CONSELHO DE MINISTRO
PROPOSTA DE LEI N.º
DE
/VIII/2015
DE
Assunto: Define o regime geral de privatização das empresas públicas
Exposição de Motivos
O Governo de Cabo Verde, através do Documento Estratégico de Crescimento e
Redução da Pobreza (DECRPIII), delineou como uma das estratégias de
desenvolvimento de médio prazo, a promoção de uma economia de base essencialmente
privada, onde o agente económico deve ser preferencialmente o empreendedor privado,
enquanto, ao Estado cabe o papel de regulação e promoção, fomentando um ambiente
favorável ao desenvolvimento de negócio e de investimento.
Para a concretização desse seu plano estratégico, decidiu retomar o processo de
privatizações num momento em que o quadro regulatório do país encontra-se
fortemente consolidado.
Por conseguinte, em Cabo Verde, a privatização aparece como um instrumento
fundamental para uma política económica mais aberta e competitiva e um elemento
decisivo para a dinamização do mercado de capitais, designadamente em bolsa de
valores.
No entanto, volvidos 22 anos sobre a adopção da citada lei, impõe-se a sua revisão, à
luz da experiência entretanto adquirida e também para adequar o seu regime à realidade
actual, conferindo-lhe, para além de uma aproximação às melhores práticas
internacionais, uma maior transparência, flexibilidade e eficiência.
A presente revisão da Lei das Privatizações foi igualmente motivada pelo interesse em
estabelecer as condições necessárias para tornar as próximas privatizações tão
vantajosas quanto possível para o Estado, obedecendo a critérios de solidez e
perenidade das soluções, esperando-se que a nova Lei das Privatizações acomode
satisfatoriamente todos os futuros processos de privatização, e não apenas os incluídos
no actual Plano, promovendo um novo ciclo de crescimento a médio e longo prazo.
Por outro lado, o Governo, no quadro da Agenda de Transformação de Cabo Verde, tem
vindo a preparar um plano de privatizações estratégicas das empresas públicas,
nomeadamente, dos sectores dos transportes aéreos, energético, portuário e
aeroportuário, elegendo os seguintes vectores de actuação: racionalização das
participações directas do Estado, diminuição do peso do Estado na economia, redução
da divida pública, reestruturação de sectores e ou empresas e aprofundamento das
parcerias público-privadas em grandes projectos de investimento.
Assim:
Nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 203.º da Constituição, o Governo submete à
Assembleia Nacional a seguinte Proposta de Lei:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Artigo 1.º
Objecto e âmbito
A presente lei define o regime geral de privatização das empresas públicas.
Artigo 2.º
Âmbito
Exclui-se da aplicação da presente lei a alienação de participações a que se refere a
alínea c) do artigo 3.º, a qual é objecto de legislação especial.
Artigo 3.º
Definições
Para efeitos da presente lei, entende-se por:
a) “Privatização”:
i. O processo pelo qual o Estado ou outra entidade pública transfere para
entidades privadas participação social no capital de uma empresa pública,
sempre que em virtude da transferência a empresa deixe de ser pública;
ii. O processo pelo qual o Estado ou outra entidade pública aumente o capital de
uma empresa pública, procedendo à alienação a entidades privadas de acções
resultantes do aumento, desde que em consequência disso a empresa deixe de
ser pública;
b) “Empresas Públicas”:
i. As sociedades constituídas nos termos da lei comercial, nas quais o Estado ou
outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente,
de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude de alguma
das seguintes circunstâncias: detenção da maioria do capital ou dos direitos de
voto; ou do direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos
órgãos de gestão ou de administração ou de fiscalização; ou de outros
privilégios enquadráveis no artigo 16.º;
ii. As empresas públicas a que se refere o artigo 7.º número 1 da presente lei:
c) “Alienação de participações em empresas públicas”, toda a alienação de que não
resulte perda da qualidade de empresa pública.
Artigo 4.º
Objectivos
As privatizações obedecem aos seguintes objectivos essenciais:
a) O aumento da eficiência, produtividade e competitividade da economia e das
empresas;
b) O fomento empresarial e o reforço da capacidade empresarial nacional;
c) O desenvolvimento do sector privado, no quadro da preservação e valorização
do interesse nacional;
d) A redução da dívida pública;
e) Desenvolvimento do mercado financeiro.
Artigo 5.º
Modalidades de privatização
A privatização realiza-se, alternativa ou cumulativamente, através de:
a) Alienação de participação social;
b) Aumento do capital social.
Artigo 6.º
Princípio norteador de escolha de Procedimento de Privatização
Sempre com observância dos princípios da legalidade, transparência, rigor e isenção, e
qualquer que seja a modalidade de privatização, poderá o Governo, em obediência a
estratégias previamente definidas, escolher, modelar, e implementar o procedimento de
privatização que, em cada momento, se apresente mais ajustado à prossecução e
optimização do interesse público.
CAPÍTULO II
ALIENAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL
Artigo 7.º
Transformação em sociedade anónima
1. As empresas públicas a privatizar que não possuam a forma de sociedade anónima
serão transformadas nesse tipo de sociedade, mediante decreto-lei.
2. O decreto-lei que operar a transformação aprovará também os estatutos da sociedade
anónima, a qual passará a reger-se pela legislação comercial em tudo quanto não
contrarie a presente lei.
3. A sociedade anónima que resultar da transformação continua a personalidade
jurídica da empresa pública transformada, mantendo todos os direitos e obrigações
legais ou contratuais desta.
4. O decreto-lei que operar a transformação constitui título bastante para todos os actos
de registo da sociedade anónima.
5. O registo da sociedade anónima resultante da transformação de empresas públicas é
isento de quaisquer emolumentos e impostos.
Artigo 8.º
Avaliação prévia
1. A privatização é sempre precedida de uma avaliação prévia aos activos e negócios da
empresa a privatizar.
2. A avaliação a que se refere o n.º 1 é realizada por entidades idóneas e independentes
e obedecerá às regras de procedimento previstas na legislação aplicável, excepto
quando o interesse nacional ou outro atendível, devidamente justificado, exijam ou
recomendem a contratação por escolha directa do membro do Governo responsável
pela área das finanças, sob proposta da Unidade de Privatizações e Parcerias PúblicoPrivadas.
Artigo 9.º
Procedimento de privatização
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 6.º, o procedimento de privatização é realizado,
em regra, através de concurso público ou subscrição pública, sem prejuízo do
disposto no número seguinte.
2. Quando o interesse nacional, razões imperiosas de interesse geral ou a estratégia
definida para a empresa ou para o sector o exijam, ou, ainda, quando a situação
económico-financeira da empresa, imperativos de fomento empresarial ou industrial
e transmissão de conhecimento para o mercado nacional o recomendem, poderá
proceder-se a:
a) Concurso limitado, aberto a candidatos especialmente qualificados, com
garantias de estabilidade dos novos accionistas e em obediência a requisitos
considerados relevantes para a própria empresa em função das estratégias de
desenvolvimento empresarial, de mercado, tecnológicas ou outras;
b) Venda directa, à alienação de capital.
3. A privatização será, em qualquer caso, regulada por decreto-lei, adiante designado
por “decreto-lei de privatização”, o qual deve definir e aprovar o procedimento e as
condições de privatização.
4. Os títulos transaccionados por concurso limitado ou venda directa são nominativos,
podendo determinar-se a sua intransmissibilidade ou o condicionamento à sua
transmissão à autorização do Estado, durante determinado período a fixar em
decreto-lei de privatização.
Artigo 10.º
Procedimento de privatização por concurso público
1. O concurso público é aberto a qualquer interessado que reúna os requisitos
genericamente estabelecidos no caderno de encargos.
2. O caderno de encargos deverá conter as condições exigidas aos candidatos, o modo
como se procederá á sua apreciação comparativa, avaliação e selecção, bem como os
demais trâmites do concurso público.
3. O caderno de encargos é preparado pela comissão especial a que se refere o artigo
21.º.
4. O decreto-lei de privatização aprovará o caderno de encargos da privatização.
Artigo 11.º
Procedimento de Subscrição pública
A subscrição pública consiste no lançamento das acções no mercado, onde poderão ser
adquiridas por qualquer pessoa, pelo preço fixado.
Artigo 12.º
Procedimento de privatização por concurso limitado
1. O concurso limitado é aberto apenas a um número restrito de candidatos
especialmente qualificados e pré-seleccionados, entre os quais se fará a apreciação
comparativa, avaliação e selecção dos adquirentes das acções.
2. Ao concurso limitado é aplicável o regime do concurso público, devendo as
condições de qualificação constar do caderno de encargos aprovado no decreto-lei de
privatização.
Artigo 13.º
Procedimento de privatização por venda directa
1. A venda directa de capital consiste na adjudicação sem concurso a um ou mais
adquirentes do capital a alienar.
2. No caso previsto no número anterior, o decreto-lei de privatização aprova o caderno
de encargos da privatização, com indicação de todas as condições da transacção.
Artigo 14.º
Regime de aquisição ou subscrição de acções por trabalhadores ou pequenos
subscritores
1. No caso de privatização por concurso público, concurso limitado ou subscrição
pública, o decreto-lei de privatização pode reservar parte das acções a alienar para
aquisição ou subscrição por trabalhadores ao serviço da empresa.
2. Pode, ainda, o decreto-lei de privatização estabelecer, considerando as
especificidades da empresa a privatizar, o sector em que actua ou a situação
económico-financeira da mesma, que determinadas categorias de trabalhadores ao
serviço da empresa a privatizar possam beneficiar de condições especiais na
aquisição ou subscrição de acções, podendo, para o efeito, no caso dos trabalhadores,
atender-se, designadamente, ao tempo de serviço efectivo por eles prestado, à
avaliação de mérito, entre outros.
3. As condições especiais a que se refere o número anterior devem ser definidas no
decreto-lei de privatização, e poderão incluir:
a) Pagamento das acções em prestações;
b) Dedução à matéria colectável de imposto complementar dos dividendos
resultantes das acções adquiridas.
4.
O disposto nos números anteriores pode aplicar-se aos trabalhadores de sociedades
em relação de grupo ou de domínio com a sociedade que resultar da transformação
da empresa pública a privatizar.
Artigo 15.º
Regulamentação e restrições
1. O decreto-lei de privatização aprova o processo e as modalidades de cada operação
de privatização, designadamente os fundamentos da adopção das modalidades
previstas no artigo 9.º e as condições especiais de aquisição de acções.
2. No decreto-lei de privatização pode ser determinado que nenhuma entidade, singular
ou colectiva, possa adquirir ou subscrever mais do que uma certa percentagem do
capital a privatizar, ou impor limites ao montante de acções a adquirir ou subscrever
por determinadas categorias de entidades. Nesses casos, as propostas que excedam as
referidas percentagens ou limites consideram-se reduzidas aos máximos permitidos.
3. Para efeitos dos números anteriores, determinam a imputação à entidade adquirente
ou subscritora do capital os direitos de voto:
a) Detidos por terceiros em nome próprio, mas por conta dela;
b) Detidos por sociedade que com a entidade adquirente ou subscritora se
encontre em relação de domínio ou de grupo;
c) Detidos por titulares do direito de voto com os quais a entidade adquirente ou
subscritora tenha celebrado acordo para o seu exercício, salvo se, pelo mesmo
acordo, estiver vinculado a seguir instruções de terceiro;
d) Detidos, se a entidade adquirente ou subscritora for uma sociedade, pelos
membros dos seus órgãos de administração e de fiscalização;
e) Que a entidade adquirente ou subscritora possa adquirir em virtude de acordo
celebrado com os respectivos titulares;
f) Inerentes a acções detidas em garantia pela entidade adquirente ou subscritora
ou por esta administradas ou depositadas junto dela, se os direitos de voto lhe
tiverem sido atribuídos;
g) Detidos por titulares do direito de voto que tenham conferido à entidade
adquirente ou subscritora poderes discricionários para o seu exercício;
h) Imputáveis a qualquer das pessoas referidas numa das alíneas anteriores por
aplicação, com as devidas adaptações, de critério constante de alguma das
outras alíneas.
Artigo 16.º
Acções privilegiadas
A título excepcional, sempre que razões de interesse nacional ou razões imperiosas de
interesse geral o recomendem, poderá o decreto-lei de privatização atribuir acções
privilegiadas ao Estado, destinadas a permanecer na sua titularidade e que lhe
concederão, independentemente do seu número, direito de voto quanto às alterações do
pacto social e outras deliberações respeitantes a determinadas matérias, nomeadamente
as previstas na alínea b) do artigo 3.º, devidamente especificadas nos estatutos, ou ainda
aprovar um outro regime de salvaguarda de activos estratégicos do Estado.
Artigo 17.º
Fins de utilidade pública
São consideradas afetas a fins de utilidade pública as acções privilegiadas do Estado nos
termos do artigo 16.º antecedente, bem como as acções normais nas empresas públicas,
ao limite que garanta ao Estado a maioria do capital nas mesmas.
Artigo 18.º
Aumento de capital
As acções resultantes do aumento de capital a que se refere o item ii, da alínea a) do
artigo 3.º serão alienadas nos termos estabelecidos no Capítulo I.
CAPÍTULO III
DISPOSIÇÕES FINAIS
Artigo 19.º
Competência do Conselho de Ministros
Compete ao Conselho de Ministros, em matéria de privatização:
a) Aprovar e actualizar a lista das empresas e participações públicas a privatizar;
b) Aprovar, por Resolução, as condições finais e concretas das operações a realizar
em cada caso de privatização;
c) Aprovar os cadernos de encargos previstos na presente lei;
d) Proferir a decisão final sobre a apreciação e selecção dos candidatos à aquisição
de acções em processo de privatização por concurso público ou limitado;
e) Definir as condições específicas de alienação por via directa e escolher os
respectivos adquirentes, sobre proposta fundamentada da Unidade de
Privatizações e Parcerias Público-Privadas;
f) Escolher o procedimento de privatização.
Artigo 20.º
Competência do Membro do Governo responsável pela área das finanças
Compete ao membro do Governo responsável pela área das finanças orientar e conduzir
o processo de privatização, designadamente, e sem prejuízo da possibilidade de
delegação de poderes:
a) Anunciar as empresas e participações a privatizar;
b) Escolher as entidades, sob proposta da Unidade de Privatizações e Parcerias
Público-Privadas, que efectuarão a avaliação prévia das empresas e
participações a privatizar, nos termos do disposto no artigo 8.º;
c) Conduzir, através da Unidade de Privatizações e Parcerias Público-Privadas, as
negociações com os candidatos a adquirentes no concurso limitado ou na venda
directa;
d) Supervisionar, através da Unidade de Privatizações e Parcerias Público-Privadas,
a comissão prevista no artigo 21.º.
Artigo 21.º
Comissões especiais
1. Em cada um dos processos de privatização e em ordem à prossecução dos objectivos
fixados no artigo 4º, é constituída uma comissão especial para acompanhamento
daqueles processos, que se extinguirá com o respectivo termo.
2. As comissões especiais são criadas por despacho conjunto dos membros do Governo
responsável pela área das finanças e tutela sectorial, sob proposta da Unidade de
Privatizações e Parcerias Público-Privadas.
3. As comissões especiais a que se refere a presente norma são sujeitas à coordenação e
supervisão da Unidade de Privatizações e Parcerias Público-Privadas.
4. As comissões especiais têm por incumbência apoiar tecnicamente o processo de
privatização, de modo a garantir a plena observância dos princípios da transparência,
do rigor, da isenção, da imparcialidade e da melhor defesa do interesse público.
5. A escolha dos membros de cada comissão especial deve basear-se estritamente em
critérios de competência, devidamente justificados, tendo em conta, designadamente,
a experiência profissional ou académica em matéria económica, financeira e jurídica,
garantindo a multidisciplinaridade da comissão.
Artigo 22.º
Destino das receitas obtidas
As receitas do Estado provenientes da privatização podem ser utilizadas, no todo ou em
parte para, de entre outras de razões de interesse nacional ou geral:
a) O financiamento da Unidade de Privatizações e Parcerias Público-Privadas;
b) Fomento empresarial e industrial;
c) Amortização da dívida pública;
d) Amortização da dívida do sector empresarial do Estado.
Artigo 23.º
Proibição de aquisições
Não poderão adquirir acções, no quadro de privatizações por concurso limitado ou por
venda directa:
a) Os Membros do Governo;
b) Membros das comissões especiais;
c) Membros da Unidade de Privatizações e Parcerias Público-Privadas;
d) Entidades a que se refere o n.º 2 do artigo 8.º;
e) Todas as pessoas e entidades que pelo exercício das suas funções possam ter
acesso normal a informações privilegiadas no processo de privatização em
causa.
Artigo 24.º
Alienação de participações
A alienação de participações do sector público nas empresas públicas e participadas a
que se refere o artigo 3.º é regulada em diploma próprio.
Artigo 25.º
Revogação
É revogada a Lei n.º 47/IV/92, de 6 de Julho, alterada pelas Leis n.ºs 41/V/97, de 17 de
Novembro e 1/VII/2006, de 3 de Agosto.
Artigo 26.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor trinta dias após a sua publicação.
Aprovada em Conselho de Ministros de16 de abril de 2015.
José Maria Pereira Neves
Rui Mendes Semedo
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Proposta de Lei - Assembleia Nacional de Cabo Verde