O SUPERENDIVIDAMENTO DO CONSUMIDOR Fernanda Maria dos Reis1 O presente trabalho tem por objetivo traçar linhas gerais sobre o superendividamento do consumidor, visando analisar a proteção jurídica atualmente oferecida ao indivíduo que sofre com o endividamento crônico, bem como apontar medidas a serem adotadas com vistas à tutela da questão. Diante da ausência de legislação específica sobre o assunto, o presente trabalho foi desenvolvido mediante o estudo de textos e artigos doutrinários, decisões judiciais, estudos e pesquisas já desenvolvidos sobre o tema. É importante notar que a facilidade do acesso ao crédito, a falta de orientação e a avidez pelo consumo têm levado cada vez mais brasileiros à condição de inadimplentes e o superendividamento é hoje uma realidade para significativo número de consumidores. A situação tem se mostrado tão alarmante que por todo país Órgãos de Proteção e Defesa do Consumidor, Tribunais de Justiça e até hospitais já dispõem de serviços voltados para esse público. Eles atuam basicamente mediando a renegociação das dívidas e prestando apoio psicológico. O fenômeno é recente, razão pela qual ainda não contamos com instrumentos legais específicos para a regulação da matéria. Não obstante, encontramos em nosso 1 Advogada - Graduada em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais Vianna Júnior - Pós Graduada em Direito Empresarial e Econômico pela Universidade Federal de Juiz de Fora - Membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/MG Subseção Juiz de Fora - Membro da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual [email protected] ordenamento jurídico arcabouço necessário à defesa do consumidor superendividado, em especial, mediante a aplicação dos princípios. Cláudia Lima Marques define o superendividamento nos seguintes termos: O superendividamento pode ser definido como impossibilidade global do devedor-pessoa física, consumidor, leigo e de boa-fé, de pagar todas as suas dívidas atuais e futuras de consumo (excluídas as dívidas com o Fisco, oriundas de delitos e de alimentos) em um tempo razoável com sua capacidade atual de rendas e patrimônio (MARQUES; LIMA; BERTONCELLO, 2010, p. 21). O consumidor superendividado, por sua vez, é classificado como passivou ou ativo. No primeiro grupo estão aqueles que chegaram a essa condição por fatos alheios à sua vontade, pelo desemprego, por exemplo. Já no segundo grupo encontramos consumidores que se endividaram pelo abuso do crédito. Em que pese referida classificação, a doutrina entende que ambos merecem proteção. Diante da definição supra, resta incontroverso que o consumidor superendividado tem colocada em risco a própria subsistência, sofrendo incontáveis prejuízos à sua dignidade. Ele deixa de desfrutar de momentos de lazer, se priva do contato social, perde o crédito e, via de regra, se vê em um círculo vicioso, contratando empréstimos para quitar dívidas anteriores que já não conseguiu pagar. Nesses casos, paga cada vez mais caro pelo crédito e nem sempre escolhe a melhor opção para liquidar o débito. Fato é, que os próprios fornecedores contribuem, em muito, para a situação de superendividamento, em especial, ao se valerem de estratégias de marketing extremamente agressivas e ao não orientam devidamente o consumidor com relação aos contratos que serão celebrados. O Poder Judiciário já vem sentido os reflexos dessa situação e ações judiciais fundadas no superendividamento do consumidor, objetivando a revisão de contratos estão se tornando comuns. Normalmente essas ações visam a diminuição dos juros, o reparcelamento da dívida, ou mesmo a redução do seu valor. Não obstante, se faz necessária uma mudança de comportamento por parte do consumidor que deve se conscientizar da necessidade de planejar seus gastos, de se informar sobre todos os detalhes e implicações do negócio que pretende celebrar com vistas a evitar o superendividamento. Lado outro, os fornecedores devem atuar de boa- fé, o que implica, dentre outros, em informar de maneira clara e adequada sobre o negócio que está sendo celebrado, além de realizar uma análise responsável e criteriosa sobre a capacidade do consumidor de arcar com o compromisso que pretende assumir. Entretanto, a mudança de comportamento das partes envolvidas não afasta e necessária e urgente implementação de políticas públicas objetivando a proteção do consumidor, desde a fase pré contratual, a fim de se evitar a condição de superendividamento, sem esquecer jamais daqueles consumidores que já padecem em razão do fenômeno e que devem obter condições para se recuperarem economicamente. É preciso que o Estado atue no sentido de orientar o consumo do crédito de maneira responsável, bem como na repressão das práticas abusivas relacionadas à sua concessão. REFRÊNCIAS MARQUES, Claudia Lima; LIMA, Clarissa Costa; BERTONCELLO, Káren. Prevenção e Tratamento do Superendividamento. Brasília: DPDC/SDE, 2010.