editorial. .1 A data de nossas Jornadas Clínicas se aproxima. “Dizer e fazer em análise” é o mote para indagar os fios que tecem palavras e atos ao longo da direção da cura. “Primeiro era o verbo”, conforme o bíblico João, ou “antes de tudo era o ato”, conforme Goethe? Lacan situa a pergunta para logo responder que não há oposição nas duas fórmulas. Ele reúne, assim, no mesmo tecido, os atos de palavra e a linguagem que compromete o sujeito em seus atos. Na mesma trama também estão analista e analisante, no campo constituído de dizeres e fazeres. De outro lado, Lacan busca no Seminário dedicado ao tema, o estatuto do ato, como se ele fosse único, com propriedades específicas e localiza aí a possibilidade de um verdadeiro começo. Trata-se numa análise de muito dizer até que o ato se torne possível ou o ato é aquilo que permite que as palavras digam de um sujeito? O que vem antes, verbo ou ação, falar ou fazer? Opções não excludentes, tais perguntas aludem ao que o Seminário concebe a respeito da análise: um voltar de outra forma ao ponto de partida, não reencontrando nunca, porém, o ponto mítico do início. Diz ainda Lacan que o fim de análise acontece quando se rodou em circuito, mais de uma vez, ou seja, que se reencontrou aquilo de que se é prisioneiro. No final, embora, haja um reencontro, o sujeito é original, quer dizer, alude à singularidade própria ao ato analítico e ao começo enquanto fundação de um novo. De tessitura outubro 2010 l correio APPOA editorial. única, de voltas e avanços, com os fios da linguagem e dos atos, um final Para exemplificar este ineditismo, Lacan se vale da história de César de análise produz um sujeito inédito. e o atravessamento do Rubicão. Rubicão era o nome antigamente utilizado do rio na Itália Setentrional, que corria para o mar Adriático. No século I a. C., este rio formava a linha de fronteira entre a Itália e a província romana da Gália Cisalpina. Em 49 a. C., o futuro dirigente romano Júlio César fez a sua famosa travessia do Rubicão, depois do Senado romano tê-lo proibido de entrar na Itália com seu exército. Tal medida visava a impedir que os generais manobrassem grandes contigentes de tropas no núcleo do Império Romano, evitando riscos à estabilidade do poder central. Quando Júlio César atravessou o Rubicão, em perseguição a Pompeu, violou a lei, tornando inevitável o conflito e a deflagração de uma guerra civil. A expressão “atravessar o Rubicão” passou a ser usada desde então para referir a qualquer pessoa que tome uma decisão arriscada de maneira irrevogável, sem volta. Lacan evoca César e o Rubicão para considerar que o ato não é qualquer ação, posto que é uma ação significante. O ato não se refere à magnitude do obstáculo, mas sim ao valor significante que o acompanha. César não permanece igual depois do ato, pois ele dá lugar a algo inaudito. “Ultrapassar o Rubicão não tinha, para César, uma significação militar decisiva. Mas, em compensação, ultrapassá-lo era entrar na terra-mãe, a terra da República, aquela em que abordar era violar. (...) No terreno do ato há também certa ultrapassagem, ao evocar essa dimensão do ato revolucionário e caracterizá-lo como diferente de toda a eficácia da guerra notícias. Jornadas Clínicas da APPOA DIZER E FAZER EM ANÁLISE 06 e 07 de novembro de 2010 Centro de Eventos do Hotel Plaza São Rafael Av. Alberto Bins, 514 – Porto Alegre – RS – Brasil Freud abre o século XX propondo nos capítulos da Psicopatologia da Vida Cotidiana uma reviravolta na forma de pensar os esquecimentos, os lapsos, as descontinuidades que se apresentam com frequência em nosso dia a dia. Toma seu traço de enigma e propõe sua decifração com a aten- ção flutuante de um pesquisador que busca os detalhes mais sutis, para além das evidências. Lacan, a partir desta obra freudiana, destaca os atos falhos, o ato sexual e a passagem ao ato propondo “esse estranho par de ato? Qual é sua parte no jogo? Seria a interpretação? Seria a transferência? palavras”, o ato psicanalítico. Interroga: O que é para o psicanalista um Enfim, na trama do dizer e fazer, incluem-se ato e significante, tra- Se Freud inaugura uma nova ordem com o inconsciente, Lacan, no Semi- e que se chama suscitar um novo desejo” (lição 10 de janeiro de 1968). vessia dos obstáculos impostos pelo fantasma, novo lugar, desejo renova- nário XV, faz um outro giro, formulando a divisão $ <> a como efeito do .3 do e sujeito transformado. Aí estão alguns dos elementos que as Jornada outubro 2010 l correio APPOA discurso do psicanalisante, a partir do ato analítico na transferência. correio APPOA l outubro 2010 Clínicas da APPOA pretendem tecer, percorrer. 2. notícias. Lacan interrompeu seu Seminário “O Ato Psicanalítico” no calor dos acontecimentos de maio de 68 em Paris, quando foi chamado a tomar posição e o fez em ato, juntando-se às barricadas dos estudantes. Com isso indicou que todo ato porta uma face de subversão, de movimento, de abertura do inconsciente. O ato é transgressivo na medida em que, ao romper com o estabelecido, inaugura um novo começo, produz uma alteração a partir da qual já não há mais retorno possível. É “o que autoriza a tarefa psicanalisante”. Faz surgir a ambiguidade que marca o sujeito em relação ao saber, dividido em sua hiância fundamental, que não se revela a não ser em sua face de desconhecimento. Nossa Jornada Clínica compartilha com Freud e Lacan a proposição Produções textuais: Seminário XV de Lacan. (Des)ato Adão Luiz Lopes da Costa – APPOA 06/11 SÁBADO / TARDE 14h30 Conferência Las intervenciones del Analista en el Analisis de un niño Alba Flesler – Escuela Freudiana de Buenos Aires 15h45 Mesa 3 Vida privada e o objeto a-ato: Lacan e Tolstoi Edson Luiz André de Sousa – APPOA Cada um tem o analista que merece Ricardo Goldenberg – APPOA Intervalo de tramar – na operação analítica – ato, fazer, dizer e significante. Como esses conceitos se distinguem e se conjugam na análise nos diferentes 17h30 Conferência Faça! Jacques Laberge – Intersecção Psicanalítica de Brasil - Recife 9h30 Intervalo 11h Conferência – Ato e acting out (de “Zelig” até “A rosa púrpura do Cairo”) Alfredo Jerusalinsky – APPOA Encerramento Lúcia Alves Mees – Presidente da APPOA outubro 2010 l correio APPOA .5 Mesa 4 A relíquia: o ato diz algo Maria Auxiliadora Pastor Sudbrack – APPOA O ato de Lacan Liz Nunes Ramos – APPOA Efeitos do discurso: notas sobre o significante psicanálise na cultura Robson de Freitas Pereira – APPOA 07/11 DOMINGO / MANHÃ lugares de analisante e analista? Como se combinam na análise de crianças? Quais especificidades do ato e da linguagem na infância? E nas de- Abertura Mesa 1 Um ponto de partida Ester Trevisan – APPOA Fernanda Breda – APPOA Carlos Henrique Kessler – APPOA Conferência La logica del acto en la experiencia del analisis Isidoro Vegh – Escuela Freudiana de Buenos Aires correio APPOA l outubro 2010 11h 15 Mesa 2 Ratos Elaine Starosta Foguel – APPOA Intervalo 9h45 9h 06/11 SÁBADO / MANHÃ mais clínicas, quais as funções do dizer e do fazer na cura psicanalítica? 4. notícias. INFORMAÇÕES E INSCRIÇÕES R$110,00 R$150,00 R$140,00 Após ou no local** Associados R$120,00 R$180,00 Antecipadas até 22/10 Estudantes de graduação e Recém formados* R$140,00 Categorias Profissionais * Estudantes de GRADUAÇÃO e recém formados até 2 anos, mediante comprovação. ** Se houver vagas DEMAIS INFORMAÇÕES: – Sede da APPOA – Horário de funcionamento da Secretaria: de segunda à quinta-feira, das 8h30min às 21h30min e sextas-feiras, das 8h30min às 20h. – Inscrições mediante depósito bancário para o Banco Banrisul: agência: 0032, conta-corrente: 06.039893.0-4 ou Banco Itaú, agência: 0604, conta-corrente: 32910-2. Neste caso, enviar, por fax ou e-mail, o comprovante de pagamento devidamente preenchido para a inscrição ser efetivada. – Estudantes de Graduação deverão apresentar comprovante de ma- temática. Notas sobre um encontro marcado1 Liz Nunes Ramos Durante a elaboração deste texto, uma criança me perguntou como era minha “escola”. A indagação inspirou-me a interrogar que escola é a tir da subversão muito particular que ela opera das noções de saber e instituição psicanalítica e como se dá a transmissão da psicanálise, a par- – Inscrições pelo site: www.appoa.com.br, após efetuar a inscrição sujeito, ao sustentar que o saber não é o conhecimento e que o sujeito não trícula em curso superior. pelo site, enviar por fax ou e-mail o comprovante de pagamento devida- é o indivíduo, mas o do inconsciente. 1 Artigo elaborado a partir de trabalho apresentado pela autora na Jornada de Abertura da APPOA, em abril de 2010. outubro 2010 l correio APPOA .7 ressituando o que organiza a formação. Qual o estatuto do psicanalista e conceito de ato surge como algo novo, radical no campo psicanalítico, “não há ato sexual”, pois há uma fenda irredutível entre os parceiros. O 10/67, e é consecutivo ao da Lógica do fantasma, no qual formula que co. Ele é contemporâneo da proposição do procedimento do passe, de 09/ Apoiei-me na lógica que Lacan traz no seminário do Ato psicanalíti- mente preenchido. – As vagas são limitadas. correio APPOA l outubro 2010 [email protected] Lucy Linhares da Fontoura informa seu novo e-mail: Mudança de endereço eletrônico 6. se desdobra e o que seria o seu término? A questão se impunha naquele de seu ato? O que lhe autoriza? O que permite instalar uma análise, como é na própria determinação do sujeito que o ato incide, após o qual o $ não subjetiva e é nessa ligação que se desdobra a experiência analítica, então, na, seja remanejado. Se a ligação de significante a significante é a que Produções textuais: Seminário XV de Lacan. momento e Lacan ressalta que a passagem do analisante a psicanalista será mais o mesmo. temática. resulta de uma mutação do desejo, já que não se trata se realiza-lo, mas ção. Ou, o inconsciente sempre existiu, mas quando Freud reconhece seus que este possa inscrever-se em algum lugar”, por exemplo, numa institui- como psicanalista também constitui um ato, “quando chega ao ponto de Ela exige o ato de se decidir e aí se opera um franqueamento. Instalar-se Já de início, Lacan diz que vemos o ato na entrada de uma análise. Não sabemos do ato que o analista leva a cabo, senão pelos efeitos, só mental na análise e na formação, constituindo o tempo de elaboração. posteriori. Destaque para o termo: nachträglich, a posteriori. Ele é funda- jamais senão do significante a buscar leitura, que só pode ser efetuada à na dimensão do ato, seja falho, sintomático ou acidental, não se tratará retoma Freud, “A psicopatologia da vida cotidiana”, demonstrando que Qual é a essência do que o psicanalista opera por seu ato? Lacan efeitos e o inscreve de forma incontestável na cultura falamos da funda- depois. Não há nada que ele possa saber antecipadamente à fala do de engajar-se na prática a partir do desejo do analista. ção da psicanálise como ato. Aí, houve algo da escritura, sempre implicada analisante. Apagado quanto à atividade, lhe cabe interrogar as relações do ser num ato. E fundar uma instituição psicanalítica constitui um ato, já que a his- com a fala. Sua responsabilidade, na transferência, não se refere à inter- que ao analisá-los algo era deixado em suspenso, sendo sempre ali que tória da psicanálise está repleta de instituições, fundadas e dissolvidas Para desdobrar a indagação sobre o que é o ato psicanalítico, Lacan uma verdade ficava retida, induzindo a erros de interpretação. O verda- venção em qualquer contexto intersubjetivo, no nível das relações de ob- diz que para aceder a um saber é preciso considerar a dimensão da verda- deiro passo, essencial quanto ao ato, postula Lacan, precisa ser dado para jeto, mas ao discursivo. Freud menciona, na “Interpretação dos sonhos”, de inconsciente do desejo. A isso não acedemos por um saber prescritivo clarear a noção, a função do desconhecimento, da babaquice, para ressal- num piscar de olhos? A fundação da APPOA constituiu e após seus 20 e introduz, ainda, uma diferença de princípio em relação à universidade. tar a pertinência e o valor do lapso, da dimensão do chiste. “É preciso anos nos perguntamos o que foi franqueado então? Diz que se vêm ouvi-lo é porque têm a impressão de que ali se enuncia “O interesse fascinante desses dois capítulos é que no ato sintomáti- trazer a verdade ao campo do Outro, pelo chiste, dimensão aberta somen- conseqüências, não ocasione desordens. Pois, na psicanálise, o ato tem co, o primeiro a ser situado por Freud, há algo de original, há uma abertu- algo que poderia ter conseqüências. O princípio do que chamou ensino conseqüências, elas estão do lado do psicanalisante, da subversão do su- ra, um traço de luz, algo de inundante que por muito tempo não voltará a te quando a suspensão deixa o significante em seu jogo”. jeito; não visa reconfortar e não incide em fatos da vida, mas em sua se fechar”. Vemos a extrema acolhida de Freud e Lacan para com o sinto- de faculdade é que tudo é posto em circulação de forma tal que não tenha posição discursiva. O estatuto do sujeito não se realiza senão na lingua- ma, tomando-o por um lado como fracasso do que é sabível pelo sujeito, .9 mas, por outro, como algo que sempre representa alguma verdade, cons- outubro 2010 l correio APPOA gem, em sua estrutura, e o ato analítico não a deixa intacta. Há, portanto, correio APPOA l outubro 2010 desordem, para que o fantasma, a relação do sujeito ao objeto que o alie- 8. Produções textuais: Seminário XV de Lacan. que nenhum analista poderia saber e só emerge quando o analisante fala. temática. titui um dizer, como criação. Logo, não pode ser dispensado, pois tem curar e ensinar, se o psicanalista, por definição, não sabe e não dispõe de Um analista só pode ligar uma cadeia até então desconhecida. Aí está o Lacan se pergunta sempre a quem se endereça e diz que seu modo de prescrições? Cada um precisa haver-se com a singularidade de sua traje- que constitui a dificuldade da análise e do ensino da psicanálise. Como ensino se organiza fora da transmissão de um saber normativo, o dos ins- tória. A cura deriva, pois, do exercício da palavra e não é possível ensi- função. Ambos concluem que se trata de abrir as vias ao que do sexual titutos de então. É da transmissão de um estilo que se trata, ponto que nar, senão transmitir uma experiência de investigação do inconsciente. escapa à apreensão na linguagem. para a APPOA é fundamental garantir. Nas sociedades que menciona, o é o que Lacan acentua: “O que pode ser o fim da psicanálise didática, já A principal das questões a diferenciar como princípio do seu ensino inconsciente, ele instaura a experiência discursiva que se endereça ao rado unicamente no desejo do analista, de extrair da fala o conteúdo que autoriza o sujeito a amar e falar e, na instituição, a produzir. Ampa- culação a palavra. O ato do analista é aceitar ser suporte da suposição “Se o analista faz algo é simular que sabe, e seu ato de simulação é que seu término é burocraticamente pré-determinado? O que seria o tér- Outro, nunca à sua pessoa, dando garantias para o amor de transferência analista é constrangido a sustentar um discurso abusivamente didático, mino de uma operação que tem relação com a verdade”? Naquele mode- causa de um processo no qual ele pisa em falso para renovar a presença lo, seria possível conceber o fim como resto da análise da transferência? se desdobrar. “É uma suposição útil para engajar o sujeito na tarefa e que não tem a ver com os problemas propostos pela experiência cotidia- E o que é a análise da transferência? Não é senão a eliminação do fazer entrar em jogo o Outro. Há um que já sabe”. Este é seu estatuto e do sujeito”, fazer surgir a misteriosa relação do $ ao objeto que o aliena. sujeito suposto ao saber. Citação de Lacan: “... no curso do fazer psicana- dessa posição em falso que o caracteriza, o analista, sustentado apenas na. Como organizar um ensino que não mascare o que fica sempre oculto lisante, na caminhada em direção ao que diz respeito ao horizonte, à mi- pelo desejo do analista, só se autoriza pelo eco, pelo efeito de seu ato. Esta suposição engendra algo parecido com o amor, que não será ragem, ao ponto de chegada... de saída o psicanalisante toma seu bastão, Não há autorização antecipada, fora do laço transferencial e da emer- nas psicanálises ditas didáticas? É esta a questão que presidiu a fundação carrega seu alforje, para ir ao encontro, ao encontro marcado com o sujei- gência do saber não sabido do inconsciente. Não existe, em nenhum correspondido, mas instaurará o circuito da demanda e colocará em cir- to suposto saber”. Assim começa uma análise, este começo determina seu lugar, S.s.S., muito menos para o analista. No entanto, seu ato é uma da APPOA e dirige nossos pressupostos de formação. desdobramento e o que precisará ser resolvido da transferência ao final. não comparecerá, porque ele é um artefato. No entanto, é preciso supô-lo. estrutura ele põe em ato perante o público que vem ouvi-lo, numa opera- Esta é a estrutura do ato para Lacan, dar suporte à transferência. E tal profissão de fé no S.s.S. O analista simula que a posição do S.s.S. seja sustentável, porque nessa ção clara de transmissão. Ele diz: “Não posso oferecer-lhes nada em troca Mas, o analisante não suspeita que a este encontro marcado o S.s.S suposição está a única possibilidade de acesso à verdade que o $ só entre- de sua presença”, mas pede que lhe enderecem perguntas e observações, .11 que indiquem como o escutam, estabelece um meio de trocas, permite outubro 2010 l correio APPOA ga ao supor que o analista sabe do que o determina, quando de fato o que correio APPOA l outubro 2010 o determina sustenta-se apenas numa cadeia articulada de significantes, 10. Produções textuais: Seminário XV de Lacan. responsável por deixar o analisante trabalhar e o analista manifestar-se temática. apenas na dimensão do ato e da interpretação, só se sustenta no fato de quando advém a castração e seu analista não é mais S.s.S. Ponto de vira- que os interessados inscrevam sua presença e manifestem seu desejo. Que da de psicanalisante a psicanalista, “referente de toda competência ana- tomem a palavra e não se apeguem ao saber que supõem nele. Assim, É o que faz o psicanalista. Sem significação e sem formular qualquer lítica”. Esta concepção da transferência é nova. “É esta estrutura do ato, que se supõe que o psicanalista tenha chegado ao término da análise, demanda põe o vazio em jogo, sabendo que o resíduo inconsciente, ao seu verdadeiro nó na função do S.s.S., que precisamos conhecer para sa- Lacan faz comparecer sua castração e, por efeito, a dos ouvintes. qual o sujeito é inapto para acessar, é a verdade, que não se revela senão O ato se define por ser corte numa cadeia, logo, o fim da análise não em determinadas condições. E o que Lacan transmite é que a castração poderia ser concebido a não ser na lógica de um corte, operado pela trans- ber o que se passa no campo limitado que é a psicanálise”. são. A castração, diz ele, “implica só que o sujeito aceda ao que não tem. ferência na transferência, desprendendo o sujeito da alienação ao objeto do analista é imprescindível a estas condições, na análise e na transmisEle não tem o órgão que promoveria o gozo único, unário, unificante, ele do fantasma, na cena em que se vê como objeto do Outro. Trata-se para o “O que se torna o S.s.S? Seguramente, ele cai”. Só pode aceitar a su- não tem nada que seja o UM que faria o gozo na conjunção dos sexos”. A posição de saber o analista que aceitar que cairá e for capaz de fazer com análise transcorre tentando inscrever esta falta. Portanto, ir até o seu fim “a pressa é o que deixa escapar a verdade”. O término da operação tem a o analisante o luto dos significantes que sustentam o eu ideal, caso con- analista de faltar ao encontro marcado com o S.s.S, para comparecer em ver com a passagem deste objeto a (olhar, voz, fezes, falo), do lugar ilusó- é o que abre para a chance de aceder à castração, “único referente” que, rio de unificação para, inscrito como perdido, operar como causa de de- trário, manterá a alienação. É da articulação do ato com a verdade, com o Outro lugar, pois não há encontro possível. sejo. O $ é efeito da inscrição dessa perda e é preciso que ele faça essa saber insabido, que Lacan parte para avançar. O saber (enquanto conhe- segundo Lacan, autoriza a passagem à psicanalista. Ele diz algo marcante: transição, via amor de transferência, para saber o que lhe falta, único cimento) lembra, é uma função imaginária, uma idealização. Nunca sa- Vemos que se não há paridade na transferência, conjunção, há conju- Outro, acessível à investigação. bemos tanto quanto supomos. A verdade, ao contrário, está no lugar do saber possível ao deparar-se com seu fantasma. “É preciso que haja um ato que seja criador, e que esteja ali um novo começo, que não se institui per se”, e sempre se coloca quando há “necessidade de transferir algo à ordem do significante”. O $, apartado do objeto todo, que toma o bastão e empreende a caminhada. É um fazer de pura lece entre fazer e ato: quem faz é o analisante. É ele quem fala o tempo Outro ponto nuclear na noção de ato é a bipartição que Lacan estabe- na relação com a verdade”. Lacan diz que o analista não possui, mas faz “por estar em posição de a, faz girar tudo que diz respeito ao destino do $, to à estrutura do inconsciente e à intervenção analítica”. O psicanalista efeito do discurso do psicanalisante, “decisivo para tudo o que diz respei- gação do ato e da tarefa, através do a, como termo médio. O objeto a é fala, na qual o $ é colocado em ato. Ao analista cabe garantir a instaura- semblante desse objeto. Ele se faz de olhar, de voz, de fezes a reter ou a é a criação. ção do discurso, abstendo-se do seu desejo de sujeito e da mobilidade, expulsar, de falo a conquistar, tornando possível a operação. Ele não é .13 objeto, nem saber, é semblante. outubro 2010 l correio APPOA para deixar o significante emergir na demanda. A manutenção destes lu- correio APPOA l outubro 2010 gares que não são de paridade é condição da análise. E esta bipartição, 12. da que a demanda insiste e a perda é simbolizada, fraturando o eu ideal e objetos em circulação. Parece-me essencial ter claro que é quando recusa- fetiche, atender à demanda com a reciprocidade amorosa que põe estes Por isso, é parte do ato analítico recusar-se a mascarar a falta com um idealização, que o analista é castrado, que não dispõe do objeto suposto. De início, não é possível ao analisante admitir, por efeito da formação e transmissão não ocorrem dissociadas. motivo maior da instituição ao fazer circular o discurso. Desta forma, ções da cadeia significante, como pressuposto da formação analítica, armazenar um saber. O ato precisa sempre renovar-se em novas articula- desconhecimento, nem a análise, nem a instituição, podem totalizar ou to de sua formação, nomeá-lo. Por isso, se todo ato é levado a cabo no munhar os atos que ele produziu como analista e, num determinado pon- amparar-se na articulação significante, mas na formação ela pode teste- duzir-se a função do S.s.S, à medida que em análise sua verdade passou a produzirem-se alterações de suas inscrições inconscientes e pode ver re- Assim, o analista é feito (ou efeito) em análise, quando falou e viu Lacan apontará que, se não há junção entre homem e mulher, também não há entre analisante-analista, e acrescentamos que não há entre institucional. desejo. Quando o sujeito não sofreu fraturas em análise, dilacera-se o laço tado a dimensão do ato que o fizesse faltar para operar como causa de sividade alienante frente a um objeto persecutório, onde talvez tenha fal- Aqui, os actings-out e passagens ao ato parecem constituir atividade para tapar um buraco angustiante. Atividade de ruptura para escapar da pas- e rupturas de transferências, tão recorrentes no movimento psicanalítico. cratiza a passagem à psicanalista e parece levar às repetidas dissoluções ente) com demanda de reconhecimento (do olhar para a imagem), buro- persecutórios, equivoca autorização (efeito do acesso ao saber inconsci- reconhecer a imagem ideal; o que permeia a formação de conteúdos aos analistas e instituições, de não encarnarem o pai incastrado capaz de desemboca na decepção, nas queixas e acusações, tantas vezes dirigidas que teria sido perdido do próprio corpo. A sustentação dessas imagens só ocorre pela via do significante. Preserva a fantasia de restituição do analista), impede a apropriação do saber não sabido do inconsciente, que Produções textuais: Seminário XV de Lacan. abrindo às identificações simbólicas do Ideal de eu. É por ser parcial que mestre-aluno, analista-instituição. Pode haver conjugação, na modalida- temática. o objeto a permite destituir a ilusão do todo e inscrever falta no inconsci- de que apontamos, pois em toda transferência emergirá o objeto a. do sexo, se nomeie o que aliena e falta. É por esta via que se inscreve o cada um tome seu bastão, se entregue à temporalidade do inconsciente, representar o sujeito não pelo universal, mas pelo traço, o que exige que Ao adentrar na lógica dos quantificadores, Lacan diz que escolheu ente. Por isso, ao analista interessa substituir-se ao objeto na subjetivida- singular no universal, algo do $ no Outro. Transitar na discordância fun- experimente o vazio de demandas, se faça ouvir e se aproprie do saber de do analisante, para que se efetue o barramento, se inscreva o não-todo damental entre as demandas do amor de transferência e as recusas do ato inconsciente. É só o que haverá em seu alforje. Para encerrar: o que a APPOA franqueou em sua fundação e ao longo analítico, é o que constitui o desafio de toda análise. de seus 20 anos? O que lhe permitiu dar o salto e operar na formação e O objeto a é central no seminário do Ato, definindo o que não faz mais parte do sujeito, ao desfazer-se a alienação do amor e a posição de- transmissão? Na minha percepção, o reconhecimento de uma dívida, que permitiu a apropriação de significantes fundamentais de nosso campo, a caída do analista. O que equivale à inscrição do desejo na linguagem. Na minha leitura, é o que o seminário do Ato retoma como núcleo da partir dos quais cada um se inclui nas dobras entre o singular e o coleti- .15 vo. É do reconhecimento de uma dívida que nasce a possibilidade de outubro 2010 l correio APPOA experiência analítica, da formação do analista e da transmissão da psica- correio APPOA l outubro 2010 nálise: o apego ao objeto imaginário, às imagens ideais (por exemplo: ser 14. Referências bibliográficas Produções textuais: Seminário XV de Lacan. inscrever o próprio lugar, reconhecer o dos pares, escutá-los, deixar as LACAN, J. Discurso de Roma. In: Outros Escritos. Campo Freudiano no Brasil. RJ. Jorge Zahar Editor, 2003. COSTA, Ana. Pontuação sobre transmissão em psicanálise. In: Correio da APPOA, n. 186, dez. 2009. temática. análises transcorrerem sem pressa, testemunhar as inevitáveis fraturas _______. O engano do sujeito suposto saber. In: Outros escritos. Campo Freudiano no Brasil. RJ. Jorge Zahar Editor, 2003. que delas resultam, acolher atos e, em consequência, só depois, nomear analistas. _______. Ato de Fundação. In: Outros Escritos. Campo Freudiano no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge zahar Editor, 2003. _______. Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da Escola. In : Outros Escritos . Campo Freudiano no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. todo, se o objeto é sempre parcial, se a verdade é dita a meias, como pen- _______. A transferência. Seminário VIII. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992. Digamos que a APPOA se pautou pelo seguinte: se o sujeito é nãosar um saber psicanalítico que fosse todo? Uma instituição não é a soma .17 _______. O ato psicanalítico. Seminário XV. Escola de Estudos psicanalíticos, 2008. outubro 2010 l correio APPOA de saberes, é uma conjugação de faltas. Constituímos uma experiência que incluiu a castração fazendo circular a palavra, desfazendo alienações e inscrevendo o desejo, na busca de elaboração e apropriação da experiência. Renunciamos à solidão e à captura, já que o “o ato analítico é sem captura”, diz Lacan, em ato, a cada vez que dirigimos e de passamos a palavra aos pares. Da solidão de Freud, ao fundar um Comitê secreto para preservar a teoria quando não mais vivesse; da solidão de Lacan, ao fundar a Escola Freudiana de Paris (junho/64), expressa no Ato de fundação: “Fundo, tão sozinho quanto sempre estive em minha relação com a causa psicanalítica...”, dessa solidão não mais padecemos, justamente por efeito do que nos foi transmitido, cujo reconhecimento nos autorizou a fundar uma experiência de formação não institucionalizada. Nossa modalidade de passe não estende “passarelas seguras para o salto de analisante a analista, quando então, não haveria mais salto algum”, como adverte Lacan; mas também não se exime da responsabilidade quando seus membros se preparam para tal, afinal, cada analista se autoriza de si mesmo, com alguns outros, numa “escola” que se organiza por uma lógica bem peculiar, a de uma saber que não se sabe e de um sujeito que não se apreende a si mesmo. Com quantos atos se faz uma instituição viável? Depende do desejo do analista, legado maior deste seminário, a sustentar todo ato psica- correio APPOA l outubro 2010 nalítico. 16. temática. Maio de 1968 e os bastidores do Seminário XV de Lacan1 Christiane Bittencourt O Ato Psicanalítico, nem visto, nem concebido afora nós, isto é, jamais situado, questionado menos ainda, eis que o supomos no momento eletivo em que o psicanalisante passa a psicanalista (Jacques Lacan – Anexo III – Resumo do Seminário XV para o anuário da École pratique dês Hautes Études). Lacan estava com 66 anos nesta época – um mês após a Proposição de 9 de Outubro – um ano após a edição dos Escritos. Nestes tempos, pela primeira vez, Lacan assina dois manifestos, um a favor de Régis Debray, em 19 de abril de 1967 e outro em favor dos estudantes revoltados em maio de 1968. Um mês antes de dar inicio ao seminário do Ato Psica- .19 Artigo elaborado a partir de trabalho apresentado pela autora no Cartelão preparatório às Jornadas Clínicas da APPOA, em junho de 2010. 1 outubro 2010 l correio APPOA temática. nalítico, Lacan discursa na EFP para propor o passe, isto é, uma nova maneira de acesso ao status de psicanalista didata. Inicio da Crise que levará a EFP à cisão. Em quinze de novembro de 1967, dá inicio à primeira lição do seminário, que viria a interromper seis meses depois, em 15 de maio de 1968, em solidariedade ao movimento nascido entre os estudantes franceses. O Seminário foi interrompido em 08 e 15 de maio de 1968 atendendo a uma determinação de greve convocada pelo Sindicato Naci- Lacan disse: Produções textuais: Seminário XV de Lacan. Não há dialogo, o dialogo é uma tolice”. A tolice que a noção de dialogo encobre é que jamais existe troca entre dois indivíduos. Há, eventualmente, troca de informações objetivas, comunicação de informações, que resultam então numa decisão comum [...]Mas em qualquer outra situação o dialogo não é senão a justaposição de Do mesmo modo, Lacan dirá em breve que “ não há relação sexual”, para mostrar que a relação sexual não é uma relação, ou “que a mulher não existe”, para designar a ausência de uma natureza feminina. Após, Lacan recebeu Daniel Cohn-Bendit e seus companheiros. Estes queriam fazer conhecer os objetivos de seu movimento, enquanto os analistas desejavam ouvir contestadores. Os psicanalistas deram dinheiro aos estudantes nesta noite e eles foram jantar no La Copoule. Nesta noite, Lacan não abriu a boca, mas no dia seguinte interrompeu o Seminário do Ato Psicanalitico. Lacan, então, diz aos presentes em seu seminário que o “paralelepípedo e a bomba de gás lacrimogênio cumprem a função do objeto a”, referindo-se ao fato dos estudantes arrancarem os paralelepípedos para fazer barricadas e jogar nos policias. Um pouco mais da atmosfera destes dias... No início, era apenas um grupo de alunos da Universidade de Paris querendo o direito de freqüentar o dormitório das alunas. Em pouco tempo, a revolta dos estudantes incluiu outras reivindicações e se transformou num enorme movimento contra o conservadorismo do Estado francês. Foi um período de passeatas, greves e embates com a polícia. Charles de Gaulle, então presidente da França, chegou a fugir de helicóptero e, monólogos ( Giroud, François –”Quando o outro era deus”). da confrontação. Recebeu dois deles e, depois de alguns minutos de con- por um dia, refugiou-se na Alemanha. Tudo isso transformaria aquele mês onal do Ensino Superior(Sem.XV, p.249). Lacan levanta a questão da res- versa, dispensou-os após invectivar sobre a palavra diálogo, e contra a no mítico Maio de 68, que eternizou slogans libertários como “Seja realis- ponsabilidade dos psicanalistas, que não estavam na universidade e para falta de cultura dos jovens estudantes de medicina, que apesar de faze- ta, exija o impossível” e “É proibido proibir”. Hoje, as opiniões dos fran- 1968, Lacan pediu a Irene Diamantis que lhe enviasse os organizadores Esboço de uma vida, podemos conhecer bem esta história. Em maio de com humor. Na pág 456, do livro de Elisabeth Roudinesco sobre Lacan – Num primeiro momento, Lacan observou a contestação dos jovens jovens marcados pelo Althussero-Lacanismo. Cultural Proletária. O grupo fundador da esquerda proletária agrupava mento maior: a deflagração, na China, em 1966, da Grande Revolução Este movimento todo teve por pano de fundo originário um aconteci- esquerda proletária. tude intelectual francesa, reunida no outono de 1968, sob a bandeira da radicalmente antagônicas, seriam solicitados por esta parcela da juven- celebridade nem o brilho internacional de Sartre. Mesmo assim, por vias um nível da carência, da insuficiência. Em maio de 68, Lacan não tinha a são questionadas. Transmissão de um saber, a psicanálise estabelece em trata de um fenômeno estrutural, no qual as relações do desejo e do saber estes, a questão do ensino constituía um nó. Para Lacan este momento rem vir à faculdade representantes de diversos grupos psicanalíticos, nada .21 ceses sobre o movimento são bastante divergentes, mas a maioria concor- correio APPOA l outubro 2010 outubro 2010 l correio APPOA conheciam sobre a obra de Freud. 20. a liberdade sexual. O próprio filósofo Jean-Paul Sartre, presente nos acon- da que houve grandes conquistas em áreas como os direitos individuais e Alain Geismar. Antes de Maio de 68, Castro, de origem judaica, foi prote- líderes do movimento, ao lado de Daniel Cohn-Bendit - Dani, le Rouge – e no grego, natural de Salônica. O então jovem de 27 anos se tornou um dos Produções textuais: Seminário XV de Lacan. tecimentos de maio de 1968 em Paris, confessou, dois anos depois, que gido pelos comunistas durante a Segunda Guerra Mundial, se engajou temática. “ainda estava pensando no que havia acontecido e que não tinha compre- contra a guerra na Argélia, visitou Cuba e conheceu Che Guevara. para Gilles Lipovetsky e outros, era “a reivindicação de um novo indivi- C.Castoriadis, o vissem como “uma revolta comunitária” enquanto que, de rua entre estudantes, operários e policiais, fez com que alguns, como do seu resultado final. A mistura de festa saturnal romana com combates se, não só, à múltipla potencialidade do movimento como à ambiguidade A dificuldade de interpretrar os acontecimentos daquele ano deve- por sonhos de forma concreta, distante dos “devaneios imaturos” de Promete continuar seu combate por uma França mais justa e bela e lutar poder concorrer oficialmente no pleito, mas nem por isso desanimou. Utopia Concreta (MUC). Não obteve as 500 assinaturas necessárias para candidatura à eleição presidencial, sob a sigla de seu Movimento da profissão de arquiteto. Em 2006, retornou à arena política e lançou sua governo socialista de François Mitterrand e passou a se dedicar a sua durante sete anos com o psicanalista Jacques Lacan, trabalhou para o Depois de Maio de 68, Castro entrou em depressão e se analisou endido muito bem: não pude entender o que aqueles jovens queriam...então acompanhei como pude...fui conversar com eles na Sorbone, mas isso dualismo.” 1968 tornou-se um ano mítico porque foi o ponto de partida Maio de 68. não queria dizer nada” (Situations X). para uma série de transformações políticas, éticas, sexuais e comporirreversível. Seria o marco para os movimentos ecologistas, feministas, Eu estava muito mal. Depois que fechei minha organização, fiquei tamentais, que afetaram as sociedades da época de uma maneira das organizações não-governamentais (ONGs) e dos defensores das minorias e dos direitos humanos. Frustrou muita gente também. A não realização dos seus sonhos, “da imaginação chegando ao poder”, fez com que parte da juventude militante daquela época se refugiasse no consumo das drogas ou escolhesse a estrada da violência, da guerrilha e do terrorismo urbano. Assemelhou-se, aquele ano aloucado, a um caleidoscópio: para qual- outubro 2010 l correio APPOA .23 no falar para que a história continue. Eu me agarrei nisso. Para que a história continue é preciso falar um pouco de tudo. Tem aquela Não via saída. Eu me recordo de uma citação de Lacan que diz que a psicanálise é o discurso que permite que sobre fruição suficiente acabado. Logo depois passei a me interessar novamente pelas coisas da sociedade, mas naquele momento nada me sensibilizava. num estado deplorável. Não sabia mais onde estava. Estava mesmo muito mal. Comecei a psicanálise porque precisava, urgentemente, falar para alguém. No dia seguinte ao que fechei a organização, passei a ser detestado, me acusavam de ter abandonado a causa. Houve muito ressentimento contra mim por causa disso. Eu me encontrei só, e não acreditava em mais nada. Eu me lembro que o golpe de Estado no Chile não me provocou nenhum sentimento, nenhuma reação, não fiz nada contra. Procurei Lacan em maio de 1973 e o golpe de Pinochet foi no 11 de setembro. Mas nem participei das passeatas. Não acreditava mais nas manifestações. Estava quer lado que se girasse, novas formas e novas expressões vinham à luz. Foi uma espécie de fissão nuclear espontânea que abalou as instituições e regimes. Uma revolução que não se socorreu de tiros e bombas, mas da pichação, das pedradas, das reuniões de massa, do auto-falante e de muita irreverência. Tudo o que parecia sólido desmanchou-se no ar. Entre os estudantes revolucionários da época estava Roland Castro, correio APPOA l outubro 2010 nascido na cidade de Limoges em 1940, filho de um imigrante clandesti- 22. temática. frase incrível de Lacan: “Eu aguardo, mas não espero nada”. E, numa assembléia de estudantes revolucionários, em 1972, ele disse algo que me perturbou muito: “A revolução é feita para manter a ordem”. A minha análise com ele durou sete anos, e aos poucos fui me reconstituindo (Castro apud Eichenberg, 2007). Daniel Cohn-Bendit é hoje deputado pelo partido verde no parlamento europeu, esteve em Porto Alegre em agosto deste ano e disse que “precisamos esquecer maio de 68 e os erros da revolução”. Se Lacan estivesse lá teria dito: “A revolução é feita para manter a ordem”. Referências bibliográficas CASTRO, R. Líder de Maio de 68 pede sonhos concretos. Paris/São Paulo: dez. 2007. Entrevista concedida a Fernando Eichenberg. Disponível em: http://noticias.terra.com.br/imprime/0,,OI2120378-EI6782,00.html. Acesso em: 13 set. 2010. LACAN, J. O Ato Psicanalítico. Seminário XV. Escola de Estudos Psicanalíticos, 2008. LOSURDO, D. Leia entrevista com Domenico Losurdo, biógrafo de Nietzsche. São Paulo, jun. 2006. Entrevista concedida a MARCOS FLAMÍNIO PERES. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/757470-leia-entrevista-comdomenico-losurdo-biografo-de-nietzsche.shtml. Acesso em: 13 set. 2010. ROUDINESCO, E. A Batalha dos Cem Anos. In: História da Psicanálise na França. Vol 2: 1925-1985, p. 486-490. correio APPOA l outubro 2010 _______. História de um sistema de pensamento. In: Jaques Lacan: Esboço de uma vida. p. 451-472. 24. temática. A lógica do Ato Analítico Ligia Víctora Este texto foi resultado da apresentação das lições 5 (10/01/68) e 6 (17/01/68) do seminário de Lacan O Ato Psicanalítico, ocorrido em nossa sede no dia 26 de agosto de 2010, no Cartelão preparatório às Jornadas Clínicas da APPOA: Dizer e fazer em análise.1 I. Os atos como fundadores Parece que, por querer marcar bem o Ato Psicanalítico como algo inédito, Lacan tem que defini-lo muitas vezes durante este seminário. Outros atos – actings out, passagens ao ato, atos falhos – também entram no elenco, e chama a atenção sobre o fato de que se denomine acte manqué, .25 1 As lições 4,5 e 6 foram discutidas previamente no Seminário de Topologia com a participação de todos os integrantes deste: Elisabeth Sudbrack, Felipe Pimentel, Gilson Firpo, Manuela Lanius, Mary Georgina Boeira da Silva, Ricardo Martins, Ricardo Pires, Silvana Lunardi, Sílvia Carcuchinski, Sonia Mara Ogiba, Sueli Souza dos Santos, Thales Abreu, Verónica Pérez. Coordenação: Ligia Víctora outubro 2010 l correio APPOA temática. como sendo da ordem da ação, já que passa por uma questão puramente Produções textuais: Seminário XV de Lacan. lica, não Real. Referência puramente ao significante, pois. Lacan aprovei- um ciclo. Como o trem da meia-noite, é uma identificação apenas Simbó- ano? Se o tempo é um continuum, há apenas uma demarcação formal de uma semana sumida, é saudada como Lua Nova. Mas é a mesma! E o do ano. Porque novo? A lua, diz ele, a cada vez que reaparece depois de Começa a lição 5 desejando Feliz Ano-Novo, já que é a primeira aula lógica da sexuação. E até o nó borromeu, no qual Lacan, de início, defen- lugares e quatro tempos); a fórmula da metáfora; os quatro discursos; a tempos; os esquemas L, R e I; o sistema á-b-ã-ä; o Grafo do desejo (quatro grafo do Ato Psicanalítico, e, foram também o diamante dos primeiros tetraédricos de Lacan é a da projeção do tetraedro no plano. Assim é o todas as faces são triângulos equiláteros. A forma básica dos esquemas arestas. É uma pirâmide triangular (lados iguais entre si), ou seja, em que O tetraedro é um polígono regular que possui 4 vértices, 4 faces e 6 II. Os esquemas tetraédricos ta para fazer um gancho: da mesma forma, um ato está sempre ligado à dia que três aros (R – S – I) bastariam para representar a estrutura de um significante. Assim será também com o Ato Psicanalítico. determinação de um começo. sa o que aconteceu, importa é a marca que deixou. Lacan evoca o mito da um ato constitua um verdadeiro começo... que seja criador... não interes- panha desde seus primeiros esquemas, quando ele introduziu um quarto Lacan – segue os moldes de uma lógica quaternária. Esta lógica o acom- Logo, o grafo do ato psicanalítico – assim como muitos outros de sujeito neurótico, mas logo depois incluiu um quarto nó. criação e sua escritura bíblica: no começo, era o verbo. Arremeda: no elemento no triângulo edípico de Freud, o Falo, como o Significante Desta vez, Lacan vai abordar os atos como marcas fundadoras: que começo, era a ação. Porque, sem ato, simplesmente não poderia haver organizador, o qual Lacan ao longo de sua obra definiu tal como uma e a Gália Cisalpina. O rio entrou para a história por ser casus belli da 2ª seu exército. Servia de fronteira (ano 59 a.C.) entre as províncias romanas no direito romano porque a nenhum general era permitido cruzá-lo com mação – Transformationsgrupen – exatamente como podemos pensar que Erlanger.3 Klein definiu este fenômeno como sendo grupos de transfor- para a inauguração do departamento de Lógica da Universidade de Este escreveu seu artigo que ficou conhecido como o Erlanger Programm Esta lógica quaternária de Lacan foi inspirada no Grupo de Klein.2 meter para alcançar o estatuto de falasser. função matemática, pela qual todos os seres humanos deveriam se sub- nada, nem questão. Nenhum começo sem ação, diz ele. Compara um verdadeiro ato inaugural à travessia do Rubicone, por guerra na Gália: quando Júlio César transpõe o rio. Diz a história que ele são as fórmulas da álgebra lacaniana. Observem que basta girar cada ele- Júlio César. O Fiúme Rubicóne, na Itália, tinha uma importância crucial se deteve por um longo instante às margens deste e, finalmente, proferiu 2 Erlanger, Alemanha, 1872. Félix Klein (1849-1925). Sobre este tema v. Cf. Víctora. Site: www.freud-lacan.com ca foi realizada. Mas a matemática nunca mais seria como antes! 3 outubro 2010 l correio APPOA .27 mento para resultar em outro, seguindo as setas. Esta apresentação nun- a sentença: “A sorte está lançada!” O ato estaria petrificado no momento da ordem: Alea jacta est! Como o nosso “Independência ou morte”: é no momento em que são soltas as palavras, que o mundo ganha sentido. Como num ato revolucionário, por exemplo, cuja eficácia necessita da surpresa, o que ele chama de efeito de correio APPOA l outubro 2010 ruptura para suscitar um novo desejo. 26. temática. O grupo de Klein tem como especificidade que todos os elementos podem se transformar em todos os outros, bastando uma única operação. Não é o caso do grafo da alienação. Por isso Lacan o teria chamado de meio-grupo de Klein? Parece uma coisa muito simples, agora que já está escrita, mas a importância destes grupos para o desenvolvimento da matemática moderna foi fundamental. Eles estão presentes na Física, na Geometria, e na Topologia (conceitos de invariância, de homeomorfismos, etc). Lembrando que um conjunto de elementos, citado por Galois, pode ser formado por números, pontos, retas, etc, e que as transformações, de que ele fala, podem ser aritméticas, algébricas ou geométricas. III. A lógica do Grafo do Ato Psicanalítico Algumas operações lógicas utilizadas por Lacan (fórmulas de De Morgan, de Boole e outras apresentadas com os círculos de Euler):4 correio APPOA l outubro 2010 4 Observação: sombreei os campos que não contêm elementos, como nos livros de lógica. Lacan muitas vezes fazia o contrário. 28. Produções textuais: Seminário XV de Lacan. 1. União: Ou (+) equivale à soma lógica: significa que um elemento dado pode estar inserido de qualquer lado. Escreve-se também A U B. Aplicando o Cogito seria o “Penso ou sou”. Isso é propenso a muita confu- são, pois o OU simples é a soma. Seria o equivalente a dizer “Penso-sou”. 2. Interseção: E (.) significa que deve pertencer aos dois ao mesmo B (Penso se e somente se sou). tempo. É o produto lógico. Escreve-se: (A.B) ou A ∩ Β. Na prática equivale ao A 3. Não-A e B: [(-A) . (B)] nada no conjunto A, só se admite elementos no B. Seria o caso de dizer: “Sou, não-penso”. 4. A e Não-B: [(A) . (-B)] nada no B, apenas verdadeiro no A. “Penso, não-sou”. 5. OU... OU. Outra relação que Lacan usou foi a disjunção, da ál- gebra de Boole. Também conhecida como forma normal disjuntiva (F.N.D.) ou ainda união-disjunta, OU-exclusivo (EX-OR da lógica dos .29 B Lê-se: {A (se e somente se não) B}; ou A conjuntos). Significa que existem elementos ou de um lado, ou do outro lado, nada no meio. A ou B [(-A) Λ (-B)]. outubro 2010 l correio APPOA temática. IV. O Cogito lacaniano-freudiano-cartesiano Lacan parte de dois aforismos: o dito freudiano Wo es war soll Ich werden e o cartesiano Cogito ergo sum. Depois recorre também ao Cogito hamletiano, como sempre buscando recursos em outras linguagens para validar suas teses – bem de acordo com a lógica moderna e o teorema da correio APPOA l outubro 2010 decidibilidade de Turing, que, resumindo em uma frase, provou que só se 30. Produções textuais: Seminário XV de Lacan. pode decidir sobre a validade de uma sentença recorrendo a outro siste- ma que não o próprio em que ela foi estabelecida. Observem que no lugar de cima, à direita, o desenho, supostamente de Lacan, deixa todos os campos em branco – como se fosse um OU sim- ples da lógica de De Morgan (União ou soma lógica). É aqui, segundo Lacan, o ponto de partida de toda Psicanálise. Já a fórmula de baixo, à esquerda, fica difícil de saber se é um EX-OR (OU-exclusivo) ou um pro- duto lógico (E-exclusivo), pois Lacan não faz os círculos por inteiro, e ora ele colore a parte cheia, ora a parte vazia. 5 V. O Cogito hamletiano de Lacan O que eu chamo de Cogito hamletiano de Lacan: um sujeito partido ao meio, dividido entre ser-falso e não-ser, e com o Isso freudiano no meio... Em sua releitura de Hamlet, ele explica que entre ser e não ser existe alguma coisa – são duas falsidades: um ser falso, que não pensa e um .31 não-ser, que sabe, diz ele. Nunca é um sujeito inteiro, pois sempre falta Um ano antes, no Seminário A lógica do fantasma, sobre este tema, Lacan fizera esquemas parecidos. um pedaço (representado pela “mordida” no círculo). 5 outubro 2010 l correio APPOA temática. As fórmulas que Lacan realmente utilizou em seu grafo foram: Produções textuais: Seminário XV de Lacan. Lacan tenta fazer um espelhamento, mediante a linha da Transferên- Klein deveria ser todo simétrico). Haveria aqui uma duplicação de luga- cia, o que daria uma certa simetria (para ser um verdadeiro grupo de Será que a alienação em Lacan pode ser considerada como o OU- res: são dois “Issos”, ele diz. Ou dois “lá onde Isso era”, o que corresponde outubro 2010 l correio APPOA .33 A transferência põe o analista no lugar do Sujeito-suposto-saber. É somente com este aval do analisante, que o analista poderá operar. Aqui, A transferência é o objeto a. operação de divisão, é como na aritmética: vai até sobrar um “resto”, que à “distância teórica que separa o Inconsciente do Isso”. Passando por esta exclusivo (EX OR) – o OU-OU da lógica dos conjuntos? Observem os exemplos que ele apresenta: A bolsa ou a vida?; A liberdade ou a morte? Seria este mais um erro de Lacan na aplicação das matemáticas? Ele próprio reconheceu que sua leitura era uma “inovação da conjunção disjuntiva”... Parece mesmo que a alienação de Lacan é de outro tipo, que ele chamou de “escolha forçada”, como o dito de nosso Don Pedro: Independência ou morte! Sabemos que para Descartes, a única garantia da existência humana era o fato de que ele pensava. Mas, o Cogito foi sendo subvertido a partir da descoberta do Inconsciente. Como disse Lacan: Se há um pensamento inconsciente, o Eu não sabe mais o que pensa, e menos certeza ele tem do que ele é! No meu entendimento, para corresponder ao que Lacan relata, o grafo VI. Corrigindo o grafo correio APPOA l outubro 2010 do Ato Psicanalítico deveria ser assim: 32. temática. Lacan aponta no grafo o lugar do analista, projetado pelo sujeito. Lugar em falso, do qual pode ser catapultado a qualquer momento, e de onde cairá com certeza no final da análise. A interpretação É pelo escorregador de Significantes do analisante, que o psicanalista pode interpretar, e sempre através da linguagem. A resistência No sentido inverso, o sintoma pode retornar. Por uma característica própria ao falasser comparável ao fenômeno físico da resiliência dos materiais, a cadeia sintomática tem uma tendência a voltar à forma ante- correio APPOA l outubro 2010 rior. Faz parte de sua “memética”... 34. O Recalcamento Produções textuais: Seminário XV de Lacan. Por outro lado, há um saber-sem-sujeito no Ics que parece querer retornar, como um ato-falho, sem estar associado diretamente a um significante – só poderá ser interpretado se – e quando – o paciente falar sobre ele. A repetição A Verdade conquistada sobre o Inconsciente deixa o sujeito na posi- ção “Penso, não sou”. Não-ser, mas “não-sem-saber”. Lugar novamente .35 em falso, que pode catapultá-lo de volta ao ponto da ignorância (nãopenso). outubro 2010 l correio APPOA temática. A subjetivação A cura Produções textuais: Seminário XV de Lacan. Conforme Lacan, começar uma análise é sem dúvida um verdadeiro Ato, então, o que dizer de terminar um trabalho analítico? Como se arti- cula esta lógica da alienação durante e até seu final? O final da análise Freud descobriu, mas não deixou mastigado para nós – diz Lacan – que durante uma Psicanálise há um processo de “experiência subjetiva”. supõe certa realização da “operação verdade”, diz ele, assim como a riência em sua própria análise. outubro 2010 l correio APPOA .37 tar “desser” para o lugar de resto, ele mesmo deve ter passado pela expe- lugar instável, como já falamos, de onde será ejetado no final. Para supor- O psicanalista parte do lugar de saber, suposto pelo analisante. Um O lugar de Analista, um lugar “em falso” assunção do desejo. O analisante se torna sujeito, de seu desejo. A castração simbólica A castração simbólica corre por fora, seguindo a trajetória da transferência e da interpretação. Pode ser realizada durante toda a vida, ou du- correio APPOA l outubro 2010 rante uma psicanálise. 36. temática. Para chegar a ser um psicanalista – isto só é possível ao final de uma Psicanálise. A linha da Transferência que serviu para o sujeito “elevar” seu analista à posição de Sujeito-suposto-saber, pressuposto necessário para a realização do Ato Analítico, depois será a trajetória da dessubjetivação do analisante durante o processo todo e também do “desser” do analista no final de uma Psicanálise. Poderá servir, então, como trampolim para o analisante que almejar chegar à posição de Analista. Freud escreveu: Onde era Isso, deve ser Eu. Lacan leu: Aqui onde Isso correio APPOA l outubro 2010 era – Eu devo vir a ser – Psicanalista! 38. temática. A Clínica em Lacan - no Seminário XI (Primeira parte) Anotações de Jacques Laberge1 “Meu Seminário, desde o início [...] era dirigido para [...] a formação dos psicanalistas” (15.01.64). É na primeira sessão do Seminário XI, Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise que se encontra esta afir- mação de Lacan. Em momento posterior de ensino, ele deixa entender que não falou de formação do psicanalista. Seria uma denegação do tipo “não é minha mãe” do sonho!? Deslizaria para a mentira, recurso habitu- al da verdade? “É em primeiro lugar como instituindo-se em, e mesmo por, uma certa mentira que vemos instaurar-se a dimensão da verda- de”(22.04.64). Aqui, a verdade da primazia das formações do inconscien- Psicanalista, Intersecção Psicanalítica do Brasil, Recife. .39 te sobre a formação do analista. A formação do analista se fundamenta na 1 outubro 2010 l correio APPOA seu passo inaugural”. “Não digo que Freud introduz o sujeito no mundo Produções textuais: Seminário XV de Lacan. [...] porque foi Descartes”. “Mas direi que Freud se dirige ao sujeito para temática. práxis do analisante com as formações do seu inconsciente, ato falho, Da psicologia, síntese em lugar de análise, consciência em lugar de sonho, chiste, lapso, sintoma. Aliás, a respeito do sintoma, symptôme em analisante, assim poderia ser pensado um aspecto do trabalho em análise inconsciente, convencimento em lugar de associação, cadê o sujeito? Lacan dizer-lhe isto que é novo –Aqui, no campo do sonho, estás em casa, Wo es nos momentos de associações sobre um sintoma. A antiga escrita do sin- chega a denunciar Anna Freud e os psicólogos do eu. Reconhece o talento francês, Lacan volta, em 1975-76, à antiga grafia “sinthome”. Veio-me a toma é uma das vias para responder à pergunta: quando apareceu este de analista de Melanie Klein, mas questiona a primazia dada por ela ao war, soll ich werden” (05.02.64). sintoma? Mais adiante, no decurso da análise, o analista pode retornar à falo imaginário e ao objeto, negligenciando a importância do desejo ma- ideia seguinte: tentar retornar à antiga escrita do sintoma na história do pergunta e ouvir do analisante um “De novo?”. Pois é, aparecem modifi- Ampliar o debate com outros campos de saber é um dos caminhos terno, do desejo do Outro. tão bem ilustrado pelo sintoma, curte em retornar. Nestas idas e voltas, abertos pela “volta a Freud”. Lacan retoma o diálogo de Freud com a lite- cações na “escrita” nesta volta ao mesmo lugar onde o real do desencontro, cai no lixo o que ao lixo cabe e transforma-se o resto, permitindo certa ratura. Ele vai além e, via lingüística, desemboca, com James Joyce, na primevo, surge a pista levando ao “Nome-do-Pai”. Se Freud cita os filóso- letra. Da interlocução freudiana com a antropologia e seu mito do pai amarração. Psicanálise e ciência cológica do cogito cartesiano reduzido a um “aborto” (22.04.64). Daí, o sujeito não deve ser situado “em relação à realidade”, degradação psi- intuição e da síntese. O sujeito, “segundo em relação ao significante”, o dizer: a psicanálise não pode ser uma religião nem uma psicologia da e sistemático. Mas o sujeito da filosofia não é o sujeito da psicanálise. A lar-lhe o vazio. Na obra lacaniana, o ser vai sofrer um esvaziamento lento clínicas. Não se trata em análise de chegar à essência do ser, senão reve- nário XI, referências à filosofia, aqui a Descartes, têm suas incidências temática do ser, central na filosofia, para a questão do sujeito. No Semi- O primeiro a convidar a ir além do ser é Descartes que deslocou a fos, Lacan encontra neles sua mais constante interlocução, desaguando recurso à ciência, começando pela “ciência primitiva”, lugar do jogo da psicanálise traz algo “novo, reconduzindo o sujeito à sua dependência “O discurso que tenho aqui tem dois objetivos, um que visa os “combinatória”, das “oposições”, “da água e do fogo, do quente e do significante (19.02.64)”. Lacan, por exemplo, sublinha a importância da na lógica, “ciência do real”, onde a letra vem esvaziar o sentido. A letra frio” (29.04.64). “Antes do estabelecimento das relações humanas “[...] lingüística e do jogo combinatório. Fala do inconsciente estruturado como analistas, outro aqueles que estão aqui para saber se a psicanálise é em temas de oposição, a natureza fornece [...] significantes, e esses uma linguagem. Mas especifica que a psicanálise tem parentesco com a no além da literatura, mas também no além da filosofia. Além do ser. significantes organizam de modo inaugural as relações humanas, lhes uma ciência” (19.02.64). Lacan refere-se constantemente à ciência para dão estruturas e as modelam” (22.01.64).”O campo freudiano não era “linguisteria”, espécie de lapso da língua engolindo a histeria. Não é uma .41 possível senão um certo tempo após a emergência do sujeito cartesiano, outubro 2010 l correio APPOA linguística. “O inconsciente, conceito freudiano é outra coisa [...] entre a correio APPOA l outubro 2010 nisto que a ciência moderna não começa senão depois que Descartes fez 40. temática. ria dizer: entre a causa e seu efeito, não há falha. Por isso, embora em ta”? Lacan introduz este tema, sempre abordado como interrogação. É seria o impossível de uma resposta à pergunta “qual o desejo do analis- No Seminário XI, o primeiro real aludido, mas não chamado real, Produções textuais: Seminário XV de Lacan. psicanálise se trate do sujeito da ciência, e não da religião, nem da psico- logo associado ao “pecado original da análise”: “algo em Freud nunca foi - Real do desejo do analista logia ou da filosofia, em sentido estrito, na ciência, o sujeito está excluí- analisado” (15.01.64). Seria este “real que escapa”, primeira definição do causa e o que ela afeta, há a falha” (clocherie) (22.01.64). A ciência pode- do. Mas o sujeito do inconsciente aparece e desaparece em suas forma- tituto do pai, também está dormindo. O pai, duplamente, dormindo. O lado e uma vela está queimando o cadáver. Perto do caixão, o vigia, subs- uma vez no Seminário XI. O filho, de fato, está morto no caixão na sala ao do filho ao pai dormindo, sonhando. Lacan comenta este sonho mais de (12.02.64). “Pai, não vês que estou queimando?” Eis a pergunta repreensiva E o sonho “pode produzir o que faz ressurgir a repetição o trauma” - Real do pesadelo menos” na histérica (19.02.64). mitiva é tão traumática”, causando “prazer demais” no obsessivo ou “de uma forma [...] do traumatismo”. “Inassimilável”(12.02.64). A “cena pri- lhado” “se apresentou em primeiro lugar na história da psicanálise sob (manquer)” (29.91.64). A tuché, o real, “essencialmente é o encontro fa- to decepcionante com um real [...] que o sujeito é condenado a faltar O real aparece como “repetição da decepção”, “experiência enquan- - Real do trauma Imaginário e o Real” de 1953. real em um dos textos fundadores da teoria lacaniana, “O Simbólico, o ções, em sonhos, atos falhos, lapsos, chistes, sob um “modo de tropeço”, de “achado”, instaurando a dimensão da “perda” (05.02.64). O um do inconsciente “é o um da fenda, do traço, da ruptura” (22.01.64). E este sujeito é mais propriamente um ele do que um eu. No fim de seu ensino, Lacan questiona Freud por não ter falado do “ele”, mas somente do eu e do isso. Tratar o real pelo simbólico O Seminário sobre a ética de 1959-60 nos coloca em confronto com o real, cru, da morte, da Coisa, de um certo gozo. E o Seminário de 1962-63 define A Angústia “o real que não engana”. - Real da angústia Aqui, em 1964, Lacan sublinha a diferença da psicanálise em relação a qualquer outra práxis: “Nenhuma práxis é orientada para o que, no coração da experiência, é o núcleo do real” (12.02.64). E pergunta sobre nosso trabalho de analistas “O que é a práxis?” Responde: “tratar o real pelo simbólico” (15.01.64). Por exemplo, a respeito da angústia, é preciso “dosá-la para não ser submergido por ela” (29.01.64). O real da na. O pai real não funciona propriamente como agente da castração, dei- real do desencontro volta ao mesmo lugar da demissão da função pater- pela explicitação provocada pela pergunta: “quem está sufocando você? xando o filho à mercê do desejo mortífero, incestuoso, do grande Outro angústia, na “práxis” do “tratar o real pelo simbólico” pode ser cercado Ou, alguma mãe espera o que de você?”. Não saber que objeto a se é materno. Esta mãe não soube reconhecer este homem, pai deste filho. Ela .43 para o desejo materno, eis uma perspectiva decorrente do Seminário outubro 2010 l correio APPOA abdicou da tarefa de mediação, mas com a cumplicidade do pai dormin- correio APPOA l outubro 2010 “A Angústia”. 42. Psicopatologia da vida cotidiana, o “erro de escrever Asdrúbal em vez de lhado, o pai de Freud se limitou a colher a boina na rua. No capítulo X da do por um transeunte que lhe deu um tabefe e fez voar sua boina. Humi- por Freud. O pai dele, vítima de preconceito contra os judeus, foi insulta- nálise” (Autres Écrits, p.61). Lembremos o choque traumático vivenciado a uma crise e “devemos talvez a esta crise o surgimento da própria psica- complexos familiares” de 1938 “declínio social da imago paterna”, levou eterno do pai. A demissão da função paterna, chamada por Lacan em “Os do demais. E o filho dorme seu último sono. Sonho entre sonhos, do sono “a criancinha olhando seu irmão suspenso no seio da mãe, olhando-o “invídia vem do videre”, ver. Nos textos de Santo Agostinho, lemos sobre mau olhado e sua “função mortal” de “levar a doença, o desencontro”. A de seu próprio desfalecimento” (26.02.64). E a questão do mau olho, do (19.02.64). Olhar, “ponto de ser esvanecente com o qual o sujeito confun- prio à consciência obtusa, o que há de eludido? É a “função do olhar” escópica. Na visão da imagem especular, lugar de desconhecimento pró- “cúmplice da pulsão”. E ilustra pela esquize entre olho e olhar na pulsão real” “originalmente mal vindo” (mal venu = não bem vindo), e nisso, Lacan fala da “esquize” do “sujeito em relação ao encontro” como “o Produções textuais: Seminário XV de Lacan. Amílcar, o nome do irmão substituindo o pai”, revela, diz Freud, “minha com um olhar amargo”. “O mau olho é o fascinum” (11.03.64). temática. insatisfação com o comportamento de meu pai frente aos inimigos de cê do gozo da mãe! Pensemos nos pesadelos repetidos de certo analisante: funciona senão até um certo limite que se chama o real. [...] que volta O real como limite: “A memorialização da biografia, tudo isso não - Real do limite “Algo tão real que está acontecendo mesmo, esses bandidos vão me ma- sempre ao mesmo lugar [...]o sujeito [..] nunca o encontra (05.02.64), A ausência do pai, verdadeiro pesadelo na vida de tanta gente a mer- nosso povo”. tar, não tenho jeito de escapar”. Este real sem lei, totalmente solto, apela mesmo lugar do limite, o mesmo lugar do desencontro. coincidir? A respeito do homem dos lobos, “é em relação ao real que fun- vivência, certo tipo de complô mortífero: tantos desejos de morte podem caso? A “reação negativa” usa hoje em dia, freqüentemente, o mais popu- de à posição do analista, qual poderia ser a resistência do analista no va”. Pode-se falar da resistência do analisante. Se esta resistência respon- No fim do O eu e o isso, Freud se refere à “reação terapêutica negati- por um limite nunca dado. E o analista ouve comentários sobre uma tra- ciona o plano do fantasma. O real suporta o fantasma, o fantasma protege lar dos recursos, o prolongamento da chamada depressão, para desafiar, ma persecutória dos familiares encobrindo, por comportamentos de con- o real” (29.01.64). agredir o analista: o analisante se queixa de ter sido vítima de pais negli- na rivalidade entre irmãos basicamente fundada na fantasia incestuosa dade” (05.02.64). Real do trauma a ser tratado pelo simbólico. Pensemos O real do “mau encontro”, do trauma queé a”introdução da sexuali- sação para dizer que ele, se fosse analista, seria bem melhor. Tal outro singularidade. Tal analisante usa inconscientemente esta depressão-acu- formização seria a resistência do analista. Da reação negativa, há uma maneira uniforme pelo analista em relação a vários analisantes. Esta uni- reação negativa, odiosa, da parte do analisante não pode ser abordada de gentes e irresponsáveis. O analista se revela a imagem perfeita deles. Esta entre filhos e mãe. A rivalidade começa no quarto dos filhos antes de ser quer mostrar como o analista anterior era mais animado. Tal outro acaba - Real da rivalidade, da “invídia” questão de luta pela propriedade privada, dizia Freud em 1930 (Mal-estar .45 na cultura). Por mais imaginária que seja esta rivalidade, ela não deixa de outubro 2010 l correio APPOA evocando o lado chantagista da depressão da mãe. Tantos outros e outras correio APPOA l outubro 2010 ser real pelo lado do “desencontro”. 44. tência do analista: a uniformização. analisante dentro de singularidade muito própria. Uma forma de resis- gozam no sofrimento benefícios de doenças da infância, mas cada merda em esterco e produzir algo?”. A impotência é imaginária. Certos cidade. Não antecipar cortes deve dar-lhes mais peso. Sobre esta vida muito” pode permitir dar o passo para interrogações sobre certa cumpli- sofrimento da infância até ele reconhecê-lo. Um “você realmente sofreu Produções textuais: Seminário XV de Lacan. “É o real que comanda mais que tudo nossas atividades e é a psicanálise que nos designa isso” (12.02.64). Lacan diferencia a resistência do “interesses” de analisantes os levam a confundir impotência e impossibi- temática. sujeito em relação à “resistência do discurso” e o núcleo “real” deste dis- lidade. O convite falado ao possível pode operar algum furo na beira do impossível. outubro 2010 l correio APPOA .47 “uma grande merda”, uma possível pergunta: “pode transformar esta curso (19.02.64). Da interpretação Uma analisante se queixa de uma amiga indiscreta e paradoxalmente totalmente fechada a respeito de si mesma. Um sonho: “Ela em cima de mim, quer saber tudo de mim e não diz nada sobre ela. O assunto? O amigo apelidado “dito”. O amigo “dito” e a amiga do não-dito”. “A interpretação do analista não faz senão recobrir o fato que o inconsciente [...] em suas formações –sonho, lapso, chiste ou sintoma- já tem procedido por interpretação”. Freud fala da transferência como resistente, e paradoxalmente, convida o analista “esperar a transferência para começar a dar a interpretação” (15.04.64). Tratar o real pelo simbólico significa, na práxis, tratar os reais pelo simbólico: o real da angústia, do trauma, do limite, do sonho, da repetição, da pulsão de morte, do impossível, da não-relação sexual, do gozo, do caos, da doença psicossomática, da psicose. Uma analisante narrava um sonho como um apanhado de todos seus sofrimentos fazendo da vida dela “uma grande merda”. De fato, aludindo a episódios atrozes. Lacan nos adverte de evitar a compreensão.Perguntome se a dificuldade em muitos analisantes de, pouco a pouco, tomar distância deste sofrimento, de descolar-se deste gozo masoquista, se vê reforçada porque o analista não se permite a etapa da “compreensão” no sentido de dizer algo do tipo: “entendo, reconheço que você sofreu de abusos terríveis”. Era o tio perverso que não queria saber do sofrimento correio APPOA l outubro 2010 desta sobrinha. Analisante, ela revive com o analista a perpetuação do 46. temática. O ato na Psicanálise de crianças1 Alfredo Jerusalinsky Transcrição do encontro do Núcleo em psicanálise de crianças, no dia 13 de março de 2010. .49 Vou começar por ler alguns fragmentos do seminário “A lógica do fantasma”, de Lacan, aula de 8 de março de 1967, em que propõe o seguinte: “O ato sexual: O que a psicanálise diz disso? Simples observações. É, com efeito, surpreendente, que tudo o que se enuncia na teoria psicanalítica parece destinado a apagar – ao uso destes seres a diversos títulos sofredores ou insatisfeitos dos quais nos encarregamos. Dito de outro modo, temos que carregá-los. O caráter do ato do encontro sexual. Conjuntamente, declara-se mais ou menos satisfatória tal ou qual forma do que se chama a relação sexual, evadindo assim o que tem falando com propriedade de vivo e de cortante no ato, mascarando o que o constitui, a saber ser um corte. Repito para que prestem atenção. O ato sexual, então, Lacan diz, é essencialmente um corte. Todo mundo sabe disso. Antes e depois do ato sexual não é a mesma coisa. É necessário acreditar que é 1 outubro 2010 l correio APPOA temática. Produções textuais: Seminário XV de Lacan. Bem, depois vem um título, que eu vou resumir para não alongar a considerada com seriedade a propósito do estatuto do sujeito, mas é pro- leitura, que diz: “o acting-out como revelador do ato psicanalítico”; e ou- algo, digamos ao que eu chamaria um modo moderado sob o qual a teoria masiado. Mas, o fato é também, qualquer uma que seja nossa aspiração à tro título: “o ato do corte psicanalítico”, dentro da mesma aula. Eu vou vável que aquilo interessaria menos a nossos clientes”. liberdade de pensamento, que o ato sexual não tem passado ainda à cate- lhes falar de um quarto ponto: o ato sexual e a sublimação em relação à avança. (...) Quer dizer, a psicanálise se cuida para não escandalizar de- goria daquilo que satisfaz-se no snack-bar. Que não é um assunto tão sim- Bem, Lacan sublinha que se contrapor à posição do paciente, colo- de miolos frescos. angustiado a tal ponto que ele tem que sair da sessão e ir comer um prato ele diz ter plagiado. Isto, em lugar de tranqüilizar seu paciente, o deixa é nada disso, que nenhum das idéias que ele escreveu está no livro que ele cita e voltar na sessão seguinte comunicando a seu paciente que não o analista da escola da psicologia do ego, americano, é ir ler o livro que extraído as idéias de um escrito, reproduzindo-as tal qual. O que faz Kris, copia. Durante sua análise, o paciente cita um livro do qual ele teria crever algo original e que tudo que ele escrevia inevitavelmente era uma plagiar. O sentimento era de que ele acreditava que não era capaz de es- analisou do paciente do psicanalista Kris, aquele que tinha complexo de Em relação ao acting-out, Lacan evoca o exemplo que ele mesmo Lacan disse sobre um, a continuação vou resumir os outros três. falta. Eu vou resumir esses quatro títulos. Na verdade, acabo de ler o que ples como beber um copo de água. Como se afirmava no inicio desse século, em torno de Lenin. Estamos falando do amor livre, 1917. É que a raspa depois dele, e dele se inclui, sem dúvida ainda, carregar por longo tempo esse bizarro efeito de discordância que se chama a culpabilidade. Mas aquilo não me impediria, ou não impedira de enunciar ainda, mais uma vez a insuficiência da definição do estádio genital e de estrutura ideal de seu objeto. E igualmente impugnar que a dimensão do carinho deve ocupar aí o lugar estrutural. Seria bom lembrar o que a experiência impõe. A saber, a ambigüidade do amor e se perguntar simplesmente se um ato sexual é imaturo quando está comprometido no ódio. Os amores de Tulerure e de Sygne de Coûfontaine seriam uma conjunção, então imatura? Os ouvintes em todos os casos não querem escutar nada disso. De qualquer lado que eles estejam, religiosos ou de nenhum modo em tal posição, ou menos do mundo pensante contrariamente ao que Sygne não silencia que ela, a relação sexual em tudo aquilo que encanta. Outro traço uma maturidade afetiva. Assim seja, outro quem parta primeiro um pou- cônjuge. Há aí algo que faz pensar que estaria na norma do que se chama ção sexual virou de lado e dormiu. Faltou o luto decente pela perda do perda do cônjuge. A queixa clássica da histérica que determinou a rela- caráter moderado e a demora decente que aí tomaria o luto depois da comunicasse a seu analista um sonho: uma realização imaginária de de- realização imaginaria de seu desejo, como faria qualquer analisante que ele vem e comunica a seu analista que plagiou, ele esta comunicando a algo original, seu desejo fundamental é plagiar. Quer dizer que quando Porque seu desejo não é escrever, seu desejo fundamental não é escrever se trata é o que vai fazer esse paciente com seu desejo de plagiar o outro. cando a verdade do fato, não é interpretação. Porque, justamente, o que co como a historia que Freud conta em alguma parte. Aquela do senhor sejos. Desfazer essa relação imaginária não é interpretar, porque o que se de maturidade para as afecções genitais seria de (inaudível) autores o que diz a sua mulher: ‘Quando um de nós dois morrer, eu irei a Paris’. interpreta é o desejo e não a revelação de uma verdade fática, que todo .51 mundo sabe, interessa um ovo para nós! Nossa vida não se orienta por outubro 2010 l correio APPOA Sempre resulta curioso que nada seja evocado na teoria no que concerne correio APPOA l outubro 2010 ao luto que esse sujeito maduro deixaria atrás de si. A questão poderia ser 50. pontual e efêmero, porque nós não conhecemos o tecido fantasmático não é que não saibamos nada, mas o que sabemos é muito fragmentado, guma coisa de um terceiro referido durante a análise. E eu lhe disse que, filho e me pergunta se nós podemos, através de um analisante, saber al- das da vida dele. E então, ele faz algumas intervenções em relação a esse com seu filho por uma serie de circunstâncias mais ou menos complica- mãe de um filho adolescente, um adulto jovem. Ela estava preocupada supervisão me perguntava a propósito de um caso de uma paciente que é do que aconteceu. Não interessa! Ontem, um colega de São Paulo em uma Freud e Sherlock Holmes, quer dizer, nós não vamos averiguar a verdade velha metáfora da diferença entre um analista e Sherlock Holmes, entre xa cair. É por isso que nós psicanalistas não somos descritíveis. Por isso, a blemas. O problema mais grave é precisamente quando o real não se dei- nós. E o real se deixa cair, o que quando não acontece, ficamos com pro- des fáticas, mas em função de desejos que tem um valor simbólico para verdades fáticas. Nossas decisões não são tomadas em função de verda- vicção do paciente de que não haveria outro gozo maior que aquele que desmentí-lo, anularemos o cerne de nossa interpretação, mas sobre a con- nosso paciente quando ela se aplica não sobre o desejo, que se formos hábil na intervenção analítica, só pode ser produtiva para a análise de ocupe nenhum papel na intervenção analítica. Mas, a desmentida só é ginação, ele é desmentido por seu analista. Não é que a desmentida não miolos do outro no real, já que no simbólico do seu “sonho”, em sua ima- em que nele havia uma carência de ser. Por isso, ele tem que comer os mental para o paciente de Kris era se apropriar do ser do outro na medida ele o desiludiu, não é? Você não interpretou o seu desejo. Porque o funda- um sonho. É como o paciente de Kris, ele queria que fosse um plágio. Mas deseja o desejo do outro. Como ele deseja que seja esse desejo do outro. É de falar do seu próprio desejo, porque ele esta nos dizendo, como ele Quer dizer, o modo que nosso paciente conta o desejo do outro é o modo nosso paciente. É aí que se lê o desejo de nosso paciente e não do outro. dá para ler, precisamente, no modo como esse outro é apresentado pelo tão, dizíamos, é do desejo, do desejo em relação a esse outro, que se lê ou Produções textuais: Seminário XV de Lacan. desse terceiro. Podemos ver efeitos nesse terceiro, porque nosso analisante ele está praticando. Essa desmentida é válida. Essa desmentida é muito temática. vem e nos conta. Conta para nós que em função da intervenção que tive- Na verdade, nessa terceira parte, ele mostra, retomando o que co- importante! E é ainda muito mais importante em psicanálise de crianças, mentou no primeiro título, que precisamente o ato analítico está na mos, ele falou com seu filho de determinada maneira e o filho então em paciente guiado por nós introduziu ali, ignoramos por completo. Porque antípoda da relação sexual. Precisamente, não por uma questão de mo- do que na análise do infantil do sujeito, precisamente porque é ali que se nós, quando fazemos uma intervenção em relação a esse terceiro, na ver- deração do escândalo, como ele ironiza o primeiro título que eu li, para lugar de fazer tal coisa fez tal outra. Pronto! Agora, quanto vai durar isso dade, não estamos fazendo uma intervenção em relação a esse terceiro produz a obturação de uma falta. Eis aqui, a razão pela qual eu li o que li real. Estamos fazendo uma intervenção a esse outro de nosso paciente, ao não escandalizar as pessoas que estão em volta. Mas porque, precisamen- de Lacan antes. outro que nosso paciente tem na sua cabeça. Quer dizer, não interessa te, é dessa falta que na análise se trata, da falta na relação sexual. É por que ele fez, não sabemos. Quanto de persistência, de modificação da po- para nós quem é outro, senão teríamos que, cada vez que o paciente fala isso que ela esta na antípoda, porque é a relação sexual que falta. É por sição significante de seu ato, quanto foi atingido pela mudança que nosso de outro, convocá-lo para conhecê-lo. E essa não é nossa função. Nossa isso que a psicanálise não pode se desenvolver por telefone. Por telefone, .53 não há chance de relação sexual. Embora existam os serviços telefônicos outubro 2010 l correio APPOA função é justamente intervir em relação a esse outro que constitui, forma correio APPOA l outubro 2010 parte do fantasma de nossos pacientes. Está claro? A interpretação, en- 52. ou seja faltar. Nenhuma mulher se queixa ao açougueiro da esquina que exista a chance da relação sexual advir para ela não estar se realizando, eventuais) Agora vamos ver por que. Justamente porque é necessário que (observemos que estamos falando de uma análise e não de intervenções ne! Imagina, até mesmo por skype ou vídeo conferencia. Não é possível! a relação analítica pode dar seus frutos. Analisar uma criança por telefo- seu elenco masturbatório. Nada contra!... Mas, digamos, não é por ai que dizer, mas é capturada na fantasia do paciente como formando parte de justamente essa voz é tomada como objeto pequeno a do analista, quer rença importante. É claro que a masturbação se prende a uma voz, mas eróticos, não é uma relação sexual, é uma masturbação. Há alí uma dife- Quando está dentro tem que estar fora, quando está fora tem que estar perto tem que estar distante, quando está distante tem que esta perto. que na histeria, a questão sexual é uma queixa incessante. Quando está tão premente, tão insistente que elas entram no heinamour. Vocês sabem mim!”. Assim como tem mães cujos filhotes as demandam de um modo aqui! A criança que diz para a mãe: “mãe lá” ou “não vem em cima de De crianças que querem a mãe lá! Estão me entendendo? Não a querem devem ter sido testemunhas inúmeras vezes, se são analistas de crianças. sa. Repulsa no sentido de rejeição, distanciamento. Não é errado! Vocês número 20): heinamour, fala de um amor repulsivo. Um amor em repul- junção proposta por Jacques Lacan no seu seminário “Mais Ainda...” ( o a repugnância, mais com a repugnância. Está claro? Precisamente a con- Produções textuais: Seminário XV de Lacan. está sem relação sexual. Mas, se isso acontecer com seu marido, pode se dentro. Quer dizer, essa contraposição incessante que monta a armadilha temática. queixar a seu marido. Porque, com o marido, deveria haver ou, a chance do desejo antitético na histeria. dizer, no amor, o gozo sexual não atinge seu ápice, e quando atinge seu O que seria uma contradição, onde estaria sempre em falta algo. Quer Mas, que afortunado é aquele que consegue fazê-lo coincidir com amor”. de um literato “não há gozo maior que o sexo praticado num mar de ódio. foi Roland Barthes, em “Fragmentos de um discurso amoroso”, quem cita pacientes, mas não vamos fazer disso a relação sexual. Entendem? Talvez par seu devido lugar”. Quer dizer, podemos ser carinhosos com nossos em que Lacan diz “o carinho tem que ter seu devido lugar, tem que ocu- porque dessa falta se faz, na análise, sublimação. Já li um pedaço da lição lugar, pela razão do ato. Ou seja, pela condição do ato. Em segundo lugar, É por isso que Lacan diz que estamos na antípoda. Em primeiro e inconsciente, a fonte da culpa mencionada por Lacan. Justamente, esse Ou seja, a posição moral que depois irá se repetir em um modo recalcado do que se configura de um modo firme e constante o caráter da criança. posição do sujeito na infância. Freud chega a comentar que é nesse perío- tante. Diríamos, quase, de estabilização da infância, de consolidação da fez notar no que ele intitulou o período de latência um momento impor- suficiência, não estamos na maturidade genital. Na infância, Freud nos maturidade genital a não ser sob a forma da insuficiência. Quando há turidade genital sempre se cumpre na insuficiência. Quer dizer, não há esperaria sob a forma de uma junção total. Como Lacan comenta, a ma- posição antitética, que coloca a condição de falta sempre naquilo que se lando da lógica do fantasma, justamente a lógica que coloca o desejo na no seminário da “Lógica do fantasma”, vocês estão vendo que estou fa- Revisemos um pouco a questão da sublimação: Lacan nos faz notar de haver está aí. Se não se cumpre, ela falta. Mas, com o açougueiro não falta. (Salvando a circunstancia, perfeitamente compreensível, que possa ápice é porque ele está imerso no ódio. A palavra ódio, aqui, deve ser caráter moral se instala nesse momento da infância chamado período haver mulheres que gostem de açougueiros) considerada com certo cuidado, porque a inflexão de hein, em francês, latência. E que denota, como estávamos vendo, um momento de plenitu- .55 de. Justamente, é latência porque a sexualidade, a pulsão sexual entra em outubro 2010 l correio APPOA não tem o caráter necessariamente passional que tem na nossa língua. correio APPOA l outubro 2010 Pode-se confundir essa inflexão com o rechaço, com o distanciamento ou 54. latência. Toda a atividade excitatória da criança: essa agitação, que se símbolo por todos os lados. Vemos em cada trem um papai que entra na riquíssimo. Para nós é um prato para interpretação kleiniana. Quer dizer, Produções textuais: Seminário XV de Lacan. traduz na agitação motora que vai até os seis ou sete anos de idade; essa estação mamãe e é facílimo de ver. A sessão número 14, do caso Dick, temática. dificuldade para dormir, esses terrores noturnos dos quatro ou cinco tratado por Melanie Klein, se repete incessantemente. cuitos pulsionais que se cumprem em equivalentes níveis de satisfações tâneas e múltiplas. Feliz delas! Quer dizer, são exigências corporais, cir- polimorfa da criança, porque suas vias pulsionais são diversas, simul- ambigüidade da “genitalidade” infantil, quer dizer a posição perversa menina também quer comer a mãe. E digo comer, porque aqui está a para devorar! Não importa se é menino ou menina, porque na verdade a mente com aquilo que se perdeu para sempre, ou seja, o significante que É como estudar as inscrições num cemitério, as letras nos túmulos, justa- decifrando. A criptologia é a disciplina que estuda os signos dos códigos. quer dizer, a falta. O que causa o desejo é aquilo que falta. Interpretar, damentalmente em interpretar o que causa o desejo, quer dizer, o desejo, mencionar, é como a intervenção analítica, o ato analítico consiste fun- metaforizando aquilo que Lacan propõe no título da aula que acabo de A questão é onde está a falta. O que dizemos, reformulando ou anos de idade, que são justamente o medo de reproduzir seu desejo inces- nos diversos orifícios do corpo, quer dizer nos diversos buracos, nas di- fica ali como signo de um luto. O signo da mãe perdida, do objeto perdido tuoso nos sonhos. Isso assusta porque aí vem o pai com cara de monstro versas posições da falta no seu corpo. cha, precisamente aí onde a falta fica denunciada pela falência de um Bem, justamente, dizia que a intervenção analítica entra pela bre- para sempre. Há um artigo de Norma Brunner, sobre o brincar e o luto, atenção e hiperatividade antes do sete anos. Até mesmo os comportamen- gozo. Parafraseando Lacan (nesse ponto belamente interpretado por que está numa das revistas da APPOA, o qual recomendo muito. Ele toca talistas sérios reconhecem isso. Depois, estão os comerciantes, que hoje Roberto Harari no seu livro “A repetição do Fracasso”) ou metaforizando Então, durante a latência, a criança vive uma espécie de plenitude. em dia, são muito mais abundantes que os sérios, e diagnosticam a esmo É por isso que se tranqüiliza. É por isso, por exemplo, que é totalmente com três ou quatro anos de idade. Acabo de receber um paciente, com Lacan, eu costumo dizer que a condição de adulto se ganha em função do nesse ponto de um modo exemplar. dois anos e seis meses, medicado com ritalina e com rivotril em altas do- fracasso, do fracasso da relação sexual. Quer dizer, a constatação de que a absurdo que alguém saiba diagnosticar um transtorno de déficit de ses, num estado confusional. Porque foi diagnosticada, é uma menina, com relação sexual não é o sucesso da relação. Não é o desabrochamento ta. Essa dobradiça é uma dobradiça que atravessa a condição de fracasso. transtorno de déficit de atenção. A mãe está muito feliz porque por fim se A criança é alguém que ainda não fracassou! É por isso que ela pode definitivo e total que acaba com toda carência que se verifica na condi- Dizia que, justamente no período de latência, é quando a criança desfrutar de umas boas férias que duram três anos, mais ou menos, que se ção de maturidade, quer dizer na passagem da infância para a vida adul- aparece para nós como mais razoável. Analisar uma criança no período chama período de latência. Jardim de Nárnia, ao qual dificilmente retor- sabe o que a criança tem. Vou lhes dizer, a criança não tem nada! Mas a de latência é tranqüilo. Digo que é tranqüilo, aparentemente, porque o naremos. E se formos retornar, ai de nós! Justamente porque se instalará mãe precisa que tenha, que alguém lhe responda o que a criança tem. difícil é analisar, porque aí falta presença da falta. Agora, são crianças .57 que estão numa idade que tende a tornar-las muito sociáveisl! Desenham, outubro 2010 l correio APPOA um delírio neurótico, mas, um delírio. É o preço que paga o delirante. Os correio APPOA l outubro 2010 brincam com a Barbie, brincam de guerra. O campo de simbolização é 56. temática. Produções textuais: Seminário XV de Lacan. Este problema atravessei, nesta última semana, e digo isto para con- como sendo o sabedor do que não se sabe, como aquele de quem há de se cluir, com uma menina de sete anos e meio, muito inteligente e muito poetas pagam esse preço; os sonhadores pagam esse preço. Tem gente que cação de um imaginário que não acabe nunca. Lugar de refúgio desse rápida. Mais rápida que eu! A queixa parental e escolar, justamente, é de escutar as maiores verdades. Então, digamos, a criança pequena se pren- naufrágio, de reconstrução incessante de todas as mortes, perdas, lutos que ela está em tal posição de plenitude, tão absoluta, que ela não precisa paga esse preço e nós prezamos. E não prezamos pouco, pois justamente havidos, e que acontecem a cada 30 segundos. Essa condição de ignorân- de nada nem ninguém, e está por cima de todo mundo. Mais ainda, tam- de em nós. Nós assumimos essa posição sabedora, silenciosa, do sábio, cia radical, essa posição de divisor do saber do outro que não acaba bém não precisa aprender nada porque já sabe. Então, a questão é meter são os que representam nossos sonhos, nossos anseios, nossos desejos mais nunca. Impossibilidade de apropriação de um saber, porque sempre tem uma interpretação. Ela já vem há alguns meses trabalhando comigo e, que tudo consegue entender, apesar de não entendermos absolutamente um significante a mais que denuncia que havia um sentido que ela não nessa semana, depois de alguns meses de pintar, moldar com massa de nada no início. E a criança engole a historia. Mas, quando chega à latência, sabia. Perguntas de “por que? por que? por que?”, “e o que é isso? o que é modelar, brincar com a Barbie, brincar de guerra também, com super he- secretos. Bem, a intervenção com uma criança, então, é descobrir nessa isso?”, que não acabam nunca. Justamente essa sobra, esse naufrágio in- róis, tudo! E eu, claro, interpretando o valor simbólico de suas produ- plenitude que falamos da latência, o lugar da fala. Geralmente, a criança cessante tem que contar com um outro real bondoso, generoso, disponí- ções. Nada! Ela olhava pra mim com um olhar de suficiência que me nós pensamos: agora vem uma criança mais tranqüila. Não terei que sen- vel, paciencioso, etc. Vocês sabem disso. Bem, mas que, então, torna a deixava esmagado. Algo assim, como “interessante! Muito bem! Você sabe é trazida à analise nesse período ou porque ela não o atingiu. Porque a intervenção do analista mais permeável, justamente, porque em seguida a ordem do simbólico”. Bom, aí apareceu uma chance e eu estava na es- tar no chão, não terei que correr, brincar com terra, sujar as mãos com essa criança pequena, a menos que esteja tocada por uma ameaça, uma preita, é claro, pulei em cima! A mãe, na sala de espera antes de entrar condição é dessa sobra incessante na conquista de uma forma de subli- inibição, uma experiência de mau trato ou abuso, etc, ela se prende a me disse: “aconteceram três coisas”. Então, a menina disse: “Mãe, tu não tinta, ou talvez sim, mas não tanto porque ela é ordenadinha, ela guarda uma proposta de saber do outro. E o pequeno Hans? Não é verdade?!, vais contar”. E digo: “sim! Ela vai contar, porque estamos aqui para isso. mação do gozo, o naufrágio incessante permanece. Esse naufrágio, que é Quem é esse homem, Freud, que em uma única sessão sabe tanto sobre Então passa a mãe e tu junto!”. A menina estava vacilante. Então, senta- as coisas antes de ir embora. O problema é meter uma interpretação na mim? O que é esse homem? É Deus, que sabe tudo, que sabe tudo de mos ao redor da mesa. Ela diz: “Vou brincar!”. Eu digo: “Hoje não. Hoje, cabeça delas! Tem que ficar na espreita. mim? (a famosa frase do pequeno Hans endereçada à seu pai ao sair da vamos falar! Quais são as três coisas que aconteceram?” Ela disse: “Por próprio dos dois três, quatro anos. Esse naufrágio incessante que leva única entrevista que teve com o Dr. Sigmund Freud) Claro, porque não é que não brincar?” “Porque hoje a coisa é seria, pelo que estou vendo. Quer sempre a criança a uma avidez de brincar, a uma voracidade de fabri- que Freud fosse gênio, com tão extraordinária capacidade de revelação .59 sobre o Pequeno Hans que soubesse mesmo tudo acerca dele. As crianças outubro 2010 l correio APPOA dizer, não é de brincadeira, assim, hoje não vamos brincar”. A mãe diz: correio APPOA l outubro 2010 supõem o analista, colocado pelo imaginário dos pais na transferência 58. temática. “Ela não esta dormindo a noite inteira, acorda de noite com medo”. “Essa é a primeira coisa que tu querias contar. Qual é a segunda?”. “A segunda é que ela brigou com a professora, e a professora, pela primeira vez, lhe disse que se ela queria brigar esse não era o lugar e, então, a mandou na direção e ela esteve por duas horas na direção, porque ela é extremamente desafiante. Alguém que foi lhe buscar perguntou se ela queria continuar brigando e ela disse que não. Bom, então pode ir!” Isso foi a segunda coisa que aconteceu. A terceira coisa que aconteceu é que como formam grupos para trabalhar, no grupo dela se incluiu uma menina com paralisia cerebral, ou seja, com sintomas espásticos. Essa menina, querendo se aproximar das suas colegas, se agarrava nelas porque, em função do controle corporal, a velocidade da emergência de suas expressões é muito lenta. Então, ela não consegue se fazer lugar senão agarrando as colegas. Quando a minha pequena paciente foi agarrada, ela se sentiu horrorizada, invadida por algo monstruoso. Ela tinha que suportar a lentidão da expressão. Cada vez que ela ia falar, e ela fala muito rápido, a outra a apertava. Como quem quer dizer: “Para que estou falando!” A menina, então, pediu à professora que lhe dissesse para não pegá-la... e a professora explicou que esse é o modo que ela tem de falar! “Esse é o modo de ela tem de se fazer entender, porque senão tu não lhe dás tempo. Então, tu preenches tudo, com um contínuo que não deixa espaço para o outro, não tem lugar para o outro. Não vou tirá-la e nem vou te tirar do grupo! Porque ela está se fazendo lugar em ti e tu precisas lidar com ela”. Quer dizer, a castração abriu uma fenda, um intervalo. “E então, então tu tiveste um pesadelo. Como eram teu pesadelo?” “Havia um monstro que me agarrava”. Então, claro eu interpretei. Mas vejam só como foi difícil que se produzissem as condições para que houvesse uma brecha para que a relação faltasse. Que a relação com o outro fizesse falta ali permitiu a interpretação muito mais que os ricos desdobramentos simbólicos das preciosas cenas de seu brincar . Isso demonstra o quanto o ato analítico é correio APPOA l outubro 2010 distanciado da ação. 60. debates. Tristeza também tem fim e sem ela não há felicidade: o lugar da tristeza na sociedade contemporânea1 Márcia Goidanich Tem mais presença em mim o que me falta. Manoel de Barros Optei por ater-me, mais do que ao diagnóstico nosográfico de bipolaridade, a outros dois significantes que destaco do título dessa mesa redonda: tristeza e contemporânea. Faço essa escolha em função de, em primeiro lugar, ter clareza de que sempre somos capazes de falar apenas de temas parciais. Não somos capazes, humanos que somos, de tudo di- .61 1 Texto preparado para apresentar em mesa redonda da Semana Acadêmica do Curso de Psicologia da Universidade Regional Integrada - URI, Erechim/RS, cujo título foi “Tristeza não Tem Fim, Felicidade Sim: discutindo a bipolaridade e a sociedade contemporânea”, em agosto de 2010. A referida mesa redonda era composta por um psiquiatra, uma psicóloga que trabalha com terapia cognitivo-comportamental e eu. outubro 2010 l correio APPOA zer. Dizer toda a verdade, como bem lembra Jacques Lacan (2003), é um rose o sujeito nega a castração do Outro através do recalque (verdrängung), É novamente Quinet (2001) que nos esclarece que enquanto na neu- Produções textuais: Seminário XV de Lacan. impossível: materialmente impossível, faltam palavras. Mas, também faço conservando-a, no entanto, no inconsciente, na perversão há o uso fun- debates. essa escolha por entender que a classificação de Transtorno Afetivo Bipo- damental do desmentido, ou recusa, (verleugnung) que também nega a algum, não conserva nada, arrasa. Os dois modos de negar que conser- lar é uma classificação diagnóstica descritiva, fenomenológica, e, como Abro aqui um pequeno parêntese para esclarecer tal diferenciação. vam algum vestígio do elemento da castração do Outro, mesmo negando- castração, mas conserva-a no fetiche. Por outro lado na psicose, com o Distintamente da psiquiatria moderna, a psicanálise não organiza seus o, – neurose e perversão – implicam a admissão do Édipo no simbólico, o tal, baseia-se na observação de sinais e sintomas que faz jus ao paradigma modos de entendimento diagnóstico partindo de sintomas observáveis, que já não acontece na psicose, que não conserva nenhum traço dessa uso da forclusão (verwerfung) ocorre uma negação que não deixa rastro mas sim compreende a constituição subjetiva como organizada a partir castração. nosológico biomédico. do que nomeia de estruturas. As três grandes estruturas fundamentais – forme a posição do sujeito no Édipo em relação ao gozo. Ou seja, o diag- diferenciar-se da psicanalítica justamente por esta última variar con- Antônio Quinet (2001) destaca o fato da nosografia psiquiátrica ser evidenciado em qualquer uma das três grandes estruturas clínicas intensidade, o conjunto de sintomas que caracteriza esse transtorno pode Bipolar o que é possível dizer é que, guardadas certas variantes e graus de 2001). Retornando ao diagnóstico fenomenológico de Transtorno Afetivo A essas três formas de negação da castração do Outro correspondem nóstico estrutural só poderia ser buscado no registro simbólico, no qual psicanalíticas. Ou seja, quando fechamos um diagnóstico descritivo de neuroses, psicoses e perversões – trabalhadas desde a origem por Freud, são articuladas as questões fundamentais do sujeito quando da traves- Transtorno Afetivo Bipolar não temos ainda segurança a respeito de qual as modalidades de retorno dessas operações, ou seja: o retorno do recalcado sia do complexo de Édipo. Com isso a proposta psicanalítica entende a estrutura clínica que caracteriza o mesmo sujeito.A prática clínica nos caracterizam-se fundamentalmente pelo modo como cada sujeito se que cada sujeito vai lidar de um modo específico com o fato de deparar- evidencia quadros de diagnósticos psiquiátricos de bipolaridade que tra- no sintoma neurótico, o retorno do desmentido no fetichismo do perver- se, ao longo do processo edípico, com a castração, a falta, o barramento tam-se de estruturas psicóticas, mas também nos apresenta casos que in- so e o retorno do forcluído nas alucinações e delírios do psicótico (Quinet, do Outro, que gera, justamente, uma demanda dirigida ao sujeito. É dicam estruturas neuróticas ou mesmo perversas. Dito isso, concluo essa posiciona, representa e responde, às demandas que lhe são dirigidas pelo por ser castrado que o Outro dirige uma demanda, um desejo para o breve reflexão sobre estes dois modos distintos de diagnosticar existentes Outro. sujeito.Este desejo, necessário para a constituição subjetiva, é respondi- na atualidade e fecho o parênteses. Tendo eu sido convidada para falar nessa mesa do lugar de psica- do, segundo Freud, essencialmente de três modos distintos. Cada modo de responder, e mais especificamente de tentar negar a castração do nalista tentarei fazer, então, o recorte a partir desse modo específico de .63 Outro, configura uma das três estruturas clínicas fundamentais do en- outubro 2010 l correio APPOA compreensão do ser humano que é o psicanalítico, ou seja, de um ser correio APPOA l outubro 2010 tendimento psicanalítico. 62. debates. Produções textuais: Seminário XV de Lacan. inconsciente. Ou seja, tratado como uma depressão o conflito neurótico de normalização em detrimento das diferentes formas de exploração do mas que ela passou a ser cada vez mais vivida e tratada como uma de- Aqui esbarramos naquilo sobre o que justamente proponho-me a contemporâneo parece já não decorrer de nenhuma causalidade psíquica pressão e que essa substituição de paradigma não é inocente. Ocorre refletir neste momento: o modo como a cultura contemporânea lida oriunda do inconsciente e pode, mais facilmente, ser externalizado, atri- humano que se constitui justamente a partir da relação fundamental que com a falta essencial do ser humano. Retomo os dois significantes des- estabelece com a falta do Outro e, consequentemente, com sua própria tacados do título da mesa redonda: tristeza e contemporânea. A contem- buído a origens bioquímicas frente às quais o sujeito se objetaliza, apaga- que com ela consolida-se uma valorização dos processos psicológicos poraneidade lida muito mal com a tristeza intrínseca do ser humano. De se, esvazia-se e passa a ocupar um lugar de mera vítima acometida por falta, sua falta a ser, sua incompletude, sua intrínseca parcialidade. fato ela não tolera a falta, a dor, os conflitos, a tristeza, inerentes ao ser um desajuste orgânico que precisa ser corrigido. atualmente sob a forma da depressão”, diz Elizabeth Roudinesco (2000, difundidos quadros de depressão. “O sofrimento psíquico manisfesta-se subjetiva e as relações sociais. Não há mais espaço e nem tempo para a dução da economia material, mas também tem efeitos sobre a economia bilidade, circulação de mercadorias, afeta não apenas os modos de pro- dato de produtividade, eficácia, velocidade, instantaneidade, descarta- As crescentes exigências impingidas pelo contemporâneo, o man- humano. Tal intolerância à tristeza parece gerar um agravo da apatia dos p.13) em seu livro “Por que a psicanálise?”, no qual procura responder a escuta do sujeito. É preciso silenciá-lo o mais rápido possível. A atual sujeitos, incrementando, e mesmo banalizando, os hoje cada vez mais questão sobre por que, após cem anos de existência e de resultados clí- dificuldades e às provações cotidianas da vida (Juillet, 1997, apud evolução sociocultural parece contribuir para tornar mais numerosas as Roudinesco, 2000). Não é à toa que, no final da década de noventa, o nicos incontestáveis, a psicanálise era tão violentamente atacada por Roudinesco destaca que, longe de contestar a utilidade e a importân- consumo de antidepressivos na França já atingia 22% da população e aqueles que pretendiam substituí-la por tratamentos químicos, julga- cia dessas substâncias ou de desprezar o conforto que elas podem trazer seguia em constante aumento. A excessiva medicalização é um sintoma pessoas comuns, chamadas em geral de neuróticas normais, que tiveram não se pode esquecer que elas não são capazes de curar o homem de seus de uma modernidade que visa abolir no homem não apenas o desejo de dos mais eficazes por atingirem as chamadas causas cerebrais das sofrimentos psíquicos, sejam estes normais ou patológicos. Diz liberdade, mas também a própria idéia de enfrentamento que esse desejo reduzido o limiar de tolerância aos inelutáveis sofrimentos habituais, às Roudinesco: “A morte, as paixões, a sexualidade, a loucura, o inconscien- exige (Roudinesco, 2000). dilacerações da alma. te e a relação com o outro moldam a subjetividade de cada um, e nenhu- que o homem contemporâneo quer ser despojado não apenas da angústia Seguindo esse mesmo entendimento, Maria Rita Kehl (2002) destaca ma ciência digna desse nome jamais conseguirá pôr termo a isso, felizAssim como a histeria na Viena do fim do século XIX, a depressão de viver, mas também da responsabilidade de arcar com ela, enfim, quer mente” (p. 9). domina a subjetividade contemporânea, tornando-se o que Roudinesco eliminar toda inquietação que o habita ao invés de indagar seu sentido. .65 Esta tentativa de apagamento acaba, no entanto, revelando-se uma arma- outubro 2010 l correio APPOA nomeou de epidemia psíquica das sociedades democráticas. O que a au- correio APPOA l outubro 2010 tora nos destaca é que a histeria da sociedade freudiana não desapareceu, 64. Se ela me deixou, a dor DE MAIS NINGUÉM debates. dilha, pois lança o sujeito cada vez mais em um sentimento de vazio, um Produções textuais: Seminário XV de Lacan. do próprio sujeito. É preciso que exista algum incômodo, alguma luto de qualquer dor é também uma proposição que leva ao apagamento A prescrição contemporânea do silenciamento imediato e abso- ta, mas a toda minha vida. os em discurso, já estarei, também, atribuindo sentido, não apenas à fal- momento em que posso enunciá-los, apropriar-me deles transformando- A dor, o vazio, a falta, são meus, de mais ninguém, e, a partir do eu tenho a minha dor (...) Se eu não tenho o meu amor É o que me aquece sem me dar calor. É o meu lençol, é o cobertor, a dor é minha. Se nos meus braços ela não se aninha, a cozinha, o corredor. A sala, o quarto, a casa está vazia, eu tenho a minha dor. Se eu não tenho o meu amor, é o que me aquece sem me dar calor. É meu troféu, é o que restou, a dor é de quem tem. Se ela me deixou a dor é minha, ou já tem um outro bem. Se ela preferiu ficar sozinha, Eu tenho a minha dor. Aos outros eu devolvo a dó, é minha só, não é de mais ninguém. sentimento de que sua vida é insignificante. Se a perda do sentido da existência está na origem da depressão, que é o sintoma emergente do mal-estar contemporâneo, isso é sinal de que o sentido não é um valor inerente à própria vida: é efeito de uma construção discursiva que confere significado ao aleatório, ao sem sentido, à precariedade da existência (KEHL, 2002, p. 9). Para tentar lutar contra o esvaziamento de sentido que acomete cada vez maiores montantes populacionais é fundamental que a produção de sentido se amplie, que o discurso, a narratividade, a produção simbólica, enriqueça cada existência, possibilitando a criação de vidas que venham a ser recobertas das significações mais distintas e singulares possíveis. É novamente Maria Rita Kehl (2002) quem nos recorda que o homem está sempre tentando ampliar o domínio simbólico sobre o real do corpo, da morte, do sexo, do futuro incerto, mas que essa produção de sentido não é individual e sim depende de seu enlaçamento na cultura, de sua inscrição coletiva. Dizer que uma vida faz sentido, do ponto de vista do vivente, significa que existe a possibilidade desse sentido ser reconhecido pelo Outro, ou pelos outros que o rodeiam. Jacques Lacan (1999), em seu seminário sobre as formações do inconsciente, nos lembra que há uma estreita relação entre a morte e o aparecimento do significante. É preciso haver um apagamento, um vazio, uma falta instituída para que o significante precise surgir, e, com ele, o sujeito possa advir. Entende-se, assim, que justamente esse vazio, essa falta intrínseca do ser humano, para além de ser uma mera geradora de dor é também a motriz, a potencializadora da vida, da produção criativa, Muitas são as produções artísticas, literárias, musicais, etc. que evi- da constituição subjetiva propriamente dita. desacomodação, algum desassossego, como nos lembra Fernando Pessoa, .67 denciam esta questão. Marisa Monte e Arnaldo Antunes parecem conse- outubro 2010 l correio APPOA para que qualquer produção possa surgir. “Tem mais presença em mim o correio APPOA l outubro 2010 guir nomear belamente tal contradição. 66. debates. que me falta”, ensina-nos, sabiamente, Manoel de Barros (2010). Ou ainda: “[...] se o nada desaparecer a poesia acaba” (Barros, 2010). E como não findar lembrando a preciosa estrofe inicial do poema intitulado “Autopsicografia” de Fernando Pessoa? AUTOPSICOGRAFIA eventos do ano evento agenda. local Jornada Clínica - Dizer e fazer em análise 2010 data Plaza São Rafael O poeta é um fingidor. Finge tão completamente 6 e 7/11 01 e 15 01, 08,15, 22 e 29 dia 20h30min 15h 14h hora Reunião da Comissão de Eventos Reunião da Comissão do Correio Reunião da Comissão de Aperiódicos Reunião da Comissão da Revista outubro. 2010 agenda Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. [...] Sim, parece que sem alguma parcela de dor, sem algumas irrupções de tristeza não haveria vida e, muito menos, possibilidade de felicidade. Referências bibliográficas KEHL, M. R. Sobre ética e psicanálise. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. 04 e 18 19h30min atividade LACAN, J. O Seminário, livro 5: As formações do inconsciente. (1957-1958). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999. 07,14, 21 e 28 ANTUNES, A. e MONTE, M. De Mais Ninguém. CD Verde Anil Amarelo Cor de Rosa e Carvão. 1993. _______. Televisão. In: Outros Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. Reunião da Comissão da Biblioteca Reunião da Mesa Diretiva BARROS, M. Poesia completa. São Paulo: Leya, 2010. PESSOA, F. Poesias. Porto Alegre: L&PM, 1999. 19h30min outubro 2010 l correio APPOA .69 Anistia próximo número Reunião da Mesa Diretiva aberta aos Membros 21h 21h 07 21 14 QUINET, A. Como se diagnostica hoje? In: QUINET, A. (Org.) Psicanálise e psiquiatria: controvérsias e convergências. Rio de Janeiro: Rios Ambiciosos, 2001. correio APPOA l outubro 2010 ROUDINESCO, E. Por que a psicanálise? Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2000. 68. normas editoriais do Correio da APPOA O Correio da APPOA é uma publicação mensal, o que pressupõe um trabalho de seleção temática – orientado tanto pelos eventos promovidos pela Associação, como pelas questões que constantemente se apresentam na clínica –, bem como de obtenção dos textos a serem publicados, além da tarefa de programação editorial. Tem sido nosso objetivo apresentar a cada mês um Correio mais elaborado, quer seja pela apresentação de textos que proporcionem uma leitura interessante e possibilitem uma interlocução; quer pela preocupação com os aspectos editoriais, como a remessa no início do mês e a composição visual. Frente à necessidade de uma programação editorial, solicitamos que sejam respeitadas as seguintes normas: 1) os textos para publicação na Seção Temática, Seção Debates, Seção Ensaio e Resenha deverão ser enviados por e-mail para a secretaria da APPOA ([email protected]); 2) a formatação dos textos deverá obedecer às seguintes medidas: - Fonte tamanho 12 - O texto deve conter, em média, 12000 caracteres com espaço - Notas de rodapé em fonte tamanho 10 3) as notas deverão ser incluídas sempre como notas de rodapé; 4) as referências bibliográficas deverão informar o(s) autor(es), título da obra, autor(es) e título do capítulo (se for o caso), cidade, editora, ano, volume (se for o caso); 5) as aspas serão utilizadas para identificar citações diretas; 6) citações diretas com mais de 3 linhas devem vir separadas do corpo do texto, com recuo de 4 cm em relação à margem, utilizando fonte tamanho 10; 7) o itálico deverá ser utilizado para expressões que se queira grifar, para palavras estrangeiras que não sejam de uso corrente ou títulos de livros; 8) não utilizar negrito (bold) ou sublinhado (underline); 9) a data máxima de entrega de matéria (textos ou notícias) é o dia 05, para publicação no mês seguinte; 10) o autor, não associado a appoa, deverá informar em uma linha como deve ser apresentado.a Comissão do Correio se reserva o direito de sugerir alterações ao(s) autor(es) e de efetuar as correções gramaticais que forem necessárias para a clareza do texto, bem como se responsabilizará pela revisão das provas gráficas; 11) a inclusão de matérias está sujeita à apreciação da Comissão do Correio e à disponibilidade de espaço para publicação.