Artigo apresentado no II ENCONTRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS – ENET promovido pelo Instituto de Direito
Tributário de Londrina de 19 a 21/09/07 (Selecionado pela Comissão Organizadora).
A GUERRA FISCAL NO ÂMBITO DO ISS
*
Valéria Canalle
*
José Adelino de Freitas
Sumário: 01. Introdução. 02. Definição do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza; 03. A Guerra Fiscal no âmbito do Imposto sobre Serviços de Qualquer
Natureza; 3.1. Incentivos Fiscais; 3.2. Conflito de Competência entre Municípios: o local da prestação do serviço; 3.2.1. O Decreto-Lei 406/1968; 3.2.2. A Lei Complementar
116/2003; 3.2.3. Definição de Estabelecimento Prestador; 3.2.4. Posicionamento da Jurisprudência atual; 04. Conclusão; 05. Bibliografia.
01. INTRODUÇÃO
Atualmente, tem lugar cativo nos noticiários e meios de comunicação a existência de uma feroz “guerra fiscal” travada entre vários Estados e Municípios brasileiros.
Mas o que seria esta “guerra fiscal”?
Este fenômeno pode ser definido como renúncia fiscal concedida por um ente tributante com o objetivo de atrair para o seu espaço territorial um grande número de
empresas ou de um ou mais segmentos da economia. Na medida em que um ente oferece uma vantagem – redução de alíquotas e de base de cálculo, por exemplo - o ente
tributante vizinho propõe uma vantagem maior, cabendo ao empresário escolher quais são os benefícios mais atraentes para a fixação de sua empresa.
A chamada “guerra fiscal” contaminou os Estados e Municípios brasileiros. Está sendo travada uma verdadeira luta, ainda que por vezes, de discutível legalidade.
A matéria ganha contornos ainda mais polêmicos quando o assunto é a prestação de serviços tributáveis pelo ISS – Imposto sobre Serviços de qualquer natureza –
de competência dos Municípios.
Com efeito, sob a desculpa de desenvolver a economia local, vários Municípios brasileiros têm se utilizado da chamada renúncia fiscal para atrair investimentos,
sob a condição de que as empresas se instalem em seus respectivos territórios e lá passem a recolher o ISS.
Apesar de ser um imposto existente no ordenamento jurídico pátrio desde 1965, sobre o mesmo pairam inúmeras controvérsias, tanto na doutrina quanto na
jurisprudência, sobretudo quanto ao local da prestação do serviço.
Assim sendo, o presente estudo tem por proposta central pintar o cenário atual do ISS, sua definição, regras norteadoras, questionamentos e principais
conflitos.
02. DEFINIÇÃO DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA
Com o brilhantismo que lhe é característico, Ricardo Lobo Torres define o ISS da seguinte maneira:
O tributo incidente sobre o serviço enquanto objeto de circulação econômica, que só se caracteriza com a habitualidade da prestação, a excluir os serviços
prestados casualmente, e a lucratividade, assim entendida a intenção de obter vantagens econômicas com a atividade, ainda que o lucro seja invisível ou esteja
embutido no rendimento de serviço paralelo. Mas para que possa o Município cobrar o imposto é necessário que o serviço conste da listagem da lei complementar,
[1]
que é taxativa em sua globalidade, admitindo, porém, a interpretação extensiva com relação a cada qual dos serviços listados.
Disso segue-se, inexoravelmente, que o ISS tem por objeto a circulação econômica de serviços – prestação de serviços – consistente na circulação econômica de
bens imateriais ou incorpóreos, que não sejam mercadorias ou produtos.
03. A GUERRA FISCAL NO ÂMBITO DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA
O tema da “guerra fiscal” no âmbito do ISS é dos mais tormentosos. Esclareça-se, desde logo, que a questão pode ser examinada sob dois planos: a) primeiro,
devido à concessão de incentivos fiscais concedidos pelos Municípios aos prestadores de serviços - sujeitos passivos da obrigação; b) segundo, da interpretação ao termo “local
do estabelecimento prestador” dos serviços, previsto no art. 3.º da LC 116/2003.
O escopo deste tópico, todavia, é afastar, de plano, equívocos envolvendo essas duas questões.
Primeiramente será abordada a questão da concessão de incentivos fiscais pelos Municípios. Em seguida, chegar-se-á a questão que envolve conflito de
competência entre Municípios, em decorrência da interpretação dada a expressão “local do estabelecimento prestador” dos serviços.
3.1.
INCENTIVOS FISCAIS
Em princípio, pode-se dizer que os incentivos fiscais visam eliminar ou reduzir a carga tributária, sendo concedidos como instrumentos para promover o equilíbrio
do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do país, nos termos do art. 151 da CF.
Essa interpretação tem o abono da doutrina. Por todos, vejamos as lições de Igor Tenório, Fenelon Bonavides Neto e Eduardo Marcial Ferreira Jardim:
Os incentivos fiscais visam, principalmente, ao desenvolvimento econômico e social. Consistem em deduções do quantum devido ao Estado, tendo como base de
[2]
cálculo o tributo que seria exigido normalmente do contribuinte beneficiário Revestem geralmente a forma de isenção parcial ou total do imposto devido
Benefício concedido pelo Governo visando a incentivar certas áreas de produção, com finalidade de incrementar o crescimento de empresas, aumentar vendas
[3]
para o exterior, ao desenvolvimento de regiões carentes, a estimular empregos, etc.
Figura situada no âmbito da extrafiscalidade, consiste na redução do quantum debeatur de natureza tributária, ou mesmo na eliminação da exigibilidade. Sua
[4]
instituição, quando legítima, representa instrumento de ação econômica e social objetivando à consecução do bem comum.
Ademais disso, convém lembrar que os incentivos fiscais apresentam-se sob diversas formas, tais como, isenção, redução da base de cálculo ou da alíquota,
[5]
anistia, vantagens financeiras, creditícias e operacionais, suspensão de impostos, etc.
No que se refere à temática em exame, o art.151, I da CF estabelece o seguinte:
Art. 151. É vedado à União:
I – instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a
Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as
diferentes regiões do País.
Convém lembrar, contudo, a disposição do art. 156, §3.º, III da CF em complementação ao supracitado artigo. Veja-se:
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
(...)
III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar;
(...)
§3.º - Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar:
(...)
III – regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
O primeiro enunciado constitucional deixa bem evidente a importância do desenvolvimento econômico em nosso País e nesse sentido não será permitido que os
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tributos sejam cobrados de modo a criarem empecilhos ao desenvolvimento econômico .
[7]
Por essas razões é que a figura do incentivo fiscal mostra-se importante, pois visa exatamente, o crescimento econômico.
Já com relação ao segundo dispositivo constitucional, vale aqui a seguinte ressalva: não obstante os Municípios serem dotados de autonomia para conceder
isenções, incentivos e benefícios fiscais, somente com a devida previsão em lei complementar poderão conceder tais desonerações.
Assim, tendo em vista o art. 88 do ADCT, vale destacar que na falta de lei complementar, não será objeto de concessão de isenções, incentivos e benefícios
fiscais, que resulte, direta ou indiretamente, na redução da alíquota mínima de 2%.
Ademais, a Lei Complementar 101/2000 já dispôs sobre o assunto, limitando a concessão de tais desonerações e responsabilizando os administradores
fazendários caso ajam em discrepâncias com o disposto em referida lei.
Disso decorre que os Municípios não possuem legitimidade para, ao seu bel prazer, conceder isenções, incentivos e benefícios fiscais, estando sujeitos aos limites
[8]
impostos na LC 101/2000, sob pena de uma eventual desobediência acarretar responsabilidade aos administradores fazendários.
O estatuído na LC 101/2000, em especial com relação à disposição do art. 14, provocou diversas opiniões jurídicas. Muitas delas no sentido de que tal preceito
apresenta-se na prática, inconstitucional. É como pensa a Mestre Betina Treiger Grupenmacher:
Sendo certo que a autonomia das pessoas políticas de Direito Público é decorrência necessária do Princípio Federativo, a vedação de renúncia de receita e a
imposição de medidas de compensação estabelecidas pelo art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal consubstanciam-se em medidas inconstitucionais, pois que
limitam-lhes a prerrogativa de autogovernabilidade.
Dentre as prerrogativas inerentes à autogovernabilidade das pessoas políticas de Direito Público está a plena autonomia arrecadatória e de gerência financeira, o
que abrange a faculdade de conceder isenções, incentivos e benefícios fiscais.
O art. 14 da L.C. 101/2000 é inoperante, pois ao invadir as competências legislativas e administrativas dos Estados e Municípios encerra comando inconstitucional.
[9]
Em que pesem as ilustres palavras supracitadas, o fato é que nos dias atuais as limitações contidas no art. 14 da LC 101/2000 mostram-se imprescindíveis, diante
de tantos abusos praticados pelos administradores fazendários.
Hodiernamente, verifica-se que os incentivos fiscais vêm sendo concedidos sob o manto do interesse público, sendo outorgados por critérios meramente políticos.
É de bom aviso ter presente que, no mais das vezes, empresas bem estruturadas, bem organizadas, levam vantagens em relação a outros setores da economia não organizados
[10]
politicamente.
Além disso, a concessão de incentivos fiscais vem gerando uma verdadeira disputa entre municípios, em especial no ramo de prestação de serviços, o que torna a
escolha dos empresários um verdadeiro leilão de benefícios fiscais.
Disso segue-se, inexoravelmente, que dentro de uma região metropolitana, Municípios mais fracos reduzem as alíquotas ou a base de cálculo do ISS para que nos
[11]
seus territórios se instalem empresas prestadoras de serviços, cujas atividades pudessem gerar empregos e rendas ao Município.
A fúria avassaladora de arrecadação de muitos Municípios fez surgir uma situação de manifesta inconstitucionalidade. Ocorre no caso em que, mesmo após a
promulgação da EC 37/2002 que estabeleceu o teto mínimo de 2% para o ISS, os Municípios oferecem alíquotas nominais inferiores a este teto, com o fim de atraírem
[12]
contrib intes para os se s territórios
Admitir tal situação seria o mesmo que admitir colocar às avessas o princípio da igualdade. Não há dúvidas de que de fato, assiste aos Municípios garantias
constitucionais que lhes proporcionem autonomia e autogovernabilidade, entretanto, tais garantias encontram limites dentro do próprio ordenamento legal que veda a simulação,
atos que atentem aos princípios da isonomia ou da igualdade, da diferenciação desenfreada de alíquotas, etc.
Verifica-se ainda que muitos prestadores de serviços atraídos pelas vantagens oferecidas por um determinado município, “instalam-se” de forma fictícia em tais
[13]
“paraísos fiscais”, mantendo ali somente sede de fachada, com uma caixa postal ou um endereço formal, por exemplo.
Nesse contexto, surge o segundo conflito envolvendo Municípios e prestadores de serviços. O que acontece na prática é um grande número de prestadores de
serviços – pessoas físicas ou jurídicas – estabelecidos em um determinado Município, prestando serviços em um outro. E isto enseja a legítima questão: qual o Município
competente para tributar tais prestações? O Município em que estas ocorrem ou o local do estabelecimento prestador?
Eis o maior conflito de competência existente nos dias atuais quando se fala em ISS, cuja solução unânime tarda em aparecer, como a seguir veremos.
3.2. CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE MUNICÍPIOS: O LOCAL DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO
Como se sabe, o ISS tem como critério material prestar serviços e disso resulta que somente irradiará os efeitos jurídicos desejados se a prestação dos serviços
ocorrer dentro do perímetro delimitador do território do respectivo Município.
Disso segue-se, a vital importância de se estabelecer a exata delimitação do local da ocorrência da prestação dos serviços, tendo em vista servir para definir qual a
lei aplicável e principalmente, a identificação de qual o ente político que validamente pode exigir o tributo.
Tamanha a evidência desta circunstância, que o aspecto espacial pode compreender tanto o espaço territorial de validade da lei, sendo assim definido como os
limites geográficos da pessoa jurídica de direito público, quanto o local da específica concretização do fato gerador.
3.2.1. O DECRETO-LEI 406/1968
[14]
No que se refere ao ISS o Decreto-lei 406/1968
estabelecia o seguinte:
Art. 12. Considera-se local da prestação do serviço:
a) o do estabelecimento prestador ou, na falta de estabelecimento, o do domicílio do prestador;
b) no caso de construção civil, o local onde se efetuar a prestação.
O artigo em pauta ao estabelecer o critério espacial do ISS, prescrevendo que o local da prestação do serviço é o do estabelecimento prestador – salvo nos casos
de falta de estabelecimento e no caso de construção civil - aguçou acirradas discussões entre diversos Municípios.
Tais discussões estão intimamente vinculadas ao exato entendimento da expressão “local do estabelecimento prestador”.
E é sob este prisma que existe uma feroz disputa entre vários Municípios brasileiros, geradora de uma guerra fiscal desenfreada.
Constantemente, vários Municípios reduzem as alíquotas do ISS com o específico objetivo de atrair empresas prestadoras de serviços para os seus respectivos
territórios.
Em decorrência desse fato é que as empresas prestadoras de serviços acabam sendo compelidas ao recolhimento do ISS no local onde se encontram sediados os
seus estabelecimentos.
Nesse sentido, poder-se-ia dizer que a grande dificuldade encontrada é aquela em que envolve dois ou mais Municípios, ou seja, quando uma empresa possui o
seu estabelecimento sediado em um determinado Município e presta serviço em outro.
Durante anos a fio a norma do Decreto-lei 406/1968 foi muito debatida em nossa doutrina e jurisprudência, gerando diversas opiniões a respeito.
E para finalizar as observações feitas por ocasião da vigência do antigo Decreto-lei 406, vale ressaltar que a nossa jurisprudência também vacilou ora para o local
[15]
[16]
do estabelecimento prestador
ora para o local da prestação dos serviços
.
3.2.2. A LEI COMPLEMENTAR 116/2003
Como exposto, durante anos a questão da determinação do local do recolhimento do ISS foi alvo de duros embates entre Municípios que se entendiam igualmente
competentes para tal recolhimento.
Em função disso, houve a esperança que uma nova lei regulasse a matéria, pacificando de uma vez por todas o problema do local da arrecadação do ISS.
Às vésperas da publicação da LC 116/2003 a ânsia dos tributaristas e de vários prestadores de serviços era no sentido de que depois de tantos problemas gerados
pelo art. 12 do Decreto-lei 406/1968, o local do estabelecimento prestador – como assim prescrevia - seria de uma vez por todas substituído pelo local da prestação do serviço.
Esta era a principal questão do ISS e a LC 116/2003 não solucionou. Apenas ampliou o rol das exceções, que antes era única para exatamente vinte e dois incisos.
Portanto, a regra geral – local do estabelecimento prestador – continuou a mesma.
Centremos nossa atenção agora ao que consideramos o ponto nuclear desta observação: a disposição do art. 3.º da LC 116/2003.
Art. 3.º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do
prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII...
O artigo em pauta traz três regras para a fixação do local para o recolhimento do ISS. A primeira regra é direcionada aos serviços previstos nos incisos I a XXII
onde tal imposto deve ser recolhido no Município onde o serviço foi prestado – em consagração ao princípio da territorialidade. A segunda prevista para aqueles prestadores de
serviços que não possuem estabelecimento, sendo o imposto recolhido no local do domicílio do prestador.Já a terceira regra, diz respeito aos demais casos, sendo necessária
uma interpretação conjunta dos artigos 3.º e 4.º da LC 116/2003, para a exata compreensão do que vem a ser o local do estabelecimento prestador.
3.2.3. DEFINIÇÃO DE ESTABELECIMENTO PRESTADOR
Eis a principal discussão relativa ao ISS: a exata definição do que vem a ser “estabelecimento prestador do serviço”.
A doutrina pátria vem a longos anos se posicionando a respeito, porém sem unanimidade. Dividem-se em duas correntes: a primeira no sentido de que o
estabelecimento prestador do serviço é local do estabelecimento da empresa e a segunda, no sentido de ser o local da prestação do serviço.
Os Mestres Bernardo Ribeiro de Moraes e Aliomar Baleeiro defensores da primeira corrente tecem os seguintes comentários a respeito:
De se notar, inicialmente, que a lei dispõe ‘estabelecimento prestador’ e não ‘do prestador’, exigindo, assim, a participação ativa do estabelecimento na prestação
do serviço. Estabelecimento prestador tanto pode ser a matriz ou a sede, como a filial ou a sucursal, a fábrica, a oficina, a agência, o escritório, a casa lotérica, o
[17]
hospital, a tinturaria, a escola, ou qualquer outro estabelecimento ou local onde o contribuinte exerce sua atividade econômica.
Estabelecimento prestador do serviço é o complexo de coisas, como unidade econômica de empresa, que configure um núcleo habitual do exercício da atividade,
supondo administração e gerência mínimas, aptas à execução do serviço. Tanto pode ser a sede, matriz, filial, sucursal ou agência, sendo irrelevante a
denominação do estabelecimento e a centralização ou não da escrita da pessoa. O local onde se situa cada unidade econômica – assim entendido aquele do
[18]
estabelecimento prestador do serviço – atrairá a incidência da norma municipal respectiva.
Em contrapartida, Hugo de Brito Machado, Eduardo Marcial Ferreira Jardim e José Eduardo Soares de Melo, nos ensinam que:
A questão está em saber o que é estabelecimento prestador do serviço. O equívoco está em considerar como tal o local designado formalmente pelo contribuinte.
[19]
A essência da questão consiste em conceituar o ‘estabelecimento prestador’ que nem sempre se confunde às noções de matriz, filial, sucursal, agência e outras
afins. Na verdade, ‘estabelecimento prestador’ é o local onde são praticados os atos de gestão administrativa e que congregam o conjunto de bens preordenado a
[20]
implementar os objetivos e as atividades da empresa.
Estabelecimento prestador de serviço é o local onde o contribuinte desenvolva atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure
unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de
[21]
representação ou contrato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.
Questão pacífica que se pode concluir é aquela em que a competência de qualquer Município será determinante se o estabelecimento prestador estiver presente
no mesmo Município em que se der a prestação do serviço.
As regras inseridas no art. 4.º da LC 116/2003 nos leva ao entendimento que todas as soluções ali apresentadas são válidas apenas para o mesmo Município onde
o contribuinte possui o seu estabelecimento prestador e onde efetivamente presta o serviço, não apresentando solução quando a prestação do serviço envolve dois ou mais
Municípios.
Examinando este problema, Aires F. Barreto é enfático quando afirma:
Há muito tempo, minoritariamente, mas com o aval de Geraldo Ataliba, vimos defendendo que o ISS, em face do princípio da territorialidade das leis tributárias, só
pode ser devido no local em que prestados os serviços. Fortes nessa razão, pensamos que o art. 3.º, da Lei Complementar 116/2003 é inconstitucional, por
invasão de área de competência de outro Município (daquele em que os serviços foram efetivamente prestados). Com efeito, a Constituição Federal não autoriza,
pelo contrário repudia, que os serviços prestados no Município ‘A’ possa ser tributados pelo município ‘B’, apenas por estar neste último o ‘estabelecimento
prestador’.
Admissão da espécie parece atribuir à lei municipal eficácia extraterritorial, é dizer, supor que a lei de um Município possa ser eficaz em outro, afastando a
[22]
competência deste, no qual foram prestados os serviços.
Este eminente doutrinador defende o princípio da territorialidade da tributação que se lastreia no seguinte entendimento: o Município competente para a cobrança
do tributo é aquele em cujo território se realizou o fato gerador.
Convém lembrar que tal princípio vem sendo muito defendido por nossa doutrina e principalmente pela jurisprudência pátria, para justificar os equívocos trazidos
pelo Decreto-lei 406/1968 e pela LC 116/2003.
3.2.4. POSICIONAMENTO DA JURISPRUDÊNCIA ATUAL
Assim como a doutrina, as decisões judiciais vinham perfilhando duas correntes distintas com relação ao local do recolhimento do ISS. Ora julgando como devido o
ISS no local onde o serviço é prestado, ora como devido no estabelecimento prestador, a teor do art. 12 do Decreto-lei 406/1968 – hoje, art. 3.º da LC 116/2003.
Preocupado com essas divergências, o Superior Tribunal de Justiça hodiernamente baseia suas decisões na prevalência do princípio da territorialidade,
[23]
assegurando a cada Município proceder a tributação sobre os serviços prestados em seu respectivo território.
Em face do exposto, concluímos a seguinte situação: a) como regra geral o serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador
04. CONCLUSÃO
Após rasante vôo sobre o exposto, podemos concluir que a solução do problema apenas se daria após a modificação de nossa atual legislação.
Atualmente, a LC 116/2003 prestigia a seguinte regra: a) o lugar devido para o recolhimento do ISS é o local do “estabelecimento prestador do serviço”. b) como
exceção, o lugar da prestação do serviço.
A evolução de nossa legislação é no sentido de mudanças da regra geral. O Decreto-lei 406/1968 estabelecia em seu bojo apenas uma exceção – no caso de
construção civil – onde prevalecia a tese do local da prestação do serviço. Anos depois, em 2003, a LC 116 ampliou o rol de exceções para vinte e dois incisos.
Com isso, a solução caminha para uma troca de regras: o que hoje é regra geral – local do estabelecimento prestador – tornar-se-á exceção.
Confirmando a tendência indicada pelo legislador, o STJ em seus julgados prestigia a tese da observância do local da prestação do serviço como regra geral, em
homenagem ao princípio da territorialidade.
Oxalá tais mudanças se concretizem. Teremos inúmeras vantagens, tais como, da simplificação a legislação, a autorização de uniformização dos procedimentos do
tributo, a eliminação da guerra fiscal e ainda a realização da tão buscada justiça fiscal e segurança jurídica.
05. BIBLIOGRAFIA
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FREITAS, Vladimir Passos de Freitas. Código Tributário Nacional Comentado. SP: Revista dos Tribunais, 1999.
* Pós Graduanda em Direito Tributário na Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes. Advogada. E-mail: [email protected]
* Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil na Unipar. Advogado. E-mail: [email protected]
[1]
TORRES, Ricardo Lobos. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 10 ed. RJ: Renovar, 2003. p.360, 361.
[2]
TENÓRIO, Igor; MAIA, José Motta. ibid. 139.
[3]
NETO, Fenelon Bonavides. p. 87.
[4]
JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. ibid. p. 83.
[5]
Nesse sentido, MELLO, José Eduardo Soares de ibid. p. 212.
[6]
“O princípio do desenvolvimento econômico volta a se vincular, nos dias atuais, à idéia de justiça financeira: autoriza um mínimo de intervencionismo estatal direto na economia (empresas públicas), redireciona
os investimentos para as obras de infra-estrutura, coloca sob suspeita de ilegitimidade a política de concessão de incentivos fiscais e se equilibra com outros princípios de justiça, como a redistribuição de rendas e a
capacidade contributiva.” (TORRES, Ricardo Lobo. ibid. 89).
[7]
Ora, a concessão de benefícios fiscais, pela própria natureza destes, é feita para buscar minorar desigualdades regionais sociais. Diríamos, até, que a concessão de uma isenção, por exemplo, é forma legítima
de procurar a igualdade. É desigualando-se que, muitas vezes, se iguala. Certos incentivos, outorgados com vistas a estimular determinadas atividades, estão proibidos de ser concedidos por um Município, por
exemplo? Queremos crer que não (HORVATH, Estevão. A Constituição e a Lei Complementar n.º 101/2000 (‘Lei de Responsabilidade Fiscal’). SP: Dialética, 2001. p. 160).
[8]
Em razão deste novo estatuto jurídico, os agentes não mais se encontram totalmente tranqüilos para conceder as aludidas desonerações, não só pelo risco de eventual providência por terceiros que se sintam
prejudicados, mas também pela circunstância de que o desatendimento às condições da LC 101 pode redundar na referida responsabilidade. De nada adiantará conceder benefícios, se, por outro lado, ficam
compelidos a aumentar a receita com a imposição de novos ônus tributários (MELLO, José Eduardo Soares de. ibid. p. 219).
[9]
GRUPENMACHER, Betina Triger. Aspectos Relevantes da Lei de Responsabilidade Fiscal, Dialética, 2001. p. 23.
[10]
“Também apontara o prejuízo para as demais empresas que, independentemente de sua capacidade, terão maiores dificuldades na luta pelo mercado, gerando com isso mais desincentivo ao investimento, à
melhoria de eficiência e inovação; gera incerteza e insegurança para o planejamento e tomada de decisão empresarial, dado que qualquer cálculo pode ser drasticamente alterado – e qualquer inversão realizada
pode ser inviabilizada com a concessão de um novo incentivo-; desestimula a realização de investimentos novos quanto na expansão de atividades em andamento, gerando perda de eficiência alocativa na
economia, com conseqüente redução de bem-estar (Consulta 38/99, rel. Cons. Marcelo Calliari, j. 22.3.00, DOU 1-E de 28.4.00, p. 1)
[11]
Relativamente aos incentivos concedidos, há que se ter conta que as partes envolvidas estabeleceram um verdadeiro contrato de direito público, mediante a fixação de direitos e obrigações recíprocas. De um
lado, é natural que o Município tem interesse em que o particular continue exercendo suas atividades naquela região, possibilitando o incremento econômico, geração de emprego etc., enquanto que, de outro, o
prestador de serviço continuará beneficiado com reduções tributárias, fiscais, etc (MELLO, José Eduardo Soares de Mello. Ibid. p. 217).
[12]
O Deputado Max Rosenmann em 2006 apresentou um projeto de lei complementar n.º 334/2006 com o intuito de estabelecer um limite de 0,5% (cinco décimos por cento) de alíquota do ISS sobre a locação de
veículos automotores sob a alegação que tal alíquota impedirá a oferta de qualquer chamariz amparado no ISS.
[13]
“Tem firma com sede até no cemitério. Prefeituras fazem guerra fiscal para atrair empresas, usam expedientes ilegais e a arrecadação de ISS cai 800 milhões de reais” (Revista Veja de 11/01/2006 “Ginástica
para o cérebro” Edição 1938).
[14]
O art. 12 do Decreto-lei 406/1968 foi revogado pelo art. 3.º da LC 116/2003. Importante mencionar que antes de tal artigo, apenas o ato complementar 36 de 13/03/67, art. 6.º, regulava a questão em exame
[15]
1.º TACSP - AC - 549-748-3; 4.º C. Civ. do TA PR – RN E AC 49.206-0; 1.º TACSP – AC 481.596-7; 1.º TACSP – AC 529.661-5; 1.º TACSP – AC 472.632/9
[16]
4.º C. DO TAC RJ – AC 3072/91; REsp 130.792/CE – 1.º T. do STJ.
[17]
MORAES, Bernardo Ribeiro de. Ibid. p. 296.
[18]
Aliomar Baleeiro. Ibid. p. 509.
[19]
MACHADO, Hugo de Brito. Ibid. p. 373.
[20]
JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Ibid. p. 82.
[21]
MELLO, José Eduardo Soares de. Ibid. Curso... p. 435.
[22]
BARRETO, Aires F. Ibid. p.318 – 319.
[23]
A título de ilustração, citamos os seguintes julgados: REsp. 525067/ES. Recurso Especial 2003/0034074-5. Ministro Franciulli Netto. T2 – 2.º Turma. Data do Julgamento: 19/08/2003. Data da Publicação/Fonte:
DJ 28.10.2003 p. 277; AgRg no Ag 464961/DF. Agravo Regimental no Agravo De Instrumento
2002/0095848-7. Ministro Castro Meira T2 – 2.º Turma. Data do Julgamento: 02/12/2003. Data da Publicação: DJ 25.02.2004. p. 145; AgRg no Ag 516637/MG. Agravo Regimental no Agravo De Instrumento
2003/0066796-1. Ministro Luiz Fux. T1 – 1.º Turma. Data do Julgamento: 05/02/2004. Data da Publicação: DJ 01.03.2004. p. 134; RMS 17156/SE. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança
2003/0175003-5. Ministro Castro Meira. T2 – 2.º Turma. Data do Julgamento: 10/08/2004. Data da Publicação: DJ 20.09.2004. p. 215.
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18/02/2008 - IDTL - Instituto de Direito Tributário de Londrina