A Percepção dos Docentes de Universidades Públicas Sobre a Qualidade de Vida no Trabalho Autoria: Roberto Brazileiro Paixão, Márcio Arcanjo de Souza Resumo Este estudo objetiva analisar a percepção dos professores de graduação em Administração e Ciências Contábeis de universidades públicas brasileiras sobre a qualidade de vida no trabalho (QVT). Para o referencial teórico, escolheu-se a utilização das abordagens de Walton (1973), Hackman e Oldham (1975) e Limongi-França (2010). Foi realizado um estudo descritivo com perspectiva analítica, de natureza qualiquantitativa. A amostra foi composta por 38 docentes. Através dos resultados verificou-se quais condições favoráveis e quais são as principais dificuldades enfrentadas pelos docentes para manutenção de sua QVT. Palavras-chave: qualidade de vida no trabalho, docentes, equilíbrio. 1 1. Introdução A sociedade contemporânea tem presenciado diversas mudanças de ordem social e econômica afetando significativamente as estruturas do mercado de trabalho. Do ponto de vista do indivíduo, pode-se perceber que a produtividade destes encontra-se diretamente ligada o seu bem-estar dentro da organização. Neste contexto o tema qualidade de vida passa a ser mais debatido e a busca pela satisfação no ambiente de trabalho se torna um desafio tanto para os trabalhadores quanto para as organizações. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define qualidade de vida como “uma percepção individual da sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (SKEVINGTON;LOTFY; O’CONNELL, 2004, p. 299). Desta forma pode-se inferir que o entendimento de qualidade de vida se origina de características, expectativas e interesses individuais (SUCESSO, 1997). O trabalho pode ser visto como parte integrante e essencial da vida contribuindo para a construção da identidade e personalidade, pois através deste que o trabalhador desenvolve seu potencial e se sente apto a participar, cooperar ou produzir resultados pelo próprio esforço. (KILIMNIK; CASTILHO, 2002). Desta forma, a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) está relacionada com a busca pelo bem-estar, saúde física e mental do trabalhador no desempenho das suas funções. Ela também se refere à experiência emocional da pessoa com seu trabalho frente a tantas mudanças tecnológicas e sociais que se estabelecem de forma tão intensa e acelerada (SUCESSO, 1997). Os primeiros estudos de QVT aparecem no começo do século XX através da regulamentação do trabalho e tempos mais tarde os estudos nesta área enfocaram na humanização do trabalho, na saúde e responsabilidade social (VASCONCELOS, 2001; KANIKADAN; LIMONGI-FRANÇA, 2007). Os estudos existentes sobre Qualidade de Vida no Trabalho também abarcam o docente, que atualmente vêm sofrendo desvalorização e pressão por qualificação, atualização e produção científica. Pesquisas recentes (KANIKADAN; LIMONGI-FRANÇA, 2007; LIPP; ROCHA, 1996 apud PEREIRA, 2006; LIMA; LIMA-FILHO, 2009) apontam que a profissão docente é uma das mais afetadas por estresse e outras síndromes oriundas da qualidade de vida no trabalho. A precarização do docente nas instituições de ensino superior mostra-se também relacionada com a crescente mercantilização destas instituições e a busca pelo produtivismo acadêmico, em que o docente passa a ser avaliado muito mais pelo quanto que se produz do que pela qualidade do que se produz (BOSI, 2007). Partindo dessa problematização, esse estudo analisa a percepção dos professores de graduação em Administração e Ciências Contábeis de universidades públicas, sobre a qualidade de vida no trabalho. A relevância do estudo reside na percepção da deterioração das condições de trabalho do professor em universidades públicas, através da falta de infraestrutura adequada, excesso de trabalho, cobrança por produtividade e atualização constantes. Esta deterioração foi amplamente divulgada na mídia pelos movimentos sindicais e pode estar relacionada com a greve dos professores universitários da rede pública que paralisaram as suas atividades por quase quatro meses no ano de 2012. Neste contexto julga-se adequado analisar a percepção destes atores sociais sobre qualidade de vida no trabalho e a reflexão destes sobre a própria qualidade de vida no exercício da docência. Os indicadores investigados podem auxiliar na elaboração de medidas que possam melhorar a qualidade de vida do trabalho dos professores nas universidades públicas. 2 Visando responder o problema proposto e o alcance dos objetivos estabelecidos, o presente artigo será estruturado em cinco partes. Além dessa introdução, tem-se uma revisão da literatura sobre o tema, a descrição dos procedimentos metodológicos da pesquisa, a análise dos resultados e as considerações finais. 2. Qualidade de Vida no Trabalho Docente A mercantilização nas instituições de ensino superior brasileiras e a consequente precarização do trabalho do docente teve início nas políticas de incentivo para criação de instituições de ensino privadas e a diminuição orçamentária de verbas para as instituições públicas, com também a redução de editais para concursos. Nesse período houve a flexibilização dos contratos de trabalho que podiam ser temporários ou efetivos, ambos baseados em hora-aula, em que o pagamento é relativo as horas de aulas ministradas e o caráter temporário impossibilita o plano de carreira. Houve também o aumento expressivo do número de estudantes por professor e a utilização de alunos de pós-graduação como professores substitutos (BOSI, 2007). Portanto, é certo que tal crescimento da força de trabalho docente foi (e continua sendo) marcado pela flexibilização dos contratos trabalhistas. São essas possibilidades de contratação precária, abertas por práticas constituídas à margem da lei ou mesmo por modificações na legislação trabalhista, que têm feito com que o número de docentes aumente. Nesse sentido, é certo também que, tornado numericamente predominante, o trabalho considerado precário e informal tende a converter-se em medida para todo tipo de trabalho restante (BOSI, 2007, p.1507). Existe uma pressão para aumentar o “produtivismo acadêmico” através do estímulo ao aumento no número de aulas, orientações, publicações, projetos, patentes, etc. Os cursos e os professores passam a ser avaliados pelo tanto que produzem e pela frequência destas publicações, favorecendo esta cultura da produtividade. E como consequência dessa pressão a produção acadêmica passa a ser mensurada pela quantidade produzida e por valores monetários que o docente consegue agregar ao seu salário e à própria instituição (BOSI, 2007). Outra faceta do processo de mercantilização das instituições de ensino brasileiras seria a disseminação de cursos de pós-graduação latu sensu pagos e os serviços de consultoria prestados pelos professores no âmbito universitário. Ambos exercícios seriam uma forma de angariar recursos a essas instituições e também como complementação do parco salário destes professores. Como consequência deste processo estes professores e universidades ficam cada vez mais dependentes de angariar estes recursos extra-orçamentários, instaurando um ambiente cada vez mais competitivo (BOSI, 2007) e prejudicando a busca da qualidade de vida no trabalho nestas instituições. Pereira (2006) destaca que alguns fatores contribuem para caracterizar a profissão docente como uma das mais estressantes e prejudicadas em termos da qualidade de vida no trabalho: normas e procedimentos inadequados, excesso de funções burocráticas atribuídas aos docentes, interrupções durante as aulas, condições físicas das instalações inadequadas, precariedade de recursos didáticos e, principalmente, salários defasados. 2.1. Abordagens Teóricas sobre QVT O tema Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) tem sido abordado sob variadas perspectivas, no entanto percebe-se como fator comum, entre a maioria dos modelos 3 estudados, a contestação dos métodos tayloristas e a busca pela humanização do trabalho aliada com aumento da produtividade na organização (OLIVEIRA, MEDEIROS, 2008). Dourado e Carvalho (1999), citados por Oliveira e Medeiros (2008), resumem que diversos autores entendem que para analisar a QVT alguns pontos específicos devem ser considerados, tais como: as recompensas diretas ou indiretas, as condições do ambiente de trabalho, entendimento do trabalho e das tarefas requeridas, autonomia e participação do indivíduo na realização do trabalho, imagem da organização perante a sociedade e funcionários e, por fim, o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, o qual também tem grande influência no desempenho do trabalhador. Contudo, apesar da verificação de certo consenso sobre o enfoque da QVT, não se pode afirmar qual seria a teoria mais adequada ou a abordagem mais apropriada. A escolha do modelo conceitual deve levar em consideração o contexto e a cultura da organização que o adota (KANIKADAN; LIMONGI-FRANÇA, 2007). O modelo de Walton (1973), citado por Pedroso e Pilatti (2010), é constituído por oito fatores de forma a analisar não só o trabalho em si, mas também os aspectos presentes no ambiente pessoal. Este modelo busca associar o maior número de dimensões relacionadas com o trabalho e dimensões que afetam o trabalhador de forma indireta (PEDROSO; PILATTI; 2010). De acordo com o modelo de Walton, os seguintes fatores influenciam na QVT: compensação justa e adequada; condição de segurança e saúde no trabalho; uso e desenvolvimento de capacidades; integração social na organização; oportunidade de crescimento e segurança; constitucionalismo; trabalho e espaço total de vida; e relevância social (PEDROSO; PILATTI; 2010). Para Hackman e Oldham (1975), citados por Pedroso e Pilatti (2010), a QVT está fundamentada na ideia de que o cunho da tarefa promove três fatores considerados de grande influência na motivação no ambiente de trabalho, que são os denominados Estados Psicológicos Críticos. Estes seriam: o conhecimento e resultado do seu trabalho; a responsabilidade percebida pelos resultados do seu trabalho; e a significância percebida do seu trabalho. Hackman e Oldham (1975), citados por Kilimnik e Castilho (2002), identificaram dimensões do cargo como determinantes desses estados psicológicos, pois oferecem recompensas intrínsecas e, desta forma, produzem satisfação no cargo e automotiva os trabalhadores a exercerem as suas funções. Segundo Limongi França (1996, p. 8), o conceito de Gestão de Qualidade de Vida no Trabalho (GQVT) consiste no “conjunto das ações de uma empresa que envolve a implantação de melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas e estruturais do ambiente de trabalho”. A autora declara relevante a compreensão de uma forma nova de administrar o bem-estar, considerando as organizações, o mercado, os tipos de trabalho e o estilo de vida individual. Desta forma, a GQVT deve ser construída a partir dos seguintes fatores críticos: o conceito de QVT; produtividade; legitimidade; perfil do gestor; práticas e valores; e competência na GQVT (LIMONGI-FRANÇA, 2010). Pode-se perceber que, apesar das abordagens acima serem semelhantes em variados aspectos, já que todas procuram formas de analisar o bem-estar do indivíduo, elas possuem enfoques variados. Enquanto no modelo de Walton a QVT é analisada de forma mais abrangente em oito dimensões, o modelo de Hackman e Oldham percebem a QVT tendo como centro o cargo que o indivíduo desempenha. Já Limongi-França (1996) procura abordar as questões de QVT na perspectiva de uma gestão avançada, ou seja, uma competência a ser desenvolvida no profissional. Portanto, conforme mencionado anteriormente, a abordagem adotada deve sempre depender do tipo de organização e das políticas já presentes, de forma a refletir a cultura da organização. 4 3. Procedimentos metodológicos Considerando a finalidade desse estudo, que busca analisar a percepção dos professores de graduação, em Administração e Ciências Contábeis de universidades públicas, sobre a Qualidade de Vida no Trabalho, ele se classifica como estudo descritivo com perspectiva analítica, pois busca analisar as opiniões, atitudes e percepção dos professores em relação ao estudo em questão (SILVA; MENEZES, 2005). A pesquisa de campo tem como objetivo adquirir informações ou dados acerca de um problema, em que se procura uma resposta ou hipóteses para serem comprovadas, ou até mesmo descobrir novos aspectos do problema e interações entre variáveis (SILVA; MENEZES, 2005). A coleta ocorreu através da aplicação de questionários online (plataforma google docs), que continham perguntas de caráter social e demográfico (gênero, idade, estado civil, estado onde reside, escolaridade e tempo de serviço como professor de universidade pública), além de três questões, as quais os professores deveriam responder de forma discursiva, considerando a própria visão sobre o assunto. Os respondentes foram questionados sobre o que eles entendiam por qualidade de vida no trabalho docente, de que forma eles percebiam a própria qualidade de vida no trabalho e, por fim, de que forma eles equilibram a vida profissional e pessoal. O critério de seleção da amostra foi por conveniência, basicamente através da rede de relacionamento dos autores, com solicitação de repasse para outros professores, sendo que as únicas restrições consistiam em ser professor de universidade pública e lecionar na graduação em Administração ou Ciências Contábeis. As respostas dos questionários foram computadas em uma planilha eletrônica, através da própria plataforma utilizada. O prazo considerado para as respostas foi de 14 dias, no mês de outubro de 2012, não sendo consideradas as respostas recebidas após o prazo estabelecido. Assim, foram considerados depoimentos provenientes de 38 questionários respondidos. As respostas obtidas foram analisadas de forma qualiquantitativa por meio da metodologia do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), que consiste no processamento e análise sistemáticos de depoimentos, os quais revelam os discursos dos sujeitos (LEFEVRE; LEFEVRE, 2010). O objetivo do DSC é entender o campo social pesquisado através do universo de diferenças e semelhanças que consistem nas visões dos atores sociais. Portanto, organizam-se fragmentos dos discursos individuais, captados através das respostas dos questionários, que tenham sentidos semelhantes para construção de discursos-síntese escritos na primeira pessoa do singular que representem o pensamento da coletividade (LEFEVRE; LEFEVRE, 2010). A criação dos DSC foi realizada através seguintes etapas: a) identificação das ExpressõesChave, que representam a ideia principal do respondente e podem estar presentes emmais de um trecho de um discurso; b) identificação das Ideias Centrais (IC) de cada uma das Expressões-Chave, as quais consistem na síntese das Expressões-Chave, identificadas no passo anterior, e que são identificadas como (IC-A, IC-B, IC-C etc); e criação do discurso síntese ou Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) ao juntar as expressões-chave referentes a IC semelhantes ou complementares. Cada questão passou pelas três etapas separadamente e a discursividade foi mantida. Entretanto foi necessário ajustar alguns trechos do discurso e inserir elementos textuais (conjunções, artigos, pronomes, etc) de forma que o DSC possa ser apresentado da forma mais clara e coerente possível, com o cuidado de não modificar o sentido original. Para criar os DSCs foi realizado tratamento quantitativo do material apenas para a análise da frequência em que os discursos individuais eram classificados de acordo com as ideias centrais (IC). É importante lembrar que as respostas que não podiam ser classificadas 5 como discurso, possuíam algum tipo de incoerência ou que não respondiam a questão, foram descartadas. A partir disso, foram consideradas 37 respostas para a primeira questão, 19 respostas para a segunda questão e 33 respostas para a terceira. No entanto, o somatório da frequência das ideias centrais foi superior à quantidade de respostas consideradas válidas, pois uma única resposta pode conter mais de uma IC. 4. Análise dos Resultados A amostra foi constituída por 38 respondentes. Destes, a maioria foi do gênero masculino (aproximadamente 55%). Quanto ao estado civil, 74% de todos os respondentes revelaram-se casados (ou união estável), 13% solteiros, 11% divorciados e apenas 3% se classificaram em outros. Um montante de 74% do total declararam terem filho(s). Além disso a maior parte dos respondentes são residentes de São Paulo (34%), Bahia (26%) e Sergipe (21%). A maioria dos professores respondentes está vinculada a universidades federais (66%), enquanto que os demais, 34% dos respondentes, estão vinculados a universidades estaduais. Quanto ao curso de graduação a que os respondentes compõem o quadro docente, 68% são do curso de Administração, sendo os 32% restantes do curso de Ciências Contábeis. Ademais, também foi constatado que 79% possuem título de Doutor e 21% título de Mestre. A maior parte dos respondentes apresenta tempo de experiência superior a 10 anos (47%), sendo que ampliar o intervalo da classe para acima de 6 anos possibilita abarcar 63% da amostra. A tabela 1 apresenta síntese dos principais sócio-demográficos supracitados e seus respectivos resultados: Tabela 1 – Dados sociodemográficos dos participantes da pesquisa Categorias Fi SP 13 BA 10 SE 8 DF 4 Local de Residência AM 1 CE 1 RJ 1 Total 38 Categorias Fi Entre 31 e 40 anos 10 Entre 41 e 50 anos 10 Faixa etária Entre 51 e 60 anos 9 Acima de 61 anos 9 Total 38 Categorias Fi 40h dedicação exclusiva 33 20h 4 Regime de Trabalho (atual) 40h 1 Total 38 Categorias Fi Até 2 anos 3 Entre 3 e 5 anos 11 Tempo de ensino em Universidades Públicas Entre 6 e 10 anos 6 Mais de 10 anos 18 Total 38 Fi (%) 34% 26% 21% 11% 3% 3% 3% 100% Fi (%) 26% 26% 24% 24% 100% Fi (%) 87% 11% 3% 100% Fi (%) 8% 29% 16% 47% 100% 6 Na primeira questão (O que você entende por qualidade de vida no trabalho docente?) foram identificadas doze ideias centrais. No quadro 1 que segue abaixo pode-se verificar as frequências de aparição de cada ideia central. IC A B C D E F G H I J K L Ideias Centrais Freq. Freq. Rel. Condições adequadas para o ensino, pesquisa e extensão 14 Relacionamento entre docentes 14 Infraestrutura adequada 12 Jornada de Trabalho 10 Satisfação, identificação e realização com trabalho 9 Remuneração e Benefícios 7 Apoio Administrativo 5 Bem-estar 4 Resultado social 4 Relacionamento com alunos 2 Autonomia para desenvolver as atividades 2 Adequação ao cargo 2 Total 85 Quadro 1: Frequência por ideia central - Questão 1. 16% 16% 14% 12% 11% 8% 6% 5% 5% 2% 2% 2% 100% Freq. Rel. Acum. 16% 33% 47% 59% 69% 78% 84% 88% 93% 95% 98% 100% - Foram escolhidas as IC A, B, C, D, E e F para análise mais detalhada e para a formulação dos discursos do sujeito coletivo (DSC), pois estas juntas representam 78% das ideias centrais contidas nos discursos dos respondentes. No quadro 2 é apresentado o discurso do sujeito coletivo referente à ideia central A, “Condições adequadas para o ensino, pesquisa e extensão”. Entendo que são condições de pesquisa, ambiente intelectual e institucional propício ao desenvolvimento profissional do docente. Oferta de condições necessárias para que o docente possa desenvolver suas capacidades e desempenhar suas atividades de forma satisfatória. Ter atendido as perspectivas básicas para desenvolver excelente trabalho e um ambiente propício para realização de pesquisas, preparar aulas, atender alunos. Obtenção de materiais e recursos para a aplicação de ensino, pesquisa e extensão, ou seja, estrutura para o desenvolvimento das atividades como: livros, revistas, equipamentos disponíveis para ensino, pesquisa e extensão. Condições de trabalho, autonomia para desenvolver suas atividades, acesso à produção científica (bases de dados, biblioteca), como também ambiente agradável para ministrar aulas, salas com poucos alunos, tempo para pesquisa e boas condições de infra-estrutura laboratorial para a pesquisa. Portanto, consideração de que o trabalho humano, especialmente o acadêmico e pedagógico, não é um processo fabril, mecânico. Quadro 2: IC-A – Condições adequadas para o ensino, pesquisa e extensão. De acordo com o DSC exposto acima, elaborado a partir da ideia central mais recorrente, percebe-se que os respondentes relacionam qualidade de vida no trabalho do docente com condições adequadas e favoráveis ao ensino, extensão e elaboração de pesquisa. Desta forma, o discurso no quadro 2 pode ser relacionado aos fatores “oportunidade de crescimento e segurança” e “utilização e desenvolvimento de capacidades” do modelo de QVT de Walton (PEDROSO; PILATTI; 2010), pois o docente preza que sua qualidade de vida está intrinsecamente relacionada com sua capacidade de produzir ou transmitir conhecimento e para tal as instituições devem proporcionar condições adequadas para que estas atividades sejam realizadas de forma satisfatória. Então a QVT está sendo avaliada em relação as oportunidades do docente utilizar seus conhecimentos e habilidades no cotidiano, contando com liberdade e autonomia na realização destas atividades, e as possibilidades de crescimento profissional, que a instituição promove a estes professores (PEREIRA, 2006). A ênfase que os professores dão à produção de conhecimento pode estar relacionada à imposição do “produtivismo acadêmico” nas instituições de ensino superior, em que os 7 professores são avaliados, principalmente, pelo tanto que produzem e pela frequência destas publicações (BOSI, 2007). Ademais o trecho “consideração de que o trabalho humano, especialmente o acadêmico e pedagógico, não é um processo fabril, mecânico”, presente no DSC do quadro 2, pode ser considerado como uma preocupação destes docentes à cultura da produtividade descrita por Bosi (2007). A partir da análise do DSC apresentado no quadro 3 pode-se perceber a importância atribuída ao relacionamento interpessoal, presente na universidade, entre os colegas e chefia. A socialização, entrosamento e troca de conhecimento, também como aspectos importantes para se perceber QVT. Clima organizacional - entre colegas e chefias. Convivência harmoniosa com os colegas, clima amistoso entre os docentes. Relacionamento com colegas, bom relacionamento interpessoal, um relacionamento cordial e amigável com chefia e colegas com respeito das ideias e liberdade de expressão. Relações interpessoais na Organização, tendo entrosamento com outros docentes, socialização, equipe de colegas receptiva, chefes, acolhedores, incentivadores e que o tratem com respeito e acolham com justiça seus limites de saúde. Bom ambiente com os colegas, ou seja, ambiente harmônico entre colegas e a direção da instituição. Ambiente que em que todo o grupo envolvido tenha uma postura ética e transparente que promova sempre o crescimento técnico e prático do docente através de debates e troca de informações de validade confirmada. Quadro 3: IC-B – Relacionamento entre docentes. Através dos elementos da abordagem teórica formulada por Walton (1973 apud PEDROSO; PILATTI; 2010), principalmente atrelados ao fator “integração social na organização”, verifica-se a importância relacionada à integração e ao relacionamento interpessoal entre os docentes na definição de qualidade de vida no trabalho, conforme a percepção dos mesmos. Respeito à individualidade, à diversidade e ao senso comunitário entre os pares, e instituição, de acordo com estes docentes seriam aspectos que devem ser considerados ao se pensar em QVT (PEREIRA, 2006). Pode-se também analisar o discurso do quadro 3 sob a perspectiva do modelo proposto por Hackman e Oldham (PEDROSO; PILATTI; 2010) ao examinar a dimensão do conteúdo da tarefa “feedback extrínseco”, uma vez que os docentes exprimem a indispensabilidade de uma avaliação de desempenho que lhes proporcionem crescimento profissional (KILIMNIK; CASTILHO, 2002). O conceito de QVT também está fortemente atrelado às condições físicas satisfatórias para o docente exercer suas atividades de lecionar, pesquisa ou extensão (quadro 4). Este aspecto é abarcado no modelo de Walton através do fator “condições de saúde e segurança no trabalho”, o qual demonstra a importância de um ambiente físico apropriado para que o profissional desempenhe seu trabalho de forma adequada (PEREIRA, 2006). Infraestrutura de trabalho adequada, boas condições ambientais, ambiente físico adequado e condições salubres para desenvolver minhas atividades. Satisfação com as condições materiais, infraestrutura, compatível com minhas necessidades de trabalho e condições satisfatórias de trabalho, relacionadas ao ambiente físico, como segurança, iluminação e ambiente de trabalho adequado (salas de aulas, sala de pesquisa e sala de ambientação). Desde, condições físicas, espaços adequados para os professores com ar condicionado, privacidade e Computador / Internet à um ambiente arejado para ministrar aulas. Obter recursos materiais para serem utilizados em sala de aula e estrutura física necessária para manter um bom nível da aula, sala individual de trabalho, bom ambiente físico de trabalho (temperatura - ar condicionado, sala silenciosa) internet, telefone, computador, impressora, livros. Quadro 4: IC-C – Infraestrutura adequada. A IC-D remete à importância de uma carga horária adequada às atividades exercidas pelos docentes, levando em consideração o volume de trabalho e o tempo necessário a ser despendido em pesquisa, extensão e ensino. Ademais, relaciona-se com o empenho dos docentes em equilibrar jornada de trabalho com momentos de lazer. 8 Tempo para realizar as tarefas inerentes ao cargo de professor como ensino, pesquisa e extensão. Equilíbrio entre diversas atividades a desempenhar e tempo disponível para tanto de forma a equilibrar pesquisa, extensão e ensino dentro das 40 h semanais sendo cobrado igualmente pelos três eixos. Quantidade de atividades equivalente à carga horária com distribuição adequada do tempo entre as atividades de docência e pesquisa, considerando uma carga horária em sala que permita ministrar disciplinas de forma excelente, fazer pesquisa e extensão de qualidade. Flexibilidade de horário de trabalho. Jornada de trabalho justa que leve em consideração seus limites de saúde, bem como a possibilidade de conciliar trabalho com lazer e tempo para descansar e socializar. Quadro 5: IC-D – Jornada de trabalho. Pode-se analisar este discurso, no contexto do modelo de Walton, através dos fatores da tarefa “condições de saúde e segurança no trabalho” e “trabalho e espaço total de vida”, pois a primeira preconiza uma jornada de trabalho adequada, de acordo com as legislações trabalhistas vigentes, como fator balizador da QVT e a segunda expõe a importância de equilibrar os horários de trabalho e as exigências pessoais e familiares (PEREIRA, 2006). Conforme exposto no quadro 6 (IC-E), a QVT deve ser percebida ainda através da satisfação no que se faz, ou seja, na importância da tarefa em si. No modelo de Hackman e Oldham (KILIMNIK; CASTILHO, 2002) o significado da tarefa representa uma das dimensões da mesma, que neste caso refere-se a importância auferida ao trabalho pelo docente, o qual busca reconhecimento e gratificação por meio do trabalho). Trabalhar no que gosto, ou seja, ter satisfação com meu trabalho, sentir-me realizado. Realizar trabalhos que gosto e desempenhar com prazer as atividades que desempenho (ministrar aulas, estudar, participar de palestras e outros eventos). Satisfação (prazer) com o que faço, motivação e concentrar-me em fazer o que mais gosto. Quadro 6: IC-E – Satisfação, identificação e realização com trabalho. Pelo discurso coletivo dos professores apresentado no quadro 7, verifica-se que a remuneração e os benefícios trabalhistas consistem em aspectos importantes na percepção deles sobre QVT. Esta deve ser competitiva e compatível com as responsabilidades que estes professores têm. Analisando na perspectiva do modelo de Walton, esta consiste na categoria “compensação justa e adequada” que mede a QVT em relação a remuneração obtida pelo profissional em função do trabalho realizado e da correspondência com um nível adequado de vida para ele e para a sua família. Levando em consideração também a remuneração dos demais em comparação com a própria, pois deve existir equilíbrio e esta deve estar adequada as atribuições ou responsabilidades dos profissionais (PEREIRA, 2006). A remuneração deve ser competitiva e que possibilite uma vida adequada, salário digno, plano de saúde, direitos a qualificação. Ter boa remuneração, melhorias e adequação ao nível de salário desejado pela classe. Desta forma, salário compatível com as responsabilidades do cargo. Quadro 7: IC-F – Remuneração e benefícios. Para a segunda questão foram identificadas treze IC distintas. Esta pergunta tem como objetivo entender de que forma os professores de universidades públicas entendem a própria QVT. Conforme mencionado anteriormente só foram consideradas 19 respostas para esta questão, pois metade do número de respostas obtidas foram consideradas inválidas, já que ou estas não respondiam o que havia sido perguntado, ou não poderiam ser caracterizadas como um discurso. As frequências de aparição das ideias centrais nas expressões chaves podem ser vistas no quadro 8. IC A Ideias Centrais Condições inadequadas para a pesquisa, ensino ou extensão Freq. Freq. Rel. 4 12% Freq. Rel. Acum. 12% 9 B C D E F G H I J K L M Infraestrutura inadequada 4 Dificuldade de Relacionamento entre docentes 4 Jornada de trabalho inadequada 4 Relacionamento entre docentes 3 Satisfação/ Identificação/ Realização Pessoal 3 Remuneração insuficiente 3 Relacionamento com alunos 2 Jornada de Trabalho 2 Carreira inadequada 2 Infraestrutura adequada 1 Remuneração 1 Autonomia 1 Total 34 Quadro 8: Frequência por Ideia Central - Questão 2. 12% 12% 12% 9% 9% 9% 6% 6% 6% 3% 3% 3% 100% 24% 35% 47% 56% 65% 74% 79% 85% 91% 94% 97% 100% - Como pode ser observado no Quadro 11 as ICs estão com frequência muito pulverizada. Desta forma, elas não podem ser consideradas para elaboração do discurso do sujeito coletivo, já que não podem ser traduzidas como opinião da coletividade pesquisada. A limitação enfrentada na análise destes resultados foi decorrente da possibilidade de interpretação da pergunta realizada de formas distintas. Assim, muitas das respostas obtidas não foram elucidativas quanto à questão que objetivava-se ilustrar, ou seja, não refletiam o que havia sido perguntado. Portanto, como mencionado anteriormente, metade das respostas obtidas não foram consideradas. No entanto, a partir da análise de frequência por ideia central no quadro 8 é possível inferir que as instituições têm dificuldade em oferecer condições suficientemente adequadas para ensino, pesquisa e extensão, o relacionamento interpessoal entre docentes se apresenta como problemático, o docente possui excessivo volume de trabalho e eles têm problemas em equilibrar vida pessoal e profissional devido a carga horária não ser considerada suficiente para a execução de todas as atividades necessárias para o profissional docente. Na terceira questão foram identificadas 9 IC distintas. Esta questão objetiva analisar de que forma estes docentes equilibravam a vida pessoal e profissional considerando o volume de trabalho, característico desta profissão. As frequências das IC podem ser observadas no quadro 9, organizado de forma decrescente de frequência absoluta. IC A B C D E F G H I Ideias Centrais Freq. Freq. Rel. Planejamento 17 44% Momentos de lazer 5 13% Dificuldade de equilíbrio 4 10% Satisfação no trabalho 4 10% Equilíbrio 3 8% Relacionamento entre Docentes 2 5% Atividade Física 2 5% Relacionamento com alunos 1 3% Atividades político-partidárias 1 3% Total 39 100% Quadro 9: Frequência por Ideia Central - Questão 3. Freq. Rel. Acum. 44% 56% 67% 77% 85% 90% 95% 97% 100% - Em conjunto as ideias centrais selecionadas representam 77% da frequência total, sendo escolhidas as IC A, B, C e D em função da representatividade. Através do DSC presente no quadro 10 observa-se que planejamento é a estratégia mais utilizada pelos professores para contornar a dificuldade de equilibrar o trabalho com a vida pessoal. Eles destacam a não uniformidade da rotina de trabalho e a dificuldade em realizar todas as atividades nas 40 horas semanais que consistem a sua jornada de trabalho, 10 sendo desta forma necessário abdicar de alguns finais de semana ou estender o trabalho utilizando-se de horas extras. Eles também mencionam a importância de priorizar e racionalizar suas atividades. Estabeleço prioridades em relação às atividades e deixo sempre reservado o tempo para ficar com a família, já que a atividade docente é um processo contínuo de atividades, mas o ritmo não é uniforme. Então há momentos em que a dedicação profissional requer maior demanda enquanto em outros há possibilidade de atender necessidades de caráter pessoal e familiar. Desta forma estabeleço horários para o desenvolvimento de atividades docentes e estabeleço que finais de semana, na medida do possível, destino ao convívio familiar e lazer. Organizo meus horários, procuro adequação da carga horária, mas uso as madrugadas para dar conta das atividades de correção de provas, elaboração de projetos, preparação de aulas. Racionalizo e priorizo as atividades, liberando mais tempo para as coisas realmente importantes, não deixando as tarefas acumularem e respeitando o plano de ensino elaborado no início de cada período letivo. Além disso, realizo o mínimo possível de atividades profissionais aos finais de semana, conciliando as tarefas do trabalho com outras atividades pessoais através de planejamento e determinação, mesmo que minha jornada seja mais extensa do que a maioria dos profissionais que conheço. Portanto tento organizar as atividades acadêmicas dentro do período de trabalho que sempre se extende a mais de 8 horas por dia. Programo minhas atividades deixando livres aos domingos para me dedicar a vida pessoal, mas nem sempre consigo, pois durante várias horas dos dias sábados e domingos estou ainda trabalhando em atividades da universidade. Quadro 10: IC-A – Planejamento. Considerando o discurso da IC-A e o modelo de QVT de Walton, é possível relacionálos com dois fatores que afetam a QVT: “condições de segurança e saúde no trabalho” e “trabalho e espaço total de vida”. Ao mencionar o primeiro fator deve-se considerar a dimensão jornada de trabalho, que conforme consta no discurso acima parece insuficiente para cumprir com as obrigações que o docente possui, de forma que este recorre ao seu tempo livre para finalizar seu trabalho. Quanto ao segundo fator, verifica-se que o trabalho docente absorve muito tempo e energia desses professores, desta forma afetando a vida familiar e particular destes (PEDROSO; PILATTI; 2010). Esta dificuldade de equilibrar a vida pessoal e profissional também deve ser em decorrência da cultura da produtividade, citada por Bosi (2007), vivenciada por estes profissionais que são pressionados e estimulados a aumentarem o número de aulas, orientações, publicações, projetos etc., para atingirem melhor avaliação. Pode-se relacionar o discurso do quadro 10 também com os paradoxos das relações de trabalho que ocorreram nessa era de globalização e mudanças tecnológicas, que possibilitam a praticidade do trabalho a distância (LIMONGI-FRANÇA, 2010). No entanto essa flexibilização e mudança nas esferas produtivas acabam impactando nos momentos de lazer que dão lugar a mais horas de trabalho. No quadro 11 os docentes discursam sobre a importância de dedicar algum tempo para a família, amigos e momentos de lazer. Este discurso reitera a importância da vida em família e de tempo livre suficiente, para que não prejudique a QVT do profissional. Em outras palavras, os docentes, como é de se esperar, buscam equilibrar vida pessoal com profissional ao planejar adequadamente seus horários de forma que sobre tempo para aproveitar a família e atividades de lazer. Procuro tirar o maior proveito possível durante o tempo que passo com a família e reservo pelo menos um dia no final de semana para relaxar e estar com amigos e parentes.Também viajo nas férias para ter um pouco de vida pessoal e utilizo o tempo livre para leituras, ou seja, procuro ter uma vida saudável com amigos, leituras, lazer e estudo. Quadro 11: IC-B – Momentos de lazer. O quadro 12 representa o discurso do sujeito coletivo dos professores referente à ideia central C, “Dificuldade de equilíbrio”. Percebe-se que existem dificuldades para os docentes 11 equilibrarem a vida pessoal com a profissão, estes alegam até que não é possível este equilíbrio sendo necessário escolher entre as duas atividades. Os respondentes também se mostram preocupados em serem bons profissionais e salientam que através das novidades tecnológicas tem sido ainda mais difícil se desvencilhar do trabalho. Não consigo, não há como equilibrar. Penso que estejamos todos do mesmo jeito: escolhendo ou isso ou aquilo. Tudo ao mesmo tempo da forma como hoje está posto, com qualidade, acho impossível. Mesmo fora de sala de aula, as outras atividades invadem minha casa via computador, pois celular e internet induzem ao trabalho fora do horário de expediente. E a vida pessoal é sempre desprezada, pois quero ser um bom professor, bom orientador e principalmente quero ter produção científica. Quadro 12: IC-C – Dificuldade de equilíbrio. Alguns fatores relativos à questão da produtividade para trabalhadores do conhecimento podem auxiliar no entendimento dessa dificuldade citada pelos docentes, dentre eles: ter o conhecimento necessário para realizar suas tarefas, a responsabilidade pela produtividade deve ser do próprio trabalhador, a necessidade de atualizações, aprendizado e ensino contínuos, a importância da busca pela qualidade e da vontade de trabalhar em prol de determinada organização (KANIKADAN; LIMONGI-FRANÇA, 2007). Portanto percebe-se a importância da autonomia, inovação e motivação dos docentes, como trabalhadores do conhecimento, e como sujeito ativo no desenvolvimento no das suas capacidades. Deve-se acrescentar também que o fator “trabalho e espaço total de vida”, presente no modelo de Walton também deve ser analisado a partir desse discurso, pois a dificuldade de balancear trabalho com a vida pessoal influencia na percepção de QVT dos docentes. E a dimensão do trabalho “autonomia” do modelo de Hackman e Oldham igualmente, pois inferese que o docente deve ter independência para desempenhar suas tarefas e responsabilidade pessoal para planejar e executar as mesmas (PEDROSO; PILATTI; 2010). O quadro 13 apresenta o discurso do sujeito coletivo relativo a ideia central D, “Satisfação no trabalho”. Pelo discurso coletivo dos professores, verifica-se que eles procuram no prazer que sentem na profissão o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Conforme é percebido no discurso citado, os docentes buscam não separar as duas esferas, pessoal e profissional, e sim entendê-las como complementares. Procuro desenvolver atividades que me trazem satisfação, pois tento fazer do trabalho uma diversão prazerosa. Já que para mim uma é complemento da outra, pois se a atividade profissional me dá prazer, a vida pessoal é muito agradável e vice-versa. Desta forma busco gratificação no trabalho executado. Quadro 13: IC-D – Satisfação no trabalho. Conforme as dimensões da tarefa “identidade da tarefa” e “significado da tarefa” do modelo de Hackman e Oldham, pode-se analisar o discurso acima devido a importância percebida pelo docente através do trabalho executado e a satisfação advinda deste, principalmente as alcançadas pelo resultado do trabalho e os impactos destes na sociedade (PEREIRA, 2006). 5. Considerações Finais A pesquisa buscou analisar a compreensão dos professores a partir de três questões: 1) o que eles compreendiam por qualidade de vida no trabalho docente; 2) como eles percebiam a própria qualidade de vida no trabalho; 3) como eles equilibram a vida pessoal e profissional. Na primeira questão foram identificadas doze ideias centrais (IC), que seriam: “condições adequadas para o ensino, pesquisa e extensão”; “relacionamento entre docentes”; “infraestrutura adequada”; “jornada de trabalho”; “satisfação, identificação e realização com 12 trabalho”; “remuneração e benefícios”; “apoio administrativo”; “bem-estar”; “resultado social”; “relacionamento com alunos”; “autonomia para desenvolver as atividades” e “adequação ao cargo”. Destas, as seis primeiras IC foram selecionadas para a elaboração do DSC pois, perfazem em conjunto, 78% da frequência presente nos depoimentos dos respondentes. O conceito atribuído à qualidade de vida no trabalho docente pelos professores que participaram da pesquisa refere-se principalmente a condições adequadas para o ensino, pesquisa e extensão, pois os respondentes relacionam que qualidade de vida consiste na capacidade de produzir e transmitir conhecimentos em condições ótimas, de forma que influencie positivamente nos resultados destas atividades; bom relacionamento entre docentes que promova convivência harmoniosa entre os pares e chefia, troca de conhecimentos e críticas construtivas ao desempenho do docente, de maneira que este possa aprimorar a sua performance; estrutura física apropriada que atente para a saúde e segurança do docente; jornada de trabalho, ou seja, carga horária suficiente considerando o volume de trabalho e o tempo necessário a ser despendido na preparação de aulas e atividades extra classe; satisfação, identificação e realização pessoal com o trabalho, através da busca de reconhecimento e gratificação por meio deste; e por fim, remuneração e benefícios que devem ser compatíveis com a qualificação e volume de trabalho, competitiva em relação as demais e suficiente para que docente e sua família tenham um bom padrão de vida. Para a segunda questão foram identificadas treze ideias centrais (IC) distintas: “condições inadequadas para a pesquisa, ensino ou extensão”; “infraestrutura inadequada”; “dificuldade de relacionamento entre docentes”; “jornada de trabalho inadequada”; “relacionamento entre docentes”, “satisfação/ identificação/ realização pessoal”; “remuneração insuficiente”; “relacionamento com alunos”; “jornada de trabalho”; “carreira inadequada”; “infraestrutura adequada”; “remuneração” e “autonomia”. No entanto, metade das respostas obtidas não foi considerada, pois não respondiam ao que havia sido perguntado ou não poderiam ser caracterizadas como discurso. E das 19 respostas consideradas as frequências das ideias centrais nos discursos dos docentes encontrava-se bastante pulverizada impossibilitando a elaboração do DSC, pois estas não podiam ser traduzidas como opinião da coletividade pesquisada. Porém, a partir da análise da frequência por IC foi possível inferir que as instituições têm dificuldade em proporcionar condições suficientemente adequadas para ensino, pesquisa e extensão, o relacionamento interpessoal entre docentes se apresenta como problemático, o docente possui excessivo volume de trabalho e eles têm problemas em equilibrar vida pessoal e profissional devido a carga horária não ser considerada suficiente para a execução de todas as atividades necessárias para o profissional docente. No que tange à terceira questão foram identificadas nove IC distintas: “planejamentos”; “momentos de lazer”; “dificuldade de equilíbrio”; “satisfação no trabalho”; “equilíbrio”; “relacionamento entre docentes”, “atividade física”, “relacionamento com alunos” e “atividades político-partidárias”. Das nove IC encontradas foram selecionadas as quatro primeiras, que juntas representam 77% das IC inseridas nos discursos dos pesquisados. Desta forma verifica-se que os respondentes equilibram a vida pessoal e profissional através do planejamento, devido a rotina inconstante da atividade docente e da necessidade de priorizar, e racionalizar, as atividades buscando desta maneira que os finais de semana e o tempo com a família não sejam prejudicados por atividades de trabalho; buscando momentos de lazer com a família e amigos; e satisfação no trabalho ao relacionarem as duas esferas, pessoal e profissional, e entenderem elas como complementares e não distintas, ou seja é a busca do prazer no que se faz e no que se alcança como resultado de trabalho. Também devem ser considerados nessa questão, através da IC “dificuldade de equilíbrio”, aqueles que alegaram não conseguirem atingir esse equilíbrio, pois preocupam-se em se tornarem 13 profissionais melhores e que a necessidade de atualização e aprendizado contínuos interferem na vida pessoal. Ademais a tecnologia permite cada vez mais transferir o trabalho para o ambiente domiciliar, tornando-se ainda mais difícil se desvencilhar dele. Observa-se que as IC levantadas nas questões se relacionam com os assuntos abordados por alguns autores, como Pedroso e Pilatti (2010), Pereira (2006), Kilimnik e Castilho (2002) e Limongi-França (2010), notadamente nas descrições dos modelos de Walton e Hackman e Oldham. Dessa forma, este estudo contribuiu para mostrar que o tema QVT deve ser discutido dentro do enfoque multidisciplinar humanista, na qual as perspectivas e definições de QVT são multifacetadas e têm implicações éticas, política e no desempenho do docente. É necessário considerar também diferentes dimensões para o entendimento do que exerce influência na qualidade de vida no trabalho, de maneira que sejam evitados enfoques reducionistas e aqueles que não considerem as mudanças do ambiente ou as expectativas pessoais como influentes no entendimento de QVT pelos profissionais. Quanto a análise de qualidade de vida no trabalho docente pode-se perceber que as condições favoráveis para o desenvolvimento profissional destes professores, que permitam que eles produzam e compartilhem conhecimento juntamente com um clima organizacional agradável que induza a troca de experiências positivas entre os docentes da instituição são os aspectos mais importantes e balizadores da QVT destes, pois influenciam diretamente no resultado do trabalho, sendo a partir dos resultados deste e da relevância percebida que os professores se sentem reconhecidos e satisfeitos com seu trabalho. Ademais a importância do planejamento das atividades de forma que a vida pessoal e o trabalho se mantenham em equilíbrio é primordial para preservar a saúde física e mental destes docentes que possuem grande volume de trabalho, intrínseco a qualquer profissional do conhecimento que se configura como agente modificador da sociedade e sujeito responsável pelo desenvolvimento de suas próprias capacidades. Referências BOSI, A. P. A precarização do trabalho docente nas Instituições de Ensino Superior do Brasil nesses últimos 25 anos. Educação & Sociedade, Campinas, v. 28, n.101, p. 1503-1523, set./dez. 2007. KANIKADAN, A. Y. S.; LIMONGI-FRANÇA, A. C. A Qualidade de vida no trabalho dos professores de inglês. RBGN, São Paulo, v. 9, n. 25, p. 59-80, set./ dez. 2007. KILIMNIK, Z. M.; CASTILHO, I. V. Trajetórias e transições de carreira: um estudo longitudinal sobre a qualidade de vida de profissionais assalariados de recursos humanos que experimentaram a passagem para o trabalho autônomo. 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