O SR. DR. VALDERÍLIO FEIJÓ AZEVEDO – Inicialmente, bom-dia!
Excelentíssimo
Senhor
Gilmar
Mendes,
Ministro do Supremo Tribunal Federal, e demais autoridades,
senhoras e senhores.
Represento
aqui
a
ANAPAR
-
Associação
Nacional de Grupos de Pacientes Reumáticos, uma entidade
fundada em 2006, que representa, na qual estão agregados aí
mais de uma dezena de entidades de grupos de portadores de
pacientes pelo Brasil e que tem por finalidade o apoio à
concretização
de
políticas,
tanto
de
acesso
quanto
de
promoção também à saúde de pacientes portadores de doenças
reumáticas. Então, muito me honra estar aqui defendendo os
interesses deste grupo de pacientes. Também estou aqui como
representante,
como
médico
e
professor
da
Universidade
Federal do Paraná e trabalho com atendimento há vinte anos
com portadores de doenças reumáticas.
Então, o que vou falar para os senhores é
uma
tese,
na
verdade
apresentada
para
esta
Audiência
Pública, mas ela é muito maior do que isso. Primeiramente
não
vou
falar
de
raridades,
vou
falar
de
doenças
prevalentes, porque se acredita - embora não tenhamos ainda
dados
estatísticos
realmente
confiáveis,
temos
de
nós
embasar em dados que vêm de outros países - que devam
existir entre vinte e cinco e trinta milhões neste País
sofrendo
doenças
de
enfermidades
diferentes
reumáticas.
incluídas
neste
São
grupo.
mais
Todas
de
cem
essas
doenças
causam
importante
impacto,
em
termo
de
morbimortalidade e de disfunções, inclusive de capacidade e
de qualidade de vida a esses pacientes. Então, a tese que
defendemos é uma tese - vamos falar aqui de doenças de um
grupo específico de portadores, embora eu vá me ater – que
foi
enviada
a
portadores
de
espondilite
anquilosante
e
artrite psoriática, mas é uma tese um pouco mais geral.
Espondilite
psoriática
verdade,
são
anquilosante
enfermidades
dores
e
reumáticas
inflamações,
e
que
tanto
artrite
provocam,
em
na
articulações
periféricas, articulações que não estão confinadas à coluna
vertebral, quanto à própria coluna vertebral. E se estima
que essas duas doenças juntas afetem mais de um milhão de
brasileiros. Portanto, quando comparamos, por exemplo, com
portadores
de
SIDA,
que
são
em
torno
de
quinhentos
a
seiscentos mil, temos um número maior de portadores dentro
deste grupamento de doenças.
Existiram consultas públicas para a inclusão
de medicamentos de alta eficácia no combate a essas doenças
e
elas
foram
feitas
pela
Secretaria
de
Ciência
e
Tecnologia, Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, no
segundo semestre de 2004, e, passados mais de quatro anos,
não há uma decisão ainda; essas novas terapias não foram
incorporadas à prática.
Na última Portaria, a de número 2.577/2006,
essas novas medicações de comprovada eficácia também não
foram incorporadas. No entanto - eu não gostaria de fazer
essa
comparação
-,
antiretroviral,
rapidamente,
o
à
mas
nós
temos
raltegravir,
lista
de
aqui
que
uma
foi
droga
o
incorporado,
medicamentos
de
pacientes
portadores de SIDA, inclusive usada em pacientes que não
são refratários à terapia convencional.
As espondilites
muito
diverso
doenças
é
a
compartilham
presença
de
doenças
elas compreendem um grupo
das
espondilites
uma
desse
o
protótipo
anquilosante,
alteração
antígeno,
quais
imunogenética
chamado
HLA-B27
dessas
todas
comum
-,
elas
–
todas
há
elas
agridem a coluna vertebral e existe, aí, um esforço mundial
tremendo em tentar classificar essas doenças, porque elas
compartilham
manifestações
clínicas
comuns.
Se
nós
juntarmos todos esses portadores de doenças, nós temos um e
meio da população incluída aqui dentro desse grupamento de
doenças. Para uma população de cento e oitenta milhões de
habitantes,
provavelmente,
mais
de
dois
milhões
de
habitantes sofrendo de todas essas enfermidades no Brasil.
O protótipo dessa doença é a espondilites
anquilosante, mas nós temos também a artrite psoriática,
que é outra doença na qual eu vou me ater.
Trago
aqui
uma
foto
muito
conhecida
da
Associação Americana de Reumatologia, de um hospital de
veteranos
da
Segunda
Guerra
Mundial,
onde
os
pacientes
portadores de espondilites foram seguidos durante trinta
anos
e
vê-se,
doença.
na
verdade,
as
manifestações
típicas
da
Com o passar do tempo, em pouco menos de duas
décadas, esse paciente já apresenta uma posição chamada de
“postura
do
esquiador”.
Parece
realmente
um
esquiador,
porque faz uma flexão dos joelhos e uma obliteração, com
uma calcificação completa da coluna. Provavelmente já devem
ter
visto
pessoas,
nas
ruas
das
diversas
cidades,
portadores de espondilites anquilosante, que, depois, no
final, faz um procedimento cirúrgico que corrige um pouco
da postura. Invariavelmente, todos os pacientes que evoluem
com
manifestação
anquilose
-
e
da
daí
doença
o
axial
nome
da
acabam
doença,
apresentando
a
“Espondilites
Anquilosante” - da coluna.
Eu gostaria de salientar que todas as fotos
que mostrarei aqui foram autorizadas pelos pacientes. São
todos pacientes do nosso serviço.
Essas fotos são para
ilustrar e tentar sensibilizar a platéia em relação a nossa
tese. Essa doença faz uma imobilidade tanto do quadril
quanto da coluna vertebral, mas ela não se manifesta só em
articulações chamadas do eixo axial. Ela também pode levar
à morbidade, em função do comprometimento ocular, levando
até à “mourose” e à morbidades relacionadas ao pulmão e ao
aparelho gastrointestinal, com fibrose pulmonar. Então, nós
temos um grupo de pacientes que varia de 20% a 30% dos
pacientes disponíveis de anquilosante que têm manifestações
extra-articulares. São manifestações tão impactantes como a
própria manifestação articular.
Existe
países
chamados
um
Países
atraso,
do
sem
Bloco
dúvida,
mesmo
Desenvolvido
nos
para
o
Diagnóstico, de cerca de cinco a nove anos. Não deve ser
muito diferente no nosso País. Acredita-se que quanto mais
cedo, mais agressiva é feita essa terapêutica, portanto,
depende de um diagnóstico precoce, depende de um acesso a
esses
pacientes.
No
nosso
Estado,
em
ambulatórios
do
Sistema Único de Saúde, nós temos pacientes que tentam
agendar, há seis ou sete meses, consultas dentro da nossa
especialidade, e perde-se o time para o tempo correto do
diagnóstico. Não é só a questão do diagnóstico; não adianta
ter um belo diagnóstico, sem você poder fazer um tratamento
adequado.
Então,
isso
implica
também
na
terapêutica
e
acesso também aos produtos farmacológicos relacionados à
doença
e
outras
terapêuticas
não-farmacológicas,
como
a
reabilitação que está incluída também nesses pacientes. Os
prejuízos dessas doenças são altos. Nós temos um gráfico
que compara pacientes em diferentes etapas. Em amarelo,
podemos ver pacientes com menos de cinco anos de doença e
que não tem manifestação radiológica; em azul, pacientes
com
menos
de
cinco
anos
da
doença
e
com
algumas
manifestações radiológicas, e, em vinho, pacientes com mais
ou menos dez anos de doença. Nós veremos, comparando vários
índices de avaliação, tanto de função da doença, de escalas
de dor, de índices chamados metrológicos, que são muito
similares. O impacto da doença é alto desde o início.
Os
custos
dessa
doença
-
e
lembro
que
existem categorias de custo que devem ser analisadas; são
princípios de farmaconomia - eles compreendem, na verdade,
todos os custos diretos e indiretos. No nosso País, ainda
estão
em
estudo
os
custos
diretos.
Existem
estudos
de
custos diretos importadores de espondilite anquilosante em
outros países do mundo e que chegam a ser em torno de nove
mil dólares/ano, mas o custo indireto, que está relacionado
principalmente
à
perda
da
sociedade,
à
incapacidade,
à
perda de atividade laboral, é pouco calculado, e ainda não
temos estimativas se são confiáveis. Nesses custos diretos,
estão
incluídos
hospitalizações,
os
custos
aos
exames,
médicos,
a
relacionados
próteses,
a
a
honorários
médicos e, também, alguns relacionados ao transporte desses
pacientes, ao deslocamento de residência até o local de
atendimento.
A prevalência de problemas relacionados não
se deve só a questões ligadas à articulação. Nós temos um
grupo
muito
grande
de
pacientes
que
têm
alterações
de
fadiga, sono, depressão. Vejam, quase 30% são estudos do
GESPIC, um grupo alemão que tem cerca de sete mil pacientes
incluídos.
Nós
temos
um
registro
brasileiro
que
está
investigando amplamente essa população em vários centros de
referência no Brasil; e as cifras são muito parecidas.
Existe um impacto na incapacidade física desses pacientes
quando
a
gente
compara
com
portadores
de
artrite
reumatóide. Essa doença parece-me ser a mais conhecida da
população geral, pelo grau de deformidade que causa nas
mãos – aquela atrofia importante, com desvio nas mãos -,
mas,
como
esses
portadores
normalmente
são
homens,
e
infelizmente a nossa maior mão de obra no mundo ainda é
masculina -
por exemplo, a construção civil, e outras
áreas que exigem inclusive o esforço físico, nós temos uma
porcentagem maior de homens -, nós temos um
alto grau de
impacto quando comparados com artrite reumatóide, que é uma
doença com aparecimento mais tardio e que envolve mais
mulheres. Então, com prejuízos maiores para a sociedade.
Quando comparado, em qualquer faixa etária, a incapacidade
relacionar essas doenças é maior do que em portadores de
artrite reumatóide.
Nós
temos
aqui
o
exemplo
de
um
paciente
cego, uma anquilose tremenda de coluna, “time” perdido para
o diagnóstico e o tempo adequado perdido por tratamento.
Em
relação
à
doença
psoriática;
hoje,
estuda-se, no que se chama medicina transacional - medicina
que vai do laboratório até à beira do leito-, que existe um
complexo chamado Complexo da Psoríase, que envolve desde a
doença de pele até a doença articular. Então, no futuro,
não vamos conseguir separar essas duas coisas. Hoje, a
psoríase
é
estudada
dentro
da
área
dermatológica
e
a
artrite psoriática estudada dentro da área reumatológica,
e, provavelmente, no futuro, não muito distante, elas serão
estudadas
agrupadamente.
manifestações,
algumas
A
doença
similares
psoriática
à
própria
tem
várias
espondilite
anquilosante, como é o envolvimento ocular, mas, também,
envolvimento
de
pele,
que
é,
talvez,
um
dos
mais
contundentes. Nós temos várias formas dessa doença, e uma
das formas é chamada de Mutilante, da artrite psoriática,
onde tem-se grande incapacidade funcional, não só das mãos;
mas também de outros membros, os pés.
Um dado que eu gostaria de chamar a atenção
é que essa doença não causa somente incapacidade física.
Vários estudos têm mostrado que o índice de morbidade e
mortalidade
pacientes
cardiovasculares
quando
comparados
está
com
a
aumentado
população
nesses
geral.
A
mortalidade é cerca de duas vezes maior do que a população
geral. São pacientes que tendem a ter o óbito antes dos
sessenta anos de idade, por complicações cardiovasculares,
independente do custo da doença articular. Além disso, 20%
a 40% são atribuídos a outras manifestações, como é o caso
de disfunções de lipídios na circulação, arteriosclerose
precoce, que pode ocorrer nesse grupamento de pacientes.
E
aqui
temos
um
gráfico
que
compara
a
espondilite anquilosante com controles, com outras doenças.
A mesma coisa tem sido estudada por artrite psoriática, a
mortalidade
cardiovascular
está
aumentada
nessa
doença
também. Existem alguns grupos mundiais, como é o Grapa, que
tem
um
esforço
autoridades
conjunto,
mundiais
no
uma
sentido
“taskforce”
de
tentar
de
várias
alinhar
uma
diretriz terapêutica para pacientes com artrite psoriática.
Esse grupo mostra que os imunobiológicos são uma terapia de
linha novamente final, no caso dessa doença especificamente
e em pacientes que são refratários a outras terapias, que
são
pagas
europeus,
por
como
sistema
é
o
de
caso
reembolso
da
em
diversos
Inglaterra,
da
países
Bélgica,
da
França e da Itália também.
Temos, aqui, um exemplo contundente de uma paciente também
do
nosso
serviço,
portadora
de
artrite
psoriática,
com
grave lesão de pele, e que, depois de doze semanas de uso
de uma droga imunobiológica, vinte e quatro semanas após
pode-se ver a diferença do impacto.
drogas
que
estão
dentro
do
Ela usava todas as
protocolo
do
Ministério
da
Saúde, e teve que adquirir essa droga por ação judicial –
por judicialização. Então, nós não discutimos, aqui, se é
benéfico ou não, o nosso interesse é defender o interesse
do paciente que, como médicos, atendemos.
No caso da espondilite anquilosante, todas
as drogas que fazem parte do atual Protocolo Clínico e
Diretrizes Terapêuticas para espondilite anquilosante não
funcionam
na
coluna
vertebral.
Temos
mais
de
trinta
referências bibliográficas na literatura; todas em medicina
embasada
em
evidência;
algumas
colocadas
na
tese
apresentada
para
esta
audiência
funcionam
muito
bem
na
periferia, não sei se em articulações periféricas. Mas,
quando se trata de doença da coluna vertebral, elas não têm
eficácia, tirando, aí, o anti-inflamatório normonal.
O
Grupo
Asas
é
um
grupo
europeu
para
o
tratamento tanto para o diagnóstico quanto para tratamentos
de espondilite anquilosante, que coloca os bloqueadores do
TNF – são algumas das drogas imunobiológicas e são terapias
de
escolha
para
todas
as
manifestações,
sejam
elas
periféricas ou axiais. Existe, na verdade, um protocolo já
aprovado no Brasil, consenso nacional de espondilite, desde
2004; já foi revisado em 2007, é aprovado pela Associação
Médica
Brasileira.
Esse
consenso
não
foi
incluído
nas
avaliações da Syntec. Então, no início do tratamento, você
tem que ter uma doença definida, e o paciente, para efeito
da doença na coluna vertebral, tem que ser refratário ao
uso de anti-inflamatório normonal, porque a sulfasalazina e
o metotrexate não atuam, e não há nenhuma evidência de que
eles
possam
ter
algum
impacto,
mesmo
até
na
evolução
radiológica da coluna vertebral. O que acontece, muitas
vezes, é que essas drogas também não são terapias fáceis de
lidar; elas têm complicações, efeitos adversos, e existem
alguns
cuidados
e
rotinas
que
devem
ser
colocados.
Na
tuberculose, existem alguns estudos mostrando que houve um
recrudescimento,
um
aumento
também
de
incidência
dessa
doença no mundo, em função do advento da introdução de
agentes imunobiológicos.
Para concluir, gostaria de sensibilizar os
senhores no sentido de que haja a possibilidade de que esse
debate seja amplamente discutido, também com a sociedade
civil organizada, e que isso não seja levado só a grupos de
técnicos do Executivo, mas a outras instâncias da sociedade
civil.
Agradeço.
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Valderilio Feijó Azevedo - Supremo Tribunal Federal