unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE ENGENHARIA DE BAURU RESÍDUOS SÓLIDOS Conceituação e Caracterização Prof. Dr. Jorge Hamada Grupo de Estudos de Resíduos Sólidos Setembro - 2003 SUMÁRIO 1. 2. CONCEITOS E FUNDAMENTOS ________________________________________ 1 1.1. RESÍDUOS _____________________________________________________________ 1 1.2. HIERARQUIA NO MANEJO DE RESÍDUOS________________________________ 1 1.3. ASPECTOS AMBIENTAIS E ECONÔMICOS _______________________________ 3 CARACTERIZAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS___________________ 5 2.1. CLASSIFICAÇÃO _______________________________________________________ 5 2.2. COMPOSIÇÃO _________________________________________________________ 6 2.3. PROPRIEDADES________________________________________________________ 8 2.4. RESÍDUOS DOMICILIARES PERIGOSOS ________________________________ 15 2.5. REFERÊNCIAS ________________________________________________________ 17 1. CONCEITOS E FUNDAMENTOS 1.1. RESÍDUOS Dentre a diversidade de definições para o termo, pode-se afirmar que resíduos se referem a coisas sem utilidade ou valor. Resíduos também podem ser definidos como restos da atividade humana e, fisicamente, contém os mesmos materiais que são encontrados nos respectivos produtos originais que tinham valor e utilidade. Mais importante que a própria definição, é saber o que fazer com os resíduos. Segundo a abordagem de White et al (1993), uma solução básica para um resíduo seria restaurar seu valor até que deixe de ser considerado um resíduo. A perda ou ausência de valor em muitos casos está relacionada com a mistura ou ao desconhecimento de sua composição. Mais especificamente, quando se trata de resíduo sólido, diversos grupos podem ser identificados ou classificados de acordo com a abordagem estabelecida. Dentre os diferentes grupos de resíduos sólidos, os domiciliares, por natureza, são os mais complicados em termos de manejo, pois são constituídos por uma grande diversidade de componentes (plásticos, vidro, metais, vidro, restos de alimento, etc.), via de regra, totalmente misturados. A composição desses resíduos também varia muito em função da sazonalidade e geograficamente (de um país para outro e de uma cidade para outra). Outros resíduos sólidos, tais como comerciais e industriais tendem a ser mais homogêneos e a apresentar-se em grande quantidade para cada um dos componentes. 1.2. HIERARQUIA NO MANEJO DE RESÍDUOS Historicamente saúde e segurança são os principais objetivos no manejo de resíduos. Na atualidade outros aspectos têm-se tornado relevantes, tais como a poluição ambiental e a conservação de recursos naturais. No estudo de ciências ambientais não se podem esquecer os princípios de Meadow referentes a períodos não muito distantes. Em 1972 afirmava-se que a taxa de exploração dos recursos materiais e energéticos do planeta não poderia ser mantida indefinidamente (Tammemagi, 1999). Em 1992 verificou-se que os materiais brutos vinham sendo explorados 1 com uma taxa bem maior que a possível de ser repostos pela natureza ou alternativamente substituídos. Nesta abordagem conclui-se que o futuro do ser humano neste planeta repousa no conceito de desenvolvimento sustentável, em que se busca satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de terem atendido suas próprias necessidades (Corson, 1993). Na concepção de Tamemmagi (1999), a nova abordagem quanto a esse princípio, em relação aos resíduos, pode ser ilustrada pelos princípios: proteção da saúde e do meio ambiente, minimização do sacrifício das futuras gerações e a conservação de recursos, como mostrado no Figura 1-1. Figura 1-1: Princípios do desenvolvimento sustentável e o manejo de resíduos (Tamemmagi, 1999). O desenvolvimento sustentável implica no manejo eficiente dos recursos naturais e, sempre que possível, conservá-los. Contra essa premissa, a produção e a disposição de resíduos no solo, nas quantidades atuais, demonstram que há bastante desperdício. Essa volumosa descarga, em lixões ou aterros sanitários, é um forte indício da ineficiência de manejo adequado dos recursos materiais. O planeta terra é um sistema aberto do ponto de vista energético, porém do ponto de vista da matéria é um sistema praticamente fechado. Embora os recursos de materiais brutos estejam diminuindo, a quantidade total de cada elemento presente na terra permanece 2 constante. Verifica-se inclusive, segundo White et al (1993), que a concentração de determinados materiais úteis é maior nos depósitos de lixo que na forma de minério. Na realidade, segundo o referido autor, a reabertura de antigos aterros para recuperação de materiais já existe em alguns países. Contudo esta não é a forma mais eficiente de se efetuar o manejo e o reaproveitamento de materiais. Para a solução desta questão, decisões estratégicas podem contribuir muito mais por avaliar diferentes alternativas de manejo, ao invés de simplesmente refinar uma determinada solução. Neste caso, define-se uma hierarquia para o manejo de resíduos sólidos e nesta estabelecem-se objetivos para a recuperação e reciclagem de materiais. A hierarquia para o manejo de resíduos sólidos, como mostrado na Figura 1-2, é encabeçada pela redução na origem, ou seja, minimização de resíduos. Como linha geral seguem como opção e nesta ordem: reuso, reciclagem, compostagem, resíduo em energia (recuperação de energia), incineração sem recuperação de energia (redução volumétrica) e disposição final (aterros). Figura 1-2: Hierarquia no manejo de resíduos sólidos (baseado em White et al, 1993) 1.3. ASPECTOS AMBIENTAIS E ECONÔMICOS Melhorias do meio ambiente em relação aos métodos disposição dos resíduos são bem vindas quando cientificamente justificáveis. Contudo, as melhorias normalmente apresentam um custo econômico associado, principalmente quando relacionadas às legislações de controle de emissão (end-of-pipe), que resultam no emprego de novas tecnologias. Mesmo quando se procura atender as legislações estratégicas, tais como a reciclagem, ocorre o aumento dos 3 custos associados, uma vez que a coleta torna-se mais complexa, com o envolvimento de equipamentos e veículos diferenciados. Portanto, o maior desafio no manejo de resíduos sólidos é encontrar o ponto de equilíbrio entre custos econômicos e a preservação do meio ambiente. Custos ambientais ou sociais relacionados à disposição de resíduos têm sido considerados historicamente como custos externos. Por exemplo, os efeitos da emissão da incineração de resíduos ou dos gases e chorume dos aterros não são considerados como parte do custo desses sistemas. No caso dos aterros sanitários ou mesmo industriais, existe a necessidade do monitoramento após o seu encerramento, assim como a provisão de fundos que permita remediar quaisquer problemas ambientais futuros. Isto mostraria efetivamente os custos reais do sistema de manejo de resíduos. Sob tais condições as opções de manejo com menor impacto ambiental, que aparentam ser muito custosos, podem tornar-se economicamente viáveis. Para um sistema existente que não foi desenvolvido tendo como objetivo a preservação ambiental, a implementação de ações para atender um determinado padrão ambiental, se não atendida previamente, implicará certamente em custos adicionais. Por outro lado para um sistema de manejo de resíduos concebido desde o início para alcançar os objetivos ambientais, essas ações podem significar pouco ou nenhum custo adicional, se houver necessidade atender um novo padrão ambiental. Um sistema integrado que pode atuar sobre todos os materiais do fluxo de resíduos sólidos representa um conceito de qualidade total para o manejo de resíduos. O objetivo da qualidade total poderia ser a minimização dos impactos ambientais de todo o sistema de manejo de resíduos, enquanto mantém os custos econômicos em níveis aceitáveis. A definição de aceitável varia com o grupo envolvido e com a localidade, mas se o custo for pequeno ou menor que os praticados previamente, será invariavelmente aceitável. 4 2. CARACTERIZAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS 2.1. CLASSIFICAÇÃO Pelo fato de existir algumas divergências com relação à classificação, para fins do presente texto, resíduos sólidos urbanos constituem um grupo de resíduos classificados, segundo sua origem em: ◦ Domiciliares, provenientes de residências (casas e apartamentos); ◦ Comerciais, provenientes de lojas, restaurantes, mercados e supermercados, escritórios, hotéis, etc; ◦ Institucionais, originados em escolas e instituições governamentais; ◦ Serviços municipais, resultantes de podas e manutenção de jardins, praças públicas, áreas de recreação, varrição de ruas, etc. Considerando-se uma categoria mais abrangente, a qual será denominada de resíduos sólidos domésticos, serão incluídos além dos anteriores, os resíduos originados em: ◦ Construções, que são os entulhos resultantes das obras civis; ◦ Serviços de saúde, incluindo hospitais, clínicas, laboratórios, farmácias, núcleos de saúde, ambulatórios, etc.; ◦ Industriais, originados nos processos industriais dentro da área urbana, sejam perigosos ou não. Resíduos originados na indústria, mas advindos dos setores administrativos, de refeitórios e de ambulatórios médicos, podem ser incluídos na categoria de resíduos sólidos urbanos. Resíduos originados das atividades agropastoris pertencem a um grupo de resíduos denominados de agrícolas, inclusive das agroindústrias. Incluem-se, neste caso, alguns resíduos perigosos, tais como embalagens de defensivos agrícolas e de adubos, e respectivos produtos quando vencidos. Resíduos especiais, originados nos portos e aeroportos, resultantes de viagens internacionais, seguem normas específicas de destinação. 5 Uma outra forma bastante empregada para classificação de resíduos sólidos, segue as definições da NBR 10.004 (1987), que tem sido aplicada para definir a periculosidade do material. Esta classificação é usual para resíduos sólidos industriais, mas pode ser aplicada para outros tipos de resíduos sólidos. 2.2. COMPOSIÇÃO Os resíduos sólidos domésticos, segundo definição adotada, são constituídos por misturas de restos de alimento, papel, papelão, plásticos, metal, vidro, madeira, trapos, couro, etc. A composição física dos resíduos sólidos domésticos é importante para a seleção e operação de equipamentos e instalações, na otimização de recursos e consumo de energia e na análise e projeto de aterros sanitários. Essa composição, por outro lado, varia com a localidade e com o estágio de desenvolvimento em que se está inserido. Tal variação é nítida quando se efetua uma comparação entre diferentes países e respectiva renda per capita, como ilustrado por Tchobanoglous et al. (1993) na Tabela 2.1. Verifica-se que os valores observados na Tabela 2.1 são compatíveis com a composição observada em alguns municípios brasileiros. Pessin et al (1991) da Universidade de Caxias do Sul desenvolveram, através do Grupo de Resíduos Sólidos do Centro de Ciências Exatas e Tecnologia, um programa de pesquisas sobre manejo, coleta, tratamento e destino final de resíduos sólidos domésticos no município de Caxias do Sul, RS, em três estações do ano. Nesse programa foi efetuado um estudo sobre a composição gravimétrica, como mostrado na Tabela 2.2. Caracterizações efetuadas no município de São Carlos, SP, são próximas daquelas observadas nos levantamentos de Gomes, citado por Pinto et al (2000), como demonstram os valores indicados na Tabela 2.3. Neste estudo efetuou-se também uma classificação em termos de biodegradabilidade dos componentes avaliados. Determinadas localidades do Brasil apresentam características bem diferenciadas daquelas observadas nos municípios da região Sul e Sudeste do Brasil, onde são verificados porcentuais elevados de restos de alimento, como observado na Tabela 2.4 com dados fornecidos pela CONDER (1992). 6 Tabela 2.1: Distribuição típica para composição gravimétrica dos resíduos sólidos domésticos em função do estágio de desenvolvimento do país (Tchobanoglous, et al 1993). Componente Países de baixa renda per capita Países de média renda per capita Países de elevada renda per capita Orgânico Restos de alimento Papela e papelãob Plásticos Têxteis Borracha e couro Podasc e madeirad 40-85 1-10 (a+b) 1-5 1-5 1-5 1-5 (c+d) 20-65 8-30 (a+b) 2-6 2-10 2-10 1-10 (c+d) 6-30 20-45 e 5-15 2-8 2-6 0-2 10-20 e 1-4 1-10 1-5 1-40 1-10 1-5 1-30 4-12 3-12 0-10 Inorgânicos Vidro Metais em geral Terra, pó, cinzas Tabela 2.2: Composição Gravimétrica dos resíduos sólidos domésticos de Caxias do Sul RS. (Pessin et al, 1991). Componente Restos de alimento Papel, papelão Metais ferrosos Trapo, couro, borracha Plástico fino e grosso Vidro Madeira Metais não ferrosos Diversos Porcentagem em peso (base úmida) Inverno Primavera Verão Média 48,70 26,50 4,80 7,70 8,70 1,10 0,80 0,40 1,30 53,00 15,30 6,20 7,00 9,50 5,40 1,90 0,20 1,50 53,43 21,03 5,00 6,63 8,87 2,60 1,13 0,33 0,97 51,7 20,9 5,3 7,1 9,0 3,0 1,3 0,3 1,3 7 Tabela 2.3: Composição gravimétrica dos resíduos sólidos domésticos do município de São Carlos – SP e respectiva biodegradabilidade. (Gomes, apud Pinto et al., 2000). Porcentagem em peso (base úmida) Componente Biodegradabilidade Classificação Restos de alimento 56,7 Facilmente biodegradável Papel, papelão 21,3 Moderadamente biodegradável Trapo 3,4 Madeira, couro, borracha 2,3 Vidro 1,4 Plástico 8,5 Metal 5,4 Inertes 1,3 Tabela 2.4: % do total 56,7 Dificilmente biodegradável Não biodegradável 21,3 5,7 16,3 Composição Gravimétrica do Lixo Domiciliar em dois municípios da região metropolitana de Salvador (CONDER, 1992). Porcentagem em peso (base úmida) Componentes Simões Filho Restos de alimento Papel Papelão Metais ferrosos Trapo, couro, borracha Plástico mole Plástico duro Vidro Madeira Metais não ferrosos Outros Produção per capita 3 Massa específica (kg/m ) Lauro de Freitas 74,20 5,10 3,00 1,90 1,60 8,80 2,00 3,30 0,10 - 74,60 4,50 2,40 1,90 2,50 10,1 1,30 1,50 0,30 0,20 0,70 0,9 ± 0,2 260,80 0,7 ± 0,2 226,70 2.3. PROPRIEDADES As propriedades físicas, químicas e biológicas dos resíduos sólidos domésticos são de grande importância para análise, concepção e dimensionamento dos elementos constituintes 8 do sistema de manejo de resíduos sólidos. Possibilita a escolha de alternativas para coleta, tratamento destinação, assim como dos equipamentos envolvidos. PROPRIEDADES FÍSICAS Dentre as propriedades físicas mais importantes dos resíduos sólidos domésticos, desatacam-se: massa específica, umidade, tamanho das partículas e sua distribuição, capacidade de campo e porosidade. A massa específica é um parâmetro de importância uma vez que podem ser determinados diversos valores, considerando-se as condições em que se encontra o resíduo, ou seja: natural, como encontrado em recipientes, compactado (em caminhões compactadores e no aterro), entre outras situações. Infelizmente, existe muita dificuldade na definição de padrões para a massa específica dos resíduos, devido a sua não uniformidade, e a questão das condições em que o mesmo se encontra (compactado ou não), muitas vezes não é bem definida. Contudo, Tchobanoglous et al (1993) apresenta valores referenciais para massa específica e umidade dos diversos tipos de resíduos, como mostrado na Tabela 2.5. Tabela 2.5: Massa específica e umidade dos resíduos domiciliares, comerciais, industriais e agrícolas (adaptado de Tchobanoglous et al, 1993). Tipo de Resíduo Massa Específica kg/m3 Faixa Típico Umidade % em peso Faixa Típico Domiciliar (não compactado) Restos de alimento (misturado) Papel Papelão Plásticos Têxteis Borracha Couro Restos de jardim Madeira Vidro Latas (aço) Alumínio Outros metais Poeira, cinzas, etc. 131-481 42-131 42-80 42-131 42-101 101-202 101-261 59-225 131-320 160-481 50-160 65-240 131-1.151 320-1.000 291 89 50 65 65 131 160 101 237 196 89 160 320 481 50-80 4-10 4-8 1-4 6-15 1-4 8-12 30-80 15-40 1-4 2-4 2-4 2-4 6-12 70 6 5 2 10 2 10 60 20 2 3 2 3 8 9 Tipo de Resíduo Massa Específica kg/m3 Faixa Típico 650-831 745 89-181 131 Umidade % em peso Faixa Típico 6-12 6 5-20 15 30-148 208-297 593-831 267-356 267-386 59 237 593 297 326 20-40 40-80 50-90 20-70 40-60 30 60 80 50 50 No veículo compactador No aterro Normalmente compactado Bem compactado Comercial 178-451 297 15-40 20 362-498 590-742 451 599 15-40 15-40 25 25 Alimentos (úmidos) Equipamentos Engradado de madeira Ornamento vegetal Restos combustíveis Restos não combustíveis Restos misturados Construção e demolição 475-949 148-202 110-160 101-181 50-181 181-362 139-181 540 181 110 148 119 300 160 50-80 0-2 10-30 20-80 10-30 5-15 10-25 70 1 20 5 15 10 15 1.0001.599 300-400 181-359 1.1981.801 1.421 2-10 4 359 261 1.540 4-15 4-15 0-5 8 8 - 1.000 801 160 1.780 75-99 2-10 6-15 0-5 80 4 10 - 739 899 949 291 181 0-5 0-5 0-5 10-40 6-15 2 20 10 Cinzas Outros Restos de jardim (domiciliar) Folhas (caídas e secas) Grama (cortadas) Grama (úmida e compactada) Restos de jardim (pedaços) Restos de jardim (composto) Urbano (da coleta normal) resto Demolição misturado (não combustível) Demolição misturado (combustível) Construção misturado (combustível) Concreto Industrial Lodo químico (úmido) Cinzas Tiras de couro Tiras de metal (pesado) Tiras de metal (leve) Tiras de metal (misturado) Óleos, piche, asfalto Pó de serra Têxteis 801-1.101 700-899 101-249 1.5011.999 498-899 700-1.501 801-1.000 101-350 101-220 10 Tipo de Resíduo Madeira (misturada) Agrícola Agrícola (misturado) Animais mortos Frutas (misturadas) Esterco (úmido) Vegetais (misturados) Massa Específica kg/m3 Faixa Típico 400-676 498 400-751 202-498 249-751 899-1.050 202-700 561 359 359 1.000 359 Umidade % em peso Faixa Típico 30-60 25 40-80 60-90 75-96 60-90 50 75 94 75 As dimensões e a distribuição do tamanho dos materiais componentes dos resíduos sólidos domésticos ganham maior importância quando existe interesse na sua recuperação, principalmente por meios mecânicos. Dentre os materiais de maior tamanho médio, destacam-se o papelão e o papel, seguido pelo plástico, tomando-se como base o comprimento como maior dimensão. A capacidade de campo dos resíduos sólidos domésticos é representada pela umidade total que pode ser retida em uma amostra de resíduo, submetido à ação gravitacional. A capacidade de campo desses resíduos é de importância crítica na formação do chorume nos aterros sanitários. A quantidade de chorume pode ser relacionada diretamente com o excedente da capacidade de campo. A capacidade de campo varia com o grau compactação e o estado de decomposição do resíduo aterrado. A capacidade campo de resíduos domésticos não compactados varia entre 50 e 60%, considerando-se os dados de Tchobanoglous et al. (1993). PROPRIEDADES QUÍMICAS As informações sobre a composição dos resíduos sólidos domésticos são de grande importância na avaliação de processos alternativos e opções de reciclagem. A prática da incineração, por exemplo, torna-se viável, dependendo da composição química dos resíduos. O conteúdo energético pode ser determinado em laboratório, empregando-se calorímetros ou estimado por cálculos baseados na composição elementar de componentes conhecidos dos resíduos domésticos. Quando há interesse na conversão biológica dos resíduos domésticos, tais como compostos (de compostagem), metano e etanol, as informações dos nutrientes essenciais são de grande importância na manutenção do equilíbrio e da eficiência na conversão. 11 Tabela 2.6: Dados típicos da composição de componentes dos resíduos sólidos domiciliares (Tchobanoglous et al, 1993). Componente Carbono Porcentagem em peso base seca (%) Hidrogênio Oxigênio Nitrogênio Enxofre Cinzas Orgânico Restos de alimento 48,0 6,4 37,6 2,6 0,4 5,0 Papel 43,5 6,0 44,0 0,3 0,2 6,0 Papelão Plásticos Têxteis 44,0 60,0 5,9 7,2 44,6 22,8 0,3 - 0,2 - 5,0 10,0 55,0 6,6 31,2 4,6 0,15 2,5 Borracha Couro 78,0 10,0 - 2,0 - 10,0 60,0 8,0 11,6 10,0 0,4 10,0 Podas de jardins Madeira 47,8 49,5 6,0 6,0 38,0 42,7 3,4 0,2 0,3 0,1 4,5 1,5 0,5 0,1 0,4 <0,1 - 98,9 4,5 26,3 0,6 3,0 4,3 2,0 <0,1 0,5 0,2 90,5 68,0 Inorgânico Vidro Metais Pó, cinza, etc. PROPRIEDADES BIOLÓGICAS Ainda, segundo Tchobanoglous et al (1993), excluindo plásticos, borracha, e couro, os demais componentes orgânicos presentes nos resíduos sólidos domésticos podem ser classificados como: ◦ Componentes solúveis em água (açúcar, amido, aminoácidos e vários ácidos orgânicos); ◦ Hemicelulose (produto da condensação de determinados açucares); ◦ Celulose (produto de condensação da glicose); ◦ Gordura, óleos e ceras (ésteres de álcool e longas cadeias de ácidos graxos) ◦ Lignina (matéria polimérica contendo cadeias aromáticas com grupos -OCH3); ◦ Ligninocelulose (combinação de lignina e celulose); e ◦ Proteínas. BIODEGRADABILIDADE A biodegradabilidade da fração orgânica é freqüentemente medida através do conteúdo de sólidos voláteis, determinado pela queima acima de 550 ºC, contudo os 12 resultados podem ser, por vezes, enganosos, pois determinados produtos altamente voláteis são pouco biodegradáveis. Alternativamente o conteúdo de lignina dos resíduos pode ser usado para estimar a fração biodegradável e, neste caso, diversos compostos orgânicos podem ser listados para identificação da biodegradabilidade, como mostrado na Tabela 2.7. Tabela 2.7: Dados de fração biodegradável de alguns resíduos orgânicos, baseados no conteúdo de lignina calculados por Chandler, et al (1980). Componente Restos de alimento Papel Jornais/revistas Papéis de escritórios Papelão Podas (jardins) Porcentagem de Sólidos Voláteis em relação aos Sólidos Totais Porcentagem de Lignina em relação aos Sólidos Voláteis Fração biodegradável 7-15 0,4 0,82 94,0 96,4 94,0 50-90 21,9 0,4 12,9 4,1 0,22 0,82 0,47 0,72 Materiais com maior quantidade de lignina, tais como revistas e jornais, apresentam menor biodegradabilidade que outros resíduos orgânicos encontrados no lixo doméstico. A taxa com que ocorre a degradação dos principais componentes orgânicos do lixo doméstico varia consideravelmente, e do ponto de vista prático podem ser classificados em rapidamente e lentamente degradáveis. ODORES Odores surgem de resíduos sólidos quando se verifica o armazenamento por períodos relativamente longos no intervalo da geração “in loco” e a coleta, nas estações de transbordo e nos aterros sanitários. Essas ocorrências tornam-se significativas em locais de clima tropical, como no Brasil. A formação de odores resulta da decomposição anaeróbia de componentes biodegradáveis. Por exemplo, sob condições anaeróbias, o sulfato pode ser reduzido a sulfeto, que posteriormente combina com o hidrogênio para formar H2S. Os íons sulfeto podem também combinar com sais metálicos, tais como ferro, e formar sulfetos metálicos. A cor preta ou escurecida dos resíduos sólidos submetidos à 13 decomposição anaeróbia em aterros, ocorre primariamente pela formação de sulfetos metálicos. A redução de compostos orgânicos contendo um radical de enxofre pode iniciar a formação de compostos como metil-mercaptana e ácidos aminobutíricos, que apresentam odores desagradáveis. A metil-mercaptana pode ser hidrolizada bioquimicamente para metilálcool e sulfeto de hidrogênio. MOSCAS A procriação de moscas é um problema constante em países como o Brasil, portanto são muito importantes considerações sobre o armazenamento, principalmente no local de origem. As moscas podem se desenvolver em menos de duas semanas após a postura de ovos. Dentro deste ponto vista, o período em que ocorre a formação da pulpa no aterro sanitário pode ser inferior ao período de desenvolvimento (9 a 11 dias), uma vez que o período de armazenamento desde sua geração (ou às vezes antes) até sua disposição no aterro, podem ser elevados. Na Tabela 2.8 é mostrado o desenvolvimento das moscas domésticas, a partir da postura. Tabela 2.8: Fases de desenvolvimento de moscas domésticas (Salvato, 1992) Fase Eclosão de ovos Primeiro estágio do período larval Segundo estágio do período larval Terceiro estágio do período larval Estágio de Pulpa Total Tempo 8 a 12 horas 20 horas 24 horas 3 dias 4 a 5 dias 9-11 dias Ainda, durante o estágio larval, as larvas podem aderir-se nas paredes dos recipientes e containeres, e podem ser transportados posteriormente ao aterro sanitário, onde finalizam seu desenvolvimento. Neste aspecto, a cobertura diária é imprescindível na redução e eliminação de moscas dos aterros sanitários e arredores. 14 2.4. RESÍDUOS DOMICILIARES PERIGOSOS Segundo a NBR 10.004 (1987), resíduos perigosos são definidos como resíduos ou a combinação destes, que proporcionam um potencial perigo aos seres humanos ou outros organismos vivos, pois: ◦ Não são degradáveis ou persistem na natureza; ◦ Podem ser mensurados biologicamente; ◦ Podem ser letais ou ◦ Podem provocar ou tender a provocar efeitos cumulativos prejudiciais. A questão da periculosidade está diretamente relacionada com a segurança e a saúde. São propriedades relacionadas com a segurança: corrosividade, explosividade, inflamabilidade, ponto de ignição e reatividade. São propriedades relacionadas com a saúde: carcinogenicidade, infectividade, irritabilidade (resposta alérgica), mutagenicidade, toxicidade (crônica ou aguda), radioatividade e teratogenicidade. Para o lixo doméstico, as propriedades mais comuns que identificam a periculosidade de determinado material, são: ponto de ignição, corrosividade, reatividade, toxicidade e carcinogenicidade (Wagner, 1991). Muitos produtos que são utilizados diariamente nas residências são tóxicos e podem ser perigosos à saúde e ao meio ambiente, tais como: de limpeza, de uso pessoal, automotivos, de pintura, e de jardinagem. Na Tabela 2.9 apresenta-se uma lista de produtos considerados perigosos. As pequenas quantidades de resíduos perigosos encontrados no lixo doméstico podem ser consideradas de significância, pois estão presentes em todas as instalações de manejo de resíduos sólidos e diversos persistem ativos após a descarga no meio ambiente. Na Tabela 2.10 são mostrados os perigos associados aos resíduos persistentes e não persistentes presentes no lixo doméstico. Na atmosfera dos arredores de aterros sanitários, têm sido encontrados traços de constituintes orgânicos, em gases extraídos dos aterros e no chorume. Os traços desses constituintes podem ter origem no próprio resíduo aterrado e/ou foram produzidos pelas reações químicas e bioquímicas. De acordo com Tchobanoglous et al. (1993), estudos realizados em 1987 pelo Comitê de Resíduos Domiciliares Perigosos forneceram indicativos da quantidade de resíduos sólidos perigosos em residências e comércio. Os resultados são apresentados na Tabela 2.10. 15 Tabela 2.9: Produtos perigosos típicos empregados em residências (Tchobanoglous et al. 1993). Produto Propriedade Local de Disposição Adequado Produtos de limpeza Pó abrasivo, amônia e Baseados em amônia, água sanitária, desentupidores, limpadores de vidro, limpadores de fogão e removedor de manchas. Corrosivo Instalações para resíduos perigosos Aerossóis, polidores de móveis, polidores de sapatos, polidores de metais, limpador de tapetes. Medicamentos vencidos Inflamável Instalações para resíduos perigosos Perigosos para os demais da família Diluição e lançamento no esgoto. Veneno Diluição de pequenas quantidades e lançamento no esgoto. Instalações para resíduos perigosos Produtos de uso pessoal Loções para cabelo e shampoos medicinais. Para limpeza de unhas Veneno e inflamável Produtos automotivos Fluídos de freio e de transmissão e gasolina. Óleo diesel, óleo usado e querosene Bateria de carros Inflamáveis Instalações para resíduos perigosos Inflamáveis Centros de reciclagem Corrosivo Centros de reciclagem ou reparo Esmalte, a base de óleo e látex Inflamáveis Instalações para resíduos perigosos Solventes e Thinners Inflamáveis Reuso ou Instalações para resíduos perigosos Baterias e pilhas Corrosivos Centros de reciclagem Produtos químicos para fotografia Corrosivos, venenoso Corrosivos Instalações para resíduos perigosos Produtos para pintura Diversos Ácidos para piscina e cloro Instalações para resíduos perigosos Pesticidas, herbicidas e fertilizantes Inseticidas Instalações para resíduos perigosos Fertilizantes químicos Veneno e alguns inflamáveis Veneno Inseticidas para jardins Veneno Instalações para resíduos perigosos Instalações para resíduos perigosos 16 Segundo esses estudos, a distribuição de resíduos perigosos entre fontes residenciais e comerciais variou amplamente, contudo, estima-se que aproximadamente 75 a 85% dos resíduos perigosos domésticos podem ser de origem residencial. Tabela 2.10: Perigos associados com a persistência e não persistência de resíduos orgânicos (Porteus, 1985). Compostos Típicos Perigos Orgânicos não persistentes Óleo, solventes de baixo peso molecular, alguns pesticidas biodegradáveis (organofosforados, carbamatos, triazinas, anilinas), óleo usado, maioria dos detergentes Problemas de toxicidade primariamente ao meio ambiente e biota na origem ou local de descarga. Efeitos tóxicos ocorrem rapidamente após exposição. Orgânicos persistentes Hidrocarbonetos de elevado peso molecular clorados e aromáticos, alguns pesticidas (hexaclorobenzeno, DDT, DDE, lindane), PCBs Podem ocorrer efeitos tóxicos imediatos na origem ou no local de descarga. Pode ocorrer toxicidade crônica e duradoura. O transporte dos resíduos a partir da origem pode resultar em contaminação difusa e bioconcentração na cadeia alimentar. O transporte natural no ambiente pode expor a biota a baixos níveis de poluição, resultando em toxicidade crônica. 2.5. REFERÊNCIAS 1. ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10.004: Resíduos Sólidos. 1987. 2. Chandler, J.A., et al., Predicting Methane Formation Biodegradability. Biotechnology and Bioengineering Symposium. Vol. 10, p. 93-107. 1980. 3. CONDER – BA, Plano diretor de limpeza urbana da área central de Salvador – BA. 1992. 4. Corson, W. H., editor. Manual Global de Ecologia. 1ª ed., Editora Augustus. São Paulo, ISBN 85-85497-12-2. 397p. 1993. 5. Pessin, N., Mandelli, S.M.C., Slompo,M., Determinação da Composição Física e das Características Físico-Químicas dos Resíduos Sólidos Domésticos da Cidade de Caxias do Sul. in: Tratamento de resíduos sólidos: compêndio de publicações. Universidade de Caxias do Sul. Caxias do Sul, RS. 291 p. 1991. 17 6. Pinto, D.M.D.L., Baldochi, V.M.Z., Povinelli, J., Procedimento para Elaboração de Resíduo Urbano Doméstico Padrão. Revista de Engenharia Sanitária e Ambiental ABES. p. 25-31. Vol. 5, nº 1 e 2. 2000. 7. Porteus, A., editor, Hazardous Waste in UK: An Overview. in: Hazardous Waste Management Handbook. Butterworths, London. 1985. 8. Salvato, J.A., Environmental Engineering and Sanitation. 4th ed., Wiley-Interscience, New York.. 1992. 9. Tammemagi, H.. The Waste Crisis: Landfills, Incinerators, and the Search for a Sustainable Future. Oxford University Press, Inc. New York, ISBN 0-19-512898-2. 279 p. 1999. 10. Tchobanoglous, G.,Theisen,H., and Vigil, S. Integrated Solid Waste Management Engineering Principles and Management Issues, McGrall-Hill, Inc.,New York, 949 p. 1993. 11. Wagner, T.P., Hazardous Waste Regulations, 2nd edition. Van Nostrand Reinhold, New York.. 1991. 12. White, P.R., Franke, M., Hindle, P., Integrated Solid Waste Management: A Lifecycle Inventory. Blackie Academics & Professional (imprint of Chapman & Hall). ISBN 07514-0046-7. 362 p. 1993. 18