OS JULGADOS DE PAZ E A REFORMA DA
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA CIVIL
João Pedroso
FEUC/CES da Universidade de
Coimbra
Conferência comemorativa
8 anos do Julgado de Paz de Lisboa
– O Balanço
21/01/10
PRIMEIRA PARTE
A Justiça Civil, em Portugal, está em crise ?
(Zuckerman. 1999. Civil Justice in crisis – Comparative
perspectives of civil procedure. Oxford Un. Press)
1. Análise da procura e da oferta da justiça civil
1.1. O movimento processual – processos PENDENTES, ENTRADOS e FINDOS
1.2 – FACTORES DE EXPLICAÇÃO
a) ENDÓGENOS (sistema judicial)
- Alterações legislativas
Substantivas – Lei desjudicializadora (d.m.c.; tutelares cíveis)
Processuais – simplificação/complexificação do
processo civil
– Alt. Organização judiciária
– Alt. Leg. das Custas
– Formação/variação de magistrados e funcionários
- Alterações institucionais
- Alterações técnicas - novas tecnologias (vídeo, tramitação electrónica, etc.)
b) EXÓGENOS
- Transformações sociais, económicas, políticas e culturais (Natureza muito diversa)
- mudanças de regime político
- desenvolvimento económico
- variação da população
- industrialização e urbanização
- cultura local e sua propensão à litigação
- acessibilidade do Tribunal
- grau de consciência dos direitos
1.3
Movimento Processual: justiça cível
1.400.000
1.200.000
1.000.000
800.000
600.000
400.000
200.000
0
1996
1997
Entrados
Fonte: DGPJ
1998
1999
2000
Findos (Decisão Final)
2001
2002
2003
Pendentes (Decisão Final)
2004
Principais acções declarativas cíveis e injunções (2004)
2004
Nº
%
Injunções
267.920
58,30%
Divida Civil e Comercial
86.561
18,84%
Divida de Premios de Seguro
13.747
2,99%
Divórcio Litigioso
9.373
2,04%
Reclamação de créditos
8.824
1,92%
Embargo de executados
7.455
1,62%
Despejo de prédio urbano dest.à habit.por falta pag.de
6.705
renda
1,46%
Procedimento cautelar comum
4.739
1,03%
Responsabilidade civil: Outro ou n.e.
4.377
0,95%
Acidente de Viação
3.951
0,86%
Outras acções
45.864
9,98%
Total
459.516
100,00%
Fonte: DGPJ
Distribuição das acções declarativas findas por tipo de autor e réu (2004)
Pessoa Singular / ?
1%
Pessoa Colectiva / Pessoa
Colectiva
27%
Pessoa Singular / Pessoa
Singular
20%
Pessoa Singular / Pessoa
Colectiva
12%
Pessoa Colectiva / ?
0%
Pessoa Colectiva / Pessoa
Singular
40%
Fonte: DGPJ
Duração das acções cíveis declarativas (1990 e 2004)
1990
2004
[0, 6 meses[
1 [0, 6 meses[
38,02%
2 [6 meses, 1 ano[
24,93%
3 [1 ano, 2 anos[
[6 meses, 1 ano[
[2 anos, 3 anos[
7,33%
6,58%
5 [3 anos, 5 anos[
[3 anos, 5 anos[
5,49%
6 [5 ou mais anos
30,00%
Fonte: DGPJ
20,00%
18,92%
[1 ano, 2 anos[
17,65%
4 [2 anos, 3 anos[
40,00%
36,33%
10,00%
[5 ou mais anos
0,00%
0,00%
17,96%
7,35%
8,88%
10,57%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
2. Crise da justiça cível em Portugal: um diagnóstico dos bloqueios quase
consensual
2.1. Selectividade dos Tribunais/colonização das acções de dívidas
- dívidas de pequeno valor
- explosão da litigância de massa
- empresas v.s. consumidores
(S. Santos; Marques, MML; Pedroso, João e Ferreira, Pedro. 1996. Os Tribunais nas sociedades
contemporâneas: o caso português. CES/CEJ)
2.2. Morosidade/ineficiência
→ desadequação entre a oferta e a procura
→ desadequação e arcaísmo da lei processual
(prazos, recursos e instâncias)
→ arcaísmo da organização judiciária
Território
procedimentos
Recursos humanos e materiais
Litígios ausentes
Debilidades no sistema público, de mercado e comunitário de
2.3. Inacessibilidade
acesso ao direito e à justiça
Custos (judiciais, advogados, oportunidade)
Imagem de justiça distante
Consciência dos direitos/não uso dos direitos
2.4. Deficit na qualidade da justiça
Ouvir as pessoas
Fundamentação de facto e de direito
Transparência/auditoria democrática
Profissões ≠ corporações ≠ cidadania
Serviço público
3. Crises das funções da justiça: “doença” da democracia
3.1. – Instrumental – Deficit na Resolução de litígios
3.2. – Política – Deficit no cumprimento direitos/deveres
integração/controle social
LIBERDADE
Segurança
3.3. – Simbólica – Deficit na legitimidade da vida política e social
(S. Santos et al. 1996, 19-34)
Segunda Parte
A oportunidade: a construção de um novo
paradigma de justiça civil
4. A reforma da justiça civil é sistémica
4.1. – A reforma da justiça é reforma do Estado
(L. Cadiet et L. Richter. 2003.)
4.2. – A reforma da justiça é a re (re)gulação do mercado
4.3. – A reforma da justiça é a promoção e garantia dos direitos das
pessoas da comunidade/sociedade (cidadania)
5. Os principais tipos de reformas da justiça civil
5.1. – O argumento quantitativo dos recursos
(+ Juízes, + Tribunais, + Funcionários)
5.2. – Tecnocrática e gestionária
- processo civil mais flexível e expedito
- gestão de recursos humanos e materiais
- alteração da divisão do trabalho judicial/delegação do
trabalho de rotina
5.3. – Inovação e tecnologia
- desmaterialização/informatização
- tecnologias de comunicação/vídeo
- novos modelos/cadeias de decisão
- alteração das qualificações profissionais e das regras
e de hierarquia
de autoridade
5.4. – Desjudicialização e resolução alternativa (substitutiva e complementar)
de litígios
- desjudicialização (Cons. Reg. Civil, BNI);
- CCA Consumo;
- Julgados de paz;
- CPCJ;
- Mediação (família, laboral e penal);
João Pedroso et al. 2003. Por caminhos da(s) reforma(s) de justiça. Coimbra Editora (OPJ/GPLP)
6. Um novo paradigma de sistema de resolução de litígios
A pirâmide da justiça
(ou do sistema integrado da resolução de litígios)
Tribunal
A desenvolver por
entidades privadas ou
mistas
Meios híbridos
de resolução de
litígios próximos do
modelo judicial
Arbitragem
Mediação
Conciliação
Profissões jurídicas (ou não) que resolvem litígios
Prevenção de litígios
Aconselhamento de direitos com e sem resolução de litígios
Autoregulação / Autocomposição
Adaptado de Wonters e Van Loon (1991; 23); Santos e al. (1996; 80); Dufresne (1993); Pedroso et al. 2003
“A pedra de toque de um novo modelo de administração
da justiça é a consequente criação de um sistema
integrado (ou plural) de resolução de litígios que assente
na promoção do acesso ao direito pelos cidadãos (…).
Assim, a justiça deve ser entendida como a entidade (ou
terceiro) que os litigantes consideram mais legítima e
adequada para a resolução do seu conflito e defesa dos
seu direitos. Ora, esse terceiro, tanto pode ser o Tribunal
como qualquer instância que cumpra essa finalidade. (…)
A questão fundamental é que a terceira parte escolhida
pelo cidadão para resolver o seu litígio não lhe seja
imposta, mesmo que subtilmente, pelas estruturas sociais,
mas corresponda pelo contrário, ao meio mais acessível,
próximo, rápido e eficiente da tutela dos seus direitos.”
(Pedroso et. al. 2003: 48 e 49)
Terceira Parte
A JUSTIÇA DE PAZ
- UM BALANÇO
7. Quadro de análise
7.1. – As relações entre a justiça e o político: o processo de criação dos
Julgados de Paz
7.2. – A transformação do “campo jurídico”
7.3. – A relação entre os Julgados de Paz e os seu mobilizadores
7.4. – Os Julgados de Paz e a sociedade
(Guibentif, 2007; 331-359)
7.1. – O processo político de criação dos Julgados de Paz
a) consenso político: proposta do PCP apoiada pelo Governo PS;
b) As profissões jurídicas não são hostis, mas não estão comprometidas (nem
activas;
c) um espaço novo onde Estado (governo) pode tomar iniciativas sem actores
instalados (institucionais ou profissionais);
d) uma nova estrutura concorrente/complementar aos Tribunais;
e) ideologia e discurso centrado nos conceitos de “justiça de proximidade e
mediação”;
f) acompanhar o sentido de transformação das relações entre o estado e os
cidadãos;
g) uma justiça de pessoas e não uma justiça das organizações
7.2. – A transformação do “campo jurídico”
a) a criação de um discurso sobre a diferença e a identidade de uma nova
justiça face à justiça tradicional;
b) novas profissões:
- Juiz de Paz
- mediadores
c) feminização da profissão jurídica;
d) consolidação de uma cultura jurídica de cooperação e de mediação;
7.3. Justiça de Paz: a relação com os cidadãos
a) processos simples, demanda oral, sem necessidade de advogado;
b) celeridade do processo e da decisão;
c) mediação;
d) instituição e processo – facilita a cooperação entre as partes;
e) uma justiça nova e alternativa, ainda pouco conhecida e limitada territorialmente;
f) limitada à resolução de conflitos inter-individuais civis;
7.4. Julgados de Paz e a sociedade
a) superação de uma lógica jurídica clássica binária e adversarial/adjudicação;
b) discurso de acessibilidade;
c) a ferramenta da mediação;
d) um instrumento moderno para a promoção de uma Sociedade auto-compositiva;
(Santos, Marques, Pedroso, Ferreira, 1996
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Os Julgados de Paz e a Reforma da Administração da Justiça