* O alívio da dívida já começou mas isso é apenas o início Neste ano, celebramos um novo milênio. Ao faze-lo, reafirmamos a promessa de que, trabalhando juntos, poderemos melhorar a situação de todos os seres humanos – especialmente os mais pobres do mundo. É possível que esse espírito do milênio tenha sido melhor expresso por um movimento extraordinário – inspirado pelo conceito bíblico do Jubileu – com vistas ao cancelamento da dívida dos países mais pobres e mais pesadamente endividados. Líderes religiosos, cantores de rock e tanto homens quanto mulheres empenharam-se em todas as partes do mundo para galvanizar a ação pública e inspirar a política oficial. Esse espírito está no centro da missão do Banco Mundial e em nenhum lugar está ele mais firme do que no alívio da dívida dos países pobres. Quatro anos atrás, lançamos com a comunidade internacional a primeira resposta mundial à crise da dívida dos países mais pobres do mundo e, em outubro de 199, ampliamos o programa tornando esse alívio “mais profundo, amplo e rápido. O objetivo do plano, que assumiu o nome de Iniciativa para os Países Pobres Mais Endividados (IPPME)” permaneceu inalterado desde então: eliminar a dívida como um obstáculo à redução da pobreza. Nos últimos dias deste ano do milênio, depois de tanto empenho e dedicação de tantos, cumpre perguntar o que foi conseguido. Em primeiro lugar, alcançamos a meta de chegar ao fim de ano com alívio da dívida para 22 países. Isso representa o cumprimento de um compromisso de apoiar os países que deram os passos difíceis requeridos para transformar o alívio da dívida em desenvolvimento humano. Em segundo lugar, o fundamental é que o programa está cancelando uma enorme quantidade de dívida: o alívio chega a aproximadamente US$35 bilhões; em coordenação com outras formas de alívio da dívida, o total da dívida nesses países poderia ser reduzido em mais de dois terços. Mais animador, contudo, é o que está acontecendo nos países. Novos recursos capacitarão os governos a aumentar de forma acentuada investimentos sociais desesperadamente necessários; desde que começou o alívio, as despesas sociais estão subindo para níveis entre duas e três vezes maiores do que as obrigações do serviço da dívida. Graças a isso, milhões mais de crianças terão uma oportunidade de aprender a ler e a escrever, as clinicas de saúde e as estradas rurais e instalações de saneamento serão construídas; os programas de AIDS alcançarão os que sofrem dessa doença; e já agora, as pessoas trabalham junto com os seus governos para abrir a sua própria trilha de desenvolvimento. Muito foi alcançado. Mas podemos fazer ainda muito mais. O milênio proporciona uma oportunidade singular e, na verdade, uma responsabilidade, no sentido de fazer perguntas mais amplas e mais difíceis. A mais importante delas: esses avanços vão perdurar? A criança que nascer hoje na África terá uma melhor oportunidade de festejar o seu quinto aniversário graças ao trabalho que fizemos juntos? Menos mulheres pobres morrerão no parto? A malária, a diarréia e o AIDS vão matar menos africanos? Se o alívio da dívida, independentemente de quanto for perdoado, for a única ou até mesmo a resposta principal, a resposta será negativa. Se, contudo, ampliarmos as nossas exigências 1 e os nossos esforços a fim de combater as causas mais profundas da pobreza, poderemos fazer uma diferença. Em primeiro lugar, embora o alívio da dívida seja essencial, só ajudará a reduzir a pobreza se os países em desenvolvimento continuarem o difícil trabalho de aperfeiçoamento da sua administração econômica. Há muito a discutir sobre quais políticas mais promovem a redução da pobreza. Mas não há dúvida de que as maiores vítimas dos déficits descontrolados e da inflação são os pobres; de que os subsídios que beneficiam as elites são injustos e de que a corrupção estrangula primeiro os mais pobres. Felizmente, há avanços reais em andamento. Veja-se, por exemplo, os casos de Uganda e de Moçambique, os primeiros a se qualificar para o alívio da dívida no contexto da IPPME e, até duas décadas atrás, dois dos países mais complicados do mundo. Essas duas nações vêm registrando crescimento econômico rápido e sustentado ao mesmo tempo em que reduzem a pobreza absoluta e aumentam a matrícula nas escolas primárias. Esses avanços resultam não apenas do alívio da dívida mas do empenho e das idéias do povo nesses países. O alívio da dívida que apoia esses esforços é um investimento claramente prudente. Mas não substitui a assistência para o desenvolvimento. E neste caso é necessário um debate público amplo e vigoroso. Muitos crêem na ficção segundo a qual montanhas de dinheiro são despejadas em assistência. Na verdade, os países industrializados gastam aproximadamente um quarto de um por cento do seu produto interno bruto em assistência para os países mais pobres do mundo. A assistência funciona e podemos fazer muito para que seus efeitos se distribuam para muito mais pessoas. E que vai acontecer com os empréstimos no futuro? O acesso ao capital externo é fundamental para o desenvolvimento de todos os países mas tanto os que estendem quanto os que recebem empréstimos precisam estar vigilantes quanto à capacidade de sustentação a longo prazo da dívida que estão criando. Em muitos casos isso significa que terão que fazer doações e limitar novos empréstimos estritamente, apenas àqueles que puderem ser estendidos em condições mais generosas. O Banco Mundial, por exemplo, que proporciona recursos para os países mais pobres sem cobrar juros, está explorando atualmente novos instrumentos, inclusive doações, para atender necessidades prementes como as vinculadas à HIV/AIDS, ambiente, educação básica e saúde. Além disso, está na hora de falar no comércio com seriedade. Nos países em desenvolvimento, as barreiras às exportações dos países em desenvolvimento continuam a prejudicar gravemente os países pobres. No ano passado, por exemplo, os países industrializados gastaram mais de US$300 bilhões em subsídios agrícolas. Isso é quase igual ao PNB de todos os países da África Subsaariana. Alívio da dívida sem maior acesso aos mercados é inútil. Finalmente, a epidemia de AIDS, especialmente na África, torna o empenho em todos os essas iniciativas cada vez mais crucial. Em alguns países africanos que mais sofrem desse mal, a esperança de vida na próxima década poderá cair de 60 para menos de 30 anos – matando mais implacavelmente os trabalhadores mais produtivos e os pais. Os sonhos de ampliar o atendimento de saúde, o ensino, a agricultura, energia e outras áreas de desenvolvimento ficarão em perigo simplesmente porque não haverá professores, 2 alunos, agricultores e trabalhadores vivos para transformá-los em realidade. Nos países que empreenderam programas de educação, exame e tratamento, as taxas de infecção estão caindo. Estão sendo criadas parcerias animadoras para continuar essas iniciativas mas elas precisam ser sustentadas. Os desafios trazidos pelo novo século são assustadores. Mas nós os enfrentamos com confiança renovada. Os que mantivemos vivo o espírito do Jubileu e lutamos pelo alívio da dívida, sabemos o que pode ser conseguido quando trabalhamos juntos. Temos que manter esse espírito vivo, tanto no ano que vem quanto no futuro. Não há alternativa. 3