Capa Paulo Bau / eQuiPe Do RestauRante keR Por Wagner Sturion Com estudo se chega ao longe! Cursos e treinamentos podem desviar o seu restaurante da trilha do desperdício e mantê-lo no caminho lucrativo do conhecimento. O sucesso por trás da formação profissional dos colaboradores... rumos da proFissionaLiZaÇÃo Estudar gastronomia é uma necessidade, uma tendência ou um modismo? O diretor executivo da Abrasel-SP, Sérgio Marques Júnior, defende uma pitada dos três ingredientes. “Mas, com certeza, destaco que estudar gastronomia é uma questão de necessidade, pois o setor de alimentação está em franco crescimento e vem a cada dia se profissionalizando mais. É uma questão de tempo para ficarem e serem contratados no mercado de trabalho apenas aqueles que tiverem uma base de estudo”, afirma. Marques Júnior destaca também certo modismo. 26 Cozinha Profissional 102 Ele aponta os quadros de culinária e gastronomia nas redes de televisão como uma tendência que ganha força a cada programa que vai ao ar. Apresentada por novos e renomados chefs, a arte de cozinhar tem despertado a partir das “telinhas” o interesse crescente de pessoas de todas as idades por cursos técnicos e de especialização na área. Desde o ano 2000, a formação profissional no segmento de restaurantes está em amplo desenvolvimento, segundo Naira Scavone, coordenadora de ensino da Escola de Educação Profissional em Gastronomia Aires Scavone (Egas), w w w . c o z i n h a p r o fi s s i o n a l . c o m . b r localizada em Porto Alegre, RS. “Ainda é cedo para analisarmos os efeitos concretos sobre o foodservice, tendo em vista que as escolas estão se adaptando às necessidades do setor, e, por outro lado, o próprio mercado ainda está um tanto Resumo da matéria • Futuramente, só serão contratados no segmento de gastronomia os que tiverem uma base de estudo. • Inúmeros jovens podem encontrar nas Escolas Técnicas sua vocação, sua carreira e seu sustento. • O ensino superior é fundamental, principalmente no Brasil, em que as regras e legislações são muito exigentes. prática diária. “Após a abertura de cursos na área de gastronomia, o segmento vem se transformando progressivamente. Com certeza, essa mudança é positiva em vários aspectos, pois com ela nasce a união entre os profissionais que detêm a prática com os que dominam a técnica, associando-se também o conhecimento da ciência.” Mas como o proprietário de restaurante pode encontrar mão-de-obra especializada em um País que praticamente exclui boa parte da população de baixa renda, tanto do nível técnico quanto do universitário? “Complicada essa questão, pois, ao menos assim pensamos, dependeria de um esforço entre governo – empresários – órgãos de formação profissional. Acho que o setor deveria ser mais unido para pressionar medidas governamentais, que incentivassem tanto o empresário investir na qualificação de seu colaborador, como as escolas privadas. Acho que, basicamente, falamos de incentivos fiscais e mudanças nas leis de trabalho etc.”, comenta Naira Scavone. “É uma questão de tempo para ficarem e serem contratados no mercado de trabalho apenas aqueles que tiverem uma base de estudo” Divulgação Sérgio Marques Júnior, diretor executivo da Abrasel-SP Divulgação / Hotec resistente em absorver os profissionais com formação. Acredito que, nos próximos cinco anos, os ajustes entre mercado e escolas serão corrigidos e, dessa forma, teremos um segmento mais preparado para atender à crescente demanda, que é a alimentação fora do lar”, prevê. O diretor de marketing da Faculdade de Tecnologia em Hotelaria, Gastronomia e Turismo de São Paulo (Hotec), Rubens de Carvalho Pinto também aponta o ano 2000 como sendo um marco do crescimento na oferta de cursos superior, técnico e de qualificação profissional voltados à área de gastronomia. “Tal fenômeno se deve em muito aos avanços tecnológicos na produção diversificada, distribuição, armazenamento e na elaboração de alimentos para um cliente que, cada vez mais, realiza suas refeições fora de casa.” Ele lembra também que o aumento no poder de compra proporcionou ao consumidor a ida mais freqüente aos restaurantes, tornando-se essas saídas uma forma agradável de entretenimento, unindo-se os desejos naturais de alimentação saudável com os de lazer. Para o professor de Alimentos e Bebidas (A&B), Gestão de A&B, Enologia e Gastronomia, Celso dos Santos Silva, e para a coordenadora do Curso de Hotelaria e docente de Organização de Eventos, Marina Lindenberg Lima, ambos da Faculdade Armando Álvares Penteado (Faap), de São Paulo, SP, atualmente o mercado profissionalizado exige boa experiência e ótimos conhecimentos. “No entanto, o fenômeno no Brasil é muito recente: há dez anos, as profissões gastronômicas eram vistas com muito preconceito e sem grandes reconhecimentos do trade. Nesse meio tempo, profissionais sem estudo, mas repletos de muita vontade de crescer foram ocupando espaços de destaque, mesmo sem formação. Porém, a palavra do futuro é formação profissional e, de preferência, continuada”, reforçam. O chef Eduardo Luis Lopes, diretor do Curso de Gastronomia da Faculdade Editora Nacional (Faenac), localizada em São Caetano do Sul, SP, também recorda que há poucos anos a mão-de-obra era formada por profissionais que aprenderam o ofício no próprio mercado de trabalho, ou seja, na Estradas para o crescimento Naira, da Egas, faz questão de frisar que, na escola que coordena, só ensina o oficio quem tem formação específica e experiência consistente no mercado gastronômico, além de ter passado por um treinamento na metodologia de ensino da instituição. “Quanto ao perfil do aluno, basicamente são pessoas jovens entre 20 a 30 anos, identificadas com o setor, que buscam a formação para ingressar no mercado, ou para melhorar a qualificação (quando já empregados). Quem oferece empregos são restaurantes que têm como meta melhorar sua qualidade, ou seja, aqueles que acreditam e apostam na formação como um dos caminhos para o crescimento e a consolidação de seus negócios”, adianta. De acordo com Lopes, esses empregos são oferecidos também por empresas de coletividade, bufês, hospitais, fastfoods, empresas de consultoria, bares, indústria de alimentos etc. E ele destaca: a maioria dos empresários que oferece vagas prefere pessoas com mais experiência em vez de alunos recém-formados. “Entretanto, devido às novas exigências do setor, outros contratantes optam por profissionais recém-formados com conhecimentos mais abrangentes em áreas como higiene e manipulação, custos e gerência de cozinha”, observa. Ou seja, a oportunidade está para os iniciantes assim como para os veteranos... Os professores do ensino superior w w w . c o z i n h a p r o fi s s i o n a l . c o m . b r Cozinha Profissional 102 27 Capa Divulgação / Hotec O aumento no poder de compra proporcionou ao consumidor a ida mais freqüente aos restaurantes e uniu os desejos naturais de alimentação saudável com os de lazer de chefs para compor a tripulação de navios”, acrescenta. De acordo com a diretora, as ofertas chegam a ser superiores ao número de alunos que a instituição tem para indicar. “Temos constatado que muitos dos nossos estudantes são profissionais com diploma superior, mas com pouquíssima experiência prática, razão pela qual vêm a Flores da Cunha buscar aperfeiçoamento”, revela. Santos Silva e Marina, da Faap, também apontam o perfil dos que procuram cursos no segmento de refeição fora do lar: “Para as áreas operacionais, em sua maioria, são profissionais que já atuam ou estão prestes a atuar no setor gastronômico e, em geral, têm no máximo dez anos de escolaridade formal. Já nos cursos gerenciais, são familiares de empresários do ramo, com segundo grau completo, ou jovens cuja família não está ligada à atividade. Eles identificam a gastronomia como sendo uma atividade econômica importante e possível geradora de lucratividade”, reforçam. Divulgação são, na sua maioria, ex-alunos dos cursos de gastronomia mais antigos, que já trabalham no mercado, ou chefs de cozinha que possuem formação superior, segundo Lopes. “Ambos se revezam na importante tarefa de passar o ofício, mostrando ao aluno a relação entre a teoria e a prática”, explica. Ele revela que os cursos nessa área são procurados por um público bastante variado, que vai desde apaixonados por gastronomia, profissionais do mercado, empresários do setor até curiosos. Maria Beatriz Dal Pont, diretora da Escola de Gastronomia UCS ICIF – Cultura e Enologia das Regiões da Itália, em Flores da Cunha, RS, garante que seus alunos saem da escola já com empregos garantidos. “Há grande procura por parte de restaurantes e hotéis de todo o Brasil, além de alguns estabelecimentos dos Estados Unidos, Espanha, Itália, para os quais já enviamos profissionais formados. Também somos contatados por empresas que necessitam “A falta de profissionais realmente especializados, muitas vezes, obriga o empresário a contratar pessoas com pouco conhecimento e treiná-las com o tempo” Raphael Rodriguez Popovic, dono do Restaurante Galeria 32 28 Cozinha Profissional 102 w w w . c o z i n h a p r o fi s s i o n a l . c o m . b r Via de acesso aos que querem estudar Questionado sobre a porcentagem de colaboradores experientes, recém-formados e estagiários com que um restaurante deve trabalhar, o coordenador dos cursos de Gastronomia e Confeitaria e Panificação da Anhembi Morumbi, Rafael Barros, responde: “Não existe regra, mas um time balanceado seria o ideal, ou seja, 50% formados e 50% em busca de formação profissional. Todo empregador deve contribuir para a educação de seus colaboradores. O ensino superior é fundamental, ainda mais em nosso País, em que as regras e legislações são tão exigentes. O ambiente acadêmico contribui em muito para a formação, já que a vivência universitária apresenta um universo abrangente ao aluno, que irá auxiliá-lo na escolha certa dos caminhos a seguir”. Conforme Santos Silva e Marina, sob o ponto de vista operacional, a formação profissional está bem desenvolvida na Região Sudeste. No entanto, nas demais regiões do Brasil, deve ser mais promovida, organizada e ampliada. “Em relação aos aspectos de natureza gerencial, há inúmeras carências e necessidades a ser atendidas, mesmo na Região Sudeste”, relatam. Se os proprietários de restaurantes investem em qualificação? A resposta é de Barros, da Anhembi Morumbi: “Alguns restaurantes investem sim, mas precisamos de mais empregadores com a visão de empreendedor. Investir em uma equipe gera benefícios a todos. O nível de qualidade sobe, o desperdício diminui”. O investimento deve ser em faculdade ou escola técnica? Eis a questão. O que Torres Costa e Francisco Geraldo Frasson, respectivamente, gerente de A&B, chef de cozinha e chef executivo, ambos da GRSA – Restaurante KER (que ilustra a capa desta edição), localizado no WTC Hotel, em São Paulo, SP, evidenciam que o mercado necessita dos dois ensinos – o técnico e o universitário –, pois o que diferencia um profissional é a experiência prática e a vontade de aprimorar os conhecimentos. “Todas as escolas são boas e oferecem aporte técnico para os alunos, com diferentes ênfases, no entanto o bom profissional não é o oriundo de uma ou outra instituição, mas o que se empenha na carreira escolhida.” Paulo Bau / Restaurante ker é mais adequado ao mercado brasileiro de restaurantes? “Dentro de uma escala de educação profissional, a faculdade assim como a escola técnica desempenham papel relevante na formação e na excelência profissional de jovens e adultos. O mercado brasileiro é ávido e receptivo aos profissionais competentes e com visão de futuro, independente do seu nível técnico ou superior – resguardando, é lógico, as necessidades do empregador”, defende Carvalho Pinto, da Hotec. Na opinião de Maria Beatriz, da UCS ICIF, a formação profissional do segmento de restaurantes no Brasil é bem resolvida por um lado, com inúmeras universidades, e faculdades, oferecendo cursos de gastronomia e formação de chefs. Mas, por outro lado, ela vê problemas: “Não há instituições preocupadas em formar pessoas para níveis médios – auxiliares –, que possam assessorar com competência, tanto na cozinha, como no salão. “São pouquíssimos cursos para garçons, para formação de maîtres, quase nenhum para sommelier. Há um longo caminho a ser percorrido”, assegura. Maria Beatriz indica a escola técnica como a resolução do problema de mão-de-obra do setor: “Essa seria a via de acesso para inúmeros jovens, que podem encontrar na cozinha e no serviço de sala sua vocação, sua carreira e seu sustento. O curso superior é uma quimera para a grande maioria dos jovens brasileiros e escolas técnicas poderiam se tornar a grande alavanca do setor turístico, já que o Brasil precisa resolver seu grave problema de mão-de-obra média para crescer nesta área. Hoje, os profissionais de nível auxiliar, que atuam na gastronomia, estão sendo formados dentro dos próprios estabelecimentos, com as vantagens e as grandes desvantagens que isso acarreta”, argumenta. Mariana Bolognesi Sartorio, Gustavo Caminhando com incentivo Mariana, Costa e Frasson explicam por que o Restaurante Ker investe na qualificação dos colaboradores. “Entendemos que o aprimoramento dos nossos profissionais é fundamental para atingirmos o melhor serviço e, conseqüentemente, um bom resultado. Já que a maioria não teve a oportunidade de aprendizado, é necessário esse investimento de nossa parte. Além do mais, sabemos que para atender clientes, cada vez mais exigentes, o profissional tem de ser bem qualificado.” Eles informam que a GRSA visa à excelência da performance de sua equipe e, por este motivo, oferece programas para melhoria da competência de seus profissionais. Traduzindo, a empresa tem um plano de carreira. “A avaliação da performance é constante e, quando surgem novas oportunidades, são primeiramente oferecidas para os profissionais internos, que apresentam melhor desempenho”, contam. De acordo com o dono do Restaurante Galeria 32, Raphael Rodriguez Popovic, a falta de profissionais realmente especializados, muitas vezes, obriga o empresário a contratar pessoas com pouco conhecimento e treiná-las com o tempo. “Entretanto, muitas empresas também não acham importante que o futuro colaborador tenha experiência ou conhecimento, contratando assim, pessoas inaptas ao serviço.” Ele fala de suas exigências na hora de contratar um novo colaborador. “O primeiro quesito é a boa vontade. A disposição é essencial para que o funcionário vista a camisa da empresa e, desta forma, colabore para a equipe trabalhar em sintonia. O comportamento diz muito sobre quem w w w . c o z i n h a p r o fi s s i o n a l . c o m . b r Cozinha Profissional 102 29 Capa Cursos – profissionalização – conhecimento Contatos: profissionais que não tiveram oportunidade de estudar? Há menos de 15 anos, poucas eram as escolas que formavam para esse segmento, conta Naira. “A contratação de um chef era praticada, na maioria das vezes, apenas em restaurantes dirigidos a um público elitizado. Quase sempre um chef ‘importado’ (estrangeiro) era contratado, ou prestava assessoria, mas sua equipe, normalmente, era de pessoas sem qualificação.” Muitos, atualmente consagrados, aprenderam a profissão com esses chefs nos restaurantes. Entretanto, grande parte deles, não teve essa experiência: entrou e permaneceu trabalhando sem a oportunidade de ser treinada adequadamente. “Ainda temos muito há trilhar para compreender que a gastronomia é um patrimônio nacional e deve ser tratada como tal. Caso contrário, todos saem perdendo, o público, os proprietários e o País. Acreditamos aqui na escola que estamos num bom caminho, para contribuir na mudança dessa realidade”, salienta. A crença dos outros entrevistados dessa matéria é a mesma. Mais uma prova de que o Brasil tem o seu caminho aberto e traçado nas estradas da educação. Paulo Bau / Restaurante ker você está contratando, e por isso, é importante que o colaborador passe por um período de experiência”, ensina. Naira vai mais longe, cita alguns quesitos primordiais na hora da contratação: “É preciso comprovar o conhecimento técnico, ou seja, sou a favor de testes, além de certif icados. Verif icar se o candidato tem boa apresentação, lembrando que a higiene pessoal é fundamental na aplicação das regras de APPCC ou de Boas Práticas. Perceber se ele tem motivação para trabalhar, não só f inanceira, mas principalmente se demonstra real interesse em ser colaborador da empresa. É interessante saber do entusiasmo do candidato pela gastronomia, a sua ambição, seriedade e compromisso”. A coordenadora da Egas orienta ainda sobre o que a empresa deve oferecer: salário compatível com essas exigências, equipamentos e produtos adequados, e oportunidade de crescimento. Ou seja, a relação deve ser mais ou menos equilibrada, se não um dos pólos f icará insatisfeito e o “casamento” se acabará. Para encerrar, uma ref lexão: a que se deve o fato de muitas vagas na área de gastronomia serem preenchidas por Palavras-chave para busca no site: Sérgio Marques Júnior – Abrasel-SP www.abraselsp.com.br www.abrasel.com.br [email protected] Naira Scavone – Egas www.egasrs.com.br [email protected] Rubens de Carvalho Pinto – Hotec www.hotec.com.br [email protected] Maria Beatriz Dal Pont – UCS ICIF www.ucs.br [email protected] Celso dos Santos Silva e Marina Lindenberg Lima – Faap www.faap.br [email protected] Eduardo Luis Lopes – Faenac www.faenac.com.br [email protected] Rafael Barros – Anhembi Morumbi portal.anhembi.br Mariana Bolognesi Sartorio, Gustavo Torres Costa e Francisco Geraldo Frasson – GRSA – Restaurante KER – WTC Hotel www.restauranteker.com.br www.grsa.com.br [email protected] [email protected] [email protected] Raphael Rodriguez Popovic – Restaurante GALERIA 32 www.galeria32.com.br [email protected] Capa: A foto de capa foi tirada no GRSA – Restaurante KER – WTC Hotel. Avenida das Nações Unidas, 12.559 Brooklin Novo – CEP: 04578-905 – São Paulo, SP. Tels.: (11) 3055-8885/ (11) 3055-8896 / (11) 3055-8000 – ramal:1.710. www.restauranteker.com.br www.grsa.com.br A produção da capa é do fotógrafo Paulo Bau. Tel.: (11) 98203679 – [email protected] 30 Cozinha Profissional 102 w w w . c o z i n h a p r o fi s s i o n a l . c o m . b r