espécies invasoras chegam ao litoral por meio da água de lastro. Ela diz que o porto tem diretrizes específicas para o gerenciamento do lastro, mas que os navios geralmente seguem as normas internacionais. Lopes, da USP, acredita que vai haver maior conscientização dos profissionais a partir da Norman 20 devido às penalidades e multas. “A possibilidade de que a embarcação tenha que desatracar para trocar a água de lastro e só depois retornar é muito grande. É um problema econômico sério para qualquer embarcação. Essa pressão financeira será positiva”, diz. Segundo Sofia, a maioria dos agentes de navegação sabe das conseqüências de um lastro mal feito. Ainda de acordo com ela, técnicos de fiscalização já flagraram navios “delastrando” em locais não-permitidos em Santos. Como as diretrizes ainda não permitiam a aplicação de multas, os infratores eram chamados para explicações, e a seguir liberados. Calixto, oceanógrafo do MMA, destaca a importância de haver nos portos meios que cruzem sistemas de rotas, para identificar possíveis espécies que venham a ser introduzidas no país. Ele lembra também que é preciso conhecer o litoral para determinar as áreas onde os lastros não deveriam ser feitos. Já o professor Lopes destaca a necessidade de infra-estrutura que permita o monitoramento das embarcações nos portos. “A estrutura dos portos deveria ser complementada por uma rede de instituições de pesquisa que fornecesse apoio à Marinha e à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), pois não é possível implantar em cada porto laboratórios para realizar a amostragem de água de lastro.” Marcelo Felga, gerente de infra-estrutura, meio de transporte e controle de vetores da Anvisa, diz que o órgão tem uma planilha de controle para verificar a procedência da embarcação a fim de evitar a entrada de agentes patogênicos no Brasil por meio da água de lastro. “Verificamos se o país de origem tem relatos de ocorrência de doenças hídricas e enviamos amostras para o laboratório analisar.” O órgão, que trata exclusivamente das conseqüências da invasão de or- ganismos que possam afetar a saúde humana, fiscaliza as embarcações estrangeiras por meio de exame em laboratórios de amostragens de água de lastro. INVASORES O Brasil tem registrado casos de aparecimento de espécies invasoras em seu território. Em 1999, por exemplo, houve um surto de cólera no porto de Paranaguá, no Paraná. Na época, segundo Calixto, não foi possivel provar que o vibrião do cólera, microorganismo causador da doença, era originário de água de lastro, “mas a possibilidade revelou-se enorme”. “Felizmente, o CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 49 nha invade um novo ambiente SAIBA MAIS SOBRE A ÁGUA DE LASTRO O que é Prevenção e tratamento É a água recolhida no mar e armazenada em tanques nos navios, para dar estabilidade de navegação quando estão navegando sem cargas Um sistema de gerenciamento e controle pode reduzir a probabilidade de introdução de espécies indesejáveis. A troca de água de lastro em alto-mar (profundidade superior a 500m) é um dos mais efetivos métodos preventivos, já que o meio ambiente oceânico não serve de habitat a organismos de águas costeiras Função Em alto-mar, um navio sem lastro pode ficar descontrolado, correndo até o risco de partir ao meio e afundar. A água de lastro compensa perda de peso de carga e de combustível, regulando a estabilidade e mantendo a segurança. A troca nos portos Quando um navio está descarregado, seus tanques recebem água de lastro para manter sua estabilidade, balanço e integridade estrutural. Ao atracar em outro porto para ser carregado, a água é lançada ao mar Risco água de lastro descarregada em Buenos Aires em 2000, e aportou no Brasil através da bacia do rio Paraná. No ano seguinte, sua presença já havia sido detectada na barragem da Usina de Itaipu, onde teria chegado através das águas do Paraná, provavelmente incrustado no casco de pequenas e médias embarcações que tiveram contato com o molusco na Argentina ou em Porto Alegre. O mexilhão dourado tem causado sérios transtornos em alguns lugares, chegando até mesmo a obrigar a parada das máquinas de geração de energia hidrelétrica na usina de Porto Primavera, em São Paulo, em 2002. Segundo a bióloga Maria Cristina Dreher Precisa ser seguro, prático, de baixo custo e ambientalmente aceitável. Diversos métodos vêm sendo testados, entre eles a filtragem, o tratamento térmico, aplicação de biocidas, tratamento elétrico, ultravioleta, acústico, de oxigenação e biológico História Os navios carregaram lastro sólido, na forma de pedras, areia ou metais, por séculos. Nos tempos modernos, as embarcações passaram a usar a água como lastro, o que facilita bastante a tarefa de carregar e descarregar, além de ser mais econômico e eficiente do que o lastro sólido O MEXILHÃO DOURADO QUE VEIO DA CHINA IMAGENS MARIA CRISTINA DREHER MANSUR vibrião encontrado em Paranaguá não era patogênico e não havia quantidade suficiente do microorganismo para causar doenças.” Calixto afirma que é praticamente impossível impedir a entrada de espécies exóticas nos tanques de lastro das embarcações. “Além de organismos maiores, há sempre a presença de microorganismos, de fitoplâncton, pequenas algas e bactérias que vivem dispersos na água e que servem de alimentação aos organismos maiores.” O caso do mexilhão dourado é, até agora, a mais grave invasão de espécies exóticas no Brasil. Originário da China, o molusco chegou à América do Sul em Uma das grandes ameaças ao equilíbrio marinho. Transfere organismos exóticos e causa danos aos ecossistemas marinhos, à saúde humana, à biodiversidade e às atividades pesqueiras Opções de tratamento LARVA MEXILHÃO A figura mostra como o molusco (em estágio larval microscópico) seria transportado na água de lastro dos tanques das embarcações. Incrustado no casco de pequenas e médias embarcações, o mexilhão dourado está se disseminando por rios e lagoas do sul do Brasil. FONTES: MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE | PORTO DE SANTOS | MARIA CRISTINA DREHER MANSUR 50 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 FOTOS RODRIGO DE FILIPPO/FURNAS ESPÉCIES INVASORAS Transferência causa desequilíbrio Dados da IMO indicam que são transportadas cerca de 7.000 espécies invasoras através da água de lastro em todo o mundo. Os prejuízos causados pelos organismos estranhos ao ecossistema são muitos, principalmente os ambientais. O biólogo Rubens Lopes, da USP, afirma que organismos indesejáveis, como o mexilhão dourado asiático, causam mudanças terríveis no ecossistema, ocupando e destruindo habitats de outros seres vivos. Já o biólogo Rodrigo De Filippo diz que o mexilhão dourado, bem adaptado ao ecossistema brasileiro, atua como filtrador em estações de piscicultura, devorando todos os organismos microscópios que na água servem de alimento a outras espécies, provocando principalmente a morte de peixes nativos. Ainda de acordo com o biólogo, uma espécie exótica pode se adequar muito bem a determinados ambientes estra- nhos, devido à ausência de predadores naturais. Algumas espécies de corais que disputam espaço com gêneros nativos, podem igualmente provocar danos ecológicos. No Brasil, corais exóticos têm se expandido na costa do Rio de Janeiro, nas regiões da Ilha Grande e Arraial do Cabo. Caso recente de desequilíbrio foi registrado em Guaraqueçaba, no litoral do Paraná, quando uma maré vermelha (fenômeno ocasionado por espécies de microalgas exóticas) contaminou e matou muitos peixes da região. Estudos demonstraram que as algas provavelmente chegaram à costa brasileira em água de lastro. O mexilhão zebra, introduzido pela água de lastro de embarcações na região dos Grandes Lagos, nos Estados Unidos, está atualmente disseminado por cerca de 40% das águas continentais norte-americanas. MEXILHÕES NAS USINAS Grades de captação de água... ... sistemas de filtragem com apenas um mês de operação... ... e as tubulações não escapam da proliferação do molusco Mansur, do Museu de Ciências e Tecnologia da PUC (Pontifícia Universidade Católica, RS) “a situação do mexilhão dourado no lago Guaíba, perto de Porto Alegre, está fora de controle. Ele continua a se aglomerar e a entupir tomadas de bombas captadores de água para o abastecimento dos municípios da Grande Porto Alegre e, também, em termoelétricas e captadoras que se abas- tecem de água no baixo rio Jacuí, nas proximidades da capital”. O combate à proliferação do mexilhão dourado no país tem se limitado ao reservatório das usinas, pois os moluscos afetam os sistemas de resfriamento das hidrelétricas. O biólogo Rodrigo De Felippo, de Furnas Centrais Elétricas, explica que “apesar do molusco já estar disseminado na bacia do Paraná, há alternativas de controle, mas não é mais possível erradicá-lo porque teríamos que lançar veneno muito tóxico nas águas dos rios.” De Felippo afirma que o mexilhão dourado se adaptou muito bem ao habitat brasileiro, e continua se alastrando em direção ao centro do país, mas poucos percebem a gravidade do problema. “Por enquanto, o molusco está subindo o rio Paraná, divisor de águas com outras bacias, como São Francisco, Tocantins e a do rio Amazonas. Por estar viajando contra a corrente, até o momento precisa do casco das embarcações para ser transportado. Quando chegar a novas bacias hidrográficas, vai conseguir se locomover sozinho, com a correnteza a favor. A partir daí, o problema vai ficar muito mais sério.” t 52 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 ASFALTO INTELIGENTE VIAGEM COM SEGURANÇA TRECHOS CONCESSIONADOS NO BRASIL DISPÕEM DE TECNOLOGIA DE PONTA PARA ATENDER BEM AO USUÁRIO POR POR SANDRA CARVALHO A AUTOBAN CONSEGUE CHEGAR AO LOCAL DA OCORRÊNCIA EM MENOS DE 6 MINUTOS nformações on-line sobre acidentes ou qualquer outro evento na estrada, atendimento rápido para qualquer que seja a demanda do usuário e da organização – tudo associado à tecnologia de ponta. Esses são alguns dos pontos chaves das chamadas rodovias inteligentes. São vias que proporcionam para seu usuário menor custo, menor tempo no atendimento, maior segurança, maior conforto e menor desgaste para o transporte de cargas e de passageiros. O conceito, mundialmente conhecido como ITS (Intelligent Transportation Systems), está I previsto no regulamento de concessões rodoviárias do Brasil e, para atingi-lo, as concessionárias estão investindo cada vez mais nesses recursos tecnológicos, criando sistemas e ferramentas de gerenciamento e controle de tráfego que não deixam nada a desejar quando comparados aos utilizados em países desenvolvidos. Segundo a ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias Rodoviárias), em 2004, as concessionárias investiram R$ 7,93 milhões nos sistemas inteligentes de transporte. Nos 10.794 km de rodovias concessionadas, foram insta- lados 425 telefones de emergência, 377 km de cabos de fibra ótica para transmissão de dados, 92 cabines eletrônicas de pedágio, 23 painéis de mensagem variável e 179 circuitos fechados de TV. Todas as rodovias pedagiadas do país contam hoje com modernos centros de controle operacional ligados a um sistema que detecta todos os eventos que nelas ocorrem. As tecnologias dos sistemas inteligentes podem ser utilizadas desde o momento em que o usuário planeja pegar estrada. Quem pretende trafegar pelo trecho da BR-116, que liga o Rio de Ja- CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 NOVADUTRA/DIVULGAÇÃO QI NO ASFALTO Saiba mais sobre rodovias inteligentes CONCEITO Rodovias que proporcionam redução no custo, atendimento rápido, segurança, conforto e menor desgaste para o transporte de cargas e de passageiros COMO FUNCIONA Através de tecnologias que funcionam com o objetivo de proporcionar o melhor para o usuário. São chamadas de ITS (Intelligent Transportation Systems, sistemas de transporte inteligente, na tradução) neiro a São Paulo, por exemplo, pode ter informações em tempo real sobre as condições e fluxo da rodovia antes mesmo de sair de casa. Basta entrar no site da NovaDutra, administradora do trecho, e acionar o trecho que pretende pegar. Vão aparecer imediatamente informações sobre fluxo, meteorologia, ocorrência de acidentes e condições de tráfego. Outras concessionárias, como a Autoban, que administra o sistema Anhanguera-Bandeirantes (SP), e a Ecovias, responsável pelo sistema Anchieta-Imigrantes (SP), disponibilizam fotos quase que em tem- po real dos trechos na Internet. Segundo Wards Fogagnli, analista de atendimento da NovaDutra, existem ao longo dos 402 km do trecho em concessão 22 câmeras filmadoras, instaladas nos trechos com maior grau de periculosidade de acidente e maior fluxo de veículos. As câmeras repassam diretamente as imagens para o CCO (centro de controle operacional), onde a rodovia é monitorada. Os vídeos não são a única fonte de informação sobre o que acontece na rodovia. Os analisadores de tráfego, laços magnéticos colocados no asfalto, contam o número de veículos que passam pela NovaDutra e a velocidade de cada um, repassando em tempo real todos os dados ao CCO. “Se os analisadores não passarem a informação, é porque o fluxo de veículo foi interrompido por algum motivo”, diz Fogagnli. Outra fonte são as viaturas que percorrem a rodovia. Ao identificar uma ocorrência – pode ser uma árvore caída, um carro com pneu furado até um grave acidente – os agentes das viaturas comunicam imediatamente o fato à central para a busca de soluções. E, por fim, os usuários também O QUE EXISTE NO BRASIL • Centro de controle de operação • Sistema de gerenciamento de recursos • Painéis eletrônicos • Filmadoras • Mensagens SMS • Telefones de urgência • Radiovia • Sistemas de alerta meteorológico • Teledespachos • Viaturas • Resgate • Guinchos • Ambulâncias • Visualização em tempo real pela Internet • Pedágio eletrônico MAIS INFORMAÇÕES: www.abcr.org.br www.novadutra.combr www.autoban.com.br www.ecovias.com.br www.concepa.com.br www.intervias.com.br 53 54 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 SISTEMA BRASILEIRO Entre os melhores do mundo AUTOBAN/DIVULGAÇÃO O Brasil não deixa nada a desejar em tecnologia de inteligência rodoviária, é o que afirma o presidente da organização ITS Brasil, Chequer Jabour Chequer. De acordo com ele, a tecnologia brasileira é exportada para o resto do mundo. “Nossas estradas concessionadas estão no mesmo nível de estradas equivalentes na Europa e nos Estados Unidos. A tecnologia dos sistemas de controle operacional é, em quase sua totalidade, nacional e com elevado nível de eficiência”, diz. O país é tão forte que conseguiu a vice-presidência da Associação Ibero-Americana de ITS, com sede em Sevilha, na Espanha. – país que ocupará a presidência. A entidade reúne organizações como ITS American, ITS Chile, ITS Espanha e outras. O objetivo é reunir e divulgar tecnologias e co- nhecimentos no assunto. “Pretendemos que o conceito ITS seja multimodal”, diz Chequer. A nova entidade ainda está sendo formada e deve iniciar sua atuação no próximo mês. Mas, segundo Chequer, o Brasil ainda deixa muito a desejar quando o assunto são os investimentos em ITS nas rodovias de responsabilidade do poder público. “Nenhum país tem tanto recurso para tornar todas as suas rodovias públicas inteligentes, mas fazem o que podem dentro das possibilidades. No Brasil, ainda há pouquíssimo investimento nisso. O orçamento público ainda não permite, mas é um projeto a perseguir”, diz. Ano passado, foram liberados R$ 101,5 milhões ao Dnit, dos quais R$ 64 milhões foram usados em lombadas eletrônicas e em registros de avanço de sinal. SERVIÇO Painel eletrônico com informações para o usuário passam informações ou solicitam atendimento por meio do telefone 0800 da empresa ou dos orelhões SOS espalhados pela rodovia. “O sistema de comunicação é rápido para que a solução dos problemas seja rápida”, diz Fogagnli. Quando a ocorrência é detectada, imediatamente e automaticamente as informações são enviadas internamente via sistema SMS, tipo de mensagem via telefone celular, a todos os funcionários dos setores que estão envolvidos com a ocorrência. O sistema de gerenciamento eletrônico, por meio de outras ferramentas e softwares, aponta soluções no menor tempo possível. Os usuários recebem informações sobre as ocorrências por meio dos 30 painéis eletrônicos espalhados pela rodovia. O analista de atendimento da NovaDutra acrescenta que os dados permitem também a constante criação de planos de prevenção mais ágeis. “Eles (dados) geram estatísticas que sempre melhoram nosso trabalho.” E completa: “Quando a concessão da NovaDutra foi iniciada, o número de vítimas fatais em acidentes era 481 por ano. Hoje, a média é de 240 por ano, uma redução que só aconteceu em função desse trabalho.” VIGILÂNCIA TOTAL Um verdadeiro “Big Brother”, assim pode ser chamado o siste- ma Anhanguera-Bandeirantes. Nos 317 km de extensão, estão instaladas 72 câmeras filmadoras. Com um alcance de 3 km cada, elas se movimentam horizontal e verticalmente, podendo se aproximar ou afastar de um fato ou objeto. Todas as imagens são gravadas simultaneamente e enviadas ao centro de controle operacional da rodovia – um dos mais sofisticados do país, segundo a ABCR. Além das imagens, a rodovia conta com uma rede digital de informações transmitidas por fibra ótica, 540 telefones de emergência, 28 painéis eletrônicos, sistema de detecção de velocidade e de análise de tráfego, 27 viaturas, serviços de guincho e resgate. “Nós temos um tempo médio, estipulado em contrato, para o atendimento às vítimas de acidente de 20 minutos, em 85% dos casos. Hoje, a Autoban consegue chegar ao local da ocorrência em menos de 6 minutos. O deslocamento até um hospital deve ser feito em até 20 e nós fazemos em 11 minutos”, diz o gestor de tráfego, Fábio Abritta. Outro destaque do trecho são as estações meteorológicas. Instaladas em nove pontos do complexo rodoviário, registram neblina ou chuva. As informações são enviadas a cada minuto para o CCO, permitindo ao operador informar a condição climática nos painéis de mensagens aos usuários. ESTRADAS PÚBLICAS Carentes em tecnologia AUTOBAN/DIVULGAÇÃO As rodovias administradas pelo serviço público, por falta de recursos, ainda estão muito longe de atingir o conceito de rodovia inteligente. Mas isso não significa que não há investimentos nesse sentido. Em algumas rodovias federais, por exemplo, já podem ser encontrados alguns recursos tecnológicos. Segundo informações do Dnit, existem 298 pontos de lombadas eletrônicas em 14 Estados. Há 659 faixas de sensores que contam o fluxo do tráfego. Além disso, segundo a Polícia Rodoviária Federal, existe um número de emergência 191 - disponível em 15 Estados. No próximo edital para a instalação de mais lombadas eletrônicas, já está prevista a instalação de um sistema de reconhecimento de placas, que filma ou fotografa veículos e leva as informações para agentes rodoviários. O objetivo é a checagem de dados com os registrados nos Detrans, facilitando, por exemplo, a identificação de veículos roubados que estejam trafegando. As câmeras permitirão o monitoramento em tempo real pelo usuário, que poderá acessar as imagens pelo site do Dnit. O órgão não informou quais trechos receberão a tecnologia. O Dnit publicará neste ano edital para a realização de projeto-piloto de instalação de um novo serviço de atendimento de emergência nas rodovias. O piloto deve durar dois anos e será implantado nas BRs 060 e 153, – mais de 300 km entre Brasília a Goiás. “Escolhemos esse trecho porque tem partes em áreas urbanas e rurais e reúne características específicas de outros trechos”, diz Luiz Cláudio dos Santos Varejão, coordenador de operações rodoviárias do Dnit. VIGILÂNCIA Câmera registra avanço de velocidade Para criar uma forma de fazer com que todos os recursos tecnológicos funcionem harmonicamente, um entendendo o que o outro está propondo ou precisando, concessionárias do mundo inteiro utilizam uma ferramenta chamada Genexus. Desenvolvida pela empresa uruguaia Artex e aplicada no gerenciamento das rodovias inteligentes, ela controla a qualidade do atendimento. De acordo com Afrânio Spolador Júnior, coordenador de tecnologia de informação da Ecovias, o sistema de gerenciamento de recursos das estradas da concessionária comporta um banco de dados alimentado 24 horas por dia com imagens e informações sobre todos os trechos e eventos que ocorrem na rodovia. E, para cada tipo de acontecimento, a ferramenta disponibiliza automaticamente um determinado recurso. Outro expediente utilizado apenas em uma rodovia concessionada no Brasil é a radiovia. Quem passa pelo trecho de 121 km da BR-190, entre as cidades de Osório e Guaíba (RS), pode sintonizar o rádio do carro com a rádio da rodovia. Além de câmeras e outros geradores de informações, a rodovia possui uma estação de rádio que só atinge o trecho pedagiado, administrado pela Concepa. Odenir Santos, diretor-presidente da empresa, diz que a estrada foi a primeira con- cessão a ser licitada no país e, no regulamento antigo, determinouse a criação de uma radiovia, o que não é mais exigido. “Quando assumimos a responsabilidade do trecho em 1997, iniciamos o projeto. Há quatro anos, a radiovia funciona de forma experimental, pois nem o Ministério das Comunicações e nem o dos Transportes têm um modelo de funcionamento definido”, diz Santos. Os usuários, por meio de placas, são orientados a sintonizar na rádio quando detectam qualquer problema. A programação inclui desde alertas meteorológicos, condições de tráfego e da via até a inserção de música brasileira. Para ter tanta tecnologia acu- mulada, o usuário tem que pagar pedágios que variam de R$ 2,80 a R$ 15. Alguns acham que vale a pena, é o que afirma o dentista Rui Freire, residente em Santos (SP). “Uso o sistema Anchieta-Imigrantes pelo menos uma vez por semana. Pago R$ 14,80 pelo pedágio. O valor é alto, mas é investimento em segurança e conforto. Já precisei de socorro e fui rapidamente atendido”, diz. O caminhoneiro Lindolfo Dias, residente em Vitória (ES), diz que o valor do pedágio pesa no bolso, mas que “é mínimo diante do amor pela vida”. “Acho que todas as rodovias deveriam do país deveriam ser inteligentes. Pagamos impostos para isso”, afirma. t 56 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 LOGÍSTICA DE PORTA EM PORTA CARGOLIFT AUMENTA A PRODUTIVIDADE COM PROGRAMA BASEADO NAS ANTIGAS TROCAS DE EMBALAGENS DE LEITE POR B aseando parte significativa de suas operações em moderno sistema de gestão de cargas, a Cargolift, empresa paranaense especializada em transporte e logística, obteve alta de 15% em sua produtividade no ano de 2005 em relação a 2004, graças a um programa de logística conhecido como Milk-Run, adotado em 1998. O programa, desenvolvido pela própria empresa, recebeu esse nome devido à semelhança com o processo utilizado no passado pelos laticínios, que costumavam buscar leite nas fazendas, deixan- ALICE CARVALHO do as embalagens vazias para a coleta do dia seguinte em pontos pré-determinados. No caso da Cargolift, as empresas fazem uma programação com fornecedores, que envolve também suas entregas, e estabelecem rotas que facilitam e tornam mais rápidas as operações de transporte. Informações sobre quantidades e tipos de mercadorias são repassadas para evitar que ocorra algum erro. O objetivo do sistema Milk-Run é agilizar as operações de carga, definindo pontos de coleta – também chamados de janela de coleta –, com horários de chegada e saída, nos diversos fornecedores dos clientes que utilizam os serviços da transportadora. O projeto começou em 2002, quando a empresa, buscando melhorar a produtividade, criou o “Milk-Run Efficiency Program”. Os fornecedores que atingiam níveis de eficiência superiores a 90% nas coletas, dentro do horário e nas quantidades programadas, eram premiados. O programa funcionou inicialmente como incentivo para ajudar empresa e clientes a atingirem seus objetivos. Hoje, o Milk-Run é uma ferramenta fundamental para a produtividade da empresa e opera um imenso banco de dados capaz de informar on-line o ranking de fornecedores para os clientes da Cargolift. De acordo com informações da empresa, os integrantes da cadeia estão sempre sendo estimulados a buscar a melhoria contínua dos processos, otimizando o tempo de permanência dos veículos e a expedição das embalagens. “Desde que foi lançado, o programa realizou mais de 55 mil coletas em 353 pontos e já premiou 85 empresas que cumpriram as metas de eficiência estabelecidas. Dessas, 20 receberam a homenagem Top Loaders, prêmio destinado aos clientes que apresentaram CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 57 CARGOLIFT/DIVULGAÇÃO LOGÍSTICA Caminhão da Cargolift, empresa que implantou programa baseado nas trocas de embalagens de leite o melhor desempenho na coleta programada de mercadorias no decorrer do ano”, diz Markenson Marques, presidente da Cargolift. De acordo com Marques, a Cargolift, além de otimizar e aumentar a produtividade, obteve outras vantagens com o programa. A empresa aumentou em 32%, nos últimos três anos, seus negócios com clientes. “Passamos a receber convites para participar de diversas concorrências.” CLIENTES A fabricante de caminhões Volvo do Brasil é um dos clien- “Programa ajudou a empresa a ter melhores condições de negociar o preço do frete” DAVID BECHER GERENTE DE LOGÍSTICA DA VOLVO tes da Cargolift atendida pelo Milk-Run. Segundo David Becher, gerente de logística da Volvo, desde que a empresa entrou no programa, a precisão na entrega aos fornecedores cresceu na faixa dos 35%. “O programa também ajudou a empresa a ter melhores condições de negociação no preço do frete. Isso permite melhor gestão dos estoques e produção”, diz Becher. O programa Milk-Run também funciona na montadora de peças para veículos Dana. Segundo a analista de materiais da empresa, Cristina Pires, a Cargolift recebe informações sobre todas as janelas (pontos) de entrega e sobre as quantidades estipuladas por cada fornecedor. “Quando as quantidades estipuladas mudam, comunicamos à transportadora através de e-mail e nossos fornecedores também são informados. Quando algo muda em relação às janelas de entrega ou pesos, passamos também informações on-line para todos os envolvidos no processo”, diz. Segundo Pires, o programa Milk-Run trouxe otimização de transporte, redução de custos, comodidade, além da satisfação dos clientes e crescimento na produtividade da montadora. Com matriz na Cidade Industrial de Curitiba, a Cargolift opera dez filiais no Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais, localizadas nas proximidades de montadoras, entroncamentos rodoviários e áreas portuárias. Sua frota de mais de 200 veículos, equipados com diversos modelos de carretas, atende, além da Volvo e da Dana, a General Motors, a Renault e a Nissan, entre outros clientes. t 58 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 LIXÃO EM AEROPORTOS AVIÕES EM PERIGO AVES ATRAÍDAS POR LIXÕES E MATADOUROS PRÓXIMOS AOS AEROPORTOS CAUSAM CHOQUES EM AERONAVES POR FLÁVIO HENRIQUE SILVEIRA FORAM REGISTRADAS 473 COLISÕES COM AVES EM 2004 ilão em alguns desenhos animados, considerado de mau agouro pelos mais supersticiosos, o urubu tem causado transtornos à aviação brasileira. Atraídas por lixões e matadouros erroneamente fixados nas proximidades de aeroportos, essas aves acabam habitando as áreas de circulação dos veículos, o que ocasionam centenas de choques anualmente no país. Segundo dados do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), órgão responsável por coletar estatísticas e dados V sobre os acidentes com aves no Brasil, só em 2004 foram registradas 473 colisões. Além do urubu, outros pássaros, como os quero-queros, estão presentes em aeroportos vizinhos de plantações e também disputam o espaço aéreo com os veículos de aço. As trombadas entre aves e aviões acontecem, principalmente, em processos de decolagem e pouso em virtude da baixa altitude nessas fases do vôo. O Snea (Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias) calcula que só em 2004 os prejuízos financeiros das empresas de vôo comercial gira- ACIDENTE Os urubus são ram na ordem de US$ 4 milhões no Brasil. Tudo isso porque, muitas vezes, a distância regulamentada para a prática de lixões e matadouros não é respeitada. De acordo com o major Flávio Coimbra, presidente da CCPAB (Comissão de Controle do Perigo Aviário no Brasil), os urubus são “seguramente as aves que mais participam dos incidentes com os veículos aéreos”. Alguns aeroportos conviveram e continuam suportando a presença desses bichos nos últimos anos. Casos como o do aeroporto Augusto Severo, em Parnamirim, na região CNT TRANSPORTE ATUAL 59 EDIÇÃO 126 FOTOS CENIPA/DIVULGAÇÃO considerados as aves que mais provocam incidentes em aviões. Somente em 2004 foram registrados 473 colisões entre aves e aeronaves no Brasil metropolitana de Natal (RN), onde eles viviam na cabeceira da pista de pouso e decolagem. Ou mesmo o de Aracaju (SE), no qual os urubus rondavam o bairro da Terra Dura, que está bem próximo ao aeroporto. O local quase foi interditado para vôos. E, por fim, houve a questão do aeroporto de Juiz de Fora (MG). No ano passado, o prefeito Alberto Bejani (PTB) solicitou à Infraero (Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aroportuária) que suspendesse os vôos. Em todos os locais citados, há (ou havia) a existência de lixões bem próximos. Quanto a outras aves, como os quero-queros, elas costumam atrapalhar a vida dos pilotos mais ao sul do país. Alguns aeroportos registram problemas com esse pássaro, como o de Uruguaiana (RS) ou o de Curitiba (PR), localizados próximos de culturas de soja, arroz e feijão, que atraem a presença da ave. “Hoje em dia, os quero-queros viraram uma praga nacional. Eles se instalam dentro do próprio aeroporto. Até árvores frutíferas são motivos de atração”, diz. Coimbra afirma que é possível dizer com certeza qual Companhias aéreas arcam com quase US$ 4 mi de prejuízos anuais aeroporto brasileiro é o que tem mais possibilidades de incidentes com as aves. “Eu posso dizer, por exemplo, que o aeroporto do Rio de Janeiro teve uma quantidade maior de colisões em determinado ano do que o de Aracaju. Mas, como o movimento no aeroporto na capital sergipana é menor, é difícil afirmar qual deles oferece mais riscos.” A resolução que rege as restrições a que estão sujeitas as propriedades vizinhas a aeroportos é de autoria do Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente), foi criada em 1995 e constituiu a Área de 60 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 Atividades que atraem aves devem ser ROTA INTENSA COLISÕES REPORTADAS AO CENIPA 2004 473 2003 366 2002 348 2001 373 2000 313 1999 323 1998 164 1997 164 1996 123 1995 185 1994 166 COLISÕES ENTRE 1994 E 2004 * Por tipo de ave Urubu 26% Quero-queros 9% Coruja 3% Gavião 3% Garça/Bacurau 2% * Por parte atingida Motor 24% Asa 12% Fuselagem 9% Nariz 8% * Por fase do vôo Decolagem 27% Aproximação 21% Pouso 11% Subida 10% * Efeito no vôo após colisão com urubu Nenhum 76% Pouso de precaução 8% Decolagem abortada 2% Fonte: Cenipa Segurança Aeroportuária. Baseado no Código Brasileiro de Aeronáutica e na Constituição Federal, o órgão regulamentou a edificação, os tipos de culturas agrícolas e tudo o mais que possa embaraçar o funcionamento do tráfego nos aeroportos. É o que explica Cássio Sesana, assessor técnico do Conama. De acordo com ele, atividades que possam atrair aves para aeródromos (inclui aeroportos e heliportos) só podem ser implementadas em um raio de 20 km. Isso se o aeroporto operar por instrumento. Se não, a distância diminui para 13 km. O assessor ainda conta que, no momento de se instalar um lixão ou um matadouro, o dono do negócio ou a administração municipal necessita de uma licença concedida por órgãos ambientais (sejam eles municipais, estaduais ou federais). Quando for expedir esse documento, o fiscal deve verificar a distância em relação ao aeroporto mais próximo. “Agora, se houver alguma atividade clandestina que fira a resolução do Conama, ela tem de sofrer autuação, multa, denúncia de crime ambiental e ser retirada desse local pelo poder público”, diz Sesana. PERIGO Os lixões atraem as aves para os aeroportos, o que põe em Rosangela Finocketi, coordenadora de avaliação e controle ambiental da Superintendência de Meio Ambiente e Energia da Infraero, afirma que o DAC (Departamento de Aviação Civil) tem analisado e emitido parecer sobre a implantação de aterros sanitários e matadouros nas áreas de segurança aeroportuária. No entanto, ela faz coro a Sesana e diz que a incumbência de fiscalizar é dos órgãos ambientais municipais, estaduais ou federais. Para diminuir as conseqüências dos impactos entre aves e aviões, autoridades especialistas no assunto lutam por mais conscientização de empresas e de populações em torno dos aeroportos, tentando combater e evitar a proliferação dos lixões. A CCPAB (Comissão de Controle do Perigo Aviário no Brasil), presidida por Coimbra, realiza estudos, seminários e outras propostas para se diminuir a presença de aves nos locais de segurança dos aeroportos. A entidade ainda promove encontros periódicos com a participação de membros das empresas comerciais de aviação, do Snea, CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 61 implantadas a pelo menos 13 km do aeroporto ACIDENTE Problema é maior nos EUA risco a vida de pilotos e passageiros do Ibama, entre outros. Em 2005, a comissão coordenou a Conferência Internacional de Prevenção de Perigo Aviário e Fauna, na qual dezenas de países puderam trocar informações sobre o tema. Coimbra alerta para a importância de a sociedade se organizar e combater as atividades clandestinas que atraem aves para os aeroportos. “Fazemos seminários e encontros que servem de conscientização e orientação. Transportamos biólogos para determinas locais para fazer estudos sobre o com- No Brasil, os maiores problemas relacionados aos acidentes entre aviões e aves estão ligados aos prejuízos financeiros das empresas de aviação comercial. Segundo o major Flávio Coimbra, da CCPAB, não há registro de acidentes com vítimas fatais desde 1962, quando um tripulante de um veículo de caça da Aeronáutica morreu. Nos anos 70 e 80, houve a perda de alguns aviões da FAB (Força Aérea Brasileira), e, em 1998, um piloto da entidade ficou cego num choque com um pássaro. Coimbra conta que o perigo aviário é bem mais grave em outros países, como os Estados Unidos. “No Brasil, o problema é que perto do aeroporto tem lixão. Só que o urubu pesa só 1,5 kg, e se não houver lixão dificilmente haverá colisões. Já Nos Estados Unidos há muitas aves migratórias. Imagine um ganso, por exemplo, que pesa entre 12 kg e 15 kg. Proporcionalmente, a pancada é muito maior. Por isso é que lá (nos EUA) e no Canadá de vez em quando há acidentes graves envolvendo aviões comerciais”, diz. Ronaldo Jenkins, presidente do Snea, chama a atenção para os danos que as companhias áreas vêm sofrendo nos últimos anos. Ele diz que em 2002 os prejuízos superaram os US$ 2 milhões. Em 2004, esses dados chegaram a quase US$ 4 milhões. Já Coimbra lembra que um dos fatores que levaram a Vasp à falência foram os prejuízos causados pelas constantes batidas em aves. Jenkins ressalta ainda que, por enquanto, as empresas de aviação assumem os danos causados pelos impactos com os pássaros. “Os prejuízos ficam dentro da franquia do seguro, que gira em torno de US$ 500 mil. Mas chegará um dia em que a sociedade civil terá de assimilar esses prejuízos. Existem leis (como a que determina distância de pelo menos 13 km para alguma atividade que possa atrair aves), mas elas não são cumpridas”, destaca. Os dois comandantes ressalvam que não pregam nenhuma espécie de guerra às aves. Mas, segundo Jenkins, a prevenção, extinguindo os locais de atração para as aves nos aeroportos, é a melhor saída para evitar os acidentes. “Porque, apesar de haver programas de prevenção dentro das empresas e ainda existirem uma série de orientações aos pilotos, nem sempre o piloto tem campo visual suficiente para desviar da ave.” portamento das aves. A imprensa também pode nos ajudar divulgando o problema. As pessoas que souberem de um lixão ilegal, perto de um aeroporto, têm de fazer a denúncia.” Rosangela Finocketi, da Infraero, aponta outros problemas que ocasionam a migração das aves para as áreas internas dos sítios aeroportuários, que, segundo ela, normalmente são locais ambientalmente conservados. Ela cita que a carência de saneamento básico no entorno de aeroportos podem ser a causa de migração de aves, assim como desmatamentos nas proximidades dos locais de vôo. A coordenadora da Infraero diz que o órgão adota procedimentos e medidas para minimizar a presença de aves nos aeródromos, realizando seminários sobre o assunto e programas de educação ambiental para as comunidades aeroportuárias e ao redor. “Além disso, a Infraero mantém contato estreito com as autoridades competentes nos diversos Estados, municípios e no nível federal, procurando desenvolver atividades e adoção de medidas visando minimizar os fatores de atração de aves”, diz. t 62 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 TRÂNSITO DIREITO DE IR E VIR SEST/SENAT CAPACITARÁ 100 MIL PESSOAS PARA LIDAR COM PASSAGEIROS COM MOBILIDADE REDUZIDA INCLUSÃO Programa de POR SABRINA ABREU livre a locomoção no território nacional, diz o artigo 5º da Constituição Federal. Entretanto, para parte da população, a lei não é suficiente para garantir locomoção para trabalhar, estudar ou se divertir com segurança. Idosos, portadores de deficiências físicas, obesos e gestantes são alguns exemplos de pessoas com restrição de mobilidade. Não há estatísticas sobre o número total de casos no país, mas, de acordo com o IBGE, em 2000, havia 14 milhões de idosos no Brasil, ou seja, 8,5% da população. E pessoas portadoras de algum tipo de deficiência eram É quase 26,5 milhões, o equivalente a 14,5% dos brasileiros. Passo importante para garantir a circulação e a cidadania dos que têm dificuldade de locomoção foi dado com o lançamento, em junho de 2004, do Programa Brasileiro de Acessibilidade Urbana, fruto da cooperação técnica entre o Serviço Social de Transporte (Sest), o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat), o Ministério das Cidades, a Secretaria de Direitos Humanos e a Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana. Parte do programa é a capacitação de motoristas e funcionários de empresas de ônibus, através do curso gratuito on-line “Transporte para Todos”, do Sest/Senat, iniciado em 2005 e com metas definidas para 2006 e 2007. O Programa de Acessibilidade Urbana tem o objetivo de impedir a discriminação, desenvolver ações que valorizem as diferenças entre os indivíduos, estimulem a inclusão e, ainda, capacitem os motoristas a lidar com usuários do transporte urbano coletivo com dificuldade de locomoção – identificando e agindo corretamente em relação às suas necessidades específicas. Com o curso “Transporte para Todos” já foram capacitados 3.160 profissionais, entre funcionários e instrutores terceirizados do Sest/Senat e profissionais de recursos humanos de empresas de transporte de todas as regiões do país. Para 2006 e 2007, a meta é estender a capacitação a 100.000 motoristas, cobradores e outros 10.000 trabalhadores do setor de transporte em todo o país. O curso é dividido em oito módulos, com carga horária total de dez horas. São abordados temas como sociedade e diferenças individuais, pessoas com restrição de mobilidade, inclusão social e o setor de transporte, dicas de relacionamento, leis e direitos das pes- CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 63 PAULO FONSECA Acessibilidade Urbana do Sest/Senat tem o objetivo de impedir a discriminação de usuários de transporte coletivo soas com restrição de mobilidade. Ao final dos módulos e do questionário de reação e atividades, o aluno obterá um certificado de conclusão. O curso pode ser feito através de qualquer computador conectado à Internet, nos laboratórios de informática Sest/Senat ou fora deles. Há também a opção da sensibilização presencial, realizada com o uso de cartilhas. Décio Caetano Filho, diretorsuperintendente do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Goiânia (Setransp), afirma que motoristas, fiscais e operadores de todas as sete empresas de transporte de passageiros da cidade estão envolvidas no projeto (não há trocadores em Goiânia) e que a aceitação da população, especialmente dos portadores de necessidades especiais e idosos, já está sendo sentida. “Acontecia de uma pessoa cega ou idosa ficar insatisfeita com o tratamento recebido, não por maldade do motorista, mas por falta de conhecimento. Nosso objetivo é erradicar essa situação”, diz. O Setransp estimula também a participação de associações de pessoas com mobilidade reduzida em treinamentos dirigidos à mãode-obra. “Como o curso é feito pelo computador, levar às garagens “Aprendi que quem tem necessidades especiais, idosos e crianças têm prioridade” JOSÉ CASSIANO BORGES MOTORISTA alguém que tem dificuldades, por ser portador de deficiência visual ou auditiva, serve para sensibilizar ainda mais os trabalhadores e também para aperfeiçoar a capacitação. As associações que participam dão dicas sobre o que gostariam que melhorasse no sistema de transporte de passageiros.” O motorista José Cassiano Borges, que trabalha há sete anos na empresa HP Transportes, também de Goiânia, considera o curso um complemento para sua qualificação profissional. “Aprendi que têm prioridade os portadores de necessidades especiais, idosos e crianças. Se ocorrer um acidente, como a porta fechar antes do passageiro entrar ou sair do ônibus, a maioria tem como reagir, mas eles não”. Cassiano afirma que, em horários em que os ônibus ficam mais cheios, é preciso que o motorista proteja os que têm restrição de mobilidade. A engenheira Maílla Soares, coordenadora da Ruaviva Instituto de Mobilidade Sustentável, ONG especializada em trânsito, destaca a importância do Programa de Acessibilidade Urbana e o curso “Transporte para Todos”. “Mas acho que é preciso combinar o bom relacionamento entre motoristas e passageiros com dificuldade de locomoção a outras questões, como o emprego intensivo de tecnologia mais adequada nos veículos coletivos.” t TRANSPORTE FERROVIÁRIO DE CARGAS TONELADAS EM MILHARES (JANEIRO A NOVEMBRO 2004 E 2005) ESTATÍSTICAS MESES/ANO JANEIRO FEVEREIRO MARÇO ABRIL MAIO JUNHO JULHO AGOSTO SETEMBRO OUTUBRO NOVEMBRO TOTAIS MÉDIA 2004 30.082.658 28.825.040 30.868.490 31.966.365 33.784.202 33.218.768 34.591.402 35.731.016 34.253.377 34.640.086 33.356.133 327.961.404 32.847.049 2005 32.720.031 30.156.069 34.207.360 34.046.414 36.989.195 35.769.915 36.304.758 38.712.463 37.933.827 38.097.156 35.086.095 354.937.188 35.456.662 VARIAÇÕES 8,77% 4,62% 10,82% 6,51% 9,49% 7,68% 4,95% 8,34% 10,74% 9,98% 5,19% 7,94% FONTE: IDET CNT/FIPE TRANSPORTE POR FERROVIA CRESCE MODAL APRESENTA AUMENTO DE 7,94% ENTRE JANEIRO E NOVEMBRO modal ferroviário de carga apresentou, no acumulado de janeiro a novembro, um crescimento de 7,94%, em relação a 2004. A média mensal da tonelagem transportada no ano de 2005 foi superior a 35,46 milhões de toneladas. O recorde anterior, observado no mesmo período do ano anterior, teve como média 32,85 milhões de toneladas. Desde janeiro de 2005, todos os valores registrados foram superiores a 30 milhões de toneladas, com elevação O média crescente a partir de fevereiro, atingindo, em novembro do ano passado, 35,09 milhões de toneladas transportadas pelas ferrovias brasileiras. O modal rodoviário de passageiros – segmento interestadual – registrou no ano de 2005 aproximadamente 68,7 milhões de viagens (0,36% superior ao registrado em 2004). Os principais destinos dos passageiros embarcados no Brasil foram os Estados da Região Sudeste. Em dezembro, foram registradas 6,84 milhões de viagens, o que repre- senta um aumento de 31,96% em relação a novembro de 2005. Esse crescimento no volume de passageiros transportados pode ser explicado pelo início das férias escolares e às festas de fim de ano. No modo rodoviário de carga, a variação da movimentação da carga industrial no acumulado do ano de 2005 registra uma acomodação da carga industrial no patamar atual, em torno de 455,47 milhões de toneladas/ano. A movimentação (embarque mais desembarque) de carga nos aeroportos em no- vembro de 2005 foi de 46,43 mil toneladas, o que representou um aumento de 1,84% em relação ao mês de outubro do mesmo ano. No modo aquaviário foram movimentados 36,86 milhões de toneladas em dezembro de 2005, registrando uma elevação de 4,41% se comparado com o mesmo período de 2004. t Para esclarecimentos e/ou para download das tabelas do Idet, acesse www.cnt.org.br ou www.fipe.com.br 66 CNT TRANSPORTE ATUAL EDIÇÃO 126 HUMOR DUKE